Bem, vamos ver por que ponta hei-de começar.
Talvez pelos comes. Na véspera de Natal coube-nos levar as entradas e as bebidas. Para inquietação do pessoal, em particular do meu filho que receia sempre que a mãe se exponha ao ridículo, resolvi improvisar. É mais forte do que eu. Não consigo cingir-me a receitas. Ocorrem-me ideias e invento em cima do acontecimento, sem rede. Aliás, quando anunciei que ia fazer empadas de farinheira e mini-quiches de alheira e toda a gente me perguntou se eu as sabia fazer, desestabilizei-os ainda mais dizendo que não e que ainda não tinha ideias claras de como me desembrulhar da ideia que me ia na mente. Acham que é uma imprudência e eu também acho, mas fazer o quê?
Levámos também gambas, paio alentejano, queijo das Beiras, não me lembro agora de onde mas, confeccionado por mim, foi isto das empadas e mais as tâmaras enroladas em bacon, um clássico como o meu filho diz.
Penso que isto das tâmaras toda a gente deve saber fazer porque, de facto, é um clássico e porque não tem nada que enganar.
Tâmaras com bacon
Compram-se tâmaras sem caroço ou tira-se o dito. Compra-se bacon laminado para ficarem as tiras bem finas. Cortam-se ao meio para não ficar muita roupa em volta da tâmara.
Com cada metade de fatia, envolve-se sua tâmara e prende-se com palito.
Depois põe-se num pirex ou num qualquer tabuleiro de forno e leva-se à temperatura de 170º (mais coisa menos coisa), até que se veja que o bacon está louro e a tender para o estaladiço.
É uma coisa sempre boa.
Mas então deixa lá ver se ainda me lembro de como fiz as ditas habilidades e vou dizer a dose para cada seis, isto é, para o que se vê na fotografia.
Empadas de farinheira
Fiz uma massa de quiche - cerca de 250gr de farinha normal, um bocado de planta (habituei-me a usar margarina vegetal pois acho que é mais saudável que a gordura de origem animal e já me habituei ao sabor, já me parece boa), uma pitada de sal e água que vou juntando até atingir a textura pretendida, nem líquida nem excessivamente seca. Envolve-se tudo com as mãos até ficar uma bola que se destaca do fundo e das paredes do recipiente onde a estamos a preparar. Depois deixei a repousar por uns 15 minutos.
Entretanto, numa frigideira coloquei um pouco de azeite, cortei fininho uns dois dentes de alho a que juntei uma folha de louro e deixei que o alho abrisse. Nessa altura juntei duas maçãs descascadas que cortei em cubinhos finos. Deixei que a maçã amolecesse. Juntei, então, a farinheira aos bocados (depois de a tirar da tripa) e mexi. A seguir, juntei um bocado de leite para ficar uma papa grossinha e juntei folhas de espinafres (geralmente compro sacos de folhas pequenas já lavadas mas é indiferente, uso destas porque é mais prático). Envolvi bem para que as folhas amolecessem. Fui mexendo até estar uma papa que se destaca levemente do fundo.
Entretanto, imaginem, não dei com o rolo da massa (devo ter dado com ele na cabeça do meu marido e ele, com medo que eu repetisse o castigo, deve tê-lo escondido). Portanto, à última da hora surgiu-me esta dificuldade.
Até as forminhas de papel eram pequenas demais para estas empadonas de aspecto rústico (mas boas!) |
Ah, é verdade. Na terça feira, quando me veio à cabeça esta ideia lembrei-me que tenho as formas de empadas e queques na outra casa, in heaven, e, então, tive que ir ao supermercado comprar outras. As que lá vi pareceram-me muito pequenas e, então, resolvi trazer uns tabuleiros com 6 cavidades cada. Só quando estava a usá-los é que vi que eram formas de muffin, ou seja, enormes para o fim em vista. Nada a fazer, bola para a frente.
Untei, então, as cavidades com planta. Fiz bolas pequenas de massa e, à mão (que remédio), estiquei directamente na forma até revestir as cavidades, deixando a massa a sobrar no bordo para depois tapar.
A seguir, meti umas colheradas de recheio em cada uma das 6 cavidades (como a cavidade é grande, levou uma bela quantidade). Tapei com a massa que estava a sobrar e remendei com restos que estavam na taça onde tinha feito a massa. A seguir cobri com queijo mozzarella ralado e polvilhei com uma mistura de sementes que aqui tinha (sésamo, linhaça, girassol).
Levei a forno médio, os tais 170º. Quando ficaram louras, tirei-as. Escusado será dizer que ficaram um exagero de grandes.
A seguir, meti umas colheradas de recheio em cada uma das 6 cavidades (como a cavidade é grande, levou uma bela quantidade). Tapei com a massa que estava a sobrar e remendei com restos que estavam na taça onde tinha feito a massa. A seguir cobri com queijo mozzarella ralado e polvilhei com uma mistura de sementes que aqui tinha (sésamo, linhaça, girassol).
Levei a forno médio, os tais 170º. Quando ficaram louras, tirei-as. Escusado será dizer que ficaram um exagero de grandes.
Enquanto estas estavam no forno, atirei-me à aventura seguinte.
Mini-tartes de alheira de caça
Aqui resolvi fazer uma massa fluida que a minha mãe no outro dia me tinha ensinado. Colocam-se numa taça dois ovos inteiros, um generoso fio de azeite, um pouco de sal, leite e umas colheres de farinha. Mexe-se com um garfo e vai-se juntando leite ou farinha até a massa ficar nem líquida como a dos crepes nem grossa como a das empadas.
A seguir, enquanto a massa repousava um pouco, passei para o recheio.
Numa frigideira coloquei azeite, piquei uma cebola e deixei estrugir levemente. Depois piquei salsa e envolvi. A seguir juntei a alheira (que, por acaso, era de caça mas podia ser outra) cortada aos bocados depois de retirada da tripa envolvente. Juntei leite e um pouco de farinha e novamente uma boa mão cheia de folhas de espinafres. Mexi até envolver tudo bem. A seguir juntei um ovo inteiro e continuei a mexer até estar com consistência relativamente sequinha mas não muito para poder servir de recheio.
No tabuleiro, com as ditas cavidades devidamente untadas, coloquei até meio a dita massa fluida, depois, ao meio, coloquei largas colheradas da massa de alheira e tapei com o resto da massa. Voltei a cobrir com queijo ralado e lá foi o tabuleiro para o forno.
Aqui foi um susto. Aquilo desatou a crescer, a crescer (e a farinha não tinha fermento...). A fotografia é de quando ainda estavam no forno neste processo de crescimento, já grande parte delas fora da cavidade.
Quando estavam louras, tirei-as. Gigantes.
Pois tenho a dizer-vos (e vou deixar-me de modéstias) que, apesar de anormalmente grandes, estavam todas uma maravilha, boas, boas.
Como cada uma seria quase uma refeição, na altura de as comer, cortámo-las aos quartos ou às fatias largas. Mas posso afiançar-vos que foi uma agradável surpresa, incluindo para os mais cépticos que temem sempre o resultado das minhas aventuras.
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Nem vou referir o resto dos outros pratos da véspera de Natal, já não a meu cargo, (por exemplo, linguini de polvo e mexilhão, bem bom), mas deixem que vos refira uma cena que, mal a vi, até me lembrei logo de um post que aqui coloquei há dias mas, enfim, noblesse oblige, dei um chega para lá nos pensamentos e fiz de conta que não dava para ligar o nome à pessoa que é como quem diz ao animal: um leitão inteirinho, cabeça, patinhas, tudo. Tentei não olhar de perto - e o que eu gosto de um leitão estaladiço, mas uma coisa é ver um bocado de carne no prato e outra é ver o bicho em pessoa. Na altura de o trinchar, tentaram que fosse o cirurgião a ocupar-se do trabalho já que está habituado a manejar o bisturi e deveria sair dali um trabalho a preceito. Mas declinou, a sua experiência é com carne não assada e acho que privilegia métodos menos intrusivos. Atiraram-se à faena um bando de calmeirões que deram bem conta do recado e cujos sentimentos não ficam feridos por terem no prato a cabeça do animal ou as patinhas. Credo. O meu filho, para gozar comigo, disse-me que o polvo que comi sem pestanejar também tinha bons sentimentos. Enfim. Depois de me abstrair da visão do animal inteiro, comi partes não identificadas e devo dizer que estava de se lhe tirar o chapéu (sorry Maggie...). Acompanhei com castanhas fritas, coisa que nunca tinha comido e que é muito boa.
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Entretanto, o almoço de Natal foi cá em casa. Entradas várias e, para primeiro prato, fiz bacalhau cozido com todos, nomeadamente, couve galega, feijão verde, cenoura, batata, grão e ovo. Nada a referir neste caso, nada a saber.
E, para segundo prato, galo capão recheado.
Acho que é melhor que peru. A carne é mais saborosa (e, lá está, abstraio-me da questão dos sentimentos dos animais...).
Fiz um recheio com pão de sementes, flocos de aveia, bacon aos cubinhos, bocadinhos de chouriço e pequenos cubinhos de fruta, tudo temperado com sal e um fio de azeite. Envolvi com leite e um ovo para ficar uma papa grossa.
Fiz um recheio com pão de sementes, flocos de aveia, bacon aos cubinhos, bocadinhos de chouriço e pequenos cubinhos de fruta, tudo temperado com sal e um fio de azeite. Envolvi com leite e um ovo para ficar uma papa grossa.
Quanto ao galo, metendo a mão entre a carne e a pele, inseri fatias de bacon em toda a extensão. Coloquei a papa de recheio na cavidade abdominal mas não 'atasquei' para o calor circular e cozinhar bem.
A seguir esfreguei a pele exterior com azeite, sal, orégãos, sal picado, alecrim.
Coloquei-o, então, numa grelha daquelas que pertence a um tabuleiro que em baixo dá para colocar legumes que vão ficando temperados pelo molho que vai escorrendo do galo. Antes de colocá-lo no forno, o forno aqueceu a 250º durante os 10 minutos. Quando o galo entra, baixa-se a temperatura para 160º. Fica ali durante cerca de 5 horas já que pesava cerca de 4 kg e gosto que cozinhe a temperatura baixa.
Não fiz doces porque não sou doceira mas veio um arroz doce delicioso feito pela mãe da minha nora e que tinha sobrado da véspera de Natal e veio uma tarte merengada e um bolo de mármore que a minha filha trouxe da Padaria Portuguesa.
Claro está que sobrou comida como se não houvesse amanhã mas, enfim, quem quis levou marmita para casa e, com o que cá ficou, sou capaz de ter comida para aí até ao Ano Novo.
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Ao fim da tarde, ainda de barriga cheia, fomos todos para casa dos meus pais e aí parecia que havia banquete de casamento: quiches, crepes, recheio doce e salgado, bolos, doces vários (incluindo um delicioso clafoutis de maçã que adoro desde miúda e de que ainda cometi o desplante de trazer um bocado para minha casa). A minha mãe é assim, outra imoderada. Depois tinha ainda rabanadas recheadas de gila que mais que a minha tia lhe levou. Bombas calóricas como eu sei lá.
Quando vimos a mesa, farta como sempre, tivemos a exclamação de sempre, Credo, que exagero! Mas para que é isto tudo? e a a minha mãe, sorrindo, que Então, ia ter só torradas? Mas, entre voltar a abrir presentes, conversa e etc, fez-se noite e o apetite voltou em força. Por fim, os miúdos, então, que tinham almoçado pouco, tal a excitação dos presentes, comeram na base do é fartar vilanagem! e os jovens casais vieram carregados de comida que comerão também ao longo da semana ou congelarão. E a minha mãe ficou toda contente por ver que toda a gente aprecia tanto as suas iguarias.
Claro que o meu pai já estava na cama, não aguenta estas situações, sente-se diminuído. Gosta que lá estejamos mas, ao mesmo tempo, é um sofrimento. Compreendo, mas não há nada que se possa fazer. E, de resto, sei que, no fim, ficará contente por lá termos estado.
Claro que o meu pai já estava na cama, não aguenta estas situações, sente-se diminuído. Gosta que lá estejamos mas, ao mesmo tempo, é um sofrimento. Compreendo, mas não há nada que se possa fazer. E, de resto, sei que, no fim, ficará contente por lá termos estado.
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Quanto a estes despropósitos gastronómicos, está bem de ver que já devo ir com 20 kg a mais e agora claro que não jantei, estou aqui a beber uma água das pedras a ver se me limpo minimamente dos excessos cometidos.
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4 comentários:
Caríssima UJM
Só de ler as "receitas" e de ver as fotos fiquei, literalmente, a "babar-me".
Nem imagina o que gosto, tanto de alheiras como de farinheira....
As entradas que fez não tenho dúvidas que ficaram "heavenly".
Eu passei o dia 24 e hoje em casa das minha irmã , que também é muito dada a invenções e improvisações no que toca a receitas.
Como sou um nadinha fundamentalista ( a pancadinha de neto e filho de primos direitos ) no que toca a comidas ( gorduras e açucares e não tenho nem "Castrol" nem triglicerídeos, imagine se tivesse... ) não abusei muito e portei-me muito bem.
Mas isso não impede de , pelo menos durante uma semana, recomeçar os 12 km de caminhadas diárias, depois do Ano que aí vem.
Obrigado pela partilha e fico sinceramente contente que tenha passado um Natal Feliz com os que lhe são queridos.
Uma boa noite e tudo de bom
Um abraço
HB
Belas ementas! Só de ler já estou a engordar. E eu, que devia cozer a boca, também me estendi um bocado. Mas paciência, vou ter de reduzir nos próximos dias.
Adoro as suas invenções porque eu também adoro inventar e muitas vezes até me serve para descontrair.
Abração
Boas Festas querida jeitinho. Tudo de bom para si e para a sua familia.
Beijinhos Ana
Também faço umas empadas de farinheira ou alheira com espinafres, mas nunca juntei mãças. Vou experimentar, a mistura do doce com o salgado deve ficar agradável. Mas isto só para o ano que vem, porque a partir de hoje tenho que entrar em dieta rigorosa. Esta época deixa-me sempre marcar de crescimento para os lados. Para além dos excessos do natal tenho os do meu verdadeiro natal a 26, que é o aniversário do meu filho. Um verdadeiro festival de pecados e o corpo é que paga.
MCarmoMarcos
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