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quinta-feira, setembro 04, 2025

Um dia difícil -- e uma notícia horrível ao fim da tarde

 

Primeiro quero ver a situação resolvida. Tenho testemunhado, com alguma perplexidade, como, nos temas da Administração Pública, a forma como os assuntos são resolvidos tem muito a ver com as pessoas (ou as repartições) onde o assunto vai tratar. E há do lado de quem tem o poder de os resolver uma total prepotência. Dizem que é assim e, por muito que esse 'assim' seja absurdo, arbitrário, e mesmo que digamos que no Atendimento Telefónico ou noutras repartições nos tenham ito que pode ser resolvido de outra maneira, respondem que não querem saber, que ali é assim e que estão a cumprir os procedimentos. E tenho testemunhado, repetidamente, que dali não saem. Pode o assunto ficar empancado e podemos tentar mil abordagens que não adianta.

Por isso, não quero cutucar a fera com vara curta. Vou manter-me sossegada até ter o mais recente assunto resolvido. Há outro dos assuntos de que já desisti com grande prejuízo meu e apesar de ser a coisa mais aberrante do mundo. Mas desisti. Não tenho energia para continuar a marrar numa parede que não cede, só a minha cabeça é que fica moída. Mas este último assunto estou em crer que vai ficar resolvido. E aí apresentarei uma reclamação e tentarei expor o absurdo e a prepotência a que nos submetem.

Por ora limito-me a dizer que foi mais um daqueles stresses em que parece que tudo corre mal, em que parece que estão a fazer um favor, em que, no fim, quando depois de para ali estar a apresentar papéis, a preencher, a assinar, a esperar, a bolinha baixa, baixinha, e penso que finalmente vou conseguir sair de lá com tudo resolvido, não senhor. Dão-me um papel em como entreguei um papel. E o chefe irá analisar e irá resolver. Haverei de receber em casa o que houverem por bem resolver. E boa tarde.

Como sempre me acontece, e há-de haver uma explicação para isto, quiçá somática, saí de lá a sentir-me meio esgazeada, desidratada de todo. Para além disso, aflita para fazer chichi. Por inacreditável que possa parecer, num local daqueles em que uma pessoa pode passar uma tarde, não há casa de banho. 

Portanto, saí de lá exaurida, a sentir-me agredida, violentada, e sem vontade de falar, e, como se já não bastasse, também com vontade de ir a uma casa de banho e com vontade de, a seguir, ir repor os meus níveis funcionais. E assim foi. Depois de descobrir uma casa de banho, fui a uma pastelaria e comi um bolo altamente calórico e altamente glicémico e bebi um sumo fresco também altamente glicémico. O meu marido, que não foi comigo tratar dos assuntos (e ainda bem que não foi, senão ainda armava para lá um escabeche), mas que, depois, me acompanhou à pastelaria, estava escandalizado, que eu não tinha cuidado nenhum com o que ingeria, que era um total disparate, tanta caloria, tanto açúcar. Mas, vá lá eu perceber porquê, sentia que precisava mesmo daquilo para ressuscitar e voltar ao meu estado habitual.

Quando cheguei a casa, despi-me, refresquei-me (ainda por cima estava um calor dos diabos), reclinei-me no meu cadeirão relax e, claro está, adormeci profunda e instantaneamente.

Quando acordei ainda me sentia meio esvaída. Pode parecer um exagero da minha parte mas não imaginam o que isto me maça. Eu sou muito prática, gosto de resolver tudo, de resolver rapidamente, de resolver da forma mais ágil e mais eficiente. E ver-me manietada, sujeita a ter que aceitar a falta de ritmo e os absurdos procedimentos públicos, o não poder fazer nada para ajudar a desbloquear imbróglios evitáveis, estúpidos, que não deveriam existir, o ter que me resignar a aceitar que me imponham métodos, procedimentos e prazos que ultrapassam tudo o que é razoável, desgasta-me moral e fisicamente, fico exausta, exangue.

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Enquanto escrevo, estou a ver a reportagem do desastre com o elevador da Glória. Um horror. Tantas e tantas vezes passei por ali, por São Pedro de Alcântara, tantas vezes me encantei com a graça daquele elevador, tantas vezes o fotografei. Imagino a aflição das pessoas que lá iam ao sentirem como aquilo se desgovernou. Deve ter sido uma fração de segundo. E, na fracção seguinte, 15 pessoas antes felizes, estavam mortas. E 18 ficaram vivas, no meio daqueles destroços, mas feridas, algumas em estado grave. Um horror. A vida, por vezes, é traiçoeira.

O que se passou, por que se passou, o que falhou -- isso se verá a seguir. Para já, o que sinto é muita pena ao ver o que se passou.

terça-feira, novembro 12, 2024

A pesada máquina administrativa que tritura qualquer um.
[Hoje, o que me valeu foi mesmo a jardinagem e o corte de cabelo]

 

Continuo a navegar na maionese no que a processos administrativos diz respeito. Não consigo endireitar as coisas apesar de na Conservatória me dizerem que está tudo bem, que as Finanças é que têm que corrigir. Nas Finanças dizem que o sistema é automático e não podem fazer nada, tenho é que ir à Conservatória. Ando em loop.  Em todo o lado reconhecem que está tudo bem e que tenho razão mas há ali um pormenor no qual o sistema empanca. Refiro-me ainda à casa que era dos meus pais. Os próprios dos serviços das Finanças aconselharam-me a fazer, no Portal, uma impugnação administrativa. Recebi depois uma carta registada a dizer que a impugnação administrativa não se aplica naquele caso. Informaram-me, então, que devia era fazer uma coisa que se chama Recurso Hierárquico. Assim fiz. Como nunca mais me diziam nada, fui verificar ao Portal e, se bem percebo, arquivaram o processo por 'desistência'. Não consigo perceber.

Entretanto, nas Finanças aparece como morada uma Estrada e um número que não tem nada a ver com a morada correcta. É a que era nos idos do século passado, quando não havia ainda os nomes das ruas actuais. E quando digo actuais digo desde que eu era pequena. Provavelmente é a morada de quando a casa foi construída. Perguntei se não podiam alterar. Não podem. Tenho que lhes enviar um documento da Câmara.

Fiz uma exposição à Câmara, mandando documentação e pedindo que atestem que a morada não é a de décadas. mandaram-me um mail com uma carrada de documentos que tenho que lhes enviar. E ao mesmo tempo que enviar tenho que pagar uma taxa para o processo dar entrada. E depois terei que pagar outra taxa para levantar a dita declaração de morada. Só que, de entre os documentos que tenho que enviar, incluem-se documentos que tenho que obter na Conservatória. Mas, para os obter, e posso obtê-los online, tenho que pagar antes. Isto sem ter a certeza de que estou a pedir bem ou que é mesmo aquilo. Ou seja, não tenho como ver antes para me certificar. É que não entendo bem aquelas siglas nem tenho a certeza do significado de alguns conceitos. E acredito que ao mandar esse documento vá levantar outra lebre pois a casa ainda está em nome dos meus pais. Portanto, a seguir devem pedir-me a habilitação de herdeiros. E a ver se depois não tenho que ir certificá-la não sei onde.

Desespero. Perco tempo, gasto dinheiro. E não saio do mesmo sítio.

Quando se fala numa máquina administrativa pesada, complicada, que atrapalha a vida dos cidadãos, é isto. 

O que me valeu foi que ao fim da tarde fui cortar o cabelo. Já não ia à cabeleireira há séculos. De tal forma que quando lá apareceu um rapaz com uns dois metros de altura nem reconheci que era o filho dela pois a última vez que o tinha visto era um jovem a entrar na adolescência. Corto sempre o cabelo em casa. Ultimamente tinha uma técnica fantástica: fazia um rabo de cavalo no alto da cabeça e cortava. Quando tirava o elástico, estava escadeado que era um mimo. Só que, na prática, já estava uma acumulação de cortes, cada um seguindo sua técnica. Portanto, resolvi que estava na altura de me pôr nas mãos dela. E foi radical. No fim, tal a tosquia, o chão tinha material que dava para encher uma almofada.

Também fomos comprar um vaso de cerâmica vidrada. E uma planta. E uma taça e umas suculentas. Depois estive nas jardinagens, mãos na terra. E isso é das coisas boas desta vida. Quando ando num viveiro e vejo as pessoas que lá trabalham, invejo-as: deve ser uma profissão muito feliz. 

E por agora fico-me por aqui pois estou um bocado cansada. De manhã, estava a dormir, uma chamada. Depois já não voltei a adormecer. Por isso, em cima de tudo, tenho uma ou duas horas de sono a menos.

Um dia feliz, para vocês.

sexta-feira, março 15, 2024

Por entre os meandros da insaciável máquina

 

Continuo ensarilhada com os meus temas burocráticos. Claro que sarilhos de barriga cheia são como aquilo da pimenta no cu dos outros. Acho eu. Estou com a cabeça desmiolada e já nem sei bem o significado das coisas.

O terreno, o célebre terreno do Algarve, tem-me dado bastante trabalho. Se não estivesse como estou, contava. É que é digno de ser contado. Até às sete e quarenta da noite me ligaram da Câmara de lá para me explicarem o que faltava no pedido que eu tinha feito. Eu que me tinha esmerado, que tinha tido uma trabalheira, afinal não tinha feito o que, para eles, era básico. E nessa noite, ao longo de horas, rabiei até conseguir entender-me com a ferramentaria geocomputacional e parir as plantas do bendito terreno, conforme a simpática senhora me tinha ensinado. Até a carta militar eu conseguir dar à luz.

Conclusão, estava eu hoje ainda na cama e já estavam a ligar-me para saber se a reunião agendada com o arquitecto podia ser com outro e ser já. Reunião? Antecipar a reunião? E eu na cama... Felizmente era por telefone. Ufff. Aceitei.

Isto tem várias peripécias pelo meio mas atalho: não dá para lá construir nada, metade está numa reserva de um certo tipo e a outra metade numa reserva ainda melhor. Portanto, estão a ver. Ao fim de mil anos, um terreno, que ainda se está para ver como pode vir para o nosso nome, e em que não dá para fazer nada... Coisa jeitosa.

Quanto à casa, continua a embrulhada. Na repartição sugeriram que, no portal, eu fizesse uma impugnação administrativa. Assim fiz. Todo um número. Esmerei-me, juntei comprovativos, um brinquinho. Fiquei com comprovativo. 

O tempo passava e nada. Fui lá ver. Pois bem. Arquivaram-na porque eu, ou alguém por mim, não fiz uma coisa qualquer que era suposta. Coisa essa que não faço ideia do que seja e que lá não explica. Arquivaram e bye bye. 

Uma impotência. A gente a querer resolver os imbróglios e nada, cabeça numa parede, cabeça noutra. Isto porque ando eu a querer resolver. Mas estou a começar a convencer-me que não devo conseguir. Provavelmente tem mesmo que ser um advogado ou um solicitador. Mas porquê, caraças?

Com aquilo do imposto de selo para comunicar às Finanças outra tourada. Sistema novo, pouco user friendly. Ligo para lá e cada um, simpatiquíssimos por sinal, diz sua coisa. Todos convergem: ninguém se entende com aquilo, mais vale fazer à antiga, ou pelo e-balcão ou presencial.

Lá me esmerei, lá imprimi impressos, preenchi, fotografei, reduzi a resolução, inseri tudo num único documento cuja dimensão em Mb é limitada, compus aquilo para ficar apresentável. Tudo um bocado trabalhoso. Muito expediente. Muita maçada. Ao menos a ver se resulta. Caraças.

No meio disto, uma pequena vitória. Há muito que imaginava um espelho grande aqui no exterior, mais propriamente no terraço. O meu marido revoltado com estes meus gostos que passam por ter que fazer uma coisa que odeia: furar paredes. Segundo ele, não é furar, é estragar paredes.

Uma luta.

Quando se convenceu, conseguiu ele uma vitória. A parede tem capoto e caixa de ar. Ou seja, a broca primeiro apanhou aquela coisa que parece esferovite, depois apanhou ar. Portanto, decretou: impossível.

Mas, como não sou de desistir, fui tentando arranjar soluções. E ele foi ficando mais calmo. Acertámo-nos: seria pendurado no tecto do telheiro, encostado à parede. Comprámos grandes camarões, comprámos umas correntes. Com uma escada encostada à parede, com uma broca gigante, lá tratou do assunto. Já está. Acho lindo, lindo, lindo. Reflecte o jardim, reflete a luz. 

Só espero que não caia pois é grande e pesado...

E, tirando estas coisas de nada, pouco mais tenho a relatar. Um dia destes logo conto da conversa com aquele amigo com quem estivemos e cuja actual companheira está parecida com a primeira mulher, deixando-me, assim de chofre, um bocado baralhada. Depois, já só eu e o meu marido, ao comentarmos, pensava o meu marido que esta era aquela por quem ele tinha deixado a mulher. Tinha-se esquecido que, a seguir a essa, ele tinha-a trocado por outra. Mas foi uma conversa animadíssima pois esse amigo continua como sempre foi, um divertido bon vivant que nada derruba, nem o cancro que teve lhe causou mossa. Joie de vivre é com ele. 

E, pronto, hoje fico-me por aqui que isto já não são horas. Lá está, como um Leitor ou Leitora ou Leitor@ me lembrou, isto da PDI é uma coisa tramada, uma pessoa chega a esta hora e já não atina.

Beijinhos e abraços para todos e o que eu estimo é o que eu desejo.

sábado, março 09, 2024

Não me parece nada bem que a Fonte de Belém e a Manuela Ferreira Leite tenham tentado estragar-me a paz in heavem

 

A vida no campo adoça-me as arestas e traz-me algum do oxigénio de que ando bem necessitada.

Têm sido tempos de stress e esforço, mesmo físico, em contínuo desde há vários meses. Depois de meses sem perceber o que é que a minha mãe tinha, convicta de que era um caso agudo de hipocondria, convencendo-a a voltar a ter seguimento psicológico, insistindo até mais não poder, até à exaustão, a que tomasse os medicamentos para o coração, a descontrair e a não pensar em doenças e sintomas, caiu-me em cima uma primeira bomba de que, afinal, de súbito, sem aviso prévio, tinha entrado numa fase terminal e a segunda bomba de que, afinal, isso não era do seu desconhecimento, que tinha exames e estava avisada pela médica, e que, sabe-se lá porquê, tinha resolvido ocultar a doença grave e fazer de conta que não sabia o que tinha. E, aqui chegados, foi aquele mês e tal em que a morte avançou sobre ela de forma galopante, estando ela lúcida e, notoriamente, não preparada para aceitar a situação pois queria viver ainda por muito mais anos. 

Claro que, a seguir, após o doloroso desfecho, poderia ter ido enfiar-me no campo, descansar a cabeça, não ter agora andar neste afã de 'limpar' a casa mas, sei lá eu porquê, parece que tive esta necessidade de não abrandar, de não deixar a casa 'ao abandono', de não querer trazer na mente, em background, a ideia de que tinha este trabalho pesado para fazer, 

Portanto, sem descanso, tenho andado a esgotar-me, revirando o conteúdo de gavetas e prateleiras e caixas e roupeiros e malas e sacos, tentando salvar o máximo de coisas -- com o meu marido e os meus filhos sem quererem quase nada, ou nada mesmo --, e a dar voltas à cabeça para ver como hei-de conseguir absorver o máximo de coisas sem ficar com a casa atravancada, desvirtuada.

Por exemplo, no outro dia, quando a minha filha lá deu um salto, tínhamos que dar destino ao faqueiro melhor, o que estava na sala de jantar. Há outro na cozinha, digamos para uso corrente, que lá ficou. Mas este era o que usava quando lá estávamos todos ou, depois de a minha mãe ter deixado de dar aulas, para os lanches com as amigas. Sendo um faqueiro bom e o faqueiro usado quando a família estava reunida, custava-me dá-lo. Pareceu-me que a minha filha estava receptiva a levá-lo para sua casa. Afinal, não, guardou-o mas era para eu o trazer.

Fiquei mesmo sem saber onde colocá-lo. Pensei que só se fosse no campo. Portanto, para lá foi. Hoje estive a guardá-lo. No gavetão grande do aparador, havia um espaço em que talvez pudesse ser. Não poderia estar naqueles tabuleiros com divisórias pois os tabuleiros não caberiam no espaço livre. Coloquei um dos milhares de paninhos com rendinhas no fundo da gaveta, no espaço livre. E comecei a arrumar por espécie: colheres, garfos e facas de sobremesa, colheres de sopa, facas e garfos de carne, facas e garfos de peixe, colheres de chá, colheres de café. Depois mais uma dúzia de garfinhos para entradas e mais daqueles mínimos para amuse bouche. E até me parecia que ia caber tudo. As colheres grandes, para servir, incluindo a concha de sopa, tiveram que ir para a gaveta de cozinha que tem disso. 

Claro que, ao arrumar, me pareceu que não estava a dúzia completa de cada coisa e estava a dar graças por se terem tresmalhado tantas peças. Mas, para minha neura, quando fui arrumar o saco grande onde tinha vindo o faqueiro, senti-o bastante pesado. Havia lá uns plásticos de bolhas onde a minha filha tinha embrulhado peças de vidro. E, por baixo desses plásticos, estavam mais carradas de peças. Cá para mim a minha mãe comprava doze peças de cada mais umas quantas de reserva. A ginástica que tive que fazer para conseguir arrumar o que faltava sem ficar tudo ao monte só eu sei. Às tantas já estou num desespero, sem saber onde guardar tanta coisa de que não tenho falta e já só me apetece ou deitar coisas fora ou guardá-las a esmo.

De qualquer forma, pelo menos na minha cabeça, a parte mais complexa e pesada já está quase. Pelo menos acho que as coisas de mais valor, material ou estimativo, já foram retiradas de lá. Claro que ainda há o tema das mobílias e do muito que ainda lá está. Mas quero acreditar que isso se haverá de resolver.

Enfim. 

Acho que agora vou tentar intervalar. Preciso mesmo, mesmo. 

Claro que ainda tenho que tratar do imposto de selo com a documentação inerente, depois é o averbamento, depois a conservatória, etc. Do primeiro ainda tenho quase dois meses para tratar e do resto acho que não há grande urgência. Claro que também ainda há que regularizar a trapalhada da propriedade horizontal e mais não sei o quê e, já agora, também do terreno do Algarve que, felizmente, já comprovámos que, nas Finanças, está em nome do meu avô. Menos mal.

Com isto e mais um conjunto de outras coisas, só vi televisão à noite. E nem queria acreditar no que a Manuela Ferreira Leite tinha dito. Uma vergonha. Uma náusea. A todos os títulos, evitável. Diria mesmo: constrangedor. Nem queria acreditar, também, na ingerência da so called Fonte de Belém na campanha, uma coisa indecorosa, sem perdão. 

É o mal de gente daquele calibre. Ressabiados, descontrolados, sem princípios...? O que é isto?A sério que nem sei o que ache de comportamentos assim. Parece que, para eles, vale tudo. Ninguém pode estar descansado com gente assim por perto, essa é que é essa.

Mas hoje quero dar descanso à minha beleza e à minha saúde, preciso de manter a calma. Não vou perder tempo com o que só faz mal. Vou, isso sim, respirar fundo, aspirar o ar fresco e lavado. 

É verdade: pelos vossos lados também choveu como pelos meus? Puxa... Uma chuva pegada, intensa. Eu a querer andar a fotografar os maravilhosos verdes, as lindas flores, a primavera que já mal consegue aguentar, doida para aparecer, escandalosamente revigorada, e a chuva que não dava tréguas...

E que precisados andávamos de boa agüinha assim... Fico mesmo contente. Só tenho pena de não ter uma cisterna para a aproveitar. De futuro, cada edifício que se construísse (prédio ou moradia) deveria ter reservatório para água da chuva. Não acham?

Tirando isso, a ver se retomo a leitura e a escrita. Idealmente até conseguiria dormir umas sestazinhas depois de almoço mas isso já é capaz de ser pedir muito. Ou isso ou ir passear. 

É verdade, este sábado é para a malta não pensar em nada, não é? 

(Ou é o oposto: é para pensar?)

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Um dia bom

Saúde. Tranquilidade. Paz.

sexta-feira, março 08, 2024

O mistério da lembrança de tempos felizes

 

Tenho estado a tentar decifrar documentos antigos, imagino que bué antigos, mas em que não encontro nem nomes nem datas nem locais. Se, pelo menos, tivesse os envelopes talvez conseguisse ter alguma pista. Assim, zero. 

Neste caso, o papel usado é espesso e tem marcas que apenas são visíveis em contraluz. Vejo distintamente THOMAR. Se calhar é a marca do papel. Dá ideia que a folha que agora estou a ver foi cortada, não obedecendo a medidas standard. Numa parte do papel, na margem (digamos assim mas que, na prática, se trata apenas da zona em que o papel foi cortado), leio ASSO. Ou seja, deduzo que seja papel de almasso, escrito assim, na grafia antiga. Vejo também um símbolo que deve ser o logotipo.

Pela semelhança com outros de que me lembro de ouvir a minha mãe dizer que eram coisas que vinham da avó dela (minha bisa), o que foi descoberto na quarta-feira pode ser uma de duas: ou poemas que o filho, anarquista deportado, lhe enviava ou parte integrante da correspondência entre ela e os primos. Mas posso estar enganada, pode até ser coisa mais antiga. Não faço ideia.

Quem escreveu, dobrou o papel em três na vertical, mantendo as partes unidas. Ficaram, pois, seis 'tiras' verticais.

Mostro duas dessas 'tiras':



Gostava de saber quem escreveu estes poemas, a quem os enviou, quando, onde. Não percebo porque é que nunca na minha família ninguém deu importância a estas memórias e só agora eu esteja a tomar conhecimento de tudo isto. Só que agora todos os que me poderiam elucidar já morreram. Foram-se todos, várias gerações de permeio, ramos da família que caminharam para o desconhecimento mútuo. E, no entanto, estas folhinhas sobreviveram, estão aqui na minha mão.

Aquela velha questão do sentido da vida dá uma volta sobre si própria quando a gente pensa no des-sentido de tudo quando se constata quão efémeras são as pessoas e quão duradouras são as suas palavras escritas.

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Desejo-vos um dia bom

Saúde. Poesia. Paz.

quinta-feira, março 07, 2024

E a luta continua...

 




Hoje a labuta em casa da minha mãe foi muito produtiva. Apesar de ter estado pouco tempo pois foi lá ter connosco numa corrida junto à hora de almoço, a minha filha deu uma ajuda considerável. Grande parte das gavetas e das prateleiras dos armários já está com muito pouco ou nada.

Ainda há conjuntos de copos que lá permanecem: os meus filhos não querem, eu já não tenho onde pôr e o meu marido recusa-se a transportar. 

E a cozinha está ainda com tudo. E a despensa continua com muita coisa. E nos roupeiros e cómodas ainda há roupas de vestir, de cama, de banho. O roupeiro que está no pequeno hall junto à casa de banho está ainda compacto de coisas até acima (e o roupeiro vai até ao tecto): cobertores, turcos, lençóis. 

A solução para tudo isso será a mesma que encontrarmos para os móveis. Tenho muita pena dos móveis, alguns muito bonitos, mas não há qualquer possibilidade de os aproveitarmos, são muito grandes e não cabem em lado nenhum.

Já deitámos fora muitas dezenas de sacos de lixo. Muitos papéis, muitos, muitos, e muitas revistas, muitas (de decoração, de tricot, de crochet, de saúde e nutricionismo, etc) e muitos exames médicos. Isso deitamos nós directamente para o lixo. 

E a senhora que cuidou do meu pai e que continuou a ir ver a minha mãe e que continuo a contratar para zelar pela casa tem sido incansável. De cada vez que lá vou, deixo as camas cheias com pilhas de coisas que penso que são boas e mal empregadas para deitar fora. A primeira escolha é dela e terá já, certamente, aproveitado muitas coisas. Para aquilo que ela não quer, chama uma senhora amiga dela que lá vai ajudá-la a fazer uma segunda triagem, levando a seguir para uma senhora que, segundo me dizem, leva para a família ou para conhecidos carenciados que vivem no Alentejo.

Tínhamos lá um bico de obra que era o cadeirão com motor eléctrico que se reclinava até ficar quase como cama e que se punha para cima para ajudar no levante. Tínhamos comprado para o meu pai a seguir ao AVC que o usou durante vários anos até que, um dia, ao cair no corredor, partiu uma perna e nunca mais conseguiu recuperar, ficando acamado desde aí. O motor estava óptimo mas, ao contrário do que pensávamos, o cadeirão não era de pele mas sim de um material sintético que, de início, a imitava muito bem. O pior foi o que aconteceu com o desgaste, ficou em mau estado, todo estalado e feio. A minha mãe tinha posto uma coberta em cima e, não se vendo, parecia bem. Mas não estava. Era nesse cadeirão que, sendo muito confortável e não tendo como ser facilmente removido, a minha mãe passou a sentar-se para ler ou para fazer tricot ou crochet. 

Mas sabíamos que, por baixo da coberta, estava feio. Só que era tão pesado, tão pesado, que não se via como movimentá-lo. Tinha entrado pela janela e tinha sido uma odisseia para o conseguirem levar até lá. Pois bem: hoje o meu marido desmanchou-o todo. Todo. E, portanto, assim desmanchado, foi levado até junto dos contentores, onde a Câmara o levará para os monos. Mas, pouco depois de o meu marido lá o ter posto, quando levou mais uma série de sacos para o lixo, disse que tudo o que era ferro já tinha voado.

E a minha filha levou mais algumas coisas, mas poucas. Não tem onde pôr e não quer encher a casa com coisas que ou não ficam lá bem ou não cabem. Faz bem. 

E nós trouxemos mais uns quantos sacos grandes. Mais sacos que tenho que esvaziar, arrumando tudo o que lá está dentro. Um exercício de criatividade e logística (e paciência). 

E trouxemos um espelho muito grande que veio no carro da minha filha pois não cabia no nosso. Já tenho a casa cheia de espelhos mas o que está sobre o sofá desta sala é ligeiramente mais pequeno do que devia (135 x 80). Este tem 150 por 90 cm e uma moldura mais larga. Acho que vai ficar muito bem. E este que está agora aqui irá ser posto na vertical no hall da suite.


E trouxe um outro que fez com que o meu marido quase se passasse (aliás, ele anda já totalmente passado com esta labuta que parece que não tem fim...). Era o espelho que estava no que era o meu quarto em solteira, espelho em que, na adolescência, muito me olhei. E é o espelho que aparece naquelas fotografias do dia do casamento. Apesar do fotógrafo ser um colega da faculdade, lembro-me de dizermos: 'Espera lá, é costume a noiva ver-se ao espelho...'. E ali estou eu, em duplicado, eu e a minha imagem, com o espelho de permeio. A minha filha também achou que o espelho era icónico, que era pena não ser aproveitado. Portanto, veio. É recortado, tem um feitio bonito. Mas é de madeira escura. Se calhar, vou pintá-lo e pô-lo numa parede da sala in heaven onde já tenho quatro de diferentes feitios e tamanhos.

E encontrámos mais algumas pequenas preciosidades. Entre elas, uma redacção que fiz com 12 anos. Quatro páginas de redacção. Lembro-me de me darem o mote e eu, instantaneamente, desatar a escrever, a escrever, a escrever quase até tocar a campainha e ter que acabar. Lembro-me que, enquanto isso, alguns dos meus colegas olhavam para o tecto ou em volta sem saber o que escrever. São coisas que nascem com a gente. Em contrapartida, íamos para o laboratório de electricidade e uns montavam circuitos, inventavam aparelhómetros e sei lá que mais e eu nem pó, olhava para eles sem perceber como sabiam mexer tão agilmente em tudo aquilo.

E encontrámos mais uma folha escrita, creio que deve ser mais uma daquelas cartas do início do século passado dos primos algarvios dirigida à minha bisavó, quiçá do primo presidente, nunca se sabe. Como eram cartas entre primos ou não assinavam ou escreviam apenas as iniciais (mas como era escrito a caneta de aparo, numa letra muito desenhada, em papel fininho, mais de metade eu não consigo perceber. Digo que as cartas são deles pois, quando a minha avó morreu, a minha mãe achou a caixa com aquelas cartas e lembrou-se que a mãe dizia que era correspondência entre a mãe e os primos, creio que os da Mexilhoeira Grande.

Bem. A nível de pertences pessoais de algum valor, material ou, sobretudo, estimativo, creio que já veio tudo ou quase tudo.

A menos que no sótão surjam novidades. O meu marido só lá foi espreitar e nem quis aventurar-se. Diz que está cheio. Diz que deve haver móveis pois está muita coisa coberta. Não faço ideia do que seja, há muito tempo que não ponho lá os pés. A escada é um bocado íngreme demais para a minha sensível alma que padece de vertigens.

À noite, saturados, fomos esticar as pernas até à praia. Estava um ventinho gelado. Mas, apesar de tudo, soube bem. Fotografei uma árvore pois as árvores, ainda mais se nuas, são muito bonitas à noite. E fotografei uma bandeira de Portugal que, não sei porquê, alguém ali pôs. Não percebi mas achei bonito.

Só vi um pouco de televisão: Maryland. Muito bom, na RTP 2. A ver se amanhã e depois não me esqueço de ver. Depois também vi o comentário do Luís Paixão Martins, hoje não tão interessante como ontem. Devia ter mais tempo para melhor nos surpreender com a sua argúcia e descontração natural. O pobre Calafate bem quer ombrear com ele mas ainda terá que dar muito ao pedal e comer muito pão com azeitonas para conseguir chegar aos calcanhares do LPM. Mas, enfim, é o que é.

 E, portanto, dito isto, está tudo dito por hoje.

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Um dia feliz

Saúde. Boa disposição. Paz.

sábado, março 02, 2024

Serenidade

 

Dia de descanso. Nem monda por gavetas repletas de infindáveis pastas, dossiers, envelopes com mil coisas dentro, nem transporte de sacos e caixotes, nem arrumação do que se trouxe. 

Nada. Intervalo.

Estava muito precisada de desligar. 

Tem sido pesado.

Depois de já muito ter sido escolhido, perguntam-me os meus filhos porque, agora, o que sobra, não vai tudo direito ao lixo. Não posso. Tenho descoberto coisas extraordinárias onde menos se espera.

Ontem descobri um caderninho feito manualmente pela minha mãe, muito à semelhança do outro feito pela minha bisavó, sua avó materna, em que ela escreve o nome completo de todas as pessoas da família, data de e local de nascimento e, no caso dos falecidos, data em que foram para o hospital, data da morte, com quem se casaram e em que data, ou, no caso dos mais novos, nome completo, data de nascimento, nome dos pais. 

Fiquei a saber que um dos filhos de um dos meus primos tem o mesmo nome próprio (nome duplo) que um dos meus netos. Conhecemo-los apenas pelo primeiro nome e foi preciso a minha mãe ter morrido para eu descobrir que estes jovens primos são homónimos. 

Vi também duas cartas que me foram dirigidas e que juraria que nunca antes as tinha visto. Aliás estavam num lugar muito improvável, uma de um prévio namorado e outra de um que, tempos antes, tinha sido forte candidato a sê-lo. Provavelmente, a minha mãe temeu que fossem perturbar o meu namoro da altura. Mas isto, claro, são conjecturas minhas.

Descobri também umas folhas assinadas por muita gente, creio que terá sido quando o meu pai se reformou. Tenho que ver com atenção. 

E muitas medalhas dele, muitas dos seus feitos desportivos.

E descobri uma coisa que muitas vezes tinha desejado ter: umas folhinhas escritas por mim com o nome completo e a morada de muitos dos meus amigos. Há uns dias, ao ver muitas cartas que me tinham sido dirigidas, via apenas o nome abreviado (Mané, Noémia, etc) e não conseguia recordar-me do nome todo e de quase todas não sabia a morada pois no envelope, na parte de trás, escreviam apenas esse nome abreviado. Quanto muito, e raramente, por baixo, o nome da cidade. Ou a minha grande amiga e correspondente de que apenas sabia ser São Tavares. Agora tenho o nome completo e a morada.

É verdade: fica para a posteridade o que está escrito em papel. Ainda ontem, quanto contei isto ao meu filho, ele o disse. Na verdade, só isso fica. Computadores que se desactualizam, de que não sabemos as passwords, acabam por ser uma caixa preta em que o mais certo é irem para o lixo. Quantos dos meus computadores já foram para o lixo... Sei lá qual a password que usava na altura. E, caso se liguem, estão horas a fazer actualizações e muitas já nem podem ser feitas. Em contrapartida, o papel sobrevive a gerações.

Be., portanto, não quis salvar coisas com que o meu marido não concorda, não tentei trazer coisas que o meu marido se recusa a transportar, não tive que andar a ver infinitos papéis. Hoje nada disso, zero, hoje dia de descanso. 

Campo, ar puríssimo, tudo verdinho, tudo a florescer, as árvores com as folhinhas e os frutinhos a despontar, preciosidades, milagres da beleza espontânea, os passarinhos numa alegria e, certamente, a julgar pela quantidade de pinhas roídas, os esquilos também.

Pena foram dois pequenos percalços. 

Quando estávamos a chegar, lembrei-me de que me tinha esquecido das chaves. Ainda por cima, trazíamos o carro cheio. Felizmente, no molho de chaves com que ando sempre, tenho uma chave da casa. Mas não do portão... Então o meu marido teve que saltar a vedação. Receei que se espetasse todo nos espigões ou que se espetasse no chão ao saltar... mas vá lá que não. Sobreviveu. Claro que o cão estava maluco com esta dinâmica, saltava, ladrava. Não percebia. Eu, do lado de fora, a agarrá-lo e o dono a saltar o muro. 

Conseguiu entrar em casa mas agora -- desde que, há uns anos, assaltaram o quintal e levaram mesa e cadeiras e bancos grandes e artesanais de Monchique -- temos um cabo e cadeado no portão... e em casa não encontrámos nenhum duplicado da chave do cadeado.

Então o meu marido foi abrir o portão lá de baixo, ao fundo, longe da casa, e entrámos por lá. Mas como o carro não consegue chegar ao pé de casa quando se vem lá de baixo, passei as coisas pela vedação, cá em cima, ao meu marido. Um contratempo.

E este foi o primeiro percalço. 

O segundo foi um pouco pior. Fui abrir as janelas da parte mais antiga da casa. Tem uns degraus em pedra muito altos. Quando vinha a chegar cá a baixo, voltei-me para cima para me certificar de que tinha apagado a luz do quarto lá de cima. E, acto contínuo, julgando que estava no último degrau e que descendo-o ficaria no piso térreo, desci de 'marcha atrás'. Só que não, ainda havia outro e coloquei o pé na sua beira. Como estava de meias e com chinelos, o próprio pé escorregou no chinelo. Conclusão, nesse mesmo segundo levantei voo e caí para trás, desamparada, no piso de pedra. Segunda conclusão: bati com as costas na porta e caí, com toda a força, de rabo e apoiada numa mão. Felizmente, graças à porta, a queda foi amortecida e não bati com a cabeça no chão. Mas agora mal posso estar. Vou ficar com a nádega negra, verde. Receei pela mão mas parece que daí menos mal. Ao cair, acho que bati os maxilares um no outro e, num primeiro momento, doeu-me tanto que receei que daí também viesse algum problema. Felizmente parece que não. Mas ao longo do dia tenho vindo a ficar progressivamente mais dorida. 


Contudo, o importante não são os percalços, o importante é que dei descanso à cabeça e ao corpo. Um dia bom, sereno. Estivemos tranquilos, felizes, em comunhão com a natureza. E, ao usar o plural, incluo o nosso inseparável e querido amigo que, no campo, revive as suas raízes ancestrais, encontra a total liberdade de movimentos.

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Desejo-vos um bom sábado
Saúde. Tranquilidade. Paz.

quarta-feira, fevereiro 28, 2024

Pensamentos desnecessários

 

Não tenho muito a dizer. Como tinha antecipado, o dia foi muito preenchido e, não por acaso, cansativo.

Afinal o problema técnico da véspera não tinha ficado resolvido e o meu marido chamou-os outra vez. Cá estiveram. Nós a termos que sair e eles sem aparecerem. Depois que afinal era precisa outra maquineta porque, segundo eles, a instalação anterior, de tão artilhada que era (que é), não tem funcionamento óbvio.

Portanto, esta quarta-feira vêm outra vez, supostamente já com o dito equipamento. Como o meu marido vai ter que sair muito cedo, mais cedo ainda que eles, terei que ser eu a abrir-lhes o portão e a porta. Portanto, continuarei a não poder pôr o sono em dia.

Saímos já nas horas de estalar. Depois uma reunião para ver se os imbróglios se desensarilham. Demorada. Não apenas porque o principal interveniente chegou atrasado mas também porque o tema tem o seu quê de rebuscado. Aliás, não é um tema mas, sim, dois.

Dali, já tarde, seguimos para casa dos meus pais. Nesta fase, o meu marido já começa a dar mostras de uma impaciência que não tende a diminuir.

Não sei como é que o assunto se poderia resolver de outra maneira. Não creio que se possa contratar gente para ver o conteúdo de gavetas e portas e prateleiras nem para escolher o que é lixo ou o que deve ser aproveitado. 

O problema é que interminável... 

Mesmo quando se pensa que a maior parte já está vista, revista e escolhida, a verdade é que, ao fim de muitos dias, tenho a plena consciência de que há ainda muito para ver. 

E, de cada vez que vêm coisas para cá, depois há que fazer outra ginástica: arrumar, ver onde se põe, onde se guarda, etc. 

E, em cima de tudo isto, a tristeza que isto me dá. Ver o que a minha mãe guardou, saber que achou que tinha valor estimativo, pensar nela a arrumar bem aquelas coisas... e eu agora desejando que aquilo acabe... 

Outras vezes, a tristeza ao ver a roupa que me lembro tão bem de a ver com ela, pensar que ela se foi e a roupa ali continua... Uma roupa bonita, jovem, bem cuidada. 

Outras vezes, a tristeza de pensar que parecia tão bem, ela, que fazia tanto gosto em arranjar-se bem, que tinha cuidado com a alimentação, com fazer exercício, e, afinal, em menos de nada, se foi. Não sabia que isto era possível, uma pessoa parecer bem e em dois meses entrar em declínio acelerado e morrer. Sempre pensei que, em idades avançadas, as doenças tumorais evoluíam lentamente. Afinal, avançou silenciosamente, sem sintomas, e, de súbito, galopou de forma exuberante, sem qualquer possibilidade de tratamento. Ela sabia o que tinha, há cerca de um ano e picos que o sabia, mas, se calhar, também pensou que as células não se multiplicariam. E como não tinha sintomas, deve ter pensado que não valia a pena maçar-se e maçar os outros com uma coisa que não estorvava. Não sei. 

Sei que isto não estava nos planos dela. Imaginava-se a viver por muitos mais e bons anos. 

Antes de resolver ir para a residência, mandou fazer uma limpeza a fundo à casa. Os cortinados foram retirados, lavados, os roupeiros esvaziados, tudo limpo. Descongelou e mandou limpar o frigorífico.  Não queria empregada regular em casa, achava que dava bem conta de tudo. Mas, para essa limpeza profunda, concordou que tinha que ter ajuda. Foi uma limpeza e peras. Eu espantada. Para quê tudo aquilo...? Deixou a cama feita, o frigorífico ligado com comida, até fruta na fruteira na mesa da cozinha. Eu pensava que a ideia dela era até lá para ver se conseguia convencer o médico a suspender-lhe ou reduzir a medicação do coração que, segundo ela, só estava a fazer-lhe mal, e depois voltava para casa. Ou, se não gostasse daquilo, voltava para casa. Ou, quando lhe apetecesse, ia passar uns dias a casa. E eu concordava: se não gostasse, não tinha nada que lá ficar. Ia porque queria, ficava se quisesse, era dona e senhora da sua vontade.

Uns dias antes, andava aborrecida porque não tinha uma pilha das grandes para o relógio da cozinha. Tinha várias mas nenhuma do formato necessário. Quando a teve, ela própria subiu a uma cadeira e mudou a pilha. Estava de saída para uma residência mas era como se apenas lá fosse passar uma breve temporada. Quando lhe perguntei para que é que estava a mudar a pilha ao relógio, disse que gostava de chegar à cozinha e ter sempre ali as horas. Não quis perguntar-lhe se estava mesmo numa de ir e vir.

Mas, apesar disso, foi carregada de malas, parecia que ia para um cruzeiro em que tivesse que mudar de toilettes durante o dia. Até chinelos de quarto levou dois pares. Robes parece que também dois. Isto para o inverno. Dizia que não valia a pena levar logo roupa e calçado de primavera. Logo ia buscá-la quando chegasse a altura. 

Passados poucos dias estava a adoecer sem se perceber o que tinha. Tudo tão rápido.

Mas, enfim, já não adianta pensar nisso pois nunca conseguirei compreender tudo o que aconteceu. Aparentemente nem os médicos que a acompanhavam (com excepção da pneumologista, à qual deixou de ir, dando-nos a entender que a médica lhe tinha dado alta, que já não vali a pena lá andar) e que nunca descobriram o que tinham, conseguirão perceber tudo o que se passou. 

Hoje desfiz-me das suas infinitas revistas de tricot, crochet, decoração, costura, revistas com moldes. Muitos trabalhos complicados fez guiando-se por aquelas revistas. Gostava de tê-las guardado. Mas não tenho onde guardá-las e nunca iria dar-lhes uso. Mas custou-me muito.

Por isso, quando venho de lá, não sei se o cansaço que trago é de tudo isto, da tristeza e das saudades, se é de querer 'salvar' as coisas já que não consegui salvá-la a ela (embora reconhecendo que, apesar de tudo, ainda bem que viveu bem até tarde e que o período de sofrimento e agonia foi curto), se é também da impaciência do meu marido. Mas venho muito cansada.

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Enfim. Não vem nada a propósito mas apareceu-me a Pattie Boyd, em tempos uma famosa modelo e depois casada com George Harrison. E, depois, com Eric Clapton. Depois disso a sua vida continuou. Foi musa mas foi também dona do seu destino. É agora uma mulher quase com 80 anos. Na fase em que ando, vejo qualquer pessoa e inevitavelmente traço-lhe logo o destino: 'e um dia destes já cá não está....'. Mas depois afasto estes pensamentos mórbidos e parvos e penso que não há ninguém que cá fique pelo que a minha conclusão é redundante, desnecessária, parva, e que, se andamos a pensar nisso, nem aproveitamos bem a vida. Portanto, chuto o pensamento para canto (ou, pelo menos, tento), e bola para a frente.

Mas, aqui fica a Patti Boyd.


Pattie Boyd’s Prisoner Scene In The Beatles’ “Hard Days Night”


Pattie Boyd: rock's most legendary muse

A four-time Vogue cover-girl, Boyd is widely regarded as rock's most legendary muse – as the former wife of both George Harrison and Eric Clapton, she inspired some of the greatest love songs of all time. The sale is led by the original artwork chosen by Eric Clapton for the cover of Derek and The Dominos 1970 album Layla and original handwritten lyrics for George Harrison's Mystical One, alongside love letters, drawings, photographs, fashion, jewellery and watches. 

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Um bom dia

Saúde. Serenidade. Paz.

sexta-feira, fevereiro 23, 2024

Depois de uma noite mal dormida, dia de caça ao tesouro. E de saudades.

 

A senhora que ajudou a tratar o meu pai e que, depois da morte dele, muito por minha insistência, continuou a ir duas vezes por dia a casa da minha mãe para ver se estava tudo bem e que a ajudava nas compras, e a quem continuo a pedir ajuda, encontrou uma chave que consegue abrir um dos móveis do corredor. Consegue perceber-se que numa das portas há uma chave partida e as outras estavam fechadas sem que soubéssemos onde estava a chave. E eu não fazia ideia do que lá estava dentro.

Mas ela ligou-me a dizer que a chave da portinha da estante da televisão conseguia abrir a porta desse tal móvel e hoje estive de volta dele. Tudo uma arca de mil tesouros, não tanto pelo valor das coisas mas pelo inesperado de muito do que lá vou descobrindo.

O móvel é grande pelo que lá achei de um tudo. Desde logo muitos sacos de lãs. Lãs finas, grossas, fios. De todas as cores. Acondicionei em grandes sacos para as trazer. Não vou deitar fora. Se um dia me der para fazer mantas de crochet tenho ali material para as fazer de todas cores, tamanhos e feitios. Encontrei também um pano grande, muito colorido e, em minha opinião, muito bonito. Creio que se chama capulana. Comprei-o há mil anos em Angola. Pensei em usá-lo como toalha de mesa grande ou coberta para a cama ou para pôr num sofá. Hoje poderia usá-lo para estender na areia ou na relva. Nunca mais me tinha lembrado dele. Gostei de vê-lo. Trouxe-o e irei dar-lhe uso. Encontrei também uma pequena boneca de louça algo bizarra. Gostei. Há ela qualquer coisa de inocente e, ao mesmo tempo, exótico, talvez até trágico. 

E tantas coisas mais. Por exemplo uma garrafa alta, de vidro, em azul. Lembro-me de adorar a elegância daquela garrafa polifacetada. Não a trouxe porque agora estamos numa de livros e o carro já estava a deitar por fora.

Ah, sim, trouxemos outra coisa. Na varanda das traseiras, a minha mãe tinha dois pequenos cadeirões e uma pequena mesa, tudo de verga, que a minha mãe tinha pintado de azul claro. E fez-lhes umas almofadas claras, floridas. Estava muitas vezes ali sentada a apanhar sol e a ler ou a fazer tricot. Mas aquilo tem muitos anos. Há fotografias com os miúdos, ainda bebés, ali de pé, agarrados aos cadeirões ou às mesas. E neste momento estou a ver uma fotografia minha com a minha filha ao colo, teria ela talvez com um ou dois meses. Estou sentada ali, quando ainda estavam na sua cor natural. Por tudo o que recordo, quis trazer aqui para o nosso terraço. Há muitas memórias boas associadas a estes cadeirões e a esta mesinha. 

Mas claro que, com tudo isso, o carro veio a deitar por fora e o meu marido bastante contrariado.

Ainda consegui trazer um quadro que o meu tio fez para oferecer aos meus pais. Sei como o fez com gosto, com carinho. Sei como ele ficará feliz quando souber que está agora aqui em casa. 

Deixei lá, para a senhora ver se quer aproveitar alguma coisa ou dar, muitos sapatos da minha mãe, muita roupa de quando os meus filhos eram pequenos, algumas malas. Ela apareceu lá e eu disse que se calhar ela não ia aproveitar nada daquilo mas ela disse que eu lá deixasse que ela logo via. Agradeço-lhe muito por isso pois, como já o disse, isso retira-me muito do peso de me desfazer de algumas coisas.

Ainda lá há mil coisas a que tenho que dar destino. Para já, infinitos livros... E ainda não me aproximei da cozinha, da despensa, que está compacta, muitas prateleiras e prateleirinhas, com rendinhas e cortininhas, e lá, infinitos objectos, uma coisa quase assustadora. Nem sei o que fazer a tudo o que está no roupeiro grande do corredor...

Quando vimos de lá, vimos cansados. E eu parece que, nestas situações, não faço ideia porquê, fico desidratada e com a tensão baixa. Ou seja, isto esgota-me um bocado. 

Ainda por cima, a noite passada tive uma insónia das antigas, horrível, e, no pouco tempo dormido, tive pesadelos. Sonhei que estávamos a empacotar louça, copos, com todo o cuidado para nada se partir, mas, no dia seguinte, eu via tudo partido, mas partido intencionalmente. Acordava aflita, sem saber quem estava a fazer aquilo, sem saber como proteger as coisas, com vontade de chorar por ver que coisas tão queridas pela minha mãe estavam a ser destruídas.

E, ao acordar, pensava que já faz um mês que ela morreu. E punha-me a pensar em muitas das coisas em que ainda me custa a acreditar, a perceber, a aceitar. E, portanto, custava-me a voltar a adormecer.

Por isso, hoje estou muito sem energia, muito exausta.

Por vezes tenho a estranha impressão de que foi há muito tempo que a minha mãe morreu. Uma coisa longínqua, num outro tempo, numa outra vida. Mas, muitas outras vezes, sinto o oposto, parece-me que está na hora de lhe ligar ou penso que não posso esquecer-me de lhe contar isto ou aquilo. Por exemplo, ao conversar com a minha prima, ela disse-me algumas coisas que eu pensei que a minha mãe gostaria de saber e deveria ter a resposta para algumas dúvidas que se levantaram durante a conversa. E, então, percebo que esse tempo acabou. Não mais falarei com a minha mãe. E isso parece-me mentira, uma mentira em que ninguém consegue acreditar.

O meu marido pergunta-me se não seria preferível eu ir falar com aquela psicóloga que me caçou no hospital e com quem falei algumas vezes. Não sei. Penso que é um percurso que eu terei que fazer por mim e que qualquer dia já terei assimilado (ou interiorizado) tudo o que sucedeu, aceitando que o que aconteceu algum dia teria que acontecer.

A minha filha hoje perguntou a mesma coisa, diz que talvez falar com a psicóloga me ajude a arrumar os assuntos. Diz que não faz sentido eu continuar a querer perceber as decisões e as atitudes da minha mãe, que foi o que foi, que nada a fazer, que já não adianta compreender ou deixar de compreender. Bem sei. 

Mas, se continuar com o sono alterado ou a dar por mim a querer recordar as conversas com a minha mãe a ver se descubro algum indício a que deveria ter prestado atenção e não prestei, se calhar irei mesmo bater à porta da psicóloga. É que uma coisa é o pensamento racional e outra são os desvios por onde, involuntariamente e volta e meia, se tresmalham as nossas ideias.

Enfim...

Penso que aqueles pesadelos tiveram a ver com o quanto eu sei que a minha mãe estimava as suas coisas, gostava de ter sempre tudo muito ao seu gosto, tudo bem cuidado. E sei que ela gostaria de saber que quero continuar a dar uso a algumas das suas coisas, que continuarei a estimá-las, que direi 'isto veio de casa dos meus pais, foi a minha mãe que pintou', ou 'estas almofadas foi a minha mãe que as fez'. 

Mas, como já contei, preservar e trazer as coisas cá para casa é um exercício de equilíbrio pois tenho que encontrar uma forma harmoniosa de as integrar, sem desvirtuar o nosso 'estilo' . 

E tenho que agradecer ao meu marido pois tem arrumado e carregado coisas e coisas e coisas, sacos e sacos e infinitos sacos e caixotes, tudo pesadíssimo. Isto apesar de, por ele, não trazer nada, não querer nada. 

Esta tarefa, de facto, é espinhosa. Se calhar deveria ter deixado passar mais algum tempo, se calhar deveria ter descansado mais a cabeça. Mas parece que me custa pensar que as coisas da minha mãe estão ao 'abandono', inúteis, esquecidas e, por isso, quero distribui-las, acolhê-las. E digo da 'minha mãe' pois desde há muitos anos, desde que o meu pai teve o AVC, a minha mãe é que geria integralmente a casa. Mas ainda haveremos chegar ao território privado do meu pai: o sótão (que o meu filho irá explorar pois deve haver ferramentas e se calhar uma bancada de trabalho), a casinha do quintal (que não sei o que tem) e a adega que ele fez debaixo da escada, segundo ele num lugar em que a temperatura e a humidade preservavam a qualidade do vinho.

Bem. Já chega. Tenho ideia que a escrita anda para aqui às voltas mas tenho sono demais para tentar voltar atrás para a enfiar nos eixos. Sinto-me cansada. 

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E, uma vez mais, já que estou numa de coisas da casa, partilho um vídeo que mostra uma casa muito interessante. Ao ver casas assim, sinto-me inspirada. Há aqui ideias muito engraçadas, criativas e acolhedoras. Espero que também gostem.

Touring a MASSIVE NYC Loft Apartment | Michelle Pham

Welcome to Michelle's STUNNING loft in heart heart of Flatiron, Manhattan! This inspiring and unique home is filled with endless art, DIY projects and decor from around the world that brings such a welcoming feel to the space. There are so many incredibly thoughtful details throughout the apartment that you can't miss. Make sure to take all the inspiration for your own space


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Desejo-vos uma sexta-feira feliz

Saúde. Serenidade. Paz.

quinta-feira, fevereiro 22, 2024

Coisas e loisas.
[E decoração da colorida e criativa]

 

Vão-me aparecendo assuntos para tratar e, desabituada que quero estar de ter a agenda preenchida, fico logo como se estivessem a estragar-me o programa de festas. Até há cerca de um ano tinha não sei quantas reuniões por dia, recebia não sei quantos telefonemas, geralmente de gente que vinha comunicar-me problemas, esperando que eu os resolvesse, e não tinha outro remédio senão condensar os assuntos pessoais para os resolver de atacado, a correr, quando houvesse tempo. Estava saturada, ansiando por descanso e tranquilidade. 

Agora, quando acabo um dia, anseio por não ter nada para tratar no dia seguinte. 

Mas tenho tido. Ainda por cima, do tipo de assuntos de que nem sei bem por que ponta pegar e que, seja qual for a ponta, é coisa que não me é familiar. que me parece complexa, demorada, exasperante.

Por exemplo, a minha prima lembrou-se que, se calhar, deveríamos tentar regularizar a situação do terreno que temos no Algarve. Mas lá está: temos? 

Era do meu bisavô. Não sei se já havia registos naquela altura, princípio do século passado. Quando fugiu (e já sei, a minha prima confirmou, que foi para a Argentina), depois de ter perdido tudo, afinal ainda deixou o dito terreno, a casa em que a mulher e os filhos viviam e, se calhar, mais qualquer coisa. Dado que não havia certidão de óbito dele, as partilhas foram-se arrastando. A minha bisavó lá deve ter determinado a distribuição disso pelos filhos, cabendo ao meu avô o dito terreno. Mas nada disso foi registado.

A minha prima tem ideia que, a dada altura, alguma coisa fizeram. Mas não está certa. Eu tenho ideia que não fizeram. A estar em nome de alguém, cá para mim, ainda deve estar em nome dessa minha bisavó, cujo nome só agora soube. 

Ora como é que se passa disso, longínquo, impreciso, para um terreno devidamente registado em nosso nome? Parece-me um salto quântico...

Ela diz que, quando ia ao Algarve, se calhava irem também os pais, às vezes iam lá ver o dito terreno. E que ainda lá está. Diz também que lhe parece que o vizinho do terreno mais acima deve andar a mexer nos marcos pois parece que estão cada vez mais para baixo.

Eu não sei. Sei que encontrei um desenho do terreno, com medidas e tudo. Talvez venha a ser útil embora não saiba para quê.

E não sei se, para tratar de alguma coisa, poderei fazê-lo remotamente ou se terei que me mudar para lá, coisa que, obviamente não acontecerá.

Lembrei-me de ir à Loja do Cidadão. Quem me atendeu, perante a explicação, ficou na dúvida se poderiam resolver ali alguma coisa mas disse-me que, se quisesse tentar, teria que ir de manhã cedo para tirar uma senha. Ou, então, que sempre poderia fazer marcação no siga.marcações. Tentei. Mas, caraças, a dita aplicação... mandou-me para a Conservatória Predial do concelho a que o terreno pertence. 

Também estive a tratar do seguro da casa da minha mãe. Vencia-se agora. O valor, um balúrdio. Pedi uma nova proposta na mesma seguradora. Mais baixo mas, ainda assim, muito caro. Pedi na seguradora onde tenho os meus seguros. Mais em conta. Portanto, tive que tratar também disso, cancelar de um lado, fazer um novo noutro lado.

E etc.

Enfim. Conforme me disse o Conservador, na brincadeira, quando fui tratar da habilitação de herdeiros, só tem maçadas destas quem tem coisas para herdar... É um facto.

Quando os meus filhos me falam das suas vidas profissionais ou quando um amigo, como hoje aconteceu, me fala dos seus contratempos empresariais, quase me parece coisa de um outro planeta, coisa da qual eu, em boa hora, me pus a milhas. Mas, em contrapartida, aparecem-me destes pincéis para os quais não tenho um mínimo de competências...

Felizmente, esteve algum sol e consegui reclinar-me um pouco à hora de almoço, a banhar-me em vitamina D.

E é isto...

Por sorte, há pouco apareceu-me um vídeo giríssimo, uma casa cheia de cores e de ideias inusitadas, que vou partilhar. Pode parecer demasiado fora da caixa mas vejo ali ideias engraçadas.

Senão não fosse isto, o post de hoje não passava da indigência que acabaram de ler. É que ele há dias...

House Tours: 550 sq ft Custom Chelsea Studio

  • Location: New York, NY
  • Size: 550 Sq Ft / 51 Sq Meters
  • Type of Home: Studio Apartment
  • Years Lived In: Owner, 1.5 years

This colorful, custom and retro studio apartment in Chelsea is a labor of love and mad skill, all crafted by Helena, a props fabricator and designer for theater and film. Helena has turned a dull pail studio apartment into a jewel-toned ultra-functional home and hangout destination. Nearly every inch of her apartment has been carefully outfitted with custom furniture, handmade textiles, art objects, and playful paint patterns. In this house tour she shares not so obvious tips for constructing a Murphy bed, painter’s tips for color blocking, and how to make a studio apartment a welcoming destination for her and her friend’s weekly Dungeons and Dragons game night. See why Helena won Apartment Therapy’s “Cleverness Award” in the 2023 Small/Cool Contest!


Um dia feliz

Saúde. Boa disposição. Paz.

quinta-feira, fevereiro 15, 2024

Pedro Nuno Santos & André Ventura?
Com licença, vou antes falar de toalhas e de lençóis

 

Vou dizer a verdade: o dia foi produtivo. Para os great achievers o que eu consegui é menos que nada. Mas, para mim, agora que me comparo comigo na versão pessimista, foi um feito. Pensava que estava perante uma missão impossível e, afinal, está cumprida.

Reformulei o conteúdo das gavetas da escrivaninha que aqui tenho num recanto bem como o das gavetas de um móvel de meia altura que tenho na entrada. Claro que tive que dar destino ao que lá estava.

Agora tenho sete gavetões, sete, 7, sept, seven, com toalhas de mesa compactadas. 

Uma gaveta, uma senhora gaveta, tem só renda, toalhas rectangulares gigantes, rectangulares médias e redondas, todas em renda. 

Uma segunda tem híbridas: toalhas bordadas com rendas. Ou quadrados de renda, quadrados de tecido com bordado, ou bordadas com cercadura em renda. Ou outras combinações.

Outra tem toalhas de linho ou alinhadas. Ocupam espaço que se fartam. O tecido é encorpado para burro.

Outra tem quase só guardanapos. Tanto guardanapo, senhores. Uma loucura. Cada uma das toalhas bordadas ou de renda tem doze guardanapos similarmente decorados. Uma loucura. A minha mãe acharia esta arrumação um disparate, diria que os guardanapos, quais filhotes, têm que estar sob as saias da respectiva mãe-toalha. Mas não. Se é altamente improvável que eu dê uso àquelas obras de arte pois nem imagino a mão-de-obra necessária para as engomar, ainda mais é que use os guardanapos. Bem sei, bem sei, que não há nada como um belo guardanapo de pano. Compreendo. Concordo. Mas num restaurante. Aqui, de pano, só se forem de pano liso. Na maioria, quase totalidade das vezes, os guardanapos são de papel. Agora estar a pôr guardanapos bordados ou com rendas, só se receber uma rainha mas, ainda assim, só se for uma rainha a sério. E com o Goucha a acompanhar como comentador. Por menos que isso, não vão guardanapos de renda para a mesa.

Outra tem toalhas mais normais, mas em bom.

Outra toalhas mais banais, estampadas, ora estivais ora natalícias.

Enfim. Algumas gavetas tiveram que ser fechadas com o joelho. Que remédio. Já não tinha mais gavetas... O meu marido diz que não vou conseguir abri-las. Vou... 

Depois das toalhas passei para o castigo dos lençóis. Outra reformulação prévia, claro.

Desocupei a prateleira grande do roupeiro grande do corredor dos quartos. Tive que arranjar espaço para o que de lá tirei, como é óbvio. Tudo isto é um puzzlezinho de fazer queimar os neurónios a uma santa.

Os meus bordados e arrendados (arrendados de carregadinhos de rendinhas, não arrendados do programa mais-habitação) transitaram também lá para cima. Portanto agora tenho carradas de lençóis do mais artístico e elaborado que se possa imaginar. Os meus, os da minha mãe e não garanto que não também os das minhas avós. Lindos. A sério. Nunca usados. 

Depois há uma pilha, igualmente numerosa, de lençóis lisos, ditos 'de baixo'. Claro que uns são de linho para emparelharem com os correspondentes bordados ou cheios de rendas, outros de algodão, uns têm ajour no remate e etc, ou seja, a combinação não deverá ser aleatória. Mas algumas vez irão ser usados...? Muitas dúvidas.

Depois descobri umas peças não identificadas. Um formato incompreensível, nem lençol nem toalha de mesa, um algodão branco mais fino, uma renda imensa, bordados maravilhosos. Depois vi que cada um tinha duas letras bordadas. A inicial do nome da minha avó materna e a do meu avô. Depois de pensar, concluí que deveriam ser toalhas de casa de banho, quiçá as maiores a fazer a função de toalhão. Não sei. São obras de uma delicadeza e beleza extraordinárias. Deviam estar em vitrinas, expostas. 

Há ainda um outro monte, uma pilha enorme: as fronhas. Identicamente umas bordadas, outras com rendas, umas de um tecido, outras de outro. Se um dia quiser preparar um leito a preceito, teremos que fazer uma caça ao tesouro para conseguir acasalar o de cima com o de baixo e com as respectivas fronhas.

Mas, com isto, a verdade é que o tema de conseguir arranjar espaço para o que me parecia impossível de concretizar está resolvido. Todas as peças feitas com tanto carinho, tanto trabalho, tantas e tantas horas de um minucioso trabalho manual, amoroso, atento, estão guardadas, preservadas. 

Claro que imagino o pesadelo que será quando outros que não eu tiverem que resolver o que fazer a tantas relíquias... Mas, enfim, com sorte já cá não estarei para assistir a isso. 

Tirando isso o dia teve de tudo, Umas coisas menos boas e outras boas, incluindo visita a exposições, passeio à beira-rio e etc.

Conclusão: de debates só vi parte do último, o Pedro Nuno Santos em aceso duelo com o insuportável boçal-trauliteiro. Para dizer a verdade, tive alguma dificuldade em manter-me atenta pois tudo naquele arruaceiro fere a minha sensibilidade: o que diz, a forma como diz, a forma como se comporta, tudo. É um desordeiro, um perigo, uma pessoa sem princípios, sem pudor, sem vergonha.

Prazer tenho em ouvir (e ver) o Paixão Martins. Não há nada como uma pessoa inteligente, com sentido de humor, sem medo. Foi uma boa ideia a CNN tê-lo contratado para comentar os debates. 

Por isso, tirando o Paixão Martins e o fofo Raimundo, naturalmente por motivos diametralmente opostos, pouco mais prende a minha atenção nesta cegada dos debates a contra-relógio que, segundo as questões que os moderadores lançam, parece que têm como único propósito discutir os temas engendrados pelo Ventura. Não há pachorra. 

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E queiram descer até onde se revela o que Paulo Raimundo faria em caso de acidente nuclear.

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Desejo-vos um dia feliz

Saúde. Força nisso. Paz.

terça-feira, fevereiro 13, 2024

Uma Kodak Six-20 'Brownie' C. Uma tarde em família (e uma fotografia, com parte da maltinha carnavalescamente disfarçada, para o atestar). Um cartão algo misterioso. A natureza a renovar-se.

 

A malta jovem combinou juntar-se para jogar basket e perguntaram se não queríamos ir ter com eles. Claro que fomos. Estava um sol tímido mas foi bom estar em família. As crianças estão de férias e os adultos nem todos mas conseguiram organizar-se para que a tarde fosse uma maravilha. 

O meu marido, os meus filhos, os meus netos.
Todos carnavalescamente mascarados.
(Todos, salvo seja... O cão não está disfarçado...)

Depois o lanche foi numa esplanada e é sempre um espanto ver a energia com que se atiram ao que vem para a mesa. 

Depois eles continuaram juntos, umas às compras, outros para o barbeiro, e, finalmente, jantando juntos. Chamaram-nos para já não deu. É que, depois do lanche, nós dois regressámos a casa e eu, como vem sendo hábito, vim arrumar algumas das coisas que tinha trazido de casa da minha mãe. E é muito cansativo pois para nada há um lugar disponível à espera de ser ocupado. Pelo contrário, há que reorganizar, mudar de sítio o que já estava instalado. Não quero ficar com muito bibelot, não quero ficar com a casa atravancada, não quero descaracterizar a minha casa. Mas também não quero colocar as coisas da minha mãe em lugares pouco dignos. Portanto, há aqui um jogo de equilíbrio que não é fácil.

Por exemplo, no outro dia trouxe uma mesinha de apoio redonda, pequenina, com uma gavetinha. Um movelzinho delicado, elegante, em raiz de nogueira. Pareceu-me que ficaria muito bem numa parece do hall em que há um quadro e um candeeiro de pé alto, com uma luz relativamente fraca, amarela, que apoia na iluminação da entrada e da circulação e que está apontado para o quadro. Ou seja, dá uma luz indirecta muito agradável. Portanto, pensei que, ali, uma mesinha mínima ficaria bem. Pois bem. O meu marido que embirra com tudo o que é inútil não descansou enquanto não me convenceu a tirá-la dali. Não só dizia que a mesa não estava ali a fazer nada como ficava despropositada. 

Acabei por pô-la ao lado de um cadeirão, num sítio em que mal se vê. Pelo menos assim não embirra com ela. Mas quase que, para cada coisa, é um exercício de imaginação e equilíbrio.

Depois fomos caminhar, eo muito cansada. Quando o meu filho nos desafiou para nos irmos juntar a eles já não deu.

No meio de um conjunto de papelada -- que me forcei a ver toda para conferir o que poderia deitar fora sem receio de me desfazer de alguma coisa importante --, descobri um cartão de uma empresa de consultoria em marketing e gestão e, no verso, dirigido ao meu pai umas palavras muito lisonjeadoras. 

Como no cartão estava, por extenso, o nome da pessoa que o escreveu, uma consultora, estive a googlar. É uma consultora brasileira, tem agora uma empresa sua no Brasil, tem livros publicados. Fiquei agradada mas intrigada ao ler o que ela escreveu ao meu pai. (No cartão, apaguei o nome do meu pai, a quem ela se dirige, bem como apaguei o nome dela, ao assinar-se, na vertical, de lado). Qual dos dois, o meu pai ou a minha mãe, guardou, e bem escondido, este cartão? Mistério...

No domingo, lá em casa dos meus pais, a minha filha descobriu as máquinas fotográficas do meu pai, em particular uma antiquíssima que eu julgava desaparecida, uma velha Kodak. O estojo já completamente acabado.

O meu pai tirava imensas fotografias. Andava sempre com a sua Kodak. Lembro-me bem de ser bem pequena e de estar a ser fotografada por ele.

Mais tarde, substituiu-a por uma mais moderna. Tenho ideia de que a minha filha também a guardou. Mas hoje não a encontrei. Tenho que procurar melhor.

Tirando isso, antes de almoço apanhei as últimas três laranjas. Doces e sumarentas.

E encantei-me com o jasmim amarelo já a começar a florir. 


E a chuva de finos ramos do chorão, agora nus, começam a querer pintar-se de verde. Um prodígio de delicadeza e beleza.


A Primavera aproxima-se. A vida renasce. A vida reinventa-se. É da natureza. É a lei da vida, dizem. 

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Uma boa terça-feira

Saúde. Alegria e esperança. Paz.

segunda-feira, fevereiro 12, 2024

Não me peçam para comentar o lado positivo e as coisas grossas de que o PCP gosta.
Vou antes contar como foi o meu dia, incluindo o telefonema da minha amiga sobre a minha mãe

 


Dia chuvoso e sem grande atractivo. Mais um dia em casa da minha mãe, mais um dia confrontada com armários e roupeiros cheios que nem ovos, coisas boas, mal empregadas para serem deitadas fora, e nós sem as querermos para nós, porque não temos falta, porque não temos onde pô-las, porque não nos serve ou não são o nosso género.

Tudo muito, muito, tudo infindável.

Valeu-me a minha filha que fez um bom rastreio e que consegue ter um desapego que eu não tenho.

Começo a pensar que, se a minha mãe guardou durante toda a vida, é porque era importante para ela e, se era importante para ela, dá-me pena deitar fora.

Mas tem razão, ela (e do meu marido nem falo pois, por ele, não aproveitava nem um só copo) pois poderia ter importância para ela mas teve-as guardadas longe da vista, durante décadas. A nós pouco nos diz e, a guardarmos tudo aquilo, seria também para ter encafuado, sem qualquer préstimo. E vamos ter as nossas casas atafulhadas de coisas que vão estar escondidas e que são inúteis?

É verdade, reconheço.

Portanto, enchemos vários sacos com coisas que considerámos lixo. 

E voltei a deixar a cama com uma pilha imensa de roupa que a senhora -- que lá ia a casa e que lá irá até esta monda estar feita -- fará o favor de ver se quer alguma coisa para ela e, o que não quiser, tratará de lhe dar destino. Contou que uma rapariga brasileira que veio para Portugal quase só com a roupa que trazia no corpo delirou com a leva anterior, que lhe assenta tudo bom, que está feliz da vida. Fico contente.

A minha filha levou algumas coisas, eu trouxe coisas que acho que têm valor e não podem ir para o lixo e que ela não quer e o meu filho ainda menos.

Ela também já levou alguns livros e eu trouxe também uns quantos. O meu filho diz que fica com o Eça. Mas espero que ele fique com mais alguns pois há muitos, muitos. Eu depois verei se há alguns que  não tenha ou que minimamente me interessem. Depois... nem quero pensar.

E de copos nem sei que dizer. Várias prateleiras cheias de copos. Ora, ninguém quer mais copos, e eu não tenho mesmo onde pô-los. É de loucos, não sei como é possível ter tantos copos. E eu, que ali vivi e que toda a vida frequentei aquela casa, nunca tinha reparado em tal. A gente, à força de tanto ver as coisas, parece que deixa de vê-las. Penso que vamos ter que embalá-los e serão mais alguns caixotes que ficarão na garagem. Como já aqui o referi, só espero que os meus netos, quando estiverem a 'montar' as suas casas, queiram ficar com todo o material que cá estará à sua espera.

Entretanto, quando estava lá, ligou-me uma amiga. Gostei imenso de falar com ela. Conhece a minha mãe desde os nossos dez anos. Contou-me que tem uma grande admiração por ela desde essa altura pois, nesse tempo, entre o nosso grupo de amigas e amigos, era a única mãe que trabalhava. Todas as mães estavam em casa. Lembra-se de estar em minha casa e gostar imenso de falar com ela e de, outras vezes, passarmos pela escola em que ela dava aulas e vê-la, com a sua bata branca. E isso, para ela, era o máximo. Achei graça ela dizer isto. Nunca tinha visto isso segundo essa perspectiva. Para mim era natural a minha mãe trabalhar, tal como era natural que todas as outras mães estivessem em casa. Depois, voltou a estar frequentemente com a minha mãe pois era médica no Centro de Saúde onde a minha mãe ia e, portanto, conversavam sempre e, através dela, ia sabendo sempre notícias de mim. Tal como eu ia sabendo notícias dela. Mas, diz ela, que, do que conhecia a minha mãe, não estranhou a decisão de não nos contar a doença que tinha, não se deixar aprisionar pelos exames e tratamentos que, vendo bem as coisas, não iam servir para salvá-la e iam estragar-lhe a qualidade dos últimos meses de vida. Assim, teve uma morte muito rápida. Quando eu disse que ainda me custa acreditar e que me custa perceber como é que ela esteve tão bem, sem que ninguém percebesse nada, até cerca de mês e meio antes de cair a pique, disse ela: 'Mas ainda bem, não é? Ainda bem que esteve bem quase até ao fim, não é?'. Pois, nessa perspectiva, sim. Esta minha amiga nunca foi médica dela mas conversavam muito e diz que também nunca lhe percebeu nenhum mal estar ou que sofresse daquilo que viria a morrer. Mas reforçou várias vezes: 'Ainda bem que foi assim'.

Hoje, lá em casa, vi as flores que plantou, ela própria, no canteiro do meio, perto do portão, pouco antes de ir para a residência. Estão floridas, alegres. São a prova viva da força dela.

Queixava-se de mil pequenos sintomas, coisas que atribuía sempre aos comprimidos que tomava, achava que mais valia não tomá-los pois vivia melhor sem os seus efeitos secundários. Pelos vistos também não os tomava todos. E, se calhar, dada a conjunção de maleitas e dada a sua idade, mais valia gozar a vida como se tivesse vinte anos, sem medicamentos e, quando tivesse que ser, isto é, quando chegasse a sua vez, chegava. E chegou. Para o mês que vem faria noventa e um anos. 

E toda a gente fala dela como uma pessoa jovial, independente, bem disposta e muito sociável. Uma vez, ao princípio de estar na residência, eu estava a falar-lhe de uma senhora que tomava as refeições na mesma mesa, uma senhora muito interessante, escritora. Como havia lá mais duas, uma delas, uma das quais sua amiga, a minha mãe perguntou a qual me referiu eu: 'Qual, a velhota?'. Fiquei como sempre ficava quando ela se referia às pessoas da idade dela ou mesmo mais novas como 'velhotas'. Mas, de certa forma, percebia. É que, se as outras pareciam ter a idade que tinham, a minha mãe não parecia nada uma velhinha. Nada. Uma vez, ela tinha que ir aos Correios. Disse-me que não ia em dada altura do mês porque estava 'cheio de velhos que iam receber a pensão'. Só que ela parecia bem mais nova mas, na realidade, já era nonagenária. Mas não se sentia. Nunca se sentiu velha. Quando se queixava que os medicamentos para o coração lhe provocavam a sensação de cabeça vazia e tinha receio de ter tonturas, eu e os médicos dizíamos que, se calhar, por segurança, podia usar uma bengala. Nem pensar. Nunca usou. Para ela usar bengala devia ser sinónimo de ser velha. E, de facto, ágil e desembaraçada como era, uma bengala não tinha nada a ver com ela.

Enfim.

Por vezes penso que pode parecer estranho eu, tão cedo, estar a querer dar destino às coisas da minha mãe. Não sei explicar. Como fui várias vezes a casa dela não estando ela lá (quando foi para a residência, como já contei, nas duas ou três primeiras semanas, enquanto ainda estava bem, queria mais casacos, mais sapatos, calças de fato de treino, etc). Por isso, entrar em casa sem ela lá estar não me faz impressão. E acho que, resolvendo já isto, me custa menos do que estar muito tempo sem lá ir e depois ir a uma casa abandonada, triste. Não sei explicar. Cada um vive e gere as suas emoções da forma que lhe é mais natural. Eu parece que fico mais tranquila se souber que as coisas que lhe eram mais queridas estão connosco, em nossas casas. Parece que assim, arrumando e organizando e vendo as suas coisas (como, por exemplo, as cartas, as fotografias, etc), estou a honrar melhor a sua memória, não deixo as suas coisas por lá, tristes e sem razão de ser.

Hoje descobrimos uma coisa que nos fez rir. Num dos roupeiros, numa bolsinha de crochet feita por ela para supostamente trazer, à tiracolo, com o telemóvel ou com a carteira, meia escondida no meio de uns casacos compridos, descobrimos cadernetas antigas da CGD, envelopes de cheques, uns antigos, outros actuais e, no meio, completamente ocultado, um molho de fotografias. Eram fotografias minhas com aquele namorado de quem já tantas vezes aqui falei. Nem me lembrava que as tinha. Ou seja, deu-lhes sumiço, escondendo-as completamente. Provavelmente foi para que nunca se corresse o risco de o meu marido ou os miúdos darem com elas. Mas que mal fazia? Não sei. Só sei que ela nunca engraçou com ele. Não quis que, de alguma forma, ele fosse tema. Fartámo-nos de rir.

Assim, parece que, às tantas, vamos encarando com mais naturalidade o que aconteceu e que tanto nos abalou e que tanta tristeza nos trouxe.

Afinal é o que se diz, a vida continua.

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Chegámos a casa ainda a tempo de vermos o Montenegro com a Inês Sousa Real, uma coisa sem história, pelo menos pela parte que me toca. Nada que se lhe diga. E vimos o infeliz Raimundo que, coitado, não consegue dar uma para a caixa a debater com a Mortágua. Também nada a dizer a não ser que o Raimundo arranjou dois tópicos: o PCP está ao lado do que é positivo e que só vale a pena o que é grosso. Quem viu e ouviu poderá confirmá-lo. Ora não explica o que é isso das coisas serem positivas e, quanto àquilo de só valer o que é grosso, nem vou querer saber até porque a língua portuguesa é traiçoeira. Tirando isso, é uma mão cheia de nada e que, quando quer dizer qualquer coisa, não é capaz. E quando se esforça, como no caso da Ucrânia e da Rússia, é uma infelicidade, vem com a conversa das 'forças da paz' sem que ninguém consiga perceber o que é isso das forças da paz. Uma conversa de pombinha, ainda por cima titubeante. 

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Uma boa semana a começar já nesta segunda-feira

Saúde. Ânimo. Paz.