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quarta-feira, dezembro 22, 2021

Uma das grandes diferenças entre o MasterChef Australia e o MasterChef Portugal é que o primeiro nos inspira e nos desperta para um mundo de possibilidades

 


Gosto de cozinhar. Mas, pela minha maneira de ser ou pela permanente falta de tempo para o tanto que sempre tenho que fazer, nunca me dá para fazer cozinhados muito elaborados. Também não sou de consultar ou, muito menos, seguir receitas. Sou de improvisar e de me deixar guiar pelo instinto. 

Por isso, não sei de técnicas ou truques. Simplesmente, vou fazendo, arriscando, provando, ajustando.

Contudo, também aqui como em tudo na minha vida, aquilo que aprecio não é, em geral, aquilo que faço. 

Já o contei: se vissem as pinturas que adquiri e tenho nas paredes, cores neutras, abstractas, não acreditariam nas coisas que pinto, coloridas, provocantes. São o oposto. É como os blogs. Aprecio-os discretos, contidos, com pouco espalhafato, neutros na cor, minimalistas na forma e no conteúdo. O oposto do meu. Não sei porque é isto. 

Ao comentar esta desconformidade, pessoa entendida e que muito prezo escreveu uma coisa sobre mim que me agradou. Transcrevo:

Tem que ver o lado positivo das coisas. Essa contradição permite-lhe juntar um gosto que apesar de não praticar é alimentado teoricamente e uma prática que igualmente aprecia embora a teoria lhe diga o contrário. Perfeito!:)

Tendo a levar a sério o que ele escreve pelo que não tenho por que duvidar que, desta vez, se tenha enganado. Portanto, aceito e agrada-me. Ou seja, acredito que não seja uma doida varrida mas, sim, alguém que consegue conjugar vertentes contrárias.

Isto para dizer que gosto de provar e de ver fazer pratos com criatividade, sofisticação e cuidado na confecção e... no entanto, quando vou para a cozinha é meia bola e força.

Quando falo com a minha mãe, ela refere-me frequentemente esta ou aquela que vão ao programa desta ou daquela. Nunca sei de que fala. Cada vez me falta mais a paciência para prestar atenção ao que dá na televisão. Programas nacionais, então, evito. Parece que está tudo contaminado pela maledicência, pela superficialidade, pela ausência de rigor e de lógica. 

Isto não é um bolo
Mas é televisão e, pelos vistos, também a rádio. 

No outro dia, ia de manhã no carro, estava no Fórum TSF e entrevistavam a Graça Freitas. De uma forma muito objectiva e clara, ela falava dos riscos acrescidos da Ómicron e da conjugação com os riscos acrescidos da época festiva, em que as pessoas tendem a juntar-se em casa, isto é, em ambientes fechados. Dizia ela que é bom conviver mas que não devem ser descuradas as várias camadas de protecção: em primeiro lugar a vacinação, mas também a máscara, o afastamento (possível), o arejamento, a higienização das mãos. E tudo num registo pedagógico de bom senso e afabilidade. Pois bem. A seguir, abriram a antena para o público e, para meu espanto, apareceram uns estupores que falaram com voz irritada como se tivessem ouvido outra coisa, muito diferente do que ela tinha dito. Um dizia que era tempo de acabar com tanta mentira, que há não sei quanto tempo que andam a prometer que vão acabar com a epidemia e que afinal nunca mais acaba. Outro dizia que a Drª Graça e outras pessoas parece que vivem numa cúpula a falarem de usar de máscara como se fosse possível na casa dos pais em Trás-os-Montes convencer alguém a andar de máscara ou a abrir a janela, com o frio que está. E falavam com voz irritada, zangados com a Graça Freitas e contra incertos. Nada do que diziam tinha a ver com o que ela, acertadamente, tinha aconselhado. Limitavam-se a dizer baboseiras, despejando irritação para cima de quem merece agradecimento e não palavras desagradáveis. 

Parece que as pessoas, ou algumas delas, andam parvas, maldosas, venenosas. 

Mas até nos blogs. Volta e meia leio coisas que me deixam perplexa. Penso: mas esta gente lê ou ouve ou vê o mesmo que eu? 

De pessoas ou conversas assim eu guardo distância. Fujo. Se necessário, até que desamparem a loja, fico anos isolada, a deixar crescer o cabelo e a barba, numa toca no meio do deserto. Gente rancorosa é tóxica, corrói a alma, a carne e os ossos de quem está por perto. Xô.

Bem. Mas isto para dizer que há um programa que não perco (excepto quando adormeço...), que me deixa de queixo caído, que me deixa maravilhada, que me deixa com pena de não ter tanta imaginação e habilidade e conhecimentos -- o Master Chef Australia.

Uma coisa extraordinária. Uma permanente superação. Num ápice aquelas pessoas têm ideias, decidem o que fazer, como fazer, num ápice a mestria ganha asas. Aparecem pratos artísticos, aparentemente gostosos, gulosos, elaboradíssimos, verdadeiras obras de arte. 

Bolas. Se estou bem acordada, nem tolero que a minha atenção seja desviada para o que quer que seja. Ver aquilo ali é a gente assistir a milagres que acontecem once in a life time. Que me desculpem os muito crentes mas vou mesmo dizer uma heresia: assistir aos milagres que ocorrem nas bancadas do Master Chef Australia é mais emocionante do que ver aparecer a Nossa Senhora a pairar numa azinheira.

Em contrapartida, no outro dia, pela segunda vez, calhei passar pelo Master Chef de Portugal. Nem dá para perceber. O que é que aconteceu para aquilo ser assim? Não havia melhores candidatos? Somos um país de pés de chumbo culinariamente falando?  É que tudo aquilo, ao pé do de Austrália, é coisa brega, indigente, paupérrima, coitadinha. 

Porque é que chamam àquilo MasterChef? Engodo para atrair gente distraída como eu?

Não me parece nada bem. Devia haver limites para a publicidade enganosa.

Não sei como funciona isso pois supostamente deveria haver padrões de qualidade e exigência uniformes ou, pelo menos, equivalentes. Mesmo a nível de júri. O trio australiano tem pinta, tem graça, tem espontaneidade, tem entusiasmo, imprime ritmo e uma permanente boa onda. O trio português não descola, não tem pingo de piada, não tem jeito, não agarra nem chama audiências. Nem voz têm, parece que falam com a voz agarrada ao rabo. Não têm culpa, claro. E há ainda outra coisa: lamento dizê-lo mas parece que não sabem alimentar-se de forma racional, pouco calórica. E até acho que devem ser simpáticos. Não precisavam era de ali estar. 


Dito isto. Ainda não comprei parte dos mantimentos para o jantar da véspera nem sei bem o que comprar. Também ainda não separei os presentes por destinatário, não tenho embalagens nem papel de embrulho, nem vejo quando vou tratar disso. Para agravar a situação, sinto preguiça. Apetecia-me ter férias para poder dedicar-me ao espírito natalício, mas dedicar-me como deve ser, com vontade de pôr luzinhas em grinalda à minha volta e tudo. Apetecia-me não ter que fazer nem resolver nada a nível profissional durante uns dias, apetecia-me que não me colocassem não sei quantos problemas por dia, apetecia-me ser artista para fazer pratos surpreendentes, apetecia-me que cá em casa fossem todos de boa boca para eu não me sentir inibida a inventar misturas malucas, apetecia-me que não fossem uns gozões da pior espécie para não sentir receio de que, se a coisa desse para o tordo, fizessem pouco de mim durante anos (como acontece só porque uma vez me esqueci de uma colher dentro de um bolo). Olhem, apetecia-me nem sei bem o quê. Essa é que é essa.

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Desejo-vos um dia bem passado
Alegria. Saúde. Máscara. Cuidado. E força nisso.

quinta-feira, outubro 29, 2020

Em defesa de Marta Temido e Graça Freitas

 


Já o disse mil vezes: acredito desde há muito que, nisto do coronabicho, uma das grandes fontes de contaminação, para além do contacto directo com alguém que esteja contagiado, sem máscara, a pouca distância e durante um bom bocado, é o ar. Acredito que é isso que, por exemplo, explica o contágio generalizado nos lares quando lá aparece o primeiro caso. 

A mãe de uma colega minha morreu há poucos dias. Estava num lar em que todos os protocolos de higiene sanitária eram seguidos. Cada pessoa em seu quarto, sem conviverem. E, no entanto, também por lá, tem sido uma ceifa assustadora. A minha colega não encontra explicação. A mãe estava sempre de máscara, as pessoas que entravam no quarto, as funcionárias, estavam com fatos de protecção da cabeça aos pés. Os familiares estavam com ela de máscara e com um acrílico de permeio. Portanto, concluo eu, foi contagiada enquanto dormia ou comia.

E essa é uma das razões pelas quais, em minha opinião, à medida que o tempo arrefece e as janelas se fecham, ficando o ar interior mais viciado e contaminado, o número de contágios em todo o mundo (em que se caminha para o tempo frio e/ou chuvoso) vêm aumentando.

Ainda hoje eu me insurgia com a falta de atenção que está a ser dada a isto. Respondiam-me que seria impossível verificar todas as instalações de ar condicionado, substituí-las, garantir a sua qualidade. Bem sei. Por isso, por parecer missão impossível, todos os estudos que o comprovam acabam ignorados. Percebo a dificuldade em levar a cabo e percebo o pânico que poderia gerar-se se isto fosse assumido. Mas, pergunto eu, não seria possível traçar um plano de ataque, ter um plano de formação para abranger muita gente que está desempregada para que haja gente que possa verificar, desinfectar, montar, arranjar instalações deficientes, e, em cima disso, ter um plano de apoios financeiros para quem não consegue suportar esses custos? E não seria preferível isso a deixar que morra gente ao ritmo a que está a morrer (à data que escrevo já vai em 1.163.459 o número de mortes identificadas como resultantes da Covid)? Não seria preferível isso a deixar que a economia se afunde como não há memória? Que a pobreza alastre avassaladoramente? Que a tragédia do desemprego avance desabaladamente?

Não é um problema português, contudo. Por todo o lado adoece e morre gente e, para tentar conter a propagação, avançam os recolheres obrigatórios, os confinamentos -- e a onda de psicoses e pânico que isso provoca, sobretudo em quem fica sem fonte de rendimento. E, por todo o lado (salvo recentes e pontuais excepções), o tema da propagação a partir do ar passa despercebido. Ou seja, não é problema que possa ser atribuído a Marta Temido ou Graça Freitas: é geral.

Também não percebo como, mal se viu a curva a empinar (quando ainda nem se entrou no inverno), não se decretou a obrigatoriedade do teletrabalho para todas as funções que o permitam (e para todos os trabalhadores que o aceitem -- porque há quem considere não ter condições em casa... e até pode ser porque está lá a sogra...). É essencial retirar gente de circulação sem que isso prejudique a actividade normal. Já o disse mil vezes e vou continuar a repeti-lo: é essencial. Não pode ficar ao arbítrio de cada chefe que resolva armar-se em macho man, valentão das dúzias, e ache que não há que ter medo de um viruzeco da treta, há é que vencer a miúfa e ir para o local de trabalho. Não pode ser. Não pode ficar sujeito à interpretação de cada um pois, se o exemplo não vem de cima, fica difícil fazer imperar o bom senso. Tem que vir uma ordem com força de lei: teletrabalho obrigatório e imediato (nas condições que referi). 

Mas isto não é só coisa de cá e, muito menos, é da responsabilidade da Marta Temido ou Graça Freitas.

E ainda vejo muita gente que acha que isto das máscaras é importante mas não sempre, não em qualquer circunstância -- e isto mesmo que se esteja num espaço fechado com alguém que circula sabe-se lá por onde. 

Dou um exemplo. A minha mãe tem muito medo, é cuidadosa, lava as mãos, desinfecta-se, usa máscara. Mas depois faz coisas do além. Para além de ainda ter o hábito de agarrar qualquer coisa que dela se aproxime; por exemplo, se lhe aproximamos um telemóvel para que veja qualquer coisa, a primeira coisa que faz é agarrar nele. Isto com a maior das naturalidades como se não fosse um daqueles objectos que, se usado assiduamente por alguém com covid, é mais do que certinho que terá merdinhas em cima. Mas faz mais. Uma amiga fez hoje anos, noventa e três anos. Ontem tinha-me dito que se calhar ia fazer um bolo e levar-lhe lá a casa. Percebi que se estava a dizer isso é porque já tinha decidido lá ir. Temi logo o que poderia acontecer e avisei-a: 'Mas alerte-a logo que tenha máscara e, se ela quiser convidá-la para comerem juntas uma fatia, diga-lhe que sim mas na varanda, ao ar livre'. Fez aquele suspiro que sei bem que significa que não o fará. Hoje perguntei-lhe como tinha sido. Foi levá-lo, entrou em casa, a amiga não tinha máscara. Fiquei passada. Não quis aborrecer a amiga, diz que ela não liga nada a isto, que vai todos os dias às compras, que vai ao banco, que vai ao restaurante buscar take away, que não se preocupa nada e que, portanto, não ia, estando a visitá-la em casa dela, pedir que ela pusesse máscara. è aquela coisa das regras de delicadeza e boa educação que estão enraizadas mas que, agora, fruto do momento, têm que ser bem avaliadas e, em algumas situações, reequacionadas. Fiquei, pois, ainda mais passada. A outra podia estar infectada, sabe-se lá, nisto não há que recear ofender, há que recear é contagiar o outro ou ser contagiado. Alega em seu favor, a minha mãe, que não esteve lá muito tempo e que estava de máscara. Mas, em espaços fechados, e em situações de proximidade física, a máscara é eficaz se os comparsas estiverem todos de máscara. Ora eu sei que a amiga, uma senhora encantadora, uma amiga de todos os momentos, está surda que se farta. Portanto, estiveram próximas, de certeza absoluta. E se são as duas de risco... Já tiveram ambas problemas oncológicos e, pela idade, são mais do que de risco. E são ambas ex-professoras, pessoas dir-se-ia que bem informadas. E, no entanto, é o que se vê.

E aqui, sim, acho que é responsabilidade de Marta Temido e Graça Freitas: faltam campanhas de informação claras, com situações concretas, passando mensagens explícitas, inequívocas. E na televisão, na rádio, nas redes sociais, no youtube, em todo o lado onde possa chegar a públicos diversificados: o que se deve e não deve fazer.

Mas calma, não é isto que chega para crucificar quem se tem aguentado firmemente à frente desta avalancha de acontecimentos, todos desconhecidos, tentando tomar as melhores notícias no meio da incerteza que é tudo isto, dando o peito às balas, resistindo a raios e coriscos, vendavais e toda a espécie de ameaças. forces majeures, acts of God. E elas sempre ali, tentando dar o seu melhor, ouvindo especialistas, lendo relatórios, coordenando serviços, resolvendo conflitos, fazendo contas, coligindo informação, atendendo a comunicação social, respondendo em todo o lado a toda a hora, certamente mal dormidas (e já lá vão uma data de meses). O que elas têm feito e aguentado poucos mortais o aguarentariam. Só por maldade e vil cegueira se pode dizer o contrário. Admiro-as e agradeço-lhes. E espero bem que António Costa mantenha o apoio que lhes tem prestado -- bem o merecem.

E, vendo a coisa por outro prisma: se o que está a acontecer é culpa de Marta Temido e Graça Freitas, então, por acaso, são elas também as responsáveis pela desgraça que alastra na Bélgica, em França, em Espanha, em Itália, na República Checa, no Reino Unido, na Rússia, no Irão, em... quase tudo o que é sítio?

Então porquê a mesquinhez, a maldade, a estupidez de as culpar e querer punir pelo descalabro que está a ser a segunda onda um pouco por todo o lado em que coincide com a entrada no tempo frio?

Da minha parte -- e se soubesse que o que aqui escrevo lhes chega -- só poderia deixar-lhes os meus agradecimentos e desejar que se mantenham com saúde, força e disposição para continuarem a aguentar-se tão corajosamente como até aqui o têm feito. São mulheres de fibra, inteligentes, fortes e resilientes como pouca gente o conseguiria ser numa situação como esta que atravessamos. Bem hajam.

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Fotografias do Best Bird Photography of 2020 ao som da Gymnopédie No.1 de Erik Satie na interpretação de Khatia Buniatishvili 

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E tenham um dia feliz. Saúde, força, alegria.

quarta-feira, julho 01, 2020

Para agradecer a Marta Temido e a Graça Freitas.
Para dizer ao Medina que vá mas é dar banho ao cão.
Para me fazer eco das palavras de Sofia Loureiro dos Santos.
Para ver e ouvir as mãos de Carla Bley.
[E para falar da minha estranheza face ao estranho mundo que por aí vai]


A newborn baby at Praram 9 hospital in Bangkok, Thailand
Photograph: Lillian Suwanrumpha/AFP/Getty



Já aqui falei muitas vezes: parece que uma disrupção qualquer se deu em mim. Fracturei. Este confinamento, o teletrabalho, o ter vindo viver para o campo, esta deslocação no espaço e parece que também no tempo, tudo isto operou em mim um efeito que nem eu entendo. Não consigo imaginar-me a voltar a trabalhar como trabalhava antes, enfiada no carro, enfiada numa fila de trânsito, enfiada horas a fio numa torre hermética. Contudo, pode acontecer que tenha que me readaptar. Não sei porquê mas há pessoas que não percebem que há coisas que é melhor não contrariar. Se for forçada a violentar a minha vontade, talvez ceda. Mas tão contrariada que melhor fora se não.

Mas tudo é bizarro no que vejo acontecer-me. Do vendaval que as minhas células experimentam e que me levam a querer experimentar toda a espécie de mudanças já aqui falei sobejas vezes. Mas hoje quero falar de um outro efeito que tudo isto está a produzir em mim. É que parece que tudo o que vejo à minha volta, nesse tal mundo exterior, é disparatado, improvável, estúpido, dispensável. Parece que não tenho nada a ver com isso, como se eu vivesse aqui, em paz, e, lá fora, num mundo estrangeiro, só acontecessem macacadas, cenas maradas, coisas que teriam sido impensáveis há pouco tempo.

A woman shopping in Granada. Spain
Photograph: Jorge Guerrero/AFP/Getty
Por exemplo, quase ao acaso, de entre notícias do dia:

Enquanto uns já se preocupam com a segunda vaga, como a China e a Europa Ocidental, outros tentam regressar à normalidade num cenário de incerteza, como Espanha e Portugal, que deram um passo atrás em algumas regiões. Cidade inglesa de Leicester voltou a fechar após novo surto

A administração de Donald Trump adquiriu mais de 500 mil doses do medicamento contra a covid-19, o que significa toda a produção mundial de julho e quase a totalidade referente a agosto e setembro.

Nova variação do vírus da gripe com potencial para se tornar uma pandemia foi identificado na China por cientistas. É transportada por porcos, mas pode infetar seres humanos.

O bastonário da Ordem dos Médicos afirmou hoje que o hospital Amadora-Sintra "já ultrapassou o limite da sua capacidade" e que teve de transferir 50 doentes com a covid-19 para outras unidades de saúde.
A band do their sound check before live streaming a concert in Washington, US
Photograph: Eva Hambach/AFP/Getty

E li também sobre a atitude de Fernando Medina. Não gostei. Tinha-o em melhor conta. Com esta sua oportunista e desleal atitude recuo e tiro-lhe o tapete. Bem sei que ele passa bem sem o meu tapete sob os seus pés. Mas o pior é quando um e outro e outro e outro fazem o mesmo. Pode acontecer que, quando der por ela, esteja de gatas, apeado. Roma não paga a traidores. E eu nem a traidores nem a populistas.

Marta Temido ou Graça Freitas podem, uma ou outra vez, não ter sabido exactamente como agir. Mas penso que só gente burra ou estúpida acredita que poderiam ter feito melhor. Só se fossem bruxas e adivinhassem o que a comunidade científica de todo o mundo ainda não descobriu. O que tenho visto nelas é ponderação, bom senso, sangue frio, dedicação, inteligência, força anímica, resiliência, amor ao país. Deveríamos agradecer-lhes por tudo o que têm feito num contexto desconhecido, incerto, traiçoeiro. De cada vez que vejo alguém, na bancada, a dizer uma coisa ou o seu contrário, conforme sopra o vento e acusando estas duas bravas mulheres de não terem feito ou acontecido só penso que é uma pena que seja dado palco a gente burra e oportunista. Penso que António Costa, Marta Temido e Graça de Freitas têm estado bem a gerir todo este processo e espero é que muitas vozes se levantem para lhes agradecer.

A couple have lunch at a restaurant in Paris, France
Photograph: Alain Jocard/AFP/Getty

Li um post de Sofia Loureiro dos Santos que acho que deve merecer destaque. É a voz de uma médica e é a voz de uma pessoa lúcida e, do que lhe tenho lido, intelectualmente honesta.

Transcrevo na íntegra e aconselho a que o partilhem (e, se puderem, o esfreguem na cara do Medina!):


Há coisas que, por muito que racionalmente saiba que são assim, sempre me surpreendem.

Fernando Medina, após as notícias de que António Costa se teria irritado com os técnicos e com a ministra da Saúde, não sei se por iniciativa própria ou se por estratégia concertada, resolveu abrir fogo.

Instalada a ideia de que a pandemia está a correr mal em Lisboa, é preciso arranjar responsáveis por este facto (alternativo). Já ninguém se lembra, e também não interessa a ninguém lembrar, que há escassas semanas as mesmas autoridades, as mesmas chefias e os mesmos exércitos eram os melhores do mundo.

Em primeiro lugar, após a decisão de reduzir as medidas de confinamento e há já várias semanas, temos uma evolução de novos casos à volta de 1% , uma letalidade a reduzir-se paulatinamente (à volta de 4%), o número de internamentos e de camas de UCI ocupadas também controladas. Até hoje, e felizmente, temos conseguido controlar a pandemia apesar da pobreza, das desigualdades gritantes, nomeadamente na região da Grande Lisboa, da imensidade de imigrantes em situações precárias, dos bairros sociais, dos lares clandestinos, dos transportes apinhados, do escasso número e do envelhecimento dos profissionais de saúde, da obsolescência dos sistemas informáticos, da inadequação dos equipamentos, do cansaço, da necessidade de retomar a economia e a sanidade mental.

Estes problemas já existiam antes da pandemia e não desapareceram nestes últimos meses, altura em que éramos o exemplo mundial no combate à COVID-19. Por isso as palavras de Fernando Medina são ainda mais obscenas. Já agora, o que fez ele, como responsável autárquico, para tentar resolver o problema do distanciamento físico nos transportes públicos? Será que não podia, por exemplo, implementar o desfasamento de horários para mitigar as horas de ponta? Aumentar o número de autocarros alternativos? Ou mesmo usar uma varinha mágica e acabar em 2 meses o que não conseguiu em 5 anos?

É uma pena que o SARS-Cov-2 não se comporte como António Costa gostaria. Nós todos preferiríamos que ele tivesse desaparecido, que o conhecimento sobre máscaras, desinfecções, confinamentos e desconfinamentos, terapêuticas, etc, fosse maior e mais certo.

A evidência científica perde terreno nestes tempos de chumbo. Não é só Trump nem Bolsonaro. O pensamento mágico substitui a racionalidade. E a forma como os responsáveis políticos manipulam os factos e a opinião pública para os seus proveitos é tão asquerosa quanto velha.

A man cycling in Wuhan, China
Photograph: Héctor Retamal/AFP/Getty
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Rüdiger Krause, Carla Bley e Steve Swallow interpretam Lawns

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Boa sorte, alegria e saúde a todos quantos  por aqui me acompanham

terça-feira, março 17, 2020

De um lado, Fátima Campos Ferreira e os ventiladores, Jorge Buescu e as previsões e Marcelo e a self-quarentena.
Do outro, Pedro Simas e a inteligência (e o garbo), Patrícia Gaspar e a lucidez, Marta Temido e Graça Freitas e a sabedoria e firmeza, António Costa e a liderança e Rodrigo Guedes de Carvalho e o jornalismo como serviço público.
Tudo isto em tempos de COVID-19, essa besta invisível de mil patas.





Nem consigo descrever o meu dia de teletrabalho. Não sei em que mundo é que eu vivia quando imaginei que estando em teletrabalho in heaven, ia conseguir ter tempo para limpar a casa, para dar umas voltas pelo arvoredo, quiçá estar ao computador enquanto, estendida na espreguiçadeira, apanhava uns retemperadores banhos de sol. Não sei mesmo. 

Trabalhei de manhã à noite, quase sem tempo para pôr o almoço ao lume, quase sem tempo para confraternizar com o meu roommate. E limpar a casa, claro, nem pó. Estes dias têm estado a ser muito difíceis. As empresas não estavam preparadas para isto e de uma semana para a outra pô-las a funcionar com cada um em sua casa e, na frente de batalha, as baixas a começarem a acontecer, dia após dia, e a gente a querer que as tropas se mantenham no terreno, não é fácil. E, pelo meio, articular tudo, assegurar a comunicação entre todos. E a toda a hora a receber mails de outras empresas a informar que vão deixar de prestar os serviços, e as coisas que estavam encomendadas a nunca mais chegarem e a gente a pensar que, um dia que as coisas cheguem, pode não estar ninguém nos locais para as receber. 

E todo o dia, de manhã cedo à noite, mails, telefonemas, videoconferências.


E os meus filhos em casa com os miúdos e a preocupação que tenho por eles e eu aqui longe deles, que pena, que saudades. E os meus pais, que tripla preocupação. E a minha mãe que não era capaz de me encaminhar uma receita e toda ela, enervada, a suspirar, com vontade de não tentar mais com medo de a apagar. E eu aqui com medo de lá ir não vá contagiá-los, eu que até sexta-feira andei em elevadores, em salas de reunião sem janelas e com alcatifas, em restaurantes, em toda a espécie de locais públicos frequentados por gente das mais variadas proveniências. 

Mal vi televisão mas vi a excelente entrevista de António Costa: firme, transparente, lúcido, directo, consciente. Portugal deve confiar na sua mão forte na condução desta tragédia.

E o Rodrigo Guedes de Carvalho: perfeito.

E vi os Prós e Contras. Uns nervos. Aquela Fátima Campos Ferreira esteve do princípio ao fim obcecada com os ventiladores. Qualquer coisa que qualquer dos convidados dissesse ela rematava com uma pergunta ou uma observação sobre os ventiladores. Que isso é um nó górdio é. Mas antes de nos preocuparmos que não há ventiladores para todos os que precisam, temos é que nos preocupar em que não haja muita gente a precisar. Para programas destes, sobre matérias complexas, tem que haver moderadores que percebam o que os outros dizem.


Outro que parece que levou uma paulada na tola é o tal de Buescu. Não sei para que números é que ele está a olhar que o levam a extrapolar que a meio de Abril já iremos com 12 milhões de infectados em Portugal. Juro: não percebo. A ser assim, em Itália, a esta hora, uma vez que já levam um bom avanço temporal em relação a nós, já iriam com setenta e tal milhões de infectados -- e vão com vinte e oito mil. É muito infectado, claro, mas, caraças, nada que se compare com as maluqueira do Buescu. Portanto, please, percebam que em todas as profissões há profissionais que etc. e tal e este é um desses. Não é por se ser matemático que se pode levar a sério. Isto do covid é uma desgraça que se abateu sobre o mundo mas, no que se refere a nós, não é nada da catástrofe que aquele senhor para aí anda a espalhar. Começou por desvalorixar para agora andar a empolar. Não é para levar a sério.


Bem, bem esteve Pedro Simas. Por tudo o que disse e por outra coisa: é um giraço. Não sei se ainda se diz mas eu digo: um pão. Um borracho. Façam o favor de o levar à televisão mais vezes e de avisar antes para eu não o perder. Um consolo. Gente inteligente e bem apessoada daquela boa maneira são um suplemento de alma para a gente resistir ao covid.

Outra que esteve muito bem foi a Patrícia Gaspar. Serena, forte, confiante, sabedora. A forma como acabou o programa deu-me vontade de a abraçar, de lhe oferecer flores, de lhe agradecer. Grande mulher.


Saindo do Prós e Contras, outro que também já mostrou que não se pode levar a sério é o Marcelo. Depois de andar a desobedecer a todas as recomendações da DGS e, publicamente, a incentivar ao desacato, parece que caíu na real. Mas não apenas caíu na real como parece ter ficado acagaçado perante a perspectiva de poder ter infectado meio Portugal, parece ter caído num estado de estupor catatónico. Isolou-se. Mas isolou-se mais do que a conta pois parece que desertou. Não estava doente, não tinha indicações para deixar de exercer a sua função. Apareceu a falar aos portugueses como se não atinasse com o computador, quase às cabeçadas ao monitor. Um som e uma imagem inexplicáveis. Parecia que estava a falar do meio da selva, sem condições. Caraças. Alguma coisa impede que alguém contacte com ele e lhe coloque uma câmara e um microfone à frente? Passou dos banhos de multidão com beijinhos e selfies para o isolamento monástico, esquecendo-se que é Presidente da República, esquecendo-se do momento assustador que atravessamos. Parece que sem a muleta dos beijinhos e o andarilho das selfies ficou com medo de andar.


A quem eu tiro o chapéu é a Marta Temido e a Graça Freitas. Mulheres trabalhadoras, inteligentes, bem preparadas, dedicadas, fortes. Temos que lhes agradecer por todo o esforço, por toda a entrega, por toda a lucidez, por toda a angústia e stress a que certamente estão sujeitas ao longo de tantos dias consecutivos. Não sei como aguentam, devem andar arrasadas, mal dormidas, sujeitas a todo o tipo de pressões. Confio nelas e agradeço-lhes. Nelas e na Patrícia Gaspar. E no António Costa.

Vamos sair desta. Vamos mesmo. Temos é que nos aguentar. Com muita disciplina, com isolamento, com sensatez, sem pânico. Mantendo-nos em funções se o pudermos (mesmo que remotamente), garantindo que o mundo volte ao normal logo que possível. E pode ser que surja rapidamente o tratamento e que nos reinventemos em melhor. Acredito nisto. Acredito mesmo. Ainda que agora esteja muito preocupada pois não consigo avaliar a dimensão do que nos espera.


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Não tento explicar o que me ocorre pelo que não sei porque é que me apeteceu ter aqui pinturas de Lucien Freud ao som do Cálice pela Maria Bethania.

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Desejo-vos uma boa terça-feira e, vá lá, descubram lá uma receita de coisa para sairmos desta: 
seja vacina, seja tratamento, seja bolo, seja mezinha, seja reza, seja o que for. 
Ou uma mistura disso tudo.

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