quarta-feira, fevereiro 27, 2019

Trompe l’oeil: a arte da ilusão




Mais do que os ângulos óbvios, a mim atraem-me os dúbios, os súbitos, os incompreensíveis. Se possível, indecifráveis.


Claro que uma flor é uma flor é uma flor e que, por isso, há que respeitá-la não a mascarando entre ilusões. Ou uma árvore. A dignidade de uma árvore não permite a dispersão. Afinal uma árvore também é uma árvore também é uma árvore. Mas o reflexo de brinquedos numa janela de vidro de onde se vê o jardim pode dar uma ilusão interessante. Ou o emaranhado a la Pollock de mil pequenas folhas, pequenos pauzinhos, pedrinhas, florzinhas -- também curioso. 

Também me interesso pelo que não se vê do exterior. Uma fenda numa parede de onde nasce uma luz vinda não se sabe de onde, um navio que nasce de um telhado plasmado na janela da minha sala, uma lua suspensa nos ramos nus tangenciais a um telhado.

Na vida a três dimensões também me interesso pelo que existe sob a pele, seja a minha, seja a dos outros. 

Por exemplo, alguém sempre sorridente que, afinal, está em sofrimento por uma razão que ninguém imagina e que precisa tanto de desabafar. Ouvi-la, espantar-me por ela saber disfarçar tão bem. Ou outra pessoa, conhecida pelo seu profissionalismo numa área bem comum e que, afinal, é também pintora, com obra exposta. Ou um outro, pessoa com vários cargos relevantes, uma vida profissional preenchida, com muitas viagens a muitos países, alguns bem longínquos, e que, afinal, nada conhece do seu país e, na verdade, pouco parece conhecer do mundo real.

Situações que fazem nascer a vontade de olhar melhor, de prestar mais atenção para conhecer o que está para além do imediato. A vida como uma infinita sucessão de camadas quase invisíveis. Ou de véus. Ou de espelhos.

Isto a propósito de.

Sou devota de Steve McCurry. De cada vez que há uma entrada no seu blog, vou logo espreitar. E são sempre imagens extraordinárias, algumas das quais cometi a ousadia de trazer aqui. E gosto de ver as sóbrias citações que escolhe para acompanhar as imagens. O post de hoje tem o nome que dei a este meu. E foi de lá que também transcrevi, em tradução livre, o que abaixo coloco em itálico.
Vivemos num mundo de fantasia, um mundo de ilusão. A grande tarefa que temos na vida é encontrar a realidade.
– Iris Murdoch
Há uma ilusão de óptica em cada pessoa que conhecemos 
– Ralph Waldo Emerson
Sou obcecada com o trompe l’oeil – a ideia de algo que existe e não existe
– Alessandro Michele

Não é todo este mundo uma ilusão?
– Angela Carter


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Trompe L'Oeil -- Jiří Kylián



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