segunda-feira, agosto 26, 2019

Não sei se é ela que não é humana como eu ou se é a mim que me faltam asas, molas e capacidade para desafiar as leis da Física.
Simone Biles.
A arte do impossível. Apesar de todos os pesares.


Nesta de -- desde que os pimentinhas, em dias consecutivos, terem tido o computador por sua conta -- no YouTube, agora me aparecer toda espécie de vídeos com feitos e desfeitos desportivos, acaba de me aparecer uma exibição do mais surpreendente que já vi. 

Sou muito fã de Katelyn Ohashi, a menina de borracha que tem uma alegria benfazeja a correr-lhe nas veias que, por sua vez, lhe dá uma elasticidade, uma graça e uma música ao corpo que a faz parecer uma boneca reboludinha a fazer proezas insólitas. Já Simone costuma parecer-me uma boneca de outro tipo, uma boneca mecanizada, um pequeno robot humano programado para dar saltos maiores do que as leis da física o permitiriam. Mas tendo a achar que falta ali aquela pitada de irreverência e de efeito surpresa que parece que condimenta a perfeição.

Mas hoje, ao ver o vídeo que abaixo partilho convosco, tenho que me render. O que aqui se vê mais parece uma coisa fake do que algo em que se possa acreditar. A altura a que ela se eleva nem sei a partir de que impulso, as reviravoltas que dá no ar no espaço de um único salto... Não é possível.
Se eu der um salto não sei a que altura me elevo. Meio metro? Talvez, se der balanço, um pouco mais? E que habilidades serei eu capaz de fazer durante a fracção de tempo em que estiver no ar? Uma tesourinha? 
Gosto sempre de me pôr no lugar dos outros para melhor poder avaliar o que fazem. É que, se me mantiver distante, acabo por não conseguir perceber tão bem a dimensão dos feitos. Assim, imaginando-me eu, humana e mulher como ela, a coisa ganha outros contornos. É certo que a minha idade, a minha altura e o meu peso são outros, é certo que o treino dela também ajuda. Mas, mesmo descontando ou acrescentando tudo isso, nunca na vida eu poderia ter feito tal coisa. Nunca. Creio que nem eu nem a grande maioria de seres vivos. O que aqui se vê é realmente ímpar.
E, se pensar no que ela já passou, em especial na infância, e, agora em particular, no facto de ter sido abusada sexualmente pelo choninhas Larry Nassar, o médico que supostamente a deveria acompanhar numa perspectiva puramente clínica e desportiva, ainda mais me espanto. Como é que alguém que sofre a violência e a vergonha* de um abuso sexual consegue, ainda assim, abstrair-se desse peso e desse tremendo sofrimento e continuar a treinar, a superar-se? É uma coisa extraordinária.

* E se falo em vergonha é apenas porque Simone, como muitas vezes acontece com as pessoas que são sexualmente abusadas, sofria em silêncio, temendo que a culpa tivesse sido sua, envergonhada pelo que lhe tinha acontecido.

Mas vejam, por favor, esta sua irreal actuação. Foi há dias em Kansas City, mais propriamente em 11 de Agosto.


E as palavras sentidas de Simone sobre os abusos que sofreu (ela e várias outras atletas) e da revolta que sente por não ter sido protegida pela organização que deveria ter zelado para que situações destas jamais acontecessem.


Salve Simone.

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