No post abaixo já relatei o coro de impropérios que se levantou durante o meu jantarinho de amigos aquando da visão da Leal Lápara de gatas sobre a bancada e, depois, no estúdio da TVI 24 a desdizer-se em toda a linha, na maior sem vergonhice. Aquela mulher, para além de tudo, parece nem tem maneiras de espécie alguma, nem cívicas, nem morais. Que coisa. Como será aquilo a receber convidados na Embaixada de Madrid? Pôr-se-á de gatas em cima da mesa a ameaçar a Letizia se esta não lhe fizer alguma vontade? Já não digo nada.
Bem, isso é a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra.
Ainda 'A morte sem mestre' de Herberto Helder
(Livro, contra-capa e cabeça em barro pintado, peça de artesanato)
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E música, se faz favor,
I will say goodbye
Como de costume, gosto de saber o que pensa o meu marido daquilo que escrevo. Por isso, no dia seguinte interrogo-o sempre. Não é fácil. O que me vale é que não sou de desmoralizar facilmente e que, para além disso, já dou algum desconto.
Hoje foi assim:
Leste?
Sim.
O que foi?
... Eram três coisas...
Sim. Quais?
...
Já nem te lembras, vê lá o que tu ligas.
...
A Leal Coelho...
A Leal Coelho...
Sim. E...?
...
...
... o desmaio...
De quem?
Do Cavaco...
E...?
...
Já não te lembras?
...
...
... Ah, sim, do puto.
E o outro?
O outro quê?
O outro post. Eram 3.
...
Então?
... Ah, sim, uma coisa do Herberto Helder.
Vá lá...! E o que é que achaste?
O que escreveste da Leal e do Cavaco pareceu-me bem.
... e do Herberto Helder?
Umas coisas.
O quê?
Umas coisas.
Não estou a perceber o que é isso de 'umas coisas'.
Umas coisas.
Não estou a perceber o que é isso de 'umas coisas'.
Escreveu umas coisas por ali abaixo e diz que é um poema.
Mas não gostaste?
Se fosse eu a escrever aquilo, toda a gente dizia que eu era maluco.
Ou seja: não gostaste?
Como tem 83 anos já está naquela fase em que escreve o que lhe vem à cabeça.
Pronto. Está bem.
Ficámos assim.
Confesso que, com alguns destes poemas, também fico desconcertada, também eu me interrogo: é isto poesia?
Fico na dúvida, juro.
Confesso que, com alguns destes poemas, também fico desconcertada, também eu me interrogo: é isto poesia?
Fico na dúvida, juro.
Vou transcrever mais um bocado de outro. Este é um bocado diferente.
Como é sabido a poesia de Herberto Helder é muito na base do poema contínuo. Mas eu gosto de isolar partes, ler bocados como seres autónomos.
Como é sabido a poesia de Herberto Helder é muito na base do poema contínuo. Mas eu gosto de isolar partes, ler bocados como seres autónomos.
- levem (lavem) a minha cara, eu sou outro,
levem a minha alma,
levem a minha amante e troquem-na por outra,
outra mais conforme à mulher que não existe,
e ponham tão baixo a música que deitado no chão estreme
só eu a ouça, a música escrita apenas
para a minha loucura, a paixão, a aflição, a explicação
da minha biografia irónica e sensível:
e não se esqueçam: as putas todas e as virgens todas nas
minhas câmaras vazias,
manda o rei terrífico com voz política,
aquela voz que de muito falar já treme um pouco,
que eles não saibam sobretudo que já estou demente
(mas toda a gente sabe)
tragam-me as putas todas, religiosas, profanas ou outras,
o meu pénis tem o tamanho de um ceptro
(e ergue o ceptro que tem cerca de metro e meio,
e na verdade o sexo dele é até maior um pouco),
trespasso-as da côna ao coração
(e que mulher não tremeria de pânico e oculto gozo?),
e assim passa ele o tempo e o medo e o mundo
e eu que me esqueci de cultivar: família, inocência,
delicadeza,
vou morrer como um cão deitado à fossa!
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A música é I Will Say Goodbye do Bill Evans Trio (Bill Evans: piano; Eddie Gomez: bass; Eliot Zigmund: drums). As pinturas são de Egon Schiele.
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Relembro: desçam um pouco mais se quiserem saber de uma lápara sem vergonha na cara e com uma matraca em vez de língua.
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