Imaginemos.
Uma situação muito simples. A cada uma das pessoas que já se me dirigiu por mail, e já foram muitas, eu convidava para se encontrar comigo. Ficariam todas muito admiradas: sou esquiva, bicho do mato. Várias já me convidaram -- para um lançamento de livro, para uma sessão disto e daquilo, para um café, para um jantar, para me oferecer um presente. Tenho um pretexto que é bem real e que me ajuda a não ter que mentir: tenho a vida de tal forma preenchida que não consigo acomodar novas andanças. Mas, mesmo que tivesse o tempo todo por minha conta, haveria de me furtar. Prefiro-me transparente, invisível, intangível. Por isso, cada um dos meus Leitores, recebendo um afável e inesperado convite, estranharia; mas, por simpatia e, presumo, alguma curiosidade, compareceria.
Uma situação muito simples. A cada uma das pessoas que já se me dirigiu por mail, e já foram muitas, eu convidava para se encontrar comigo. Ficariam todas muito admiradas: sou esquiva, bicho do mato. Várias já me convidaram -- para um lançamento de livro, para uma sessão disto e daquilo, para um café, para um jantar, para me oferecer um presente. Tenho um pretexto que é bem real e que me ajuda a não ter que mentir: tenho a vida de tal forma preenchida que não consigo acomodar novas andanças. Mas, mesmo que tivesse o tempo todo por minha conta, haveria de me furtar. Prefiro-me transparente, invisível, intangível. Por isso, cada um dos meus Leitores, recebendo um afável e inesperado convite, estranharia; mas, por simpatia e, presumo, alguma curiosidade, compareceria.
Ou outra possibilidade.
Inscrevia-me no Tinder (e quem vos garante que já por lá não ando a cirandar?) e, toda faceira e galante, desenvolvia um saboroso jogo de sedução online. E, ao longo de uns tempos, ia marcando um encontro com cada um dos meus interlocutores. Poderia ser numa clareira de um parque ou num jardim. Imaginemos, talvez, o coreto de um Jardim.
Inscrevia-me no Tinder (e quem vos garante que já por lá não ando a cirandar?) e, toda faceira e galante, desenvolvia um saboroso jogo de sedução online. E, ao longo de uns tempos, ia marcando um encontro com cada um dos meus interlocutores. Poderia ser numa clareira de um parque ou num jardim. Imaginemos, talvez, o coreto de um Jardim.
Em qualquer dos casos marcaria, com cada um, o mesmo dia, a mesma hora, o mesmo local. Cada um pensaria que o encontro seria apenas entre nós dois (ou duas) mas, uma vez lá chegados, constatariam que, à volta do coreto, se reunia um grande grupo de pessoas. Mas os jardins são públicos. Não desconfiariam que todos ali estavam ao mesmo.
Seria. Seria eu, sim.
Não exactamente igual à mulher que escolhi para ilustrar o post mas eu. Eu tal como sou.
Sorridente, cumprimentaria o belo grupo que rodearia o coreto. Diria nomes, todos os nomes de Leitores de que me lembrasse. Veria os sorrisos. Agradeceria a presença e, gaiatamente, desculpar-me-ia pela maldade de os não ter avisado do que se iria passar.
E diria: Sim, vamos ter um encontro a dois. Mas primeiro tenho que escolher com quem vai ser. Ganha o que merecer.
Olhariam uns para os outros, uns desanimados, outros intrigados, quase todos sorrindo.
E, então, provocadoramente, eu perguntaria: Há aqui alguém que tenha apoiado o Passos Coelho?
Silêncio. Numa altura destas quem é que confessa tal simpatia em público? Agora, parece que nunca ninguém apoiou tal alimária. Teria que insistir: Se há alguém, agradeço que ponha a mão no ar.
A medo, uns quantos, poucos, levantariam o braço. E, aí, eu diria: Muito bem. É de louvar a sinceridade. Mas façam o favor de se retirarem. O láparo e eu somos imiscíveis. E, com ar falsamente zangado, ordenaria: Andor.
Os outros desatariam a gritar em uníssono: 'Andor! Andor!' e os laranjas enrustidos não teriam como lá ficar. Rabo entre as pernas, entre apupos de rejeição, era vê-los a zarpar de fininho.
A seguir perguntaria: Há aqui alguém que tenha tido um desgosto de amor por ter sido abandonado? Silêncio. Gente a olhar em volta. Eu insistiria: Quem já foi abandonado faça o favor de levantar o braço.
E, então, hesitantemente, alguns levantavam a mão. Podem também sair, diria eu, Confio na opinião de quem vos abandonou. E esses, uns homens, outros mulheres, abandonariam o local, acabrunhados, duas vezes rejeitados.
Muito bem, estamos no bom caminho. Nada como uma boa depuração. Continuemos: há aqui alguém que durma de pijama?, seria a minha pergunta seguinte e, uma vez mais, temendo o veredicto, ninguém se acusaria. Eu insistiria: Já o disse e, do que me conhecem, sabem-no bem: sinceridade e coragem são fundamentais. Quem dorme de pijama que dê um passo em frente porque, obviamente, não tem aqui cabimento.
Com alguma timidez, alguns homens e algumas mulheres, dá-lo-iam e, claro, imediatamente foram instados a abandonar o espaço.

E continuaria: Fumadores. Não gosto do hálito do tabaco. Incomoda-me. Lamento. Pode ser boa gente mas sou sensível a cheiros; e cheiro a boca velha e requentada não dá. Podem ir. E uns quantos catarrentos tiraram o maço de tabaco do bolso e afastar-se-iam-se a fumar e a praguejar.

Está quase. Está quase a encontrar-se a pessoa que vai sair comigo, um encontro memorável, juro. Mas agora afastem-se todos os que tenham mais do que uma tatuagem ou em que a tatuagem seja indiscreta ou de mau gosto.
Lá de baixo, ouvir-se-ia um desafio: 'Ai é? E quem é que vai avaliar?'
E eu esclareceria: Nos casos em que não há capacidade de auto-avaliação, eu. Quem tiver dúvidas, mostre-as. Se necessário, dispa-se. E, após uns instantes, conformados, saíriam mais uns quantos.
Passemos a coisas sérias: quem estiver aqui para um simples engate, para tirar umas casquinha ou para se armar em esperto, fora daqui. Só me interessa gente séria e bem intencionada. Mas quem estiver para um noivado a sério, também fora daqui. Só de pensar que há quem diga noivo ou noiva ou esposo ou esposa fico incomodada. E mais uns quantos, quase os últimos, afastar-se-iam, sorrindo como se tivessem ganho alguma medalha que só eles viam mas, no fundo, intrigados com a verdadeira razão pela qual estavam a ser afastados.
Sobram três pessoas: uma mulher e dois homens. Está difícil. Vou ter que usar critérios um pouco exigentes, quiçá, até, injustos. Mas é a vida. Um dia bem passado comigo requer que me digam poesia. Se algum dos três não souber um poema de cor, terá que perceber que deve afastar-se. A mulher afastar-se-ia, piscando-me o olho. Percebê-la-ia e retribuíria.
Ficariam dois homens. Idades aproximadas, fisicamente não muito díspares, rostos agradáveis. Então eu diria: Podia ficar com os dois. Não seria mal visto. Mas, para já, como não vos conheço bem, prefiro não arriscar. Mostrem-me as vossas mãos. Umas seriam mais a meu gosto. Desceria e dirigir-me-ia a esse. Olhá-lo-ia nos olhos. Diria o seu nome. Ele confirmaria e diria: 'Reconheceu-me'. Eu abraçá-lo-ia. Depois dar-lhe-ia a mão e afastar-nos-íamos os dois.
As câmaras tudo teriam filmado.
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E isto foi, mais coisa, menos coisa, o que fez Natasha Aponte no outro dia, em Nova Iorque. Marcou encontros com 'amigos' do Tinder e pregou-lhes uma partida deste género. Ainda não são claras as motivações: a realização de um vídeo, uma campanha, publicidade.
Seja para o que for, acho delicioso e mal posso esperar por aprontar uma destas. Vale? Alinham?
Seja para o que for, acho delicioso e mal posso esperar por aprontar uma destas. Vale? Alinham?
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Uma coisa posso eu, desde já, prometer: o programa não incluiria um almoço perto do céu como estes que abaixo partilho convosco.