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terça-feira, julho 28, 2015

Há homens que, perdidos nas maiores contravenções do decoro, mantêm o espírito do desmentido, sobretudo quando estão em causa os anátemas do sexo


No post abaixo já falei do nariz do Portas em aumento galopante e com um par de valentes adenóides em perigosa exposição, já falei do Salgado a vender bolas de berlim na Comporta e, para ter aqui qualquer coisa de profundo, referi também o caso verídico da holandesa que quer casar com o cão.

Mas isso é a seguir. Aqui, agora, com vossa licença, haja contenção que se vai falar de gente grande.






As mulheres têm horror a gente assim. A coisa com que mais embirram é ficar despenteadas. Não se importam de ficar desonradas, mas despenteadas é que nunca. E Camilo era um homem desses, um vendaval, um ciclone do alfabeto, uma barafunda de pretextos para arrepiar os cabelos das famílias na sala de baile.

(...)

Ele era o que todos nós sabemos, um Voltaire à moda do Porto, com mais tripas do que carne do lombo. Eu cá, parece-me bem assim. É um monstro a retalho, o que produz grandes obras.

(...)

Há homens que, perdidos nas maiores contravenções do decoro, mantêm o espírito do desmentido, sobretudo quando estão em causa os anátemas do sexo. Um deles foi Oscar Wilde. Não inspirou ele o seguinte verso: 'De todas as doces paixões, o pudor é a mais adorável'? A pouca vergonha de Camilo estava apoiada em certo culto britânico do cavalheiro, para quem ser insolente é uma honra refinada. Nunca é, na verdade, impudico; mas sim arrogante como forma de valentia.

(...)


Camilo não é um dândi; mas gostava do risco mundano que é escandalizar a norma. É por isso que é punido, e não pelas suas travessias eróticas ou outras.

(...)

Na verdade, não sei o que lhe deu a Camilo para escrever este romance ['A enjeitada'], a não ser o desprezo pela sua actividade face a um público que lhe exigia emoções calculadas, e para quem o melodramático se confunde com o sério. Como hoje ainda acontece em vários quadrantes da sociedade. Basta ver o estilo dos jornais. Quanto às contravenções históricas, acho que devem ser usadas em família e dentro das nossas fronteiras; como quem quebra uma xícara lá em casa ou dá um pontapé ao gato. Mas fazer isso na casa dos outros é má-criação e abuso. Eu espero fazer um romance histórico tão cheio de desacertos e charadas que será uma delícia para os estudiosos revelarem. Além de que errar de propósito nos absolve de errar sem esforço.


__  _  __


O que acima puderem ler são excertos um pouco ao acaso das primeiras páginas do magnífico Camilo, Génio e figura de Agustina Bessa-Luís, da Casa das Letras.


  • Agustina Bessa-Luís nasceu em Amarante, Vila Meã em 15 de Outubro de 1922.
De toda sua vida,
qual é o instante, o fragmento,
o pontinho de luz que mais vezes
lhe ocorre para dizer
que viver vale a pena?

Ter a capacidade
de amar alguém ou algo na vida.
Ser capaz de pôr nisso todas as forças,
toda a capacidade que,
no fim de contas
é a capacidade para viver.

[LER, Outono 2003]

  • Camilo Castelo Branco nasceu em Lisboa a 16 de março de 1825 e morreu em São Miguel de Seidea 1 de junho de 1890)
Ris-te?... Se queres ser feliz abdica da inteligência, convence-te, e convence os outras de que és um pária do senso commum, entra nesses camarotes, e diz que a letra do «Barbeiro de Sevilha» é de Voltaire, e a composição do maestro Spinosa; vira-te para a vítima predestinada, e diz-lhe que a música é a voz mística dos anjos confidentes das paixões delirantes, que dos olhos dela deviam partir as inspirações que arrebataram Raphael d'Urbino, que farás autor da «Norma». Se ouvires uma gargalhada insofrida, deixa-os rir; continua; faz-te vítima interessante, acolhe-te à piedade da dama, e fala-me depois...  
Camilo Castelo Branco, in 'Mistérios de Lisboa (1853)' 
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A música é de Nicola Porpora: Alto Giove, de Polifemo numa interpretação de Philippe Jaroussky


Alto Giove, è tua grazia,
è tuo vanto il gran dono
di vita immortale
che il tuo cenno sovrano mi fa.
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As fotografias pertencem ao conjunto A bouquet of burning roses e são uma produção da  agência Ars Thanea e descobri-as, é claro, no Bored Panda.

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Relembro que, para coisas do além (o nariz crescente de Portas, as bolas de Berlim do Salgado e a mulher que quer casar com o cão), é só descer até ao post seguinte.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma terça-feira com boas notícias, sorte, saúde e alegria. 
Be happy.

...

segunda-feira, dezembro 16, 2013

Esse grande abandono nos braços da vida


No post a seguir mostro um filmezinho inocente que mete uma toalha pós-banho sobre um corpinho nu e tal e coisa, tudo para os cavalheiros poderem ficar com o astral em cima e, logo abaixo, falo do comentário deste domingo de Sócrates e, escrever esse post, a mim também me levantou o astral.

Mas aqui, agora, a conversa é outra. Aqui fala-se de literatura. E de mar.

*

E, por falar em mar, que deslizem os Wild Swans, por favor





*


Gosto imenso de literatura, isso é evidente. Como dizia Mark Twain, um grande escritor, 'truth is stranger than fiction', a realidade é muito mais bizarra do que a ficção. A literatura tem um significado mas só se mantiver uma independência total, uma irresponsabilidade total. Um escritor não é um pai de família que tem que ser responsável, é uma pessoa que faz o que quer. 

A literatura tem um significado se nos ajuda a compreender o que são o amor, a vida, a morte, o mar. Não é um fim em si. Não é necessariamente um compromisso, mas sim o sentimento do enorme mistério da criatividade da vida.

A literatura é o domínio onde a fantasia, a irracionalidade, a escrita nocturna, o caos podem, no meu caso, encontrar-se com a racionalidade necessária, a razão, a língua, uma certa ordem, que devemos dar mesmo à desordem e ao caos.


Há talvez três momentos na minha escrita. Por vezes é como uma intuição, uma sugestão que pode ser uma notícia lida no jornal ou uma pequena história portuguesa, ou um rosto, um episódio, qualquer coisa. Então começo a pensar, a deambular sem direcção com isso.

Se o tema começa a tomar forma, então agarro-o e talvez comece a trabalhar, depende do tema. 

Se a ideia, o projecto não morre nesse momento inicial, é como numa relação sentimental, começamos a ver a pessoa, telefonamos um ao outro, encontramo-nos, bebemos um café, por vezes isso continua, outras vezes não. Se a ideia, o projecto, me agarram, pelo menos do ponto de vista subjectivo, então há uma fase selvagem em que escrevo sem atenção especial ao estilo, na qual não sou realmente mestre do que escrevo, é como... É torrencial, é isso. É aí que um livro nasce ou não, não é uma decisão. 


Se sinto que o livro nasceu, espero, espero sempre, e depois começo um controlo, uma correcção muito pedante, muito penosa, muito professoral, muito aborrecida, muito fria. Mas o momento decisivo é antes.

Quando escrevo intervenções ético-políticas, aí são como furores, por vezes escrevo em vinte minutos. Surgem quando tenho o sentimento súbito de defender qualquer coisa, protestar, denunciar. Aí a escrita é muito diferente, premente, é como um ataque, um desafio de boxe. Não há tácticas. É um pouco a linguagem do Evangelho - sim, sim ou não, não - diante de uma injustiça. 


E depois há o mar:

Para mim o mar é outra coisa. é o mar da posição horizontal, não da luta para dominá-lo, mas ao contrário, para se abandonar. É o mar da felicidade. É por isso que o mar está indissoluvelmente ligado ao amor, a Eros. Para mim, era inconcebível o amor sem o mar. O mar está também na história da minha vida das paisagens do amor, isto é, desse grande abandono nos braços da vida. Nado muito mas isso não tem nada a ver com o desporto, não, é realmente abandonar-se em grandes braços amorosos.


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O texto acima, em itálico, é um conjunto de excertos colhidos e transcritos de forma não ordenada da excelente entrevista concedida por Claudio Magris a Ana Sousa Dias e que pode ser lida na Revista LER de Dezembro.


no outro dia aqui tinha dito, meio a brincar, meio a sério, que engalinho com homens que se arrebicam todos: prefiro os homens au naturel (au naturel quais ostras - ostras que, ao contrário dos homens, são geralmente saborosas e afrodisíacas; os homens, pelo contrário, têm que ser bem escolhidos para reunirem as duas características). Se, então, são do tipo capachinho, cabelo pintado, anel de brasão, fio com medalhinha a deixar-se entrever, pulseirinha, alfinete de gravata, camisa de uma cor e colarinho branco ou outras mariquices de mau gosto, tenho muita dificuldade em olhá-los com respeito. 

Por isso, quando vejo o Magris agora de cabelo todo castanho-acaju sem um cabelo branco, sabendo que o homem tem setenta e tal anos, e isto depois de já o ter visto com cabelo de cor parda e franja ridícula, ou cabelo negro asa de corvo, dou um passo atrás e reconsidero o que penso do que ele escreve.

Mas, lendo a entrevista, volto a pensar que é um homem cuja conversa cativa e que a falar deve ser quase tão interessante como a escrever - e dou, de novo, um passo em frente.

Ou seja, vou continuar a lê-lo de gosto (tenho andado a ler os Alfabetos e é uma escrita lúcida e límpida que dá gosto) e o melhor é abstrair-me desta cena do cabelo. Paciência. Ninguém é perfeito.


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As três primeiras fotografias foram feitas este domingo in heaven (e que bem que se estava lá, um cheiro a terra húmida, o musgo a atapetar a terra, as folhas caídas a deixarem no ar um odor orgânico, íntimo, e a lua clara e quase indiscreta escondida atrás das árvores, a noite a chegar-se num azul sumptuoso, tudo tão bom, tão acolhedor, dá-me vontade esconder-me numa gruta nas rochas, ou debaixo das ramadas pesadas e perfumadas dos cedros, alimentar-me de frutos, reduzir-me à minha condição de animal).

A última foi feita no Ginjal, numa manhã especialmente adornada pelo frio e pela luz.

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A canção, que acho muito bonita, é Wild Swans e é interpretada por Bill Ryder-Jones. 


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Relembro: abaixo deste há mais dois posts, um filmezinho à maneira e outro sobre Sócrates e Passos Coelho.

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Muito gostaria ainda de vos convidar a visitarem o meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa, onde hoje tenho José Régio dito por Bruno Huca, uma agradável surpresa, e tenho palavras minhas que percorrem os caminhos misteriosos e belos como céus cheios de pequenas estrelas que são, nem mais, os caminhos da minha vida. E tenho uma fotografia de que muito gosto (modéstia à parte).


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E, por agora, por aqui me fico. 
Desejo-vos uma semana muito boa a começar já por esta segunda feira. 
Saúde, bem estar, alegria, afectos - é o que vos desejo

sábado, dezembro 14, 2013

Numa certa casa, se é que me entendem. E, depois disso, compras. E depois arrumações. E mails. E mais não sei o quê. (E continuo sem ter tempo para ler a LER de Dezembro e tentar perceber se o Magris é mesmo sujeito para se pôr a pintar o cabelo]




*

Esta minha semana passou sem que eu quase não tivesse dado por ela. Detesto semanas assim, em que quase não há uma pausa, são umas atrás de outras, de um lado para o outro, uma canseira.

Esta sexta feira, por exemplo, levantei-me bem cedo. Quando tenho compromissos, sou pontual como um relógio suíço. Se sou eu a conduzir as reuniões, chego à hora e começo-as, sem minutos de tolerância. Não tenho paciência para estar à espera nem tenho paciência para pessoas que não sabem gerir o seu tempo, impondo atrasos aos outros. Por isso, se tenho alguma reunião à primeira hora do dia, saio de casa com uma segurança de quase o dobro do tempo. Hoje, no entanto, era daqueles dias em que nem um minuto era admissível pelo que saí com cerca de uma hora de antecedência em relação ao tempo que o gps do carro me indicava. Não era eu a conduzir a reunião mas era alguém ainda mais rígido nos horários que eu.

Por isso, saí de casa com uma antecedência correspondente ao triplo do tempo suposto. Para não correr o risco de me atrasar, já tinha na véspera à noite escolhido a toilette. Vesti-me e despi-me nem sei quantas vezes. Parece que não atinava. Vestia-me, ia ter com o meu marido que tem uma falta de paciência para isto que nem vos digo nada, pedia-lhe para se pronunciar e ele, quase sem olhar, dizia, 'Não'. Claro que isso não me serve. 'Não? Não porquê?'. e ele 'Pára. Não tenho paciência para essas perguntas. Despacha-te. Vamos jantar'. Fico indisposta com esta má vontade. Então insisto: 'Preciso de saber o que não está bem para perceber o que hei-de vestir'. Resposta: 'Deixa-me em paz com essas parvoíces e vem jantar'.

Então lá ia eu de volta para o roupeiro, lá escolhia outra toilette e lá se repetia a cena. Até que finalmente me disse 'Pronto, está bem'. Claro que quis confirmar, 'Mas é para eu não te chatear mais ou porque assim estou mesmo bem?'. Resposta: 'Estás bem. Agora vem'.

E pronto, lá organizei as roupas para, no dia seguinte, ser só enfiar, sem hesitações. Preto em predominância mas, na blusa, um estampado largo em encarnado profundo, por cima um blusão de seda forrado e quentinho em xadrez encarnado e preto, dois colares bem compridos, um preto, outro encarnado, brincos encarnados. Assim fui eu. O dress code referia casual.

Mas, estando eu a sair de casa, toda preparada e perfumada (com Chance - Chanel, claro), tive logo o meu primeiro sobressalto: estava nevoeiro e as manhãs de nevoeiro são jeitosas para quando se está com pressa. Confirmou-se. Foi um stress, o tempo a passar e eu quase sem sair do mesmo sítio. Um acidente com quatro carros lá mais à frente entupiu o trânsito todo. Acho que isto é o que, nesta vida, verdadeiramente me enerva: ver o tempo a escoar-se e eu sem poder deixar o carro no meio da barafunda e seguir a pé, a correr, para tentar chegar a tempo e horas.

Bom. Depois de passar os carros acidentados, lá fui, enervada, a abrir tanto quanto possível e, vá lá, cheguei a tempo: uns dois minutos antes da hora (claro que já estavam os outros vinte e tal à minha espera).

Uma reunião complexa, tensa, mas, enfim, há coisas piores.

Até porque, a seguir, já eram quase 2 da  tarde, passámos para os salões onde uma grande árvore de natal brilhava num canto, um pequeno presépio dava uma graça inocente àquele espaço tão acolhedor, e velas acesas e pequenos arranjos natalícios e muitas tapeçarias, sofás enormes e confortáveis, uma grande lareira, grandes peças de louça e vidro, grandes e belas carpetes a que o tempo retirou alguma cor e alguma espessura - e tudo contribui para aquele ambiente tão aconchegante, tão caloroso.

Por ali estivemos, conversando suavemente, trincando amêndoas torradas e salgadas, coisinhas assim.

Depois passámos para a sala de jantar, enorme pé direito, paredes forradas a azulejo, grande candelabro de tecto Murano sobre a grande mesa.



O almoço foi a delícia de sempre. A cozinheira é exímia, uma simpatia, e nós não nos cansamos de a elogiar e de lhe agradecer.

Sobre a mesa com toalha de linho, serviço vista alegre, vários castiçais com as velas acesas.



Do meu lugar, e eu estava à direita do anfitrião, via a hera que cobre as paredes do pátio interior, via a vegetação verde, fresca, frondosa.

Dali não conseguia ver as largas escadaria de pedra nem os vasos com grandes fetos.

Depois de almoço voltámos ao grande salão para o café, um ou outro (cada vez menos) fumando, e deixámo-nos estar todos à conversa até que nos despedimos. Saí de lá um pouco depois de meio da tarde, bem mais cedo do que costumo sair do trabalho mas tarde demais que justificasse ainda deslocar-me até ao escritório.

Vai daí resolvi ir para um centro comercial fazer o resto das compras de natal, livros especialmente. Um calor lá dentro horrível, um carrego... Mas, enfim, já estou despachada tirando duas ou três coisitas. 

Ou seja, cheguei a casa mais estafada do que se tivesse vindo directamente do trabalho. E depois fui fazer a minha caminhada e, na volta, fomos ao supermercado buscar mantimentos para o fim de semana e comprar já bacalhau para o natal (tenho sempre medo que acabe e que eu fique pendurada, a casa cheia de gente, e eu sem bacalhau para lhes servir).

Ora, quando de tarde, regressando mais cedo do que o costume, vinha a pensar que, dada a mini-folga que me tinha auto-concedido, me iria estender a ler a LER, em especial a entrevista do Magris. Qual quê...?


Agora, há pouco, ainda tentei mas não consegui: entre telefonemas, arrumações, responder a vários mails,  etc, fez-se tarde demais para isso. 

Mas estou curiosa.

E eu bem digo que, quando gosto de ler o que uma pessoa escreve, prefiro não saber como ela é fisicamente porque, às tantas, ainda posso ficar mal impressionada.

Aqui, no caso do Claudio, nem é bem a cara, é mais o cabelo.

Um homem daquela idade não pode ter o cabelo daquela cor, praticamente sem cabelos brancos. Cá para mim o homem pinta o cabelo. Já o vi de cabelo quase preto, castanho claro, de franja, sem franja, agora está arruivado.

Senhores. Que incómodo que isto me causa. É capaz de ser pancada minha mas faz-me impressão os homens que usam capachinho, ou três cabelos a atravessar a careca, ou que pintam o cabelo. Sou preconceituosa, eu sei. Mas, caraças, como é que um homem que escreve coisas que eu gosto tanto de ler, depois tem esta mania com o cabelo?

Por isso, quero perceber como é a conversa dele, se é um palerma qualquer com a psicose do cabelo ou se é um homem simpático, interessante como a sua escrita parece deixar perceber.

De qualquer forma, passa das duas da manhã, estou cheia, cheia de sono, já devia estar a dormir há séculos para ver se ponho o sono em dia, que com semanas destas é um disparate eu persistir nestas noitadas. Não consigo sequer responder aos comentários e tanto que eu hoje queria fazê-lo, em especial à querida O.M. que esteve a ler a história da Leonor, do Afonso e do Duarte e que foi deixando as suas impressões à medida que a história ia evoluindo. A ver se amanhã consigo organizar-me para fazer o que tenho que fazer, e ler o Expresso, e ler a LER e descansar e ainda conseguir ter tempo para conversar convosco.


*

Lá em cima a canção é 'Eu Seguro', interpretada por Márcia e Samuel Úrias.



No Ginjal e Lisboa  hoje temos João Cabral de Melo Neto na voz sedutora do sedutor Chico Buarque.

*

E, por hoje, por aqui me fico. Desejo-vos, meus Caros Leitores, um belo sábado!

sexta-feira, outubro 04, 2013

Valter Hugo Mãe na capa da revista Ler. Lá dentro 12 páginas de entrevista com a mesma criatura. A capa do Jornal de Letras...? Valter Hugo Mãe. No outro dia na televisão? Valter Hugo Mãe. ... Entro na FNAC e para onde me vire... Valter Hugo Mãe. Mas o que é isto, senhores? Está tudo doido? Este país ensandeceu ou quê? De uma coisa estou eu certa: Valter Hugo Mãe está para a literatura como o Passos Coelho para a política. E que me caia aqui no colo um cão com pulgas se estiver errada.


Francisco José Viegas num momento de ternura com o seu Valtinho,
esse Fofinho

Claro está que não vou comprar a revista Ler, não faço parte do grupo de masoquistas de que Cavaco Silva tanto se queixa. 


Ma-so-quis-ta é o que é toda a gente que consuma o valtinho às colheradas. Ma-so-quis-ta.  

In-sus-ten-tá-vel é o que é esta overdose de um prato tão requentado como o piroso do Valtino. Não se aguenta.

Fartinha da cara deste fulano, fartinha. Está em todo o lado. 

Assim vão estes tempos. Predomina o absurdo. Mas um absurdo sem glamour, sem graça, um absurdo pindérico.

Deve ser isto a decadência: uma total ausência de exigência, de critério. Vale tudo. Tudo. À frente do Governo um Passos Coelho, e em tudo o que é jornal ou revista ou canal de televisão (órgãos de comunicação social que deviam respeitar a literatura e a arte) o Valtinho. Já vale tudo. A mediocridade a ocupar todo o espaço como uma mancha de óleo.



Valtinho (ou Valty)
um artista que gostava de ser escritor
mas que é apenas um sujeito que vai nu
Em relação a este sujeito, o Valter, interrogo-me: mas ninguém vê que a criatura vai nua, senhores?


Eu, como não sou masoquista e prezo a sustentabilidade, só me apetece mandar uns quantos para reciclagem: cacos coelho, valtinho, cavaco, todos os pseudo críticos literários que estendem a passadeira vermelha a tudo o que é nulidade, a todas as universidades de verão que formam jotas e amigos dos agiotas, albuquercas, portas aos pentas, menezes e isaltinos, searas e cães com pulgas, e mais uns quantos. 


Tudo para reciclagem. Tudo para compostar, reciclar, o que quiserem desde que seja longe de mim. Bolas para isto.


Leio um excerto do que deve estar no interior da revista e a única coisa que me ocorre para caracterizar o que leio é que é uma pomada. Ora vejam (destaques meus):

Eu achava que ia morrer virgem, que era tão feio que nunca ninguém me tocaria, achava que nunca arranjaria emprego, que levaria milénios para aprender a fazer alguma coisa, nunca procurei uma editora para editar nada, pensei sempre que escrevia para me ajudar a pensar melhor e sobretudo para fugir da burrice, para não ser tão estúpido e tão alheio à inteligência.
Achava que morreria cedo, que nunca conseguiria entrar na tropa porque não era robusto o suficiente. Com 18 anos devia pesar 42 quilos, era só ossos e tudo me magoava, tinha sete ou oito gripes terríveis por ano, caía de cama constantemente. Acabei o liceu era um aluno imberbe e não sabia nada, não tinha gostado nada do liceu. A minha vida só começou a fazer sentido mais tarde.
Na universidade quis namorar com uma cachopa que me dizia que só namoraria comigo pelo meu lado interior, porque eu era tão feio. E ela também era feia e eu não tinha coragem de dizer. Hoje se a apanhasse... Eu só me candidatei porque achei que ela era tão estrupício quanto eu e estaria à altura. Esta não me vai dizer não porque, coitada.
Obviamente tinha de esperar muito tempo para construir uma autoestima qualquer e sobretudo para me curar. É preciso muitos livros para me curar. Ao Lobo Antunes, que eu saiba, nunca lhe faltaram umas cachopas. Era lindo, teve mulheres lindíssimas. Sempre cobicei muito a beleza.




E mais não digo para não parecer que até eu estou a publicitar o estrupício - e citei. Quem quiser saber a minha opinião sobre a criatura que queria fugir à burrice (e citei de novo - e só não acrescento que queria mas não conseguiu porque o sucesso que está a ter só prova que burra sou eu) é clicar aqui e aqui.

E adiante.

*

[Nota: Cheguei ao fim e ainda nenhum cão com pulgas me caíu no colo. Logo...]

domingo, setembro 22, 2013

Valter Hugo Mãe lança o seu novo livro, 'A desumanização', e o José Mário Silva no caderno Actual do Expresso estende-lhe uma carpete vermelha. Mas eu, e desculpem-me as leitoras devotas do dito Valter, o que vejo é um homem nu - mas admito que é capaz de ser influência da fotografia em que ele se mostra em pelota. É que eu nisto sou como o Gonorreias - 'há que elevar os padrõezinhos' . [Texto revisto e aumentado]


No post abaixo falo de pessoas que não apenas são talentosas como generosas e, para o ilustrar, mostro mais um maravilhoso filme de Cine Povero.

Mas isso é a seguir. Agora, aqui, a conversa é outra.

*

Já vos confessei muitas vezes: se calhar não sou normal. Gosto de coisas que ainda não estão na moda e, quando estão, já eu estou noutra. Ou gosto de coisas porque sim e de que nunca ninguém ouviu falar. E parece que tenho aversão ao que 'está a dar', às vezes nem sei bem explicar (outras sei, ó se sei).

Vem isto hoje a propósito do Valter Hugo Mãe

Ganhou o prémio Saramago, vende muitos livros, tem um ar vagamente singular, enternece algumas senhoras, tem boa imprensa. 

Mas que eu hei-de eu fazer se não consigo ler nada escrito por ele? 

Lá está: folheio, folheio, e tudo aquilo me parecem banalidades, coisa a armar, parece que não acrescenta coisa nenhuma ao ruído editorial que por aí abunda.

E depois há aquela sua exposição, aquele seu culto da auto-imagem - e isto enquanto se diz tímido e se arma em campónio. Não dá. Não faz o meu género.

Faz-se fotografar de todas as maneiras possíveis e imaginárias - a olhar o além, armado em bom, deitado no meio da rua e até completamente nu (reconheço: é melhor nu do que vestido; mas eu nem nu lhe acho graça, o que é que eu hei-de fazer?). 




Admito, contudo, que eu é que seja a excepção, já que quase toda a gente lhe ache muita graça. Eu não tenho paciência. Mas que tem boa imprensa, lá isso tem.


Vai sair ou saíu, nem sei, um novo livro, 'A Desumanização', e o Expresso dá-lhe honras de capa do Actual e quatro páginas inteiras no interior. As fotografias pelas quais ele se pela e as palavras banais de José Mário Silva sobre as palavras banais de Valter Hugo Mãe confirmam porque é que eu não consigo deixar-me seduzir, mas nem um bocadinho, por ele. 



E é quando vejo coisas destas, destaques incompreensíveis como este, que me aborreço com o Expresso. Claro que há que ir atrás do que vende mas, ó caraças, é preciso exagerar desta maneira?

Como é que se justifica que uma escrita como a do Valter Hugo Mãe justifique um tal desfiar de palavreado como aquele com que o José Mário Silva enche 4 páginas inteiras?


Já no outro dia a Revista Ler lhe deu idêntico destaque: páginas e páginas de fotografias com palavras a acompanhar. A Islândia deve ser um país bonito pelo que qualquer um que lhe aponte a câmara deve obter imagens bonitas. 


As que eu vi, na Ler, não me parecem nada de especial, umas com saturação de cores, outras de tipo postal ilustrado. Mas, enfim, é o valter hugo mãe e a revista Ler (por onde anda o mesmo José Mário Silva e outros amigos do mundo editorial) alinha pela mesma bitola: dar holofotes ao jet set da edição lusitana.

Mas, voltando agora ao Expresso e ao big artigo do José Mário Silva sobre o Valtinho: porque é que não vão os dois encher chouriços para outro lado? 

E porque é que o segundo não se fica por dar milho aos pombos (já que gosta tanto de se fazer fotografar no meio deles)?

(As admiradoras dele que me desculpem mas é o que eu penso. E já sabem: eu sei que não sou lá muito normal. Por isso, esta minha relutância em aderir à moda Valter Hugo Mãe é bem capaz de ser defeito meu)

*

Voltei aqui porque fiquei a pensar que na literatura, como na política, como em tudo na vida, a gente vai aceitando o que é menos bom, tolerarando os que gostam de se armar em originais mas não o são, vamos baixando os padroezinhos e, quando damos por ela, estamos cercados de passos coelhos, pinokias, marco antónios, searas, valtinhos e coisas assim.

Temos que subir os nossos padrões de exigência, não aceitar o enaltecimento do que é banal ou menos bom - nisto eu estou como o Gonorreias.




O homem com demasiadas características - Gato Fedorento

*


Permitam que vos recorde: se descerem um pouco mais, poderão ver, por contraste, aquilo que considero ter qualidade: mais um filme de Cine Povero, a voz de Fernando Alves, a poesia de Tonino Guerra, a música de Jordi Savall.

*

E tenham, meus Caros Leitores, um belíssimo domingo!

quarta-feira, setembro 18, 2013

O belo número de Setembro da Revista Ler. (Belo a começar logo na capa: o José Pinho da Ler Devagar valoriza qualquer capa).


No post abaixo falo da minha estranheza, das suspeitas que começam a formar-se na minha cabeça: falo da ministra Maria Luís Albuquerque, a Miss Swaps, e das contradições e factos esquisitos que começam a saber-se acerca dela. E apelo a que alguém vá atrás do seu passado próximo (por exemplo de 2000 e tal para cá) para ver se ficamos a perceber melhor que gente é esta que nos anda a sugar o sangue e o tutano, a arrancar o couro e o cabelo, a destruir o país.

Mas isso é lá em baixo. Aqui a conversa é outra, é da boa.

&

Música, por favor, há temas que pedem música.


Natalie Merchant interpreta The letter




&


Vocês nem imaginam as vezes que eu já tinha ido à procura da Ler de Setembro. Costuma sair tão cedo e este mês, já íamos a meio do mês e nada.

Pois bem, hoje já tinha finalmente chegado e já cá canta. O amigo de estimação da Ana Cristina Leonardo já tinha dito: Mantendo o formato habitual, a revista sofreu uma profunda remodelação gráfica: mais imagem, crónicas ligeiramente mais curtas, janelas de poesia aqui e ali. Tudo muito cool


Ou seja, a Ler tinha sofrido um revamping mas, pela descrição, fiquei com os dois pés atrás. Céptica, devo dizer. E mais curiosa fiquei. Cool? O que seria isso de cool aplicado a uma revista destas?

Pois bem. Só posso dizer-vos que a primeira impressão é óptima. Ainda tem o cheiro da tinta e está uma maravilha. A abrir logo uma poesia de João Vário, daquela colecção de poesia dirigida por Pedro Mexia para a Tinta da China da qual faz parte o livro da Rosa Oliveira, o Cinza, que é também muito bom. Como amuse bouche não poderia ser melhor. Uma página inteira, uma letra grande que impressiona. Fiquei logo agarrada.


Aliás, toda a paginação, todo o grafismo, a poesia aqui e ali, as cores, a dimensão das fotografias, a leitura mais fácil - tudo muito bom. Se me permitem continuar na onda do Eduardo Pitta e usar uma palavra muito usada pela gente da imagem e da comunicação, diria que está clean.

Como sabem eu sou toda dos sentidos (ou seja, em primeiro lugar, um animal - e dos primitivos - e, só depois, entra em cena o meu lado racional). A minha primeira impressão começa logo no toque, na imagem, no cheiro. E só não incluo aqui a audição e o sabor porque, enfim, não sou tão maluca que me ponha a lamber os livros e as revistas ou a ouvir vozes. Adiante.


José Pinho, Ler Devagar

Apeteceu-me fazer acompanhar o José Pinho
por algumas das minhas pulseiras
(tenho destas coisas incompreensíveis)
Também não sei se não fiquei tão bem impressionada por ter a olhar para mim um senhor tão bonito, com um olhar tão penetrante, ainda por cima rodeado por livros, ainda por cima sabendo eu que é o pai da Ler Devagar. Está aqui mesmo ao meu lado, com um meio sorriso, olhar fixo em mim.

Digo isto e fico a pensar: ao dizer uma coisa destas estou a demonstrar o quê? Auto-estima ou presunção? Pois não sei (nem isso me importa). Sei é que ele não tira os olhos de mim. Essa é que é essa.

Mas tem ar de ser malandreco, é bem capaz de fazer isto com qualquer uma. E qualquer um.

Vocês experimentem pousar a revista na mesa ao lado do computador e vejam se não ficam com a mesma sensação.

Seja como for, ainda apenas li a entrevista que a Ana Sousa Dias lhe fez em diagonal, enquanto estava na fila ao regressar ao fim do dia. Felizmente estava uma bicha do catano, demorei séculos a chegar a casa, a luz cada vez mais frouxa, e deu para me deliciar a folhear a revista, a ler algumas coisas. Por exemplo, estou cheia de vontade de ir a Óbidos ver as livrarias dele, do dito José Pinho. 


Que vida tão boa deve ser a dele. Que feliz que ele deve ser. Ralações, maçadas, limpar o pó dos livros, arrumar as prateleiras, tentar descobrir livros tresmalhados, e despesas e tudo isso mas, Deus meu, quem já esteve na Ler Devagar sabe como aquilo é outro mundo, um mundo absolutamente maravilhoso. Uma coisa que parece um sonho.


Adiante.




Li também a crónica do Pedro Mexia sobre o seu encontro com um homem invisível, o Herberto Helder - a sua antítese em termos de exposição mediática (enquanto o primeiro aparece em todo o lado, apresentação de livros, debates, moderações, Governo Sombra, escrita na Ler e no Expresso e o escambau, o segundo é bicho raro, pouco sai da toca ou, se sai, não anda por onde possa ser objecto de atenção jornalística).



Pessoalmente, no que aos escritores diz respeito, prefiro o seu anonimato mediático (digamos assim), o serem incógnitos perante os seus leitores. Os escritores deveriam ser invisíveis, transparentes, andar no meio de nós e a gente não os ver, ou viverem escondidos no fim do mundo e a gente ter uma curiosidade danada, sem saber se é homem, mulher, novo, velho, feio, bonito. É que não interessa nada disso, interessa é que os seus sentimentos e pensamentos saiam destilados em belas palavras.

Um destes dias vi o Gonçalo M. Tavares. Nunca consegui ler um livro dele, coisa insólita demais para o meu estado de evolução na espécie. No meio das coisas estranhas que escreve, aparecem frases com uma certa piada mas, no conjunto, tenho mais que fazer que tentar perceber o sentido daquilo, já que beleza não é por aí além. A escrita dele não me transporta e eu não tenho energia anímica para ter que ser eu a andar a arrastá-la de página em página. Mas, então, lá estava ele, um sujeito quase normal mas com algumas diferenças. Vi-o e achei que o que ele escrevia estava bem para ele. Não é boa coisa a gente poder tirar a prova dos noves. Mais vale permanecer na ignorância.

Adiante.

Amanhã vou levar a Ler e esperar que, no regresso, esteja outra vez um trânsito infernal, mas daqueles mesmo parado para eu poder ler devagar. Não há nada melhor que a gente ler devagar (grande nome para uma livraria.

... E cá continua ele com os seus belos olhos verdes a ver se me impressiona. Ora esta.

Vou-me mas é deitar.

*

Se não se importarem de deixar o mundo dos livros para entrarem no perigoso mundo dos embustes, é descerem até ao post seguinte. Mas, se forem, talvez depois seja melhor lavarem as mãos e os olhos que eu não sei se aquilo não faz mal à pele e à mente e não atenta contra a nossa higiene (mental, claro).

*

Resta-me desejar-vos, meus Caros Leitores, uma bela quarta feira.

PS: Não deixem de ver os comentários dos meus posts pois acontece ter por lá links fabulosos que Leitores, a quem muito agradeço, generosamente oferecem.