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sexta-feira, março 25, 2022

Como falar de jade-rollers e outras futilidades sem que sintamos que estamos a interiorizar a banalidade do mal?

 



O dia foi longo. Quando acabámos de jantar passava das onze da noite. Estou cansada e com sono e o que me vale enquanto escrevo é que, enquanto escrevo com a direita, massajo o rosto com o jade-roller que, na terça-feira à hora de almoço, comprei no Ale-Hop. É um objecto bonito, com umas translúcidas pedras cor de rosa suportadas por metal acobreado. Quando lhe pego, as pedras estão frias e a sensação da pedra macia e fria a rolar no rosto é bastante agradável. Nunca apliquei botox ou fiz lifting ou o que quer que seja. Por vezes, o YouTube, sabendo as saudades que, por vezes, sinto das revistas que via quando ia ao cabeleireiro, propõe-me tutoriais de moda ou de rotinas de beleza. Vejo com alguma curiosidade pois são apresentados como coisas simples, quase como apenas lavar a cara com água e sabão azul e branco e, afinal, são todo um processo. Põem produtos em cima de produtos e, se as mulheres começam com um aspecto normalíssimo, com algumas imperfeições, até com olhos pequenos e lábios secos, acabam com menos anos, sem rugas, sem olheiras, olhos grandes e lábios carnudos. E eu vejo aquilo e sinto-me uma descuidada. Lavo a cara, coloco um hidratante, uma leve sombra nas pálpebras superiores e está feito. Se tenho reunião, ainda ponho um pinkezito nos lábios mas, tirando isso, nem creme para isto, creme para aquilo, anti-olheiras, base, pó, iluminador, máscara, preenchimento de sobrancelhas, etc. Mas agora, com este instrumento, tenho esperança que produza o mesmo efeito que tudo o que não uso. E, se não produzir, paciência, pelo menos mantem-me acordada enquanto o uso.

Estou agora a ver as notícias. Hoje uma pessoa dizia-me que já não conseguia ver notícias pois já andava a sentir-se deprimido, não suportando a impotência perante o grau de violência de Putin e o sofrimento dos ucranianos. A minha mãe diz-me a mesma coisa, que já não quer ver notícias, diz que, sempre que vê o que está a passar-se, fica incomodada, não se sente bem. Ouço isto e receio que isto venha a acontecer comigo, com toda a gente: cansarmo-nos de ver tanta violência, alhearmo-nos da destruição e do sofrimento dos que estão a ser tão vilmente atacados, deixarmos que o criminoso aniquile um país. Quando o mal é assimilado como uma coisa normal é a morte que se metastiza na nossa vida. 

A minha mãe de vez em quando fala de quando era miúda e havia guerra e havia falta de tudo. Ouvia-a falando disso como se se tratasse de uma realidade remota, irrepetível, coisa de outros tempos. Na nossa Europa, agora estável, as fronteiras sagradas, ter havido uma coisa tão medonha  quase parecia coisa de há mil séculos. Quando mais recentemente tantas guerras têm acontecido, embora qualquer guerra seja sempre um buraco negro por onde a vida é sugada, parece que, mesmo que involuntariamente, a minha mente parece que colocava um qualquer filtro que me impedia de as encarar com excessivo realismo. Na minha mente era como se fossem conflitos ancestrais, lutas irracionais por fronteiras, casos de loucura exacerbada como os que levam algumas pessoas a matarem-se por uns centímetros nas extremas de um terreno, povos habituados à violência, civilizações para quem a vida não tem assim tanto valor, alguns arriscam-na para conquistar o paraíso e para irem fazer companhia a bandos de virgens, lugares onde as religiões andam com armas à cintura. Na minha cabeça, alguns eram lugares relativamente longínquos, de instabilidade e sofrimento, quase sem salvação possível, um triste escoadouro de armamento e munições que mantinham florescente a indústria das armas. Mas, de repente, quando estávamos ainda a digerir a nossa fragilidade perante um vírus, acontece uma coisa destas, aqui perto, uma coisa feroz, desalmada, desumana, numa era em que todos queremos paz e amor -- e tudo parece inconcebível, imperdoável e, sobretudo, muito triste.

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Mas se me compadeço e me solidarizo com os ucranianos, vítimas de uma chacina, tenho que repetir o que já no outro dia referi: tenho também muita pena dos pobres soldados russos que não passam de carne para canhão ao serviço de um louco. Não se sentem motivados para esta guerra, sofrem o frio, a fome e, tantos, o abandono e o medo. E, pelo que se vai sabendo, tirando a força bruta dos bombardeamentos que arrasam habitações, escolas, hospitais, teatros, gente indefesa, o resto demonstra desgoverno e, até, alguma desactualização tecnológica. Ouço falar em corrupção como envolvente do que parece ser um descalabro militar. Mas seja ou não seja, que preço estão estes jovens a pagar? Tal como no outro dia aqui falei, quantos destes rapazes se tornam corpos que ninguém vem resgatar...?

O vídeo abaixo é impressionante e elucidativo. Já tinha visto vídeos com comunicações russas interceptadas mas não os tinha aqui referido pois não sabia se era informação fidedigna. Parecia-me quase impossível. Mas este vídeo é do The New York Times e tudo foi checkado, inclusivamente duplamente checkado, confrontando imagens com o que as informações que militares russos trocavam entre si. Chega a ser desconcertante. Mas é, sobretudo, muito triste. Se os ucranianos lutam com unhas e dentes e anima-os a força de defenderem o seu país, estes pobres soldados estão também a passar por horrores sem saberem porquê e, pelo que se percebe, sentindo-se desprotegidos, desapoiados.

Russia Struggled to Capture a Ukrainian Town. Intercepted Radio Messages Show Why

The Times’s Visual Investigations team analyzed dozens of battlefield radio transmissions between Russian forces during an initial invasion of the town of Makariv, outside Kyiv. They reveal an army struggling with logistical problems and communication failures.


Россия пыталась захватить украинский город. Перехваченные радиосообщения показывают, почему

Группа визуальных расследований The Times проанализировала десятки радиопередач с поля боя между российскими войсками во время первоначального вторжения в город Макаров под Киевом. Они показывают армию, борющуюся с проблемами логистики и сбоями связи.

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Pinturas de Kandinsky ao som de Scriabin -- Poeme Op 32 No 1 na interpretação de Horowitz

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Dias felizes.
Espero que o mundo trave Putin. Sobretudo, espero que os russos travem Putin.
Saúde, paz e amor.

domingo, setembro 05, 2021

Uma vez que a sexualidade do Paulo Rangel não é tema que me assista, deixo que sejam o Marcelo e o Balsemão a levá-lo ao colo e ocupo-me cá das minhas coisinhas

 



Os dias têm sido preenchidos, animados, atarefados, uma festa, uma alegria. No fim do dia, quando uns se foram e outros recolhem aos aposentos, encontramos meias espalhadas pela casa, os quadros da parede por cima deste sofá tortos, o tapete da sala todo enrolado, o comando da televisão levou sumiço, há copos vazios um pouco por todo o lado. 

Há bocado, ao contar mais um episódio da história da Margaret ('um clássico'), o mano do meio dava cambalhotas para a frente e para trás como se estivesse fresco, acabado de acordar. O mais pequeno intervinha na história como se fosse um personagem. Aliás, os três interromperam-me mil vezes para esclarecer aspectos ou para acrescentar pormenores. Eu a querer que se calassem a ver se lhes dava o sono e eles só a falarem. Sento-me na cama do mais novo. Os dois rapazes dormem no mesmo quarto. Ela vem do seu quarto para se sentar nas almofadas do chão. E o do meio, fica na cama dele às cambalhotas. Para ver se o mais pequeno se cala, faço-lhe festas na cabeça. Às tantas, quando estava a falar do Kikas, o cão traquinas, grita-me ele: 'Eih! Não sou nenhum cão!!!'. E eu, admirada: 'Claro que não. Porque é que dizes isso?'. E ele: 'Estavas a fazer-me festas como se eu fosse um cão!' E eu: 'Que ideia, não estava nada'. E ele: 'Estavas, estavas'. Entretanto, no meio das cambalhotas, o do meio soltou um grande arroto. E logo de seguida: 'Desculpa, avó, sei que isto não se faz. Foi só para sentir o sabor da comida do jantar'. Isto às escuras, eu a inventar a história da Margaret na festa do Avante, já depois de ter inventado a Margaret no cinema. Hesito entre zangar-me, conter a vontade de me rir, desesperar por não lhes dar o sono. A irmã, perante estes desmandos, limita-se a dizer com voz de desdém: 'Porco'.

De manhã tinham estado a brincar às empresas e, de tarde, com os primos, a brincadeira retomou. Pasmo com o que dizem, com a agilidade e oportunidade dos seus raciocínios. E zangam-se e discutem perante situações que forjam mas que, depois, discutem como se fossem reais. Uma das vezes que fui lá, estava o mais crescido em acesa discussão com o irmão porque este tinha vendido 200.000 máscaras sem as ter. E dizia que tinha que se ver como se resolvia isso, se era anulando a venda e compensando as pessoas, porque não queria danos na imagem da empresa ou redução do seu share value. Não garanto que tenha sido share value que ele disse mas que falou em share, falou. O irmão discutia, não aceitava, queria vender na mesma. Sugeri que renegociassem, que faseassem as entregas. Entusiasmados, aceitaram a sugestão. Passado um bocado já estavam outra vez desencontrados. A fábrica das máscaras tinha fechado e o mais novo queria contratar os trabalhadores da fábrica e pô-los a fazer as máscaras. O mais velho dizia que uma empresa que vende máscaras, como uma farmácia, não é a mesma empresa que produz os artigos que vende.

E, em catadupa, iam surgindo questões concretas, que poderiam ser reais. 

De manhã, no meio da conversa, ela dizia: 'Esperem lá. Que barulho foi este?!'. Tão realista foi que caí. 'Que barulho? Não ouvi nada?'. Ela fez-me um gesto que não levasse a sério, que fazia parte da encenação'. Foi espreitar e informou: 'Foi um carro que se despistou e veio bater no prédio'. Nesta altura o avô apareceu e logo o do meio correu para o agarrar, que tinha que chamar a polícia. Perguntei: 'Mas então o que é isso agora?'. E logo ele: 'Está bêbedo, andava aí de carro a bater nos prédios, é caso de polícia, vai ter que prestar serviço comunitário'. O avô perplexo sem perceber o que estava a acontecer.

Por vezes tenho vontade de andar de roda deles a fazer filmes com as suas brincadeiras e conversas. Mas geralmente tenho o jantar ou outra coisa para fazer e não consigo andar apenas entregue ao lúdico do momento. 

Ao jantar, conversavam sobre quem tinha nascido primeiro, uns ainda se lembravam do dia do nascimento de outros. E falavam das primeiras palavras que tinham dito. Estavam os cinco sentados na mesa redonda. Não precisam de qualquer apoio. A gente serve-os e eles limpam os pratos. Alguns repetem, outros perguntam o que há a seguir. E, pelo meio, conversam em contínuo. E as conversas deveriam mesmo ser gravadas. A graça que é ter o mais crescido, o que fez agora treze anos e que já está a ficar com a voz grossa, a conversar e a explicar tudo ao que fez quatro. Talvez seja porque todos lhe explicam tudo que o mais novo sabe as coisas mais incríveis. Hoje, na brincadeira, fazia de conta que recebia uma chamada. Depois anunciava: 'Boas e más'. O irmão disse-lhe: 'Mas tens que dizer quais são as boas e quais as más'. E ele, acto contínuo: 'As más é que o prédio tem que ser demolido com as pessoas lá dentro. As boas é que sobrevivemos durante um dia'. Provavelmente isto na sequência da irmã ter anunciado que um carro se tinha despistado de encontro ao prédio. E a brincadeira continuou. E eu fico estupefacta, incrédula.

Depois de jantar, aqui na sala, enquanto os rapazes jogavam um jogo na play station e o mais novo tirava fotografias e fazia avarias, ela pintava as unhas à tia e a mim, pedia-me massagens, pedia-me penteados. E a tia via fotografias de quando eu e o pai nos casámos, fotografias de quando ela era pequena, fotografias das festinhas de anos, dela ou do irmão, a família reunida, tios e primos, amigos, a casa cheia. E os meus pais, os meus sogros, os meus tios, os meus avós. Eu com vinte e poucos anos, quase uma outra. E, no entanto, memórias tão próximas. Olho as fotografias e tenho presentes as situações. Chego a sentir na pele o tecido dos vestidos que, naquele momento, usava. 

E pronto, estou com sono e daqui a nada os passarinhos levantam-se, começa o chilreio. A ver se amanhã ou depois respondo aos comentários. Hoje já não dá. 

Em tempos normais teria comentado a entrevista e os destaques que toda a comunicação social dá à entrevista na qual a homossexualidade do Rangel, há muito conhecida, foi por ele publicamente assumida Mas agora não tenho vontade de dizer nada. O Marcelo anda impaciente com a totozice do Rio e os outros do PSD também. Têm que arranjar alguém. E não estão a conseguir. A laranja secou. Sobra o Rangel mas tinha que ser reciclado. Aqueles vídeos, aquelas coisas que se diziam. Portanto, com o Balsemão a ver se fabrica um sucessor, com a ajuda do Marcelo a ver se cria um facto político com a possível saída do Costa, a SIC começa a preparar o caminho ao Rangel. Pode ser que pegue. Nada como pôr o Daniel Oliveira a perguntar o que dizem os seus olhos a ver se deles brota a célebre lagriminha para a malta começar a aderir.

Mas eu, quanto a tudo isto, não tenho nada a dizer. Não é a minha praia, como sói dizer-se.

Portanto, com vossa licença, fico-me mesmo por aqui.

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Pinturas de Wassily Kandinsky enquanto Roo Panes interpreta There's A Place

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Desejo-vos um belo dia de domingo

sexta-feira, janeiro 29, 2021

Árvores, cores, música, supermercado, telefonemas
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Hoje é daqueles dias que não dão para explicar. Passa da uma da manhã e agora é que estou a começar a escrever. Em cima do costume resolvemos fazer uma coisa sobre a qual estávamos em dúvida e o que era mesmo om é que os meus filhos não lessem este post. É que andam a insistir para não nos metermos em supermercados, que não saiamos de casa, que não é boa altura para apanharmos covid. E se o sei bem. De tarde, uma das reuniões deixou-me esmagada.

Ambos insistem que nos habituemos às compras online. O meu filho enviou-me um link para uma cesta biológica entregue em casa. Mas não corresponde ao que preciso. Queria bananas, coisas para a sopa, por via das dúvidas ou 3 ou 4 cebolas grandes, por via das dúvidas para aí um quilo de batatas, por via das dúvidas uns quantos tomates, uma embalagem de alface, uma pizza congelada, toalhitas anti-transferência de cores. Urgente, urgente eram as bananas e as coisas para a sopa. Ora não vou fazer uma encomenda online para umas coisecas destas. Não passamos sem uma banana cada um, por dia, nem sem uma sopinha de legumes. E imagina que, durante a semana, ao fazer um peixe cozido ou uma coisa assim me falta uma cebola ou umas batatas. Há coisas imprescindíveis. Carnes, peixes, produtos de limpeza isso tenho que chega e sobra. Então pensámos, caraças, com uma máscara bem posta, estando lá pouco tempo, com distanciamento, caraças, não haveremos de ser apanhados na curva. 

E fomos. 

Aproveitei para trazer umas saquetas de frutos secos, uma embalagem de granola (ofereceram-me no natal e fiquei viciada), uma embalagem com quatro 'deliciosos pastéis de nata' porque volta e meia sentimos a falta de uma coisa doce. E pãezinhos. Há lá uns pães mesmo bons.

Quando estava de luvas a preparar-me para retirar o pão, vi um homem com a máscara no pescoço a fazer o mesmo que eu. Fiquei passada. Disse-lhe: 'Desculpe, importa-se de pôr a máscara?!'. O homem ficou assarapantado, apanhado em falso, até corou, e desculpou-se: 'Para me dobrar, puxei-a para baixo e depois esqueci-me...'. Vejam bem... E, por acaso, acredito nele. Às vezes quando quero ler qualquer coisa, dá-me vontade tirar a máscara. Como se a máscara atrapalhasse a visão... Mas acontece-me. Por isso, até acredito que, para se baixar para tirar as luvas e os pacotes de papel, tenha tirado a máscara. De qualquer forma, pensei que há coisas do além. Com o país a atravessar o maior drama de que há memória ainda há pessoas que não interiorizaram a imprescindibilidade de usar máscaras, bem postas, especialmente em espaços fechados. 

Mas, com isto, depois com o protocolo de lavar e arrumar, fiquei com o fim da tarde estragado. 

Quando estava lá, no supermercado, uma chamada de amigo com quem não falava quase há um mês. Não atendi para atender com tempo em casa. Por isso, depois de lavar e arrumar, as mãos bem lavadas e etc, foi o telefonema. Quarenta e sete minutos. Conversa boa, daquelas conversas que fluem, contamos coisas um ao outro, falamos da família, de amigos comuns, rimo-nos, gargalhamos. 

Enquanto falava com ele, uma outra chamada. Um colega. Liguei depois. Um problema para resolver e nós sem sabermos como. Hipóteses, cenários, nada concretizável, um puzzle que não conseguimos fechar. As restrições são muitas, as circunstâncias não podiam ser mais adversas. Trinta e cinco minutos. Pensei que o que me valia era que tinha ainda arroz de corvina de ontem. Com uma salada, estava o jantar pronto. A seguir, telefonema com a minha mãe. Está sozinha, precisa de conversar. Uma chatice, este confinamento. Faz-lhe falta poder ir às compras, ir ver as lojas onde gosta de ir, a das lãs, por exemplo, encontrar amigas e conhecidos. Queixa-se muito deste confinamento. Como a percebo. Conta-me coisas e eu conto-lhe a ela... e trinta e quatro minutos. Depois foi a minha filha, o dia inteiro debaixo de fogo, cansada. Os miúdos em casa e ela cheia, cheia de trabalho. Estavam os miúdos a fazer o jantar sob sua supervisão. Disse-lhe até amanhã, beijocas, tinha que ajudá-los... e treze minutos. Ontem fiz uma videoconferência com os dela. Na véspera com os do meu filho. Meus amores mais lindos, mais queridos. Não gosto desta treta de meetings com os meus amores. Nada se compara a cozinhar para eles, a abraçá-los, a vê-los a rirem e a brincarem uns com os outros.

O meu marido, entretanto, já indisposto, que já era tarde de mais, que telefonemas longos a estas horas não são boa ideia. E era tarde mesmo. Tarde, tarde. O meu filho ligou depois e foi um telefonema curto, seis minutos. 

E, ao ligar o computador, um mail com documento importante para rever. Documento longo, alterações que tinham que ser bem analisados. Depois outra coisa. Estamos a entrar nos aquários e um deles é um aquariozinho que tem que receber um presente. Estive, então, a escolher. Mais tempo para isso. E tinha que pagar uma coisa e mais tempo para isso. 

E com tudo isto agora já passa das duas e ainda aqui estou a escolher imagens, desta vez apeteceram-me as árvores de Gustav Klimt. Depois a música. Não tinha ideia precisa. Foi ir ouvindo até gostar. Josef Salvat a interpretar First Time. E o tempo passa, passa. Daqui a nada, estou a pé a tomar o pequeno-almo. O tempo corre, corre. 

Queixava-me disso ao meu amigo. Disse-me: A quem o diz... Tenho ido trabalhar para conseguir tomar conta do tempo. Em casa é o tempo que toma conta de mim.

E é verdade, não fora esta coisa do confinamento e da necessidade de levarmos isto muito a sério, já começo a acreditar que esta coisa do teletrabalho é muito bonita mas a verdade é que canibaliza o nosso tempo. Há bocado o meu filho perguntava se eu já tinha tratado de uma coisa que ando para tratar há para aí um mês. Tive que lhe dizer que não. Por incrível que possa parecer, é a verdade. A trabalhar em casa, fico sem tempo para tratar do que quer que seja pessoal, sem tempo para descansar, para ler. Para nada. Ou estou a tratar das coisas da casa ou a trabalhar. Ridículo.

Portanto: não vi qualquer notícia. Não sei o que por aí vai. Imagino que seja do piorio, uma desgraça em crescendo. Mas não sei. Não posso falar sobre o que quer que seja da actualidade. Não vi o Marcelo, não vi comentadores. Nada. A minha mãe disse-me: está mal encarado, magro. E nem comentámos o que ele disse. Já não é novidade: infelizmente a realidade ultrapassou a ficção e custa falar dela.

O meu momento de descontração aconteceu há pouco ao ver o documentário abaixo. Não vou a museus, não vou a exposições, não vou a concertos, não vou ao cinema. Nem eu nem ninguém, claro. Os meus momentos de abstração e prazer ligado à arte acontecem quando vejo vídeos assim: What does colour sound like? Kandinsky and Music. Se me permitem, partilho convosco.


Desejo-vos uma boa sexta-feira. 
Caraças, já é outra vez sexta-feira... Dá para acreditar...?

sexta-feira, agosto 21, 2020

Estantes, maminhas, marteladas e etc.




Acordei com uma dor numa perna. Tantos esforços tenho feito, tantos pesos tenho carregado, tão abaixo e acima tenho andado, debruçando-me nas caixas, esticando-me para arrumar os livros, alguns em prateleiras bem altas, livros e o demais,  que algum músculo se esticou para além da conta. Em simultâneo o trabalho, as reuniões, os telefonemas, e sempre a correr, sempre a pensar no que falta fazer. E, portanto, o corpo deu de si. Em mim, volta e meia, o muito esforço manifesta-se assim. Posso carregar caixas como um estivador que até eu fico espantada com a minha força, posso trabalhar dias a fio, horas a fio, e toda a gente acha de mais e me pede que abrande e eu só percebo que estou cansada quando aqui, à noite, caio instantaneamente a dormir. A energia e a resistência física não me faltam. Mas a ligação dos músculos aos ossos não deve ser das mais famosas. Acho que é aí, em cima, na zona de uma das virilhas, que me dói. Já tomei um ben-u-ron pois fomos ver se comprávamos candeeiros (e uma broca e buchas e extensões) e fiz mais uma máquina e tive uma reunião complicada e fomos ao supermercado. E, como estava com aquela dor e toda coxa, não tive outro remédio senão tomar um comprimido. Mas não arrumei livros nem deu para me esforçar muito, seria impossível.

De manhã, o meu filho veio com os meninos buscar as bicicletas para irem pedalar. Depois vieram largá-las e foram à vida deles. Mas estava em reunião nem consegui estar com eles. Ao fim da tarde vieram para fazer o favor de colocar as portas nas sacanas das estantes cor de rato quando foge. Desisti de me meter em trabalhos. Não era isto que eu queria mas a verdade é que, vendo bem as coisas, sendo benevolente e ceguinha, a coisa até é capaz de ficar com uma certa pinta. Uma parede toda em clarinho e outra, em perpendicular, toda em platinado foncé. Quando lá tiver os livros dentro logo faço a minha avaliação final. Como não gosto de me martirizar, quando acho que não vale a pena o desgosto, marimbo-me para as reticências e faço por descobrir vantagens. Na volta é a isto que se chama optimismo. 

A minha menininha mais linda queria ir trabalhar, ajudar-me, queria arrumar livros. Como eu estava impossibilitada, tal a dor, fomos sentar-nos na chaise longue que fica entalada entre a dita estante e a janela. Os parapeitos aqui são baixos e, por isso, ficamos a ver a rua, o jardim. Ela encostada à parede, entre a estante e a janela, eu reclinada no encosto. Ali estivemos a conversar. Adora estar cá. Disse-me que já escolheu a cama. Diz que o irmão a seguir fica na outra. A mãe perguntou onde fica o bebé. Ela disse que fica ou com ela e com o mano. Depois acrescentou: tu e o pai dormem no outro quarto. A mãe riu: ah, nós também dormimos cá? Ela sorriu, fez que sim. A mãe respondeu-lhe: 'Não... eu e o pai vamos mas é passar a noite a um hotel...'. Ela disse: 'Está bem'. E sorriu, toda contente. 

O mais pequeno queria ir à viva força para a cave, queria que eu fosse abrir-lhe a porta. Não fui. Expliquei que não havia ninguém para ir com ele. Disse que não fazia mal. Depois disse que podia ir o avô. Expliquei que o avô estava a acabar uma coisa, que tinha mesmo que acabar, não podia falhar. Depois perguntei-lhe: Mas queres ir lá para baixo fazer o quê? Respondeu: Para ir descobrir coisas. De facto, esta casa é uma verdadeira arcazinha do tesouro. Entre os recantos (e o que eu gosto de recantos...) e o que os anteriores donos cá deixaram, há sempre, de facto, coisas para descobrir. De vez em quando, a senhora, quando andava nas suas mudanças, perguntava-me se podia deixar algumas coisas. Eram coisas difíceis de retirar ou transportar, que não lhe serviam na casa nova. Tenho ideia que disse que sim a tudo. Vasos muito grandes, alguns candeeiros, prateleiras, arcas de madeira, uma mesa metálica que pesa toneladas e que, aproveitando os possantes homens das mudanças, veio para debaixo do telheiro. Portanto, de vez em quando, em especial na cave e garagem, vejo coisas que não sei bem para que servem. Por exemplo, uns módulos de gavetinhas. O meu marido perguntava no outro dia: 'Para que é que os gajos quereriam isto?'. Não faço ideia. 'Para guardar facturas, coisas assi...'. O meu marido achou que não: 'Só tu é que ias pensar numa coisa dessas'. Pois bem. Ontem, para minha surpresa, vi que já ocupou um módulo. Buchas, pregos, parafusos. Só o vi usar uma gaveta mas, na volta, vai organizar as suas ferramentas e afins por gavetinhas.

Mas o bebé não sabe disso. Se soubesse, então, ficaria curiosíssimo. Gosta de montar coisas. O pai até lhe ofereceu um martelo a sério. Quando o vejo de martelo em punho fico em pânico, a temer que me destrua a casa. Mas, até ver, ainda não.

O mano do meio é de outro calibre. Estava a ver televisão e, de repente, deixei de vê-lo. Chamei, chamei. Nada. Fui em busca, de divisão em divisão, e nada. Depois vi a luz da casa de banho acesa e pensei, ora, coitado, já não pode ir à casa de banho em paz. Passado um bocado a irmã veio dizer-me: o mano não está na casa de banho: ele é muito esperto, acendeu a luz e fechou a porta para nos enganar. Chamei por ele e ouvi a voz a vir da sala. Perguntei-lhe: 'Onde estavas?' Respondeu-me, com ar lampeiro: 'Estava aqui...'. e eu: 'Não estavas nada. Diz lá.' Detectei-lhe um arzinho de quem queria disfarçar a matreirice. E aí tive um lampejo: 'Não me digas que foste outra vez a procura daquele livro...'. Desmanchou-se: 'Descobri outro também com mulheres nuas...' e fez um ar malandro. Só me ocorreu dizer: 'Não posso crer. És maluco'. Não disse mas pensei: sai ao pai que, era quase bebé e já todo ele se entusiasmava com maminhas. Tudo o entusiasmava: fotografias, estátuas, manequins em montras. Pois quem sai aos seus não degenera e cá está o mano do meio, oito anos acabados de fazer, sempre empolgado com seios femininos.

E depois, uma vez montadas as portas das estantes, lá foi o casal fazer uma corrida e, uma vez regressados, lá se foram os cinco.

E eu fui trabalhar e o meu marido lá continuou. Depois fiz os meus telefonemas. Depois fui fazer o jantar. Jantámos às dez e meia da noite. 

Uma vez aqui chegada ao sofá, ainda circulei pelos jornais a ver se alguma coisa puxava por mim. Pode andar por aí meio mundo às turras, os médicos e o Costa, o Rio e o Albuquerque armados em não sei o quê ou pode o Marcelo andar feito nadador-salvador, pode a imprensa e as redes sociais andarem com o André Populista ao colo ou pode o Chiquinho-bebé andar a brincar aos partidos... que eu, Caro Anónimo, não sei se é das canseiras, se é da falta de pachorra para coisas assim, a verdade é que nada disto me dá pica para escrever sobre.

O que me interessa é seguir o conselho do Amofinado sobre o reencaminhamento do correio, o da Gata Aurélio sobre a forma de fixar quadros sem furar paredes (já cá cantam, já os trouxe do Leroy), a solidariedade do Francisco quanto à corzinha arratada da estante, a empatia da querida Sol Nascente e a todos que, em comentário ou mail, me deixam palavras sempre tão simpáticas e a quem aqui deixo os meus agradecimentos.

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E usei aqui pinturas de Wassily Kandinsky ao som de Max Richter: Never Goodbye.

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Entretanto, adivinhando que ando à volta das minhas estantes, o meu amigo algoritmo tinha estes vídeos aqui abaixo para me sugerir. Não é a primeira vez mas é o género de vídeo que posso ver várias vezes pois descubro sempre alguma palavra nova.

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A estante do Pedro Mexia


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A estante de Clara Ferreira Alves

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A estante de Rui Cardoso Martins


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A estante de Teolinda Gersão


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E uma bela e feliz sexta-feira

sexta-feira, julho 07, 2017

Os roubos anunciados a que ninguém ligou, os muitos pequenos poderes que ensarilham a reacção em situações que exigem intervenção transversal, os portugueses e a sua maneirazinha de ser nestas coisas dos planos de contingência




Conheço por dentro o que é trabalhar numa grande organização onde há várias linhas hierárquicas, muitas forças por vezes com objectivos contraditórios, muito poder disseminado pelas bases, por locais geograficamente dispersos, em que uns respeitam sensibilidades, outros se sentem ligados a fidelidades antigas, em que uns temem que outros pensem que eles os querem ultrapassar ou imiscuir-se no seu foro de competências, etc, etc. Conheço.

Ou seja, conheço por dentro o que é, perante uma situação -- que requereria atenção ou uma condução ágil, em tempo oportuno e com rédea curta --, por mil cuidados, mil temores, mil indefinições, mil urgências a sobreporem-se a trabalhos verdadeiramente importantes, assistirmos a nada ser feito, deixando que aconteça o que nunca deveria acontecer.

Claro que nem sempre isso acontece, nem sempre isso acontece com assuntos críticos, nem sempre é irremediável.

Mas pode acontecer que seja. Ou seja, pode acontecer que estejamos perante um desastre anunciado e, para estupefacção geral, o desastre acabar mesmo por acontecer sem que ninguém o tivesse impedido.


Há nos portugueses esta coisa: medo de ferir susceptibilidades, muita cortesia, muito deixar andar a ver se nada acontece, muito não se meterem em maçadas quando, às tantas, tudo vai correr bem, fiarem-se na virgem e não correrem. E outra coisa: não ter planos de contingência. Esperar que corra bem. Não ter a máquina oleada para situações em que a coisa dá para o torto.

Quando trabalho com alemães constato a diferença abissal. Enquanto os portugueses planificam e ala moço que se faz tarde, bora mas é meter mãos à obra e, se houver azar, cá está a malta para desenrascar, os alemães são um desespero: perdem um tempo do catano a planear tudo ao detalhe, planificando também detalhadamente cada linha de fuga, cada contingência. Tudo tem que ficar percebido, aprendido e procedimentado antes de alguém pôr o pé na tábua. As horas e horas e dias e dias que perdem nisto parece aos portugueses pura perda de tempo mas, no entanto, percebe-se, quando alguma coisa corre mal, que a forma como reagir estava ab initio já prevista.

Vem isto a propósito das notícias que ouvi na rádio: que há uma meia dúzia de anos já aconteceu um outro roubo de armamento, que esse processo ainda está em curso, que há (penso que) um ano aconteceu outro, que parece que desconfiaram de um sargento ligado a uma rede internacional de roubo de armamento, que há pouco tempo houve uma denúncia na PGR de que se preparavam novos roubos e que, pelos vistos, ninguém agiu nem avisou quem deveria ter sido avisado -- e isto parece-me tudo do além. 

Brandos costumes. O cúmulo do deixa andar. Na verdade, uma bandalheira.

Metem-se as Forças Armadas, a Polícia Judiciária Militar, a Procuradoria, os Tribunais, os Ministérios -- e, como sempre em que há muitas instituições envolvidas, cada uma cheia de pruridos e fricotes quando se sente beliscada, sempre que há porcaria verifica-se o mesmo: ensarilham-se todos e nada acontece. Um maná para a gandulagem, especialmente para a bandidagem organizada.


É que uma coisa são situações em grupos económicos em que a indefinição ou a sobreposição de poderes ou a forma coisinha de ser gera perda de clientes, sobrecustos, multas ou outros contratempos e outra, bem diferente, são situações a nível de gestão da coisa pública em que o que está em risco é a segurança das pessoas, a saúde ou a qualidade de vida das populações.


Não é mal de agora, este, não é mal deste Governo. Não. É coisa provinciana, mal endémico, doença antiga. É, na verdade, uma coisa muito portuguesa.

E os exemplos estão por todo o lado. Os processos arrastam-se anos e toda a gente aceita, os paóis são deixados ao deus dará e é uma surpresa para todos os responsáveis que aquilo fosse quase bar aberto (e daqui por pouco tempo já ninguém quer saber disso), e há um incêndio e há um monte de gente a mandar bocas e toda a gente a pedir inquéritos e todos se sentem épicos a exprimirem a sua revolta, muito manifesto no Face e muita força de likes -- mas, com vossa licença, tudo junto nada mais é que tusa do mijo. Meia volta e passou.

É que o mal não é da ordem do fogacho. Não. É profundo, antigo.

E, para o atacar, muita mangueirada tem que haver, muita liderança com o prego a fundo, muito profissionalismo, muito sentido de estado, muita consciência nacional. 

Claro que é complicado mexer neste status quo com governos com mandato para quatro anos, suportados por deputados em que a maioria deles não sabe o que anda a fazer, nem sabe nada de coisa nenhuma.

Só um governo muito hábil, muito sabedor e muito determinado será capaz de perceber a reforma profunda que tem que ser feita. Este governo tem mostrado ser competente e eu só espero que, depois deste valente choque anafilático, António Costa venha inspirado e enérgico para pegar o assunto pelos cornos. Mas tem que haver um grande entendimento entre muita gente e com o total patrocínio do Presidente da República pois tem que se mexer, a fundo, em muitas organizações e tem que se estar disposto a abdicar de muitos pequenos e egoístas pequenos poderes, tem que se aceitar trabalhar em equipa, tem de se aprender uma forma profissional de trabalhar.


A não se fazer nada disso, vou ali e já volto. E não vale a pena andarem a chamar comentadores a granel para os balcões televisivos, fazerem comissões de inquérito com deputados armados em pides de trazer por casa, a TSF pôr-se a organizar Fóruns em que abrem os microfones a tudo a que é ignorante ou besta encartada ou a Fátima Campos Ferreira chamar uns para estarem a favor e outros contra com a malta toda a bater palmas. Não passa por aí. É preciso mais. Muito mais. É preciso seriedade.  


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As imagens são pinturas de Wassily Kandinsky

A música é de Schubert: Marcha Militar

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E um dia bom para todos.

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quinta-feira, maio 14, 2015

Histórias em azul na luz da caridade - Chagall, Kandinsky, Hilda Hilst, Abdullah Ibrahim. E, para terminar, o Grupo Corpo: No es por ti. E ainda um PS sobre este desavergonhado desgoverno.


Depois da loucura alegre, pintada de absurdo e despida a preceito no post abaixo, para equilibrar (porque há quem se encandeie quando vê o destempero estampado no rosto dos outros), eis que entra agora a felicidade em azul-triste dos que um dia pensaram amar-se. Podia vir temperada por saudades, esta felicidade azul, temperada por doces nostalgias, por promessas rasgadas como perfumadas cartas românticas, por lágrimas escondidas, recordações de vozes de veludo, olhares atraentes como doces abismos. Mas não, não vem temperada. Vem nua. Límpida. Livre. Voando sobre o dorso das aves, dançando alegremente sobre os rios, esmagando espelhos, correndo como cavalos azuis nas calçadas luzidias da noite, espalhando sóis e soltando asas feitas de palavras loucas.






Se a tua vida se estender
Mais do que a minha
Lembra-te, meu ódio-amor,
Das cores que vivíamos
Quando o tempo do amor nos envolvia.
Do ouro. Do vermelho das carícias.
Das tintas de um ciúme antigo
Derramado
Sobre o meu corpo suspeito de conquistas.
Do castanho de luz do teu olhar
Sobre o dorso das aves. Daquelas árvores:
Estrias de um verde-cinza que tocávamos.

E folhas da cor de tempestades
Contornando o espaço
De dor e afastamento.

Tempo turquesa e prata
Meu ódio-amor, senhor da minha vida.
Lembra-te de nós. Em azul. Na luz da caridade.



Canção das mãos
que ficaram na minha cabeça.

Eram tuas e pareciam asas.

(...)

O que foi feito
da ternura dos que amaram...

Ficou na minha cabeça,
mas tuas mãos que pareciam asas.
Que pareciam asas.

....
......

[Pausa para que termine a límpida música de Abdullah Ibrahim]

......
....

E agora, em azul: No es por ti




Abdullah Ibrahim: The Song is My Story (e mil vezes obrigada ao Leitor que me tem dado a conhecer música tão maravilhosa)


O tango em azul é dançado pelo Grupo Corpo - "No es por ti" de Ernesto Lecuona, numa interpretação de Zoraida Marrero e com coreografia de Rodrigo Pederneiras.


O primeiro poema e um excerto de outro são de Hilda Hilst (1930 – 2004)


A primeira imagem é Yellow-Red-Blue de Wassily Kandinsky (1866 – 1944)


A segunda é Entre guerre et paix de Marc Chagall (1887 – 1985)


...

Post scriptum


E sobre a politicazinha pequenina e rafeirolas desta coligaçãozeca laporiana e portista que nos desgoverna à grande e à francesa, já não se diz nada aqui pelo Um Jeito Manso

- perguntar-me-ão os Leitores que não são dados a frescuras.


Pois bem, explico.

É verdade, confesso: tenho andado sem vontade de comentar a actuação deste governo miserável. Para mim é já quase como se fosse carta fora do baralho, é uma gente que não tem maneiras, que não sabe quando é chegada a hora de se levantar da mesa, gente que se arrasta mesmo quando a festa já acabou, que aí estão querendo ainda privatizar coisas às três pancadas, gente desqualificada da pior espécie. Aumentaram a dívida, os níveis de desemprego, arrasaram com o investimento, expulsaram do país uma parte importante da população, atentaram contra a esperança e o sossego mental dos que ficaram. Mas, pior que isso, tem sido o manto de lama pantanosa, de miséria moral, de falta de vergonha na cara, de ignorância impudica. Têm trazido a política para o chão mais conspurcado, onde a palavra de nada vale, onde a honra é o que as agências de comunicação quiserem que seja, onde os números significam uma coisa e o contrário. Envergonha-me ser governada por gente desta laia. Por isso, dizer mais o quê? Que já não os posso ver à minha frente? Mas isso já vocês estão carecas de saber, certo? (sem ofensa para os carecas, claro está).

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Relembro que no post já aqui abaixo há do bom e do bonito.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma quinta-feira em grande, feliz e boa, boa, boa.

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quinta-feira, setembro 13, 2012

A palavra aos Leitores de Um Jeito Manso. Um comentário do Leitor J. que merece ser lido com toda a atenção sobre a situação actual de Portugal, sobre alternativas ao actual estado das coisas e sobre um possível novo rumo para o País. Muito interessante.


Com a devida autorização do autor, reproduzo na íntegra e tal como recebi por mail o texto que o Leitor J. me enviou na sequência do meu post de ontem

Penso que a discussão à volta de cenários alternativos, a análise de vantagens e desvantagens, de riscos e oportunidades, é muito proveitosa e esclarecedora. Quanto mais pensarmos e ouvirmos os outros, mais fundamentamos as nossas opiniões. Assim, agradeço, e muito, o texto. Contém matéria útil, interessante e que nos faz pensar e, mais importante, antever o futuro. 

Obrigada, Caro J.





Obrigado pela resposta, mas já agora alguns comentários.

O exemplo dos 100 euros mostra bem a fragilidade de um sistema suportado na alavancagem financeira. A relação entre o dinheiro que circula no sistema financeiro e a riqueza criada é inacreditável e é assustador pensar que é tão frágil, basta “alguém querer o dinheiro de volta” no momento errado para o efeito ser desastroso. Basta haver uma crise no imobiliário, para cada casa hipotecada gerar um buraco financeiro dez vezes superior ao seu próprio valor.

Talvez por isso me custe acreditar na crença que dinheiro existe sempre, desde que haja um investimento em vista que se julgue reprodutor de riqueza. É claro que o Keynesianismo já se provou válido no passado, por exemplo quando suportou a saída da Grande Depressão. Mas a realidade portuguesa não é a americana. Nós não temos um sistema produtivo forte que aproveite o dinheiro para gerar mais dinheiro.

Dos exemplos de investimento citados por UJM refere-se: “Por isso, os primeiros investimentos deverão ser públicos e em áreas que permitam que o dinheiro se distribua pelo território (reabilitar edifícios públicos, reforçar pontes, etc) e que façam com que, atrás desses projectos, nasçam necessidades de outros bens e serviços,”.

E lá está, o investimento possível e referido é sempre na área da construção.

É muito difícil encontrar outras áreas onde o Estado possa investir de forma directa quando se pretende estimular a economia. O Estado não pode comprar acções de indústrias ou empresas de serviços, o Estado não pode exportar, o Estado não pode cultivar terrenos abandonados e o Estado definitivamente não pode empregar mais ninguém. Então sobra o investimento em infraestuturas, que já é a receita desde Cavaco, foi também do Guterres e Barroso, e sem dúvida de Sócrates.

Os argumentos são imbatíveis, o sector da construção é forte em Portugal, gera emprego directo no curto/médio prazo, estimula serviços satélites e no longo prazo ficamos com infraestruturas que promovem o progresso do país.

Mas a realidade recente prova o contrário, e ninguém duvida que a última década, com muito investimento público em infraestruturas foi, na melhor das hipóteses, anémica em crescimento.

Eu conheço o mercado da construção e percebo o porquê disso. O orçamento de uma obra reparte-se em 3 partes: financiamento do empreiteiro, contratação de mão de obra, aquisição de materiais e equipamentos.

Agora explico porque é que este dinheiro não se instalou na economia como se esperava, multiplicando-se à moda de Keynes.

Os empreiteiros cresceram tanto, numa verdadeira crise de superprodução marxista, que tiveram que investir massivamente no estrangeiro. Grande parte das verbas arrecadadas nos últimos anos serviram para deslocar os centros de produção para países em vias de desenvolvimento, com pouco retorno para o nosso país, uma vez que a maior parte dos serviços e equipamentos, na construção, são adquiridos num raio relativamente pequeno. Portanto essa parte do investimento teve muito pouco de vantajoso para a nossa economia.

No que se refere a mão de obra, o funcionamento actual nos empreiteiros é do mais selvático que existe. Subcontratação sob subcontratação até que se chega ao emprego temporário, quando não clandestino. Os empreiteiros, astutos, recusaram-se a engrossaram as fileiras de trabalhadores contratados, e mantiveram na miséria milhares de operários da construção. Claro que as margens dos subcontratantes se mantiveram e enriqueceram muita gente “honesta” que ia buscar a malta ao Campo Grande, à jorna, às 6 da manhã.

Por fim equipamentos e materiais, bem, esses são praticamente todos importados, especialmente quando a obra é financiada pelos dinheiros comunitários. A nossa indústria é fraca, fraquinha.

No longo prazo obviamente que as infraestruturas trazem vantagens. Mas parece-me que as infraestruturas servem para viabilizar o investimento, não são nem podem ser em si um fim. Não são um activo. São um passivo, massivo, que só se justifica se estiver ao serviço das populações e da economia. Não é o caso.

No que refere à industrialização não acredito que uma politica que gere procura seja, de per se, bem sucedida.

A China ou Índia que são exemplos de uma rápida industrialização recorrem a politicas fortemente intervencionistas e proteccionistas. A política económica destes países prevê a protecção ao investimento, o estabelecimento de políticas nacionais de crescimento industrial, etc.

Num exemplo histórico os EUA ou a URSS ou a Alemanha, na Segunda Guerra, recorreram ao investimento público massivo na indústria, para conseguir um forte incremento da capacidade industrial num curto espaço de tempo.

Obviamente que em Portugal, com um economia de mercado social livre, não se pode recorrer a estas ferramentas. Tem de se manter o Estado higienicamente longe do mercado. Então sobra muito pouco. Bem, sobram os dinheiros comunitários em troco de quotas de produção e declarações de intenção, ou súplicas.

Podemos investir em educação e investigação académica. Nunca tivemos tantos licenciados e bolseiros, mas também nunca tivemos tanta emigração qualificada.

Podemos investir em infraestruturas. Nunca tivemos tantas vias, mas também nunca tivemos tanta desertificação do interior.

Podemos ter muitos simplexes, mas nunca tivemos tão pouco ou tão caro financiamento da banca para abrir um negócio.

A meu ver nada irá funcionar que não seja a aposta massiva na instalação de capacidade produtiva no nosso país. Não me refiro à “desvalorização fiscal” da força de trabalho como forma de estimular o crescimento da produção.

Refiro-me à identificação de fileiras industriais que apresentem vantagens competitivas face aos nossos parceiros dentro da EU e lusófonos.

Refiro-me ao investimento directo em indústrias dispostas a modernizar-se de acordo com as orientações centrais e dispostas a contratar licenciados da área tendo em vista a I&D.

Refiro-me ao estabelecimento de uma diplomacia externa “canina” na defesa dos interesses da economia portuguesa (como acontece com a Espanha ou França, ou sem dúvida com os Chineses). Basta visitar um site de uma embaixada Norte Americana em qualquer país do mundo para ver os reports sobre oportunidades de negócio, formas de penetrar no mercado, avisos, etc para perceber como um Estado, até o mais liberal de todos, pode de forma eficiente servir de facilitador.

É preciso estabelecer marcas nacionais de grande escala, organizadas em colectivas de produção, como já acontece com grande sucesso na agricultura.

É preciso premiar quem mantém e investe na força de trabalho e se esforça em procurar novos mercados para escoar a produção.

O Estado tem de disponibilizar Capital de Risco, a fundo perdido, para novos projectos. Uma Autoestrada deve corresponder a milhares de novos projectos. E bastam, sei lá, 5% desses projectos serem bem sucedidos para termos melhores resultados da economia no longo prazo.

Mas acima de tudo o Estado tem de se ver a si próprio como um elemento dinamizador do mercado, absolutamente crucial numa fase destas. Tem de deixar de lado dogmas liberais que já não nos servem. O Estado tem de sair para a rua e perceber as necessidades dos empresários. O Estado tem de erradicar a gestão familiar e mesquinha das indústrias deste país. O Estado tem de por a máquina em movimento.


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A inclusão da imagem é da minha responsabilidade e o autor é Wassily Kandinsky.

quinta-feira, agosto 16, 2012

Do espiritual na arte - a palavra a Wassily Kandinsky (aqui sobre o vermelho e sobre o amarelo)


Um arabesco, por favor


O guitarrista Richard Durrant interpreta o seu arranjo do Arabesco nº1 de Debussy. 
O filme animado é da autoria de Miranda Vincent.


Enquanto me embrenho tentando descobrir quem assassinou selvaticamente o solitário escritor Michel Houllebecq, intercalo com a leitura de um pequeno e fascinante livrinho, Do espiritual na arte, de Wassily Kandinsky, pintor que admiro bastante.

Como já aqui referi inúmeras vezes, gosto muito de pintura abstracta. O que não existe senão quando é produzido por um artista interessa-me muito mais do que uma representação tal e qual da existência tal como a conhecemos.

Ouvir e ler sobre a arte tal como a sentem os artistas que admiro é coisa que me motiva sobremaneira. Por isso, a leitura deste livro quase me emociona. Se vos transcrever aqui algumas partes, muitos dos que me estão agora a ler são capazes de achar que não sou boa da cabeça para me emocionar com coisas assim. Mas é um facto.

Acho que a este livrinho irei voltar frequentemente. Agora deixo-vos aqui apenas um pouco, antes de me ir outra vez deliciar com a sua leitura.



Élan tempéré - última obra de Kandinsky (1944)


Numa composição triste, só a utilização do vermelho introduz o elemento dramático. Com efeito, o vermelho, quando isolado, não causa qualquer tristeza no tranquilo espelho da alma.

Quando aplicado a uma árvore, estamos em presença de um caso totalmente diferente. O tom fundamental do vermelho subsiste tal como nos exemplos precedentes; mas aqui junta-se o valor psíquico do Outono para a alma sensível (já que esta palavra, 'Outono', é, só por si, uma unidade psíquica, como o é qualquer conceito real, abstracto, imaterial ou físico). A cor associa-se intimamente ao objecto, e constitui um elemento que age sozinho, privado do som dramático (...).

Com um cavalo vermelho é outro caso bem distinto. Basta pronunciar estas duas palavras (cavalo vermelho) e somos transportados para outra atmosfera. Um cavalo vermelho não existe na realidade. A sua impossibilidade natural exige um envolvimento igualmente artificial. Sem isso, seria apenas uma curiosidade (cujo efeito superficial nada teria em comum com a arte), um conto de fadas mal interpretado (e, portanto, uma curiosidade que dificilmente passaria por obra de arte)


Pintura de Kandinsky

(...) 

Com efeito, o primeiro movimento do amarelo, a sua tendência para prender o olhar, tendência que, ao forçar a intensidade que lhe é própria, se pode tornar importuna; e o segundo movimento, ao saltar todos os limites, expande força à sua volta, assemelhando-se às qualidades de qualquer força material que se precipita inconscientemente sobre o objecto e se derrama de modo desordenado para todos os lados. Considerado directamente (em qualquer forma geométrica), o amarelo atormenta o homem, espicaça-o e excita-o, impõe-se-lhe como um constrangimento, importuna-o com uma insuportável insolência. Esta propriedade do amarelo, que tende sempre para os tons mais claros, pode atingir uma intensidade insustentável para o olha e para a alma. Assim potenciado, soa como uma trompeta vibrante, que tocasse cada vez mais alto, ou como uma fanfarra ruidosa.

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Partilhemos agora um pouco a opinião de Helen Mirren sobre Kandinsky, junto de Kandinsky.


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Tenham, meus Caros Leitores, um dia cheio de cor.

quinta-feira, março 08, 2012

A felicidade é amor... e $75.000 (segundo a Gallup); e alguns pintores que me fazem feliz (Matisse, Magritte, S. Delaunay, Chagall, Kandinsky, Paula Rego, José de Guimarães) e Sophia que me faz sempre feliz e Bob Marley que diz 'Don't worry, be happy' e os do Dortmund Ballett que são muito boa onda. E Era uma Vez uma Mulher.


O que é a felicidade? Como se atinge?


Música por favor

Don't worry, be happy - Bob Marley


Mercado no Minho - Sonia Delaunay

Li um artigo curioso da autoria de Jennifer Robison, Senior Editor do Gallup Management Journal, que aborda este tema. Por ser um tema que me interessa (ainda há poucos dias aqui o aflorei), apeteceu-me partilhá-lo convosco; transcrevo uma parte em tradução livre (e tomara que estes excertos, apesar dos muitos cortes, façam sentido; é que o artigo é extenso demais para o colocar aqui todo). 
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"A procura da definição de felicidade tem consumido muita energia. Até há pouco tempo, havia pouco a mostrar sobre o assunto – algumas canções, uns quantos poemas, uns postais mimosos – mas nada de utilização prática.

Angus Deaton, economista de renome e Daniel Kahneman um psicólogo galardoado com um Nobel, ambos da Universidade de Princeton, tentaram traduzir a felicidade em dados objectivos. Mais especificamente analisaram as respostas ao Gallup-Healthways Well-Being Index (GHWBI), a um inquérito diário a 1.000 residentes nos EUA sobre o seu bem estar.

Sobre o índice acima referido

Durante mais de 50 anos, os cientistas da Gallup exploraram as exigências relativas a uma vida bem vivida. Mais recentemente, em parceria com reputados economistas, psicólogos e outros aclamados cientistas, a Gallup revelou quais são os elementos universais que transcendem países e culturas e que diferenciam uma vida aliciante de uma passada a sofrer.
  •  Bem estar profissional: se gosta do que faz todos os dias a nível profissional ou ocupacional
  • Bem estar social: se tem relacionamentos fortes e amor na sua vida
  • Bem estar financeiro: se efectivamente gere a sua vida económica
  • Bem estar físico: se tem uma boa saúde e energia suficiente para diariamente fazer as coisas numa base
  • Bem estar em comunidade: se se sente bem integrado no local onde vive

Depois de analisarem mais de 450.000 respostas entre 2008 e 2009, o Dr. Deaton and Dr. Kahneman chegaram à conclusão que a felicidade é o resultado de se atingir a satisfação de dois estados psicológicos – o bem estar emocional e a avaliação que se faz da própria vida.

Pintura de Wassily Kandinsky

Avaliação e Emoção

A avaliação sobre a sua própria vida e o bem estar emocional referem-se a diferentes percepções. 

A avaliação da vida requer uma apreciação sobre a vida ao longo de um grande período, é uma análise retrospectiva. Tem a ver com o atingimento de objectivos, com uma segurança financeira, com uma satisfação emocional.

A investigação mostra que quanto mais convencionais forem os objectivos, melhor as pessoas avaliarão a sua vida. 

As melhores avaliações vêm de pessoas que estudaram, casaram, que têm bons trabalhos.

O bem estar emocional reflecte uma visão de mais curto prazo e refere-se à qualidade emocional da experiência diária de cada um. Se essa experiência é negativa, o bem estar emocional ressente-se imediatamente. “A felicidade emocional é antes de mais social”, diz o Dr. Kahneman. "A melhor coisa que pode acontecer às pessoas é passarem tempo com pessoas de quem gostam. Constatámos que a solidão é uma coisa terrível. O mesmo se passa com a pobreza extrema. Mas a solidão, independemente de quão rico se é, é sempre uma má coisa"

Mas a investigação mostra também que uma pessoa não se torna feliz apenas sociabilizando-se com os melhores amigos e atingindo os objectivos. Também são precisos $75,000 por ano.

Pesca - José de Guimarães

O número mágico: $75,000

Uma das descobertas mais interessantes foi que as pessoas mais felizes têm rendimentos anuais à volta dos 75.000 dólares e isto independentemente das cidades em que vivem e dos respectivos níveis de vida. Mesmo nas cidades mais caras em que os 75.000 dólares anuais valem menos que noutras cidades mais económicas, parece que as pessoas ficam felizes com este rendimento e não é pelo facto de terem rendimentos acima disso que são mais felizes. É como se os 75.000 fossem um tecto acima do qual não há felicidade adicional.

Um aparte: uma coisa que constataram foi que as pessoas mais ricas encontram menos motivo de felicidade nas coisas mais insignificantes (como por exemplo, gostar de chocolate).

The double Secret  - René Magritte

E o stress?

Portanto, pessoas que atingiram os seus objectivos, que passam muito tempo com amigos, que ganham bastante dinheiro, têm a maior satisfação com a sua vida. Os que ganham pelo menos 75.000 dólares por ano têm a maior nível de bem estar emocional Mas isso não significa que não vivam stressados. Os dados revelam que quanto maior a formação académica maiores os níveis de stress. Identicamente maiores níveis de stress aparecem nos grupos mais ricos. 

Os EUA aparecem como um país com grandes níveis de felicidade . Com níveis mais elevados aparecem os Países Escandinavos, o Canadá, a Holanda, a Suiça e a Nova Zelândia. No entanto, apesar de serem dos mais felizes, os americanos são também dos mais stressados

No entanto, o Censo de 2010 nos EUA mostrou que há muita pobreza ou seja que há muitas famílias com rendimentos bem abaixo dos 75.000 dólares. "É mau estar sózinho, é mau estar divorciado, é mau estar desempregado, mas é pior estar doente e ser pobre; além disso, se for pobre pouco benefício retira do que lhe possa trazer bem esta " diz o Dr. Kahneman. "Há enormes custos emocionais associados à pobreza."

Além disso os pobres não têm o alívio dos fins de semana, estão sempre em stress o que resulta do estado de privação permanente em que se encontram.

Pintura de Marc Chagall

A ajuda que vem dos amigos

O Dr. Kahneman diz que os estudos mostram que a vida emocional depende essencialmente das relações com outras pessoas "Fico embaraçado por dar este conselho – ‘melhore os seus relacionamentos’  - mas é o que de melhor pode fazer".

Mas há, no entanto, uma coisa que tem que ser mencionada nesta discussão da felicidade – o temperamento individual. A investigação do Dr. Kahneman e do Dr. Deaton e de outros, claramente indica que há pessoas que, de facto, nasceram para ser felizes, são as criaturas ‘solares, tal como se lhes costuma chamar. 

O seu bem estar emocional será sempre mais alto do que de outras.  Isto não quer dizer que os que não são solares têm como destino viver vidas miseráveis. Mesmo os mais pessimistas e amargurados por natureza podem encontrar algum consolo: "Se não fomos feitos para ser felizes, então fomos feitos para quê?", perguntarão.  "Para evitar ser comidos por perdadores" diz o Dr. Deaton. "E se ninguém vos devorou hoje, então fiquem felizes. Pelo menos é um começo." "

Le bonheur de vivre - Henri Matisse
.&.

E hoje é dia 8 de Março, Dia da Mulher, e daqui vai o meu desejo a todas as mulheres que me lêem que tentem ser felizes. 

Anjo (ou apenas uma Mulher) - Paula Rego

Na clara paisagem essencial e pobre
viverei segundo a lei da liberdade
segundo a lei da exacta eternidade.

['Promessa' de Sophia de Mello Breyner Andresen in Obra Poética II]
 «»
E ainda, da querida Era uma Vez,


Ser MULHER também é

DAR
o seio
o ventre
a seiva
e a semente

DAR
a vida
a força
a ternura
o saber
e a verdade

ao fim do dia
esquecer o cansaço
na loucura de um abraço
e
SOBRAR...
sobrar mulher inteira em liberdade
«»
And now, for the ladies, do Poeta-Matemático J. Rodrigues Dias


Mulher

Cheia hoje a feminina lua
Em dia da mulher…
Mulher é sempre
Como a lua 
Mesmo se cheia não estiver!

«»

E para todos, mesmo para os que não são dados a danças, um ballet imperdível, Carmen pelo Dortmund Ballett



E tenham, meus Caros, um belo dia!
...

[Hoje o convite para me visitarem ali à beira rio, no meu Ginjal e Lisboa, a love affair, é feito com mais carinho. A minha amiga leitora Era uma Vez, a quem de novo muito sentidamente agradeço, também deixou ontem, de presente, nos comentários do Ginjal, um poema, 'Desamor', e é com muito orgulho que eu ali o publico hoje, junto a Mahler. Palavras e música, com amizade.]