Como aqui o expressei, não acreditava que o PSD fosse ganhar. Não vou em cantigas. Guio-me pela minha intuição mas, também, pela razão. Não apenas não vi que a população estivesse, de forma geral, insatisfeita com a governação socialista como não acredito que se deixe completamente manipular pela chusma de comentadores, jornalistas-comentadores e convidados-avençados nem pelos argumentos hipócritas e imaturos do Bloco nem pelos argumentos antiquados e arrevesados do PCP nem pelas arruaças da direita.
Ora, em vez de apostarem na desmontagem deste perigoso argumentário, formando uma barreira contra o Chega, o Bloco e o PCP apostaram antes em dizer mal do PS. Por outro lado, o PSD e o CDS pensaram que o bom seria mimetizarem o Chega, apostando num bota abaixo ao Costa.
Mas uma coisa é certa: se há muita gente mal informada, na sua maioria os portugueses não são parvos. O governo do PS tem sabido gerir bem este período da pandemia não apenas numa perspectiva de saúde pública mas também de atenção social e humana aos mais atingidos pela crise, tem sabido relançar a economia, tem sabido controlar o défice, tem sabido desagravar a dívida pública apesar das mil dificuldades, tem sabido controlar, e bem, o desemprego, tem sabido manter o país informado e coeso. Portanto, pela cabeça de quem passaria acreditar que os portugueses queriam acabar com esta governação?
Acabar com o governo de António Costa para lá meter quem? O Chicão... porque dizia que ia acabar com o Acordo Ortográfico...? O Jerónimo porque tem melhor dicção que o Costa...? O Rui Tavares porque a Justiça em Portugal funciona como se sabe e há que penalizar o PS...?
Por isso, sempre acreditei na vitória do PS e, por isso, desejei que o resultado eleitoral garantisse alguma estabilidade.
António Costa diz, e é o que penso, que maioria absoluta não é sinónimo de poder absoluto. E temos um Presidente da República que garantirá o normal e saudável funcionamento das instituições. Portanto, a quem assusta a maioria absoluta? O que assusta é a instabilidade, o que assusta é que o Chega se unisse ao PSD, o que assusta é que o País voltasse a andar para trás.
Dito isto, penso que, agora que o Partido Socialista obteve a maioria absoluta, é tempo para se abrir ao futuro, começando a trabalhar mais energicamente numa transformação em direcção à modernidade. É preciso fazer mais, melhor, mais agilmente... e diferente.
Temos ainda uma classe dirigente a nível da gestão bastante iletrada e, logo, ineficiente e improdutiva. Temos ainda uma mentalidade muito quadrada, muito presa a ortodoxias, pouco aberta à cultura e à diversidade. É preciso criar momentos de reflexão e ter a coragem de ousar. Façam-se pilotos, testem-se modelos, inove-se. Não coisa de boca, para o papel, para inglês ver. Não: inove-se na maneira de trabalhar, na maneira de estar e, em alguns pontos, na maneira de ser.
Em especial a nível urbano, em especial nas camadas mais jovens, a IL é ouvida com atenção. Isso não deve ser levado a brincar. Há na Iniciativa Liberal algumas ideias que merecem ser ouvidas. Mesmo que não sejam para ser lidas integralmente à letra, deve ter-se em atenção que contêm a vontade da mudança. O PS deve estar aberto a esta vontade. E não são apenas as ideias: é também a atitude. A atitude da IL é uma atitude cordata, cosmopolita, desempoeirada -- e isso é louvável.
O PS tem entre os seus militantes e simpatizantes gente muito boa e deve saber valer-se disso. Mas, ao mesmo tempo, deve fugir do aparelhismo, das soluções autocentradas e burocráticas, do facilitismo. Deve ouvir e receber com agrado sugestões que visem aproximar o País de outros países mais desenvolvidos mesmo que isso configure algumas disrupções.
Mas deve ouvir também, com atenção, as sugestões válidas que provenham do PSD, do PCP e do Bloco. Acredito que estes três partidos, com o banho que levaram nestas eleições, provavelmente com novas lideranças, venham a ter uma atitude de humildade e de lealdade perante os portugueses.
Uma vez, num fórum de inovação promovido pelo Grupo a que estava ligada, sugeri que convidassem um filósofo como orador. Não quiseram. Mas acho essencial que se tragam os agentes da cultura, do saber, da investigação para o debate público nem que seja apenas para nos fazer pensar de outra maneira, para enriquecer a nossa visão com outras perspectivas.
E que se percebam os problemas de base da sociedade para que se invista onde as necessidades são mais básicas e prementes: nas creches públicas, no ensino e na saúde tendencialmente gratuitos, na formação de adultos, em residências seniores assistidas também tendencialmente gratuitas ou em redes de assistência domiciliária a idosos, no acolhimento inclusivo e de qualidade aos imigrantes, em habitação de baixo custo para os mais desfavorecidos e/ou para jovens. Etc. A baixa natalidade é uma ameaça à coesão nacional e à confiança no futuro. Por isso, tem que se investir em tudo o que comprovadamente inverta essa tendência. E o envelhecimento não tem que ser um sufoco ou um fardo para os próprios e para as famílias. O envelhecimento tem que ser digno e feliz.
Por exemplo: deve incentivar-se o teletrabalho sempre e onde seja possível (de forma controlada, obviamente) e a semana com menos horas de trabalho, deve promover-se a existência de mais espaços verdes e de hábitos de vida mais saudável, deve assegurar-se o absoluto respeito pela natureza, a adopção de práticas mais sustentáveis em todos os momentos da nossa vida. Etc.
Estou certa que, com as mãos mais livres, o PS irá saber interpretar o querer e o sentir dos cidadãos, irá trazer ideias novas para melhorar a qualidade de vida de todos e não irá desbaratar o capital de confiança que recebeu dos eleitores.
Por isso, mais do que tempos de compromisso, espero que sejam tempos de boa mudança os que aí vêm.
Portanto, boa sorte a António Costa. E, desejando muito boa sorte a António Costa, estou ao mesmo tempo a desejar muito boa sorte a todos nós.
_________________________________________________________
E queiram continuar a descer caso queiram ler o que fui escrevendo ao longo da noite eleitoral destas Legislativas 2022
2 comentários:
Há que concordar com quase tudo o que escreve. Mas inovação, testes, experiências-modelo... Não foi para isso que as pessoas votaram PS, se o fosse tinham dado mais peso ao Livre, o único partido de expressão (ainda que mínima) desse desenvolvimento moderno, inovador e verde (por cá nem se sabe quem é o Volt, por exemplo). Com PS, espera-se que haja estabilidade para um desenvolvimento paulatino, mais sustentado do que até hoje foi possível com a possibilidade histórica do PRR. Digo isto, tendo votado PS, assustado como tantos na possibilidade louca de um Rio no poder, como queriam as TVs e os jornais, com uma esquerda incapaz de se unir em pontos básicos, querendo exigir coisas impossíveis para agradar a fações radicais que já não existem na sociedade, só nos partidos deles, com um Livre que pensei tivesse desaparecido após o fiasco Joacine. Enfim. É o que temos. Não espero brilhantismo do Costa (salvo na habilidade política), agora tornada desnecessária), mas espero boa vontade e trabalho e algum desenvolvimento económico e social.
na sua maioria os portugueses não são parvos?
Enviar um comentário