quarta-feira, agosto 14, 2019

Santana Lopes está a disputar o lugar a Pedro Pardal Henriques?
Cinco motoristas no piquete e os dois candidatos a estrelas populistas a tentarem brilhar para as câmaras...
Se o ridículo desse asas talvez ainda pudessem servir para drones. Assim servem para quê?
Ah, é verdade: o Pardal e o Ouriço serão gémeos separados à nascença?
Pergunto.


Acabei de ver na televisão o recibo de um motorista. Mil setecentos e não sei quantos euros por mês. Desses, mil cento e não sei quantos são sujeitos a descontos para impostos e segurança social. Acresce ao que recebem, mais seiscentos e tal 'limpos' que se referem a ajudas de custo para fazerem face a despesas com deslocações e estadias o que, a referir-se mesmo a este tipo de despesas, obviamente não é sujeito a descontos. Do que percebo, a luta resulta de quererem que os descontos e contribuições incidam também sobre estes seiscentos e tal limpos pois, segundo o Pardal, não tem a ver com ajudas de custo mas com outras verbas pagas 'debaixo da mesa'. Como sempre, o Pardal nunca mostra provas. Tudo na base das bocas. Mas, portanto, para receberem mais dinheiro no final do mês apesar de descontarem mais, os sindicalistas reivindicam aumentos completamente acima das percentagens normais (cerca de 1% ao ano são os aumentos que se costumam agora praticar -- e é quando é). E querem aumentos valentes sobre o salário base já que os subsídios decorrentes aumentariam também. E as reivindicações não são à leão só a esse nível: são reivindicações a la longue, para os próximos anos. Coisa nunca vista. Uma greve para reivindicar aumentos para os próximos anos? Nunca vi tal coisa.

E repare-se: não questiono que o que é tributável deve ser tributado. A lei é para cumprir por todos. Nem questiono o valor do ordenado em si. Não sei se o ordenado global mensal deve passar dos (1.100 + 600)/mês para os 2.200 ou, até, para ordenados à juiz, acima do ordenado do primeiro-ministro. Não questiono porque não tenho informação que me permita proferir uma opinião. Há que pensar bem no que se diz, ter uma noção da equidade, pensar no equilíbrio geral das partes envolvidas num sistema económico. Quem me diz que um trabalhador de recolha do lixo não é igualmente crítico e não deveria ganhar tanto como um destes motoristas ou que um trabalhador que faz a manutenção das condutas de água de abastecimento público não deveria ganhar tanto quanto um deputado? Eu gostaria de ganhar três vezes o que ganho e acho que toda a gente gostaria de uma coisa assim. E quem diz três vezes, diz quatro ou cinco ou dez. Só que ou os preços de venda das coisas teriam que ser incrementados à grande ou grande parte das empresas iria à falência. E, se os preços fossem incrementados à grande, ou toda a gente era aumentada na mesma proporção ou quem o não fosse ficaria na maior penúria, sem acesso a grande parte dos bens.

Por isso, esta matéria não é para conversa de café: é para ser estudada a sério, para elaborar estudos comparativos, estudos económicos. E tem que haver um grande sentido de justiça e de humildade. Se toda a gente desata a achar-se a maior e a querer aumentos principescos sem querer saber dos outros, está bem, está.

Alinhar em conversas de coitadinhos, em que todos se acham injustiçados sem querer saber dos que estão ao lado é assassino para uma sociedade. Leva a extremos como o da sanguinária greve selvagem às cirurgias em que a bastonária dizia, com naturalidade, que sim, que a greve iria aumentar o número de mortes. E é como aquele argumento bacoco de que se devem dar todos os aumentos que qualquer um se lembre de reivindicar em vez de se acudirem a um banco com problemas. E falam como se os bancos fossem antros de corrupção e quem lá trabalha todos uns malandros e corruptos. Então deveria fazer-se o quê? Deixar o banco ir à falência? As milhares de pessoas que lá trabalham tudo para o desemprego? Os depositantes ficarem a arder, perdendo tudo o que são poupanças acima da linha de garantia? Poupanças de uma vida? 
Claro que, se sempre que se suspeite de gestão deliberadamente danosa e/ou criminosa, deverá haver investigação e, se for caso disso, julgamento e, se tal assim determinado, condenação. Mas isso é investigar actos individuais. Outra é falar em geral e quase clamar que se deve deixar os bancos ir à falência, deixando, assim, cavar um fosso no sistema económico e financeiro do país. Só gente mal informada ou mal formada pode clamar assim. E, ainda por cima, misturar isso com reivindicações de motoristas... Só pode ser verdadeiros demagogos os que assim falam.
E como os patrões não cederam às exigências dos motoristas, vai daí uma greve por tempo indeterminado e o país que se lixe. E é isso que questiono: o formato egoísta desta luta e desta greve por tempo indeterminado e a desproporcionalidade das suas consequências. O sindicalismo deve ser um movimento solidário entre trabalhadores e não uma agremiação de corporações auto-centradas, auto-exclusivas, egoístas e brutais.

Um sindicalismo como este é assassino para os trabalhadores.

E isto tudo com os motoristas a toque de caixa do Pardal que, nitidamente, está nas sete quintas. Com as televisões sempre em cima, todo ele rejubila. Tem todo o palco para espalhar a confusão à vontade. 

Mas há quem lhe dê ouvidos
(Foto daqui)
Desta vez não apareceu no Maserati. Não senhor, gozão, provocador, desta vez o Pardal apareceu de trotineta. Do que se percebe e do que se vê nas televisões, a sua ocupação a tempo inteiro é esta, andar a cavalgar e a incentivar as reivindicações dos motoristas, armando toda a baderna possível. Não vou aqui especular de onde lhe vêm os rendimentos que não tenho nada a ver com isso e, de resto, para essas investigações há gente competente que, certamente, andará a tentar perceber o que, visto de fora, não se percebe.

Dois artistas: Pardal e Flopes
(Creio que a foto é do Observador)
Agora o que é extraordinário é ver o Bloco de Esquerda a apoiar este Pardal e, ao mesmo tempo, o Santana Lopes a aparecer no piquete a apoiar aquela meia dúzia que por ali ainda tenta salvar a cara. Dando uma no cravo e outra na ferradura, sem se perceber bem qual a dele a não ser querer aparecer, Santana fez mais um dos seus papelinhos ridículos. A oferecer-se para mediador? Estará mesmo a pensar que consegue roubar o mediatismo ao Pardal? Ná. Menino do coro ao pé do Pardal. Teria que fazer flic flacs à retaguarda em cima da trotineta, teria que perder a pouca vergonha que lhe resta, teria que perder aquele ar blasé de velha rata do laranjismo, teria que andar por todos os caminhos onde o Pardal se meteu e que, ao que se lê por aí, lhe valeram processos de burla e mais não sei o quê. Portanto, Caro Santana, caia na real. Escolha causas que sejam mais a sua praia. Por exemplo, ajude a formar um sindicato independente de cabeleireiras e manicuras, apresente um caderno reivindicativo e vá para a rua rodeado de profissionais das extensões e das nails. Isso, sim, seria mesmo a sua cara.

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Tirando isso, uma questão de fundo: o Ouriço e o Pardal serão gémeos separados à nascença?

[Se não estão bem a ver, ponham uns óculos ao ouriço que logo vêem se não é a cara chapada do mano pardal]







3 comentários:

Arber disse...

Pardal Henriques no Telejornal da RTP1, segunda-feira, dia 12:

“...os motoristas…estão a ver o Governo proteger quem 'prevarica', 'em prol' daqueles que lutam por uma condição de vida melhor”.

'Isto' (conceitos errados) é inadmissível num jurista/advogado!

Conclusão: os motoristas entregaram-se nas mãos de um ignorante.

Paulo Batista disse...

UJM,

Independentemente do valor líquido do salário dos motoristas, de qualquer discussão sobre a justiça de tal valor e da forma como a luta dos trabalhadores está a ser conduzida, nas entrelinhas da "espuma do mau jornalismo" o cerne do conflito mostra um problema muito difícil e muito profundo, que as pessoas (e muitos trabalhadores até!) desvalorizam. Um problema que constitui, talvez, o principal fator do crescimento galopante das desigualdades sociais. Um problema que corroi irremiavelmente o sistema político e o próprio estado de direito. Um problema onde a letra da lei (laboral) serve mais para inglês ver, do que para ser aplicada.
Os esquemas de remuneração dos motoristas, que têm vindo a público, são um espelho claro desse problema sistémico. E nem é preciso ir pelo caminho das alegadas "remunerações por debaixo da mesa".
Vejamos. Este recibo de motorista, divulgado pela TVI: https://tvi24.iol.pt/videos/quanto-pode-ganhar-um-motorista-de-materias-perigosas/ permite ter uma boa base de discussão:
- 845€ de ajudas de custo
- ~400€ de remunerações suplementares (previstas no contrato coletivo de trabalho: subsidio de condução de veículo TIR - 130€ - e subsidio de transporte internacional)
- ~300€ de trabalho suplementar (horas de trabalho que, aparentemente, têm muito pouco de extraordinário, mas sim de regime normal de trabalho, e que, na boa fé do tal recibo, corresponderá a qualquer coisa como 2/3h de trabalho suplementar, todos os dias durante um mês, pagas ao valor da hora normal de trabalho).
- Isto tudo para um ordenado base de 630€ (ordenado mínimo, portanto)

Ora, partindo da boa fé deste recibo de vencimento, assinalemos dois pormenores: i) o trabalho suplementar tem um limite de (se não estou em erro) 200h/ano, pelo que os tais 300€ seriam pagos, no máximo, durante 2,5 meses de trabalho apenas, reduzindo significativamente a remuneração anual; ii) pelo valor auferido, as ajudas de custo corresponderão a cerca de 16 dias no mês deslocado fora do local de residência - assumindo um valor de 50€/dia para hotel e refeições - se o regime for semelhante ao da função pública, usualmente considerado generoso; neste caso, note-se que estas ajudas de custo não são remuneração, pois são necessidades básicas de quem se vê obrigado a pernoitar e a alimentar-se fora de casa (pelo que é de má fé considerá-las como "remuneração" do trabalho prestado!).
Assim, partindo só da boa fé destes números, se a prática das empresas, no que se refere à organização das atividades laborais, implica, necessariamente, que o trabalhador passe 16 dias / mês deslocado fora de casa e a realizar, sistematicamente, 2h/3h de trabalho suplementar, parece-me perfeitamente justo que o ordenado base seja superior ao ordenado mínimo. Aliás, a reinvindicação é de um valor em torno dos 900€ de remuneração base, a atingir daqui a 3 anos (ou 1000€ daqui a 6 anos no caso de ser aprovado um novo contrato coletivo de trabalho).

É uma proposta exagerada? Tenho sérias dúvidas. Afinal, parece-me justo que um trabalho, que exige dos trabalhadores uma disponibilidade extra para além das condições de trabalho de referência (8h/dia) tenha uma remuneração base ligeiramente acima do ordenado mínimo. Mais, os valores parecem estar abaixo do ordenado médio nacional - em 2017 a remuneração base média em Portugal andava nos ~917€ e, provavelmente, apenas ligeiramente acima do ordenado mínimo... o que, se tivermos em conta as tais condições de trabalho que exigem jornadas de trabalho longas e deslocadas do local de residência... parece-me equilibrado!
Afinal, o que podemos classificar como extraordinário nas reinvindicações expostas? https://www.tsf.pt/portugal/economia/interior/o-que-querem-afinal-os-motoristas-as-cinco-razoes-para-a-greve-mais-temida-11189934.html ?!

Parte 1/2

Paulo Batista disse...

Parte 2/2

Note-se que nem estou a entrar nos terrenos lodosos das remunerações declaradas em rúbricas não sujeitas a impostos ou com impostos reduzidos. Isto apesar de conhecer casos muito concretos, noutros setores de atividade, onde essas práticas - que violam os mais elementares principios da legislação laboral (e do sistema de segurança social...) são o "pão nosso de cada dia". E às quais muita gente fecha os olhos, desde patrões e trabalhadores, ao próprio estado (que tem prática semelhantes, "semi-legais"). Infelizmente, aqui, publicamente, não posso mostrar dois ou três recibos de vencimento de outros sectores de atividade (onde o sindicalismo é inexistente) e descrever como tais recibos deturpam as regras base da legislação laboral. Pessoas que trabalham frequentemente 10h a 12h/dia durante todo o ano e excedendo o tal limite de 200h anuais, sem que essas horas sejam declaradas ou sequer pagas "por fora"; pessoas que são coagidas a não usufruir das férias; pessoas que trabalham sem contrato de trabalho; etc. E isto em sectores que são a estrela da nova economia nacional (turismo, restauração, logística...).
A economia não suporta? As empresas não suportam salários mais altos? Salários mais altos implicam aumentar o preço dos produtos ao consumidor? Talvez. Mas se estes são os últimos argumentos... então temos um problema político gravíssimo. E não nos admiremos com a radicalização de quem está na base (a receber o ordenado mínimo como base) da cadeia trófica deste sistema voraz.