Hoje estou outra vez um bocado cansada mas, desta vez, acho que tenho justificação. Varri a casa toda por dentro, lavei uma colcha, lavei um tapete, estendi-os ao sol, varri cá fora, reguei, apanhei ervas. Há bocado, quando me levantei, estava toda dorida. Notoriamente falta de hábito. Face a toda as circunstâncias, há já algum tempo que não metia mãos à obra para uma faxina a preceito. O meu marido bem me avisou que amanhã, dia de páscoa, não me conseguiria mexer. Mas o tempo estava bom, a casa precisada e eu com vontade de trabalhos físicos que me pusessem o corpo a mexer.
Também fiz uma caminhada enquanto exercitava os braços (e a mente).
E falo na mente porque, enquanto andava ia a pensar que o corpo é mesmo um animal amestrado que, quando deixa de ser exercitado, se esquece das habilidades que antes fazia com uma perna às costas.
No outro dia, cá em casa, quis mostrar à minha neta as dificuldades que tenho quando, na hidroginástica, tenho que fazer uns movimentos com as pernas e outros, não equivalentes, com os braços. Quis mostrar-lhe a concentração que é precisa. Mas, ao querer mostrar-lhe, parece que o meu corpo não queria elevar-se no ar. Saltar à tesoura para os lados ou com uma perna para a frente e outra para trás, só por si, é coisa que faço nas calmas dentro de água. Elevo-me bastante bem, obrigada. Mas fora de água...?
E o que eu saltava, senhores. Gostava de saltar em comprimento e em altura, gostava de trepar, de correr. Em miúda, quer as minhas avós, em casa de quem eu ficava por vezes, moravam num sítio muito mais elevado em relação à escola, quer a minha casa era numa zona alta, bem mais do que o liceu. E o que eu adorava, mas adorava mesmo, largar a correr, correr tão velozmente como se voasse. Ganhava embalagem nas descidas e quase parecia que não conseguia parar.
Agora quis saltar, elevar-me no ar enquanto abria e a fechava as pernas, e tive que me concentrar e convencer-me que era capaz. Caraças.
Tenho que me mexer, exercitar, voltar a ter domínio sobre o meu corpo.
Esta pasmaceira e espapaçamento em que tenho estado desde que tive covid faz com que até varrer, limpar a casa ou arrancar ervas me custe como se tivesse estado a cavar batatas de sol a sol. Não pode ser.
Por isso, ver estes fantásticos vídeos aqui abaixo soube-me como uma bênção. E não é apenas pela dança alegre, é também pela voz capaz de cantar. Há tanto tempo que não canto que, se quiser cantar, acho que não me sai nada. Caraças. A gente enferruja se não praticar. Não pode ser.
Não sei se será a coisa mais apropriada para aqui ter na Páscoa mas fruir o corpo é uma coisa boa para todos os dias, Natal, Páscoa, 25 de Abril ou 1º de Maio.
Veja o que acontece quando um dançarinos de Boogie Woogie e um de West Coast Swing improvisam Sondre Olsen-Bye e Ardena Gojani dançam pela primeira vez
O contratenor e dançarino de break Jakub Józef Orliński | Retrato do multi-talentoso cantor de ópera
Ele parece um anjo e pode cantar também como um. O contratenor Jakub Józef Orliński encanta o público com sua voz aguda e simultaneamente sonora. Mas Orliński não se destaca apenas no palco da ópera. Para contrabalançar o seu trabalho operático, faz breakdance a um nível que também vale a pena ver. No caso de Orliński, a alta cultura encontra o estilo de rua. Acrescente-se a isso sua aparência extraordinária e charme incrível, e não é de admirar que o jovem polaco pareça não ter problemas para atrair até mesmo um público jovem para a ópera. Antes de uma apresentação no Théâtre des Champs-Élysées em Paris no outono de 2022, Orliński falou sobre os vários aspectos de sua vida. O resultado é o retrato de um jovem cantor excepcionalmente talentoso que olha para o futuro com curiosidade.
Tudo nesta invasão me surpreende. Surpreende-me, desde logo, a estupidez do acto. Não imaginaria tal coisa nos tempos que correm, nas circunstâncias presentes. Depois a malvadez de como está a decorrer a devastação levada a cabo por Putin. Há qualquer coisa de inumano na brutalidade indiscriminada da destruição. Surpreende-me o grau de mitomania de Putin. Mitómano, narcisista, psicopata. Mas também me surpreende a resistência destemida e determinada dos ucranianos. Nunca assisti a uma coisa assim, tão transversal, tão colectiva, tão até às últimas consequências. Não quero que pareça que estou a romantizar o que está a passar-se pois a realidade é crua demais para isso. Ver a forma como tantos se alistam, ver a forma como se despedem para ficar a lutar, ver a forma como as mulheres se põem a caminho com as crianças pequenas ao colo ou pela mão, deixando o marido ou namorado ou o irmão e a casa e toda a vida para trás, ver a forma como tantas pessoas de idade resolvem ficar para defenderam a sua casa e a sua pátria não se importando de pôr a vida em risco -- surpreende-me.
E também me surpreende a liderança arrojada e inspiradora de Zeleskyy. Devo dizer que nunca dei nada por ele. Achava que era daqueles epifenómenos gerados pela popularidade adquirida via comunicação social. Mas agora pasmo com a sua coragem, não apenas uma coragem física mas também anímica. Com ar de quem não dorme capazmente há dias, debaixo de ameaças de morte, submetido à pressão de decisões simultâneas e dificílimas ao longo de já lá vão dez dias, Zelenskyy consegue manter a serenidade e a robustez das suas convições. Com o país cercado e massacrado, este homem enfrenta o ódio de Putin sem se deixar abater, inclusivamente desafiando-o a a encontrar-se frente a frente com ele. 'Não mordo', diz ele, mostrando a valentia que falta a Putin, esse psicopata cobarde.
Hoje de tarde pensei que à noite não encontraria palavras para exprimir aqui a minha perplexidade e revolta. Peguei, então, no Breviário da Decomposição de Emil Cioran na esperança de encontrar ali as palavras que me ajudassem a compreender tudo o que está a passar-se. De facto, ao rever o índice, tudo me pareceu ajustado à loucura a que se assiste. Pensei, até, transcrever aqui alguns excertos. Mas desisti. Por muito que, desde tempos imemoriais, se tenha escrito sobre a loucura e por muito bem que alguns tenham encontrado as palavras certas para descrever a miséria humana em todas as suas formas, penso que talvez seja preferível não encontrar definições ou explicações. É que o que se passa é inexplicável e é melhor que assim permaneça.
As fotografias provêm do The Guardian. A primeira fotografia mostra um bebé de 18 meses atingido num bombardeamento em Mariupol a dar entrada no hospital, ao colo do namorado da mãe que vai a correr atrás, uma expressão de desespero no rosto. A segunda fotografia mostra o clínico que não conseguiu salvar o bebé.
In an interview with CNN’s Anderson Cooper, actor and co-founder of CORE Response, Sean Penn, details what it was like the first time he met Ukrainian President Volodymyr Zelensky.
See moment that made Clarissa Ward stop reporting and help
CNN's Clarissa Ward reports from Kyiv where many people are trying to evacuate as Russian forces close in on the capital city.
Footage shows aftermath of Russian air strike in Ukraine's Bila Tserkva
Can Ukraine win fight against Russia? See William McRaven retired US admiral's answer
Retired Admiral William McRaven joins Smerconish to talk about Ukraine's chances of winning this war with Russia.
De Leitor, a quem agradeço, recebi o texto que transcrevo de seguida, na íntegra. É um texto sem alusões: tudo aqui é explícito - quem é quem, em que negócios. Obviamente pedi-lhe autorização para o divulgar e apenas depois de devidamente autorizada o faço. Aqui vai.
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A Sociedade de Advogados PLMJ (António Maria Pereira Sáragga Leal, JM Júdice, etc), a que pertence Tiago Duarte, é uma porta giratória ou melhor dizendo, de "tráfico de influências" para facilitar negócios, com o dom da ubiquidade em quase tudo o que é privatizações, de ontem, hoje e no futuro, perito em contratos swap, especialista em PPP “incontornáveis”, na nova vaga de concessões e privatizações, nas batalhas jurídicas em torno do gás natural, etc. Contratos por ajuste directo, outra das especialidades, são incontáveis. Para o efeito, contaram com elementos do seu escritório em gabinetes governamentais, sobretudo nestes últimos 4 anos. Rui Machete veio de lá (era consultor) para assumir a pasta de MNE. E trouxe consigo um (a) elemento de lá, para o seu gabinete (Cláudia Saavedra Pinto). Pedro Lomba também por lá passou, na PLMJ. Na tal porta giratória entre sector público e sector privado encontram-se muitos nomes ligados à PLMJ. Por exemplo, Maria João Melícias Duarte veio de lá e foi colocada no conselho vogal do Conselho da Autoridade da Concorrência (AdC), em Maio de 2014, por despacho de Passos. Da lista de clientes da PLMJ constam muitas empresas cuja actividade é regulada pela AdC. As decisões da AdC em relação à fusão PT/OI e Zon/Optimus, que deu luz verde a ambas, envolveram dois clientes de topo da PLMJ: a Portugal Telecom (PT) e Zon Multimédia. O Presidente do Conselho da administração da fusão Zon/Optimus, Jorge Brito Pereira é sócio e advogado da PLMJ. A ERSE, ANACOM, EDP, Galp Energia, REN, Enercon, Eletrobras, Vodafone etc são clientes da PLMJ e supervisionadas pela AdC, onde a PLMJ tem grande influência.
Uma rede, ou teia, de interesses inacreditável!
Luís Pais Antunes foi convidado pelo então ministro Álvaro Santos Pereira para substituir Manuel Sebastião na presidência da AdC (é sócio da PLMJ, desde 1999, além de militante do PSD, amigo de Marques Mendes, que por sua vez é consultor e uma das figuras chaves de outra grande Sociedade de Advogados, a “Abreu Advogados”; vejam-se os negócios privados na Madeira, da Tecnoforma de Passos, dos offshore da Madeira, etc). Na A.R tal nomeação foi contestada por ser incompatível essa sua actividade e ser advogado da PLMJ, por conflitos de interesses. E acabou por não vingar.
Na tal porta giratória entre sector público e privado, lá voltamos a ver um elemento da PLMJ, Hugo Miguel Nunes e Sá, nomeado para o gabinete de Joaquim Pais Jorge que substituiu M.L Albuquerque, na S.E do Tesouro, o mesmo Pais Jorge que acabou por ter de se demitir pouco depois após o escândalo dos Swap. E quem o foi substituir? Isabel Castelo Branco, economista do BPI, que ali, naquele Banco, foi responsável pela venda de contratos Swap à Transtejo, com perdas na ordem de cerca de 6 milhões de euros (!). Logo depois, o tal Hugo, da PLMJ foi entretanto para o gabinete governamental dessa tal Isabel, quadro do BPI. O Hugo (da PLJM) é um especialista em contratos Swap. Entre os clientes daquele Escritório, a PLMJ, estão vários Bancos, como o BBVA, o ex-BES, Barclays, Credit Suisse, Deutsche Bank, Dapfa Bank, Millennium BCP, Morgan Stanley (a Agência de rating), Société Générale, etc. Um homónimo desse Hugo, um tal Hugo Ferreira, que se tornou sócio da PLMJ há cerca de 3 anos, alto funcionário do Deutsche Bank, foi corresponsável pelos vários contratos onerosos (ou melhor, ruinosos) Swap a empresas públicas portuguesas, como o que fez com a empresa “Metro de Lisboa”, que veio a resultar num prejuízo de 9 milhões de euros para o erário público.
A PLMJ participou, a pedido do governo rejeitado, nas privatizações da EDP (até assessorou a concorrente preterida, a Electrobras), da REN (que igualmente assessorou), dos CTT (que assessorou em parceria com a Abreu Advogados, onde está o Marques Mendes) e a Caixa Seguros (assessorando os chineses da Fosun, que vencerem o concurso). No caso dos CTT, entre os novos accionistas, como se sabe, destacam-se a Goldman Sachs e o Deutsche Bank (este último é cliente da PLMJ). Representantes da PLMJ estiveram igualmente na RP da China, numa viagem de “diplomacia económica”, para captar investimento chinês. Voltaram lá integrados na comitiva de Cavaco Silva, na viagem que ali fez em 2014.
O socialista Rui Vilar, algum tempo depois de sair da Gulbenkian foi para a REN, vindo poucos meses após a ser contratado pela PLMJ, como advogado (como consultor para diversas áreas relevantes: energia, direito bancário e financeiro, fusões e aquisições, arbitragens, etc). Suspendeu funções 2 anos depois, na PLMJ, (embora mantenha a relação “afectivo-institucional” de conveniência para ambos). Entretanto, quando governo de Passos manifestou vontade em continuar o ritmo das privatizações, como foi o caso dos Transportes Públicos de Lisboa e Porto, ao querer entregar o negócio da Carris, Metro de Lisboa, STCP e Metro do Porto a privados, a PLMJ posicionou-se para poder participar nesse processo de concessões e privatizações de empresas públicas.
Os principais advogados da PLMJ nunca desmentiram os valores que vieram a público de que, assessorando a Parpública, recebiam de honorários mais de 2 milhões de euros por mês (JM Júdice fez uma tentativa).
A promiscuidade entre este Escritório de Advogados e o Poder Político já se tinha feito sentir também quando Morais Sarmento, então Ministro de Durão Barroso foi encarregue do processo de privatização da Galp Energia. A PLMJ teve deste modo, em Morais Sarmento, a pessoa certa, dentro do governo, para lhe tratar dos interesses (ou melhor, dos negócios que pretendia assessorar). Teve nessa altura (embora hoje ainda mantenha uma boa parte) uma “parceria” privilegiada com o Estado (através do PSD).
A PLMJ contou também entre os seus clientes, Américo Amorim (que beneficiou na altura com a questão da privatização da Galp Energia, tornando-se accionista), que mais tarde foi para a Sociedade “AAA”. A Galp Energia chegou a contar com sete ex-governantes nos seus órgãos sociais (do PSD ao PS).
Outro sócio da PLMJ foi Pedro Melo, que pertence ao CDS-PP e tem-se distinguido pela sua participação em processos de privatizações ou concessão de empresas públicas e contratualizações de PPP (a sua especialidade, enquanto responsável na PLMJ do departamento de Direito Público, pelo menos até há pouco).
A PLMJ utiliza igualmente outros métodos para fortalecer as relações com o Estado (governo/s), como a de contratar juristas e advogados e depois deixá-los sair para ocuparem lugares de destaque em empresas público-privadas, por exemplo, ou públicas que depois venham a solicitar os seus serviços. J.L Cruz Vilaça, ex-sócio da PLMJ é outro exemplo, que, por coincidência, foi ocupar o lugar de presidente da Assembleia-Geral da Autoestradas do Atlântico.
As PPP é onde o Estado gasta, ou melhor, afunda milhões de formas pouco criteriosas. Embora, tais negócios ou contratações estejam “protegidas” pelos pareceres dos grandes Escritórios de Advogados, como a PLMJ. Que por vezes até juntam esforços para melhor obterem e assegurarem os resultados pretendidos. Um exemplo foi o Grupo Lena que integrou o consórcio Astérion (juntamente com a Mota-Engil, Brisa, Somague, MSF, BCP, CGD e BES) que concorreu à concessão da ANA (e ao projecto, adiado do novo aeroporto, mas que deverá ir para a frente, um dia mais tarde - uma vez exista vontade política).
Em 2007 a PLMJ celebrou um acordo de colaboração com a sua concorrente, a sociedade de advogados Vieira de Almeida & Associados - para prestação conjunta de assessoria jurídica à Astérion (“quando não os consegues vencer, junta-te a eles”). Voltando a Pedro Melo, sócio da PLMJ, foi ele quem assessorou o Estado (governo de Passos) na operação da privatização da ANA.
Enfim, um quadro que nos dá uma amostra do "tráfico de influências" dos grandes interesses privados com o Estado e a promiscuidade dos seus agentes (os Governantes). Uma forma de limitar de algum modo isto seria implementar o regime de exclusividade dos Deputados e que as nomeações para os gabinetes, institutos, etc, proveniente de gente do sector privado (ligados a grandes interesses privados, grandes escritórios de advogados, consultadorias económicas, etc) pudessem ser escrutinadas pela A.R e só poderem ser nomeados com ao acordo de 4/5 dos Deputados. E ainda que existisse um “período de nojo” alargado, sempre que um governante cessasse funções, antes de ingressarem a empresas que tivessem beneficiado de contratos do Estado, aquando no exercício das suas funções. Mas, que aceitaria isso?
(Este é pois o Escritório de Advogados onde Tiago Duarte trabalha, que lá esteve a aconselhar Passos e Portas sobre questões constitucionais, no tal Hotel. Compreendem-se, deste modo, as suas posições e argumentos. Quem lhe paga exige dele lealdade e a defesa dos interesses, que a PLMJ de modo nenhum quer ver inviabilizados).
- A Bastonária da Ordem dos Advogados, Elina Fraga (uma mulher tesa!) há mais de um ano atrás reconheceu este fenómeno do tráfico de influências entre os grandes Escritórios, ou melhor, Sociedades de Advogados, o Poder Político e os negócios público-privados, dizendo “que se utilizam as influências para alterar Leis, muita das vezes em função dos interesses privados. Deve ser incompatível o exercício da advocacia com as funções de Deputado. Não se pode legislar de manhã e atender à tarde um cliente que foi favorecido com essa Lei.” Concordo inteiramente. Quem já não concorda é o ex-candidato a Presidente da A.R. derrotado por Ferro Rodrigues, o Deputado do PSD, Fernando Negrão, que, numa entrevista à Revista da Ordem dos Advogados, em Fevereiro de 2014, disse “que o Estatuto da Ordem dos Advogados não deve consagrar a incompatibilidade entre Deputado e Advogado” (!) Pois, pois…
João Tiago da Silveira pertence (ou pertenceu até há bem pouco tempo) a outra grande Sociedade de Advogados, como consultor, a “MLGTS – Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados”, onde está António Lobo Xavier, por exemplo (como administrador executivo e sócio), entre outros. Uma das principais especialidades desta Sociedade de Advogados, a que João Tiago da Silveira está ligado, nem mais nem menos, do que a “assessoria relativa aos contratos Swap, vendedores de produtos (financeiros) tóxicos, informação sigilosa sobre matérias financeiras, etc. Alguns, a maioria, desses contratos Swap foram ruinosos para o Estado: Carris, saldo negativo de 37 milhões de euros); CP, saldo negativo de 77,3 milhões; Metro Lisboa, saldo negativo de 12,4 milhões e TAP, saldo negativo de 2,9 milhões. Moreira Rato, que esteve na presidência do IGCP, despois de ter passado pela Goldman Sachs e a Lehman Brothers (só este curriculum deveria ter sido impeditivo para que Victor Gaspar o nomeasse para aquela presidência), esteve, "ao que parece", envolvido nestes prejuízos (através do ex-BES?), que a MLGTS acompanhou “de perto” (a Sociedade onde trabalha o tal Silveira).
Recorde-se que o Estado (Governo de Passos/Portas) para evitar ir pelo caminho da Justiça para resolver alguns destes sarilhos das Swaps, com vários Bancos (alguns funcionando como Agências de Rating, como a JP Morgan, a Goldman Sach, etc), o que lhe custaria uma pequena fortuna e muito tempo – pois aqueles Escritórios não brincam em serviço – chegou a reservar 900 milhões de euros (!) num orçamento rectificativo. E não viu nenhum desses contratos ser considerado nulo! Em 2013 já tinha, o mesmo Governo, pago cerca de mil milhões de euros aos Bancos que comercializaram contratos Swap com empresas públicas!
Se olharmos para as (longas) lista de clientes das grandes Sociedades de Advogados, encontraremos por lá a nata da Banca, nacional e internacional, alguma dela ligada aos tais Mercados (agências de “rating”), as grandes empresas portuguesas, as PPP, as grandes empresas públicas e ex-grandes empresas públicas (como a EDP, REN, e agora TAP, etc), etc. (E alguns Ministérios são igualmente clientes, embora estes não apareçam como tal nessas Listas, naturalmente).
*E depois, é este governo rejeitado na A.R e esta Direita que se quer manter no Poder. E que exige sacrifícios aos socialmente mais desfavorecidos e fragilizados! Andamos a penar para ajudar estes agiotas, estes especuladores, estes traficantes de influências, esta malta da Finança!
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Numa tentativa de deixar entrar oxigénio no post, permitam que aqui inclua Roberto Alagna, num fantástico Mario, interpretando "E lucevan le stelle" da ópera Tosca de Puccini.
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E desçam, por favor, até ao post seguinte onde partilho convosco um conjunto de fotografias tocantes: crianças sírias refugiadas.
E, a seguir, tenho ainda Teresa Caeiro e, lamento, não é pelos melhores motivos.
Meus Caros, no post abaixo falei das lágrimas que me cobriram os olhos perante o magnífico Pano de Cena pintado por Chagall para a Flauta Mágica e que está no CCB. No post a seguir falei da surpresa que tive ao ler um comentário que alguém muito especial para mim deixou no post sobre o Valverde Hotel de Lisboa.
Mas, agora, que entrem as valquírias!
É que, estando eu nesta boa onda, compreenderão que pouca vontade tenha para sujar os dedos com palavras sobre a forma cobarde e estúpida como os burocratas imbecis que governam a Europa estão a tratar a Grécia. Cobardes, estúpidos, desrespeitadores, acéfalos, broncos. E ainda gozam a pensar que ganham alguma coisa vergando um povo, um país. Gente parva, perigosa.
Compreenderão também que não tenha vontade nenhuma de falar deste PS tomado por maria-amélias que medem cada palavra com medo de que os tomem por perigosos radicais, gente acobardada que parece que só lhes falta andar de fralda, que não são capazes de dizer alto e bom som que governar não é desprezar o povo, não é impedir o desenvolvimento económico, não é amarrar gerações a uma dívida que parece um monstro de mil goelas. Compreenderão que já nem posso ver o António Costa incapaz de formar uma equipa credível, de gente desempoeirada, virada para o futuro, em vez de andar rodeado apenas por meia dúzia de gatos pingados a arrastar os pés como zombies.
(e uma vez mais agradeço ao Leitor que me enviou o artigo que eu, de outra forma, não teria lido que nem tempo tenho para passar os olhos, mesmo que apenas de relance, pelos jornais). Transcrevo a parte do texto que esse Leitor me enviou:
O PS ainda não percebeu em que filme é que está metido. Continuem com falinhas mansas, a fazer vénias para a Europa ver, a chamar “tontos” ao Syriza, a pedir quase por favor um atestado de respeitabilidade aos amigos do Governo, a andar a ver fábricas “inovadoras”, feiras de ovelhas e de fumeiro, a pedir certificados de bom comportamento a Marcelo e Marques Mendes, a fazer cartazes sem conteúdo — não têm melhor em que gastar dinheiro? — e vão longe.
Será que não percebem o que se está a passar? Enquanto ninguém disser na cara do senhor primeiro-ministro ou do homem “irrevogável” dos sete chapéus, ou das outras personagens menores, esta tão simples coisa: “O senhor está a mentir”, e aguentar-se à bronca, a oposição não vai a lado nenhum. Por uma razão muito simples: é que ele está mesmo a mentir e quem não se sente não é filho de boa gente. Mas para isso é preciso mandar pela borda fora os consultores de imagem e de marketing, os assessores, os conselheiros, a corte pomposa dos fiéis e deixar entrar uma lufada de ar fresco de indignação.
Compreenderão meus Caros como fico arreliada, e arreliada é apenas um suave eufemismo, por ter que ser uma pessoa do PSD a dar este abre-olhos ao António Costa.
É tarde e espera-me outro dia dos valentes pelo que tenho que estancar a minha indignação perante tudo isto. Mas a verdade é que fico passada com tudo isto, fico mesmo.
A União Europeia fede entregue a gente que toma decisões para ter votos nas eleições do seu país ao mesmo tempo que amarra os países menos desenvolvidos e mais vulneráveis a pactos incumpríveis e os impede de crescer ou de ter esperança numa vida melhor.
Portugal está entregue a uns Pafs ignorantes, manipuladores, gente incapaz que tem vendido o País ao desbarato, gente que já nem deveria poder sair à rua sem apanhar com grandoladas, gargalhadas, sapatos, tartes e sei lá que mais em cima -- e que, afinal, por aí andam lampeiros, a defecar de alto (pardon my french).
O PS, que tinha tudo para fazer uma oposição de pé em riste, anda armada em sei lá o quê, umas mariazinhas que parece que saíram da sacristia. Nem sei o que pense disto tudo. Ou o PS acorda para a vida e percebe que, se toda a gente acha que o Passos Coelho e o Portas não prestam, mas que, ainda assim, consideram votar neles, é porque não se revêem na forma como o PS está a actuar -- ou vamos ter o caldo entornado nas próximas eleições, ai vamos, vamos.
E enquanto a UE não começar a ter Chefes de Estado capazes, gente com visão, vamos continuar a ter cimeiras que só servem para enterrar cada vez mais o ideal europeu. O cherne foi-se embora mas o aquário ficou cheio de peixe podre. Caraças.
Vou pregar para outra freguesia que já estou farta desta cambada toda. Bolas para isto.
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As imagens mostram a Golden Valkyrie de Joana Vasconcelos. A música é (e desculpem por nem traduzir mas já mal consigo manter-me acordada): The Ride of the Valkyries from Wagner's Ring Cycle at the Met.
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Sem rever nada de nada e a escrever quase de olhos fechados e, portanto, antevendo que haja para aqui mais de mil gralhas, apresento desde já as minhas desculpas.
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E, se me permitem o conselho, desçam até aos dois post seguintes que contêm temas mais agradáveis.
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Desejo-vos, meus Caros leitores, uma bela quarta-feira.
Pode parecer um tema hermético que nos é estranho. Contudo, pode ser uma bomba brutal que nos vai cair em cima. Por cá, o tema ainda não está na agenda mediática mas sabe-se que é um assunto que está a ser conduzido na moita. Percebe-se porquê. No dia em que os europeus acordarem, encontrarão um território a caminho de uma ainda maior devastação, um retrocesso a todos os níveis. Convém aos EUA e aos bananas europeus que ninguém dê por nada para que, quando acordarem, olhem azarinho, não viram? tivessem visto, agora nada a fazer.
Para que quem não saiba o que é o TIPP (Transatlantic Trade and Investment Partnership) também designado por TAFTA (Transatlantic Free Trade Agreement) fique com uma vaga ideia, transcrevo uma parte do texto apologético que se pode ler no site do Governo.
SOBRE O TTIP
O Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento entre a União Europeia e os Estados Unidos da América (TTIP) é um acordo de Comércio e Investimento que está, atualmente em negociação entre dois dos maiores blocos económicos.
Destina-se a eliminar as barreiras comerciais, aduaneiras e não aduaneiras, aplicadas sobre uma vasta gama de setores da economia, facilitando a compra e venda de bens e serviços por empresas, nos dois mercados.
Para além da redução generalizada de tarifas, a UE e os EUA ambicionam eliminar sobretudo barreiras não tarifárias ou pelo menos harmonizar as que sejam mais sensíveis - tais como as diferenças de regulamentos técnicos, normas e procedimentos de aprovação e certificação de produtos e serviços.
As negociações do TTIP têm ainda como objectivo abrir os mercados aos serviços, ao investimento e ao mercado de contractos públicos. Sendo este último extremamente interessante para as empresas portuguesas.
O TTIP é também ambicionado pelo impulso à escala global no sentido da harmonização generalizada e futura das regras comerciais entre países, convergindo para mercados mais eficientes que extraem os verdadeiros benefícios de um Mercado Global.
Como pode a Europa beneficiar com o TTIP
Porque a relação comercial UE-EUA já é a maior do mundo - todos os dias transacionamos bens e serviços no valor de 2 mil milhões de euros - cada barreira comercial que eliminarmos poderá resultar em ganhos económicos muito significativos.
Um relatório independente sugere que a conclusão de um acordo ambicioso poderia resultar em milhões de euros de poupança para as empresas e criar cerca de dois milhões de empregos. Segundo o estudo da Bertlsman Foundation Portugal poderá criar até 42.521 no cenário de maior liberalização de barreiras não tarifárias.
Espera-se que a cada ano uma família média europeia (agregado de até 5 pessoas) possa ganhar mais cerca de 545 euros, devido a um estímulo de 0,5% do PIB na nossa economia, ou 120 mil milhões de euros por ano, assim que o acordo esteja totalmente implementado.
O crescimento económico adicional vai beneficiar todos, já que impulsionar o comércio é uma boa forma de estimular a nossa economia, criando o aumento tanto da procura como da oferta, sem necessidade de aumentar as despesas públicas ou empréstimos.
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Contudo nem tudo o que se sabe sobre o TIPP é tão tranquilizador como se poderia pensar através da leitura do texto oficial. Poderia citar inúmeros documentos mas não vou mais longe, fico-me pela wikipédia:
O Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento, APT ou TTIP (em inglês Transatlantic Trade and Investment Partnership, também conhecido como Trans-Atlantic Free Trade Agreement TAFTA) é uma proposta de acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Estados Unidos, em forma de tratado internacional.
O tratado visa impedir as interferências dos Estados no livre comércio entre os países aderentes. O tratado está a ser negociado em paralelo com a Parceria Trans-Pacífico ou TPP (Trans-Pacific Partnership em inglês).
O acordo é estimado impulsionar a economia da UE em € 120 biliões, a economia dos EUA em € 90 biliões e o restante do mundo em € 100 biliões. As negociações entre a Comissão Europeia e o Governo dos Estados Unidos começaram em Julho de 2013 e alcançaram a terceira rodada de negociações no final do mesmo ano. Este acordo de livre comércio pode ser concluído até o final de 2014.
As negociações continuam secretas depois de um primeiro rascunho ter sido publicado devido a uma fuga de informação. Em Março de 2014 a Comissão Europeia lançou uma consulta pública sobre um pequeno conjunto de propostas.
O projecto está a receber muitas críticas por alguns sectores da política, dos media, de organizações de protecção da natureza e do consumidor e por organizações não governamentais, estando a ser negociado por representantes dos poderes económicos fora do âmbito público e sem o controlo democrático dos Parlamentos Nacionais e do Parlamento Europeu. Os esperados efeitos positivos sobre economia e emprego também foram alvo de críticas, representando as projecções publicadas pela Comissão Europeia o cenário mais optimista e relativas a um período de 10 anos.
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Claro que tudo nos será apresentado como: não há alternativa. Desde há uns anos que, sempre que nos põem a corda ao pescoço, dizem There Is No Alternative (a célebre TINA).
Mas há. Há sempre alternativa. Contudo, para a construirmos, temos primeiro que perceber o que se passa.
O vídeo abaixo, que um Leitor simpaticamente me enviou, é muito elucidativo. Peço a vossa atenção para o que aqui se explica (está legendado em português).
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Sobre o sinistro ISDS aconselho vivamente a leitura da lúcida reflexão As garras do niilismo.
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Leitor, em comentário abaixo, pediu-me que divulgasse os acessos quer ao site em português Não ao TIPP quer ao site relativo à respectiva petição europeia. De bom grado o faço.
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A música lá em cima é Mi Mancherai na interpretação de Josh Groban e é uma tentativa de atenuar a espinha na garganta que é todo este assunto.
Num supermercado em Londres, uma marca de produtos alimentares italianos resolveu surpreender os clientes: cinco cantores de opera disfarçados de empregados ou de clientes, do nada, sem aviso prévio, desataram a cantar o clássico Funiculì, Funiculà.
O espanto foi geral. Uma coisa arrebatadora.
Foi um Leitor que, uma vez mais me enviou este filme e eu aqui digo o que lhe disse a ele: tomara que a mim me acontecesse uma coisa assim, ia adorar, acho que ficaria arrepiada até à medula.
Mas agora que estou a escrever lembro-me que uma vez, num grande jantar em que participei e que decorreu no Museu do Azulejo, houve um momento quase imprevisto. Sabíamos que ia haver um momento de canto e esperávamos uma coisa mais convencional. Contudo, a coisa foi um pouco diferente: um casal de jovens cantores cantou ópera, andando entre as mesas, fazendo jogos de sedução com os convidados, encenando cenas de ciúmes entre eles, uma coisa bem divertida.
Aqui vos deixo com este momento de surpresa e alegria.
Susana Gaspar aqui interpretando interpreta Bodas de Fígaro de Mozart.
No domingo actua já este domingo no BBC Cardiff Singer of the World
¨¨
Mas eu gosto também muito muito desta fantástica cantora. Emociona-me. Acho que tem uma candura intrínseca, uma energia que vem da sua formidável inocência. Não sei dizer.
Ângela Silva interpreta Oh mio babbino caro de Puccini
Choveu hoje, todo o dia a chuva caíu, branda, regular. A casa está fria, húmida. Lá fora tudo molhado, as árvores escorrendo, o musgo subindo pelas paredes.
Aborrece-me cozinhar apenas para mim. Faço uma sopa que me dá para uma semana, asso um frango que dá para uma semana, como saladas, iogurtes, queijos, frutas. Só não me alimento apenas de fruta, chá, frutos secos, porque acho que isso me poderia trazer problemas e não teria paciência para os resolver.
Peguei na máquina fotográfica, saí. Ninguém na rua. O tempo está para se ficar em casa à lareira, não para andar por aí, à chuva, ao frio. Só por saber que não encontraria ninguém é que saí. Custa-me suportar o olhar das pessoas, as conversas tontas, as vacuidades de quem fala por falar.
Saí, uma capa cobrindo-me toda, uma sombra também eu, um fantasma deslizando nas sombras. Fui fotografando sabendo que nem vou olhar para as fotografias, fotografo sem objectivo, apenas por necessidade. Ninguém verá as minhas fotografias. Fotografo banalidades, coisas de nada.
Uma rocha coberta de água, uma hera trepando, uns ramos cobertos de pequenas bagas. Fotografo. Depois passo a mão pela pedra fria, molhada. Quero sentir aquilo que vejo, quero aproximar-me daquilo que me convoca.
Depois fotografo umas folhas molhadas, umas folhas de uma cor belíssima mas que, apesar de serem tão belas, em breve estarão desfeitas.
Emociono-me perante estas folhas caídas. Tempos antes fotografei-as na árvore, estavam verdes e viçosas. Agora aqui estão, inertes, belas mas perecíveis. É tão efémera a beleza. E a vida.
Passo por um muro onde sempre gosto de me deter. No verão a parede está branca e as sombras das árvores reflectem-se nele, enchendo-o de vida e de calor.
Agora está frio, a chuva entristece este muro e o painel de azulejos já não parece desafiador como no verão. Agora parece triste, desolado. Les + grands secrets se cachent dans la lumière. Assim foi toda a minha vida: os segredos escondidos pela luz, visíveis.
O pinheiro parecia coberto de luzes. Talvez seja a forma que encontrou para me lembrar que é quase natal. Ignoro o natal. É um dia como os outros. Um dia de frio e solidão.
Depois voltei para casa. Apeteceu-me pintar. Há tanto tempo que não pintava. Peguei numa tela pequena, depois nas tintas, algumas já estavam secas.
Um vestígio da antiga emoção, a tela branca sugando as cores que ainda resistem dentro de mim.
Quando pinto sou livre. Não tenho objectivos, não tenho motivos, não tenho restrições. Faço movimentos que não controlo, não vigio, não tento, sequer, interpretar. Não quero que pareça nada, não quero nada. Sem pensar escolho uma tinta, depois um pincel, depois a minha mão movimenta-se sobre a tela como se dançasse, depois outra tinta, e a dança continua.
Ninguém me perguntará o que é mas, se o fizesse, eu não poderia responder. Em tempos pintei flores, mulheres, bailados, cidades. Depois, aos poucos, fui conseguindo desfazer-me da realidade, fui conseguindo encontrar a abstracção, a intangível abstracção.
De resto, é assim que vivo, no limiar da abstracção, da intangibilidade.
Alimento-me de recordações.
Há pouco, cavalete, tela, pincéis e tintas arrumados, sentei-me com uma manta sobre os joelhos, peguei num livro. O livro do chá de Kakuzo Okakura. Ultimamente só consigo ler livros assim. O autor é japonês, nascido em 1862. Leio as suas palavras como bebo um chá cuidadosamente preparado,
Por que não destruir flores, se com isso podemos desenvolver novas formas que enobrecem a ideia do mundo? Só lhes pedimos que nos acompanhem no sacrifício ao que é belo. Havemos de expiar o feito consagrando-nos à pureza e à simplicidade. Assim raciocinaram os mestres-do-chá quando estabeleceram o culto-das-flores.
E por estes caminhos feitos de palavras delicadas vou prosseguindo a leitura. Depois volto às minhas recordações.
Lembro o dia em que soube que o velho senhor que tinha sido o meu companheiro de tanto tempo adoeceu. A minha aflição. A minha vontade de ir ao hospital. Mas, claro, no hospital estaria a família e eu não era da família. A bem da verdade, eu não era nada, não existia. Nem podia manifestar a minha ansiedade para não levantar suspeitas. Toda a minha vida foi assim, viver na sombra. Ninguém desconfiar. Uma vida construída em torno deste propósito: ninguém desconfiar. Disfarçar sentimentos, ansiedades, angústias, alegrias.
Tanta vontade de lhe ir dizer que o queria de volta, que resistisse, que não se fosse embora, que me sentia tão sozinha sem ele, que lhe seria eternamente grata por tudo o que tinha feito por mim. Tanta vontade, sobretudo, de lhe dizer que o perdoava por me ter impedido de ter o nosso bebé. Mas não fui. Nunca fui. Nunca soube da minha aflição.
Voltou para casa, debilitado, dependente, com uma enfermeira ao lado. A família por perto. Nunca consegui coragem sequer para lhe telefonar. Uns tempos depois morreu. Chorei, chorei mas em casa, ou quando estava sozinha, ou quando ninguém me via. Como explicaria o meu choro perante quem não sabia de nada? Queria ir despedir-me dele, ir à igreja. Mas não fui. Não suportaria fingir. Não ali, não nessa última vez.
O vazio que fica ninguém consegue imaginar. Nem despedir-me condignamente eu pude, nem chorar me foi permitido.
Dirão que ninguém me impedia. Não sabem o que é viver uma vida paralela, na sombra, uma vida de disfarce, escondida. É uma coisa que toma conta de nós. Se fosse ao enterro e chorasse como uma viúva , como explicaria isso a quem me perguntasse? Diria, ele era o meu homem? Quem me acreditaria? Diriam que era louca. Ou rejeitar-me-iam para sempre. Ah, o medo da rejeição, o medo da censura, o medo sempre tão presente.
Mas, no dia em que o seu corpo arrefecia numa igreja pejada de gente, ao fim do dia, quando a noite começava a cair, ganhei coragem para me aproximar e passei por fora, encostei-me à parede exterior num dos lados da igreja, e ali fiquei sozinha, agradecendo-lhe, desejando-lhe que descansasse em paz. Pensava que ele iria para junto da nossa filha e isso tranquilizava-me pois tinha, e tantas vezes ainda tenho, um pesadelo recorrente, a minha menina sozinha, nua, com frio, perdida nas ruas escuras de uma cidade deserta.
Apesar de separados, era ele que ainda me pagava o condomínio que era muito elevado. Diriam, se o soubessem, que eu aceitava ser comprada, que com a casa, os bons móveis, o carro (sim, porque ele também me tinha oferecido um carro, cujos custos suportava), ele estava a pagar-me. Que erro... Pagar o quê, se eu tão pouco lhe dava? Ele dizia que me amava pela minha juventude, pela minha beleza, pela minha alegria. Mas eu é que tinha razões para estar grata pois os seus conhecimentos, a sua sabedoria, a sua cultura, o seu humor, o seu amor viril, faziam sentir-me uma mulher grata e realizada. Eu é que tinha razões para lhe pagar, tivesse eu como. Era ele que fazia questão de me oferecer tudo aquilo mas fazia-o dizendo eu sou velho, qualquer dia parto e quero que tu fiques bem, aceita, por favor, aceita se me queres bem. A mim nada me custa e, para ti, vai ser importante no futuro.
Quando morreu, fiquei com uma casa grande de mais, um condomínio caro de mais, um carro caro de mais. Durante uns anos, lutei para os manter, pela sua recordação. Não queria desfazer-me do que ele me tinha dado com tanta preocupação pelo meu futuro mas, suportar aquelas despesas, era-me, então, muito difícil.
Nunca dizia a ninguém onde vivia. Como explicaria um luxo daqueles? Um ordenado como o que eu tinha jamais daria para uma casa daquelas. No entanto, aquele que o meu coração mais amou e de quem já vos falei foi lá muitas vezes. Quando lá entrou, não queria acreditar. Expliquei-lhe que era uma herança de uma tia. Não sei se acreditou mas riu-se, uma gargalhada das suas, isso é que são tias...!
Depois, mais tarde, quando me cansei de tudo, desfiz-me da casa e do recheio. Mudei-me para um apartamento pequeno, um apartamento de acordo com o que eu podia pagar. Depositei o dinheiro da venda do outro e ainda lá está, nunca mais lhe toquei e acho que nunca vou tocar.
Quantos amores tive depois dele? Amor a sério só um. Mas tive mais uns romances. Talvez vos conte. Mas foram irrelevantes. Em todos procurei o verdadeiro amor, em todos procurei o amor para toda a vida, uma companhia. Nunca consegui. Por isso, aqui estou, sozinha, uma manta sobre os joelhos, a falar para ninguém.
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Este texto continua a história que venho contando nos últimos dias e à qual ainda não dei nome, porque ainda não percebi onde é que isto vai parar.
A música é Un bel di vedremo da ópera Madama Butterfly de Puccini, aqui interpretada por Maria Callas.
As fotografias são minhas e foram feitas in heaven. A última é a excepção: é de Catherine Deneuve e não sei por quem foi feita.
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Permitam ainda que vos convide a permanecerem um pouco mais na minha companhia. No meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa, ao som de Elger, as minhas palavras distanciam-se daquele que me ama, ao lado das palavras de Eugénio de Andrade.
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E, por hoje, já chega, não é?
Desejo-vos uma boa semana a começar já por esta segunda feira. Divirtam-se, está bem?
Lembro-me de um dia, lembro-me tão bem como se fosse hoje, em que aquele que o meu coração mais amou tinha uma reunião numa segunda feira. Arranjou maneira de ir logo ao fim da tarde de sexta feira e levou-me com ele. Nunca eu tinha estado em Paris. Que emoção. No aeroporto fingimos que não nos conhecíamos não fosse o diabo tecê-las. Mas depois, ah que deslumbramento, namorados clandestinos, só nós dois contra o resto do mundo, um amor tão doce.
Protegidos da rotina, protegidos do lado aborrecido da vida - a mulher teria o lado oficial, o papel passado, mas eu e ele tínhamos o namoro, a paixão nunca totalmente concretizada, a que clamava sempre por uma próxima vez - vivemos Paris, a cidade do amor, como se vivêssemos um sonho. Passeámos, fizemos compras, foi lá que ele me ofereceu aquele caso de pele, eu não queria, tão caro, tão caro, uma fortuna, não, não, mas ele fez questão, foi lá também que ele me ofereceu este relógio, mas tanto dinheiro, levo-te à ruína, não quero, mas para que é tanto luxo? Mas ele dizia que eu merecia isso e muito mais, andámos de mão dada, andámos de braço dado como um casal, e isso foi, talvez, o melhor, tanto que eu desejava isso, andar na rua como se fossemos um casal, que felicidade. Fomos à ópera, conheci a biblioteca, fomos a museus. Tanta coisa em tão pouco tempo.
E, de noite, eu era a sua modelo, a sua boneca, a sua dócil criatura.
Tinha-me também oferecido uma lingerie, uma loja que só visto ali para os lados da Pigalle, e quis que eu a experimentasse. Experimentei. Quis que eu deixasse que me fotografasse. Deixei. Podia lá eu negar-lhe algum pedido?
Mas não vou agora fingir que o fiz contrariada. Fiz porque quis. Acedi sempre a tudo porque quis.
Quando ele apontava a máquina fotográfica na minha direcção parece que eu ficava outra, parece que me desinibia, que me inspirava. De lingerie preta, a fumar, exalando sensualmente o fumo, sentindo-me apetecível, uma irresistível sedutora, oferecendo-me sobre a cama, sobre o sofá, eu tinha um enorme prazer em vê-lo excitado enquanto me fotografava.
Quanto mais ele se descontrolava, doido de excitação, mais eu provocava, oferecendo-me languidamente à objectiva.
Foram noites de grande prazer, não o escondo - porque haveria de esconder?
Enquanto me fotografava costumava pedir-me, ensina-me a arte de amar, ensina-me como só tu sabes.
E eu, de olhos semicerrados - enquanto fazia deslizar vagarosamente a alça do corpete, enquanto deixava antever, devagar, devagar, o seio, aos poucos, aos poucos até ao mamilo - com voz baixa, quase rouca, ia ciciando,
Antes de mais, tem confiança no teu coração de que todas podem ser conquistadas; e vais conquistá-las; basta que estendas as redes Tal como Vénus furtiva é grata ao homem, assim o é também à mulher; o homem disfarça mal; ela é com mais recato que alimenta o desejo. Se aos homens der mais jeito não serem os primeiros a pedir, logo a mulher, vencida, há-de assumir o papel de quem pede. Na mansidão do prado, é a fêmea que solta mugidos ao touro, é a fêmea sempre que relincha ao cavalo de rijos cascos.
E ele, o meu amado, o meu devoto fotógrafo, disparava, disparava, quase sem ver, enlouquecido pela minha voz, pelo meu corpo, pela minha sensualidade.
Pelo menos uma vez por dia, geralmente de manhã e antes de sairmos para jantar, ele colocava-se junto à janela, de pé, e falava com a mulher. Relatava reuniões intermináveis, negociações complicadas, falava das saudades que tinha, pedia para falar com os miúdos, prometia presentes, enviava beijinhos. Eu ouvia com indiferença, e pensava é um filme, mente à mulher para poder estar comigo, prefere estar aqui comigo do que a aturar a vaidosa, a fútil, a palerma da mulher, e sorria, superior, agradecida por ele ser o amante querido que eu tanto amava.
O relógio é este, uso-o sempre, é lindo. Olho as fotografias, estava bonita eu, sentia-me tão irresistível, achava que ia ser tão feliz. Achava que ia voltar muitas vezes para ser feliz outras tantas. Paris. Paris. Que saudades.
Não voltei.
Regressámos a Lisboa na terça feira. Antes de abandonarmos o hotel, quando íamos a sair do quarto, ele puxou-me por um braço. Abraçou-me, beijou-me. Temos que fazer as despedidas agora porque no aeroporto ou no avião não dá, não vá alguém que me conheça ver-me. Aceitei. Beijos apaixonados e abraços apertados e quentes não se podem rejeitar. E feliz como estava, porque haveria eu de rejeitar?
Quando o avião aterrou ele disse-me que a mulher e os filhos o iam buscar e que era melhor não sairmos juntos. Foi uma decepção que tive, porque é que não me avisaste antes?, mas ele encolheu os ombros como se fosse coisa sem importância. Aceitei, estava habituada a aceitar, estava já tão habituada a viver na sombra.
Penso agora nisto e vejo que toda a minha vida arrastei as sombras como se fossem pesados mantos que me cobrissem.
Ele saíu, não tinha que esperar pela bagagem, levava apenas uma mala que cabia nos compartimentos da bagagem de mão. Eu não, eu tinha uma mala maior, carregada.
Quando me vi no aeroporto sozinha, arrastando uma mala pesada senti-me insignificante, senti uma tristeza. Mas mais triste fiquei quando, indo eu a arrastar a mala, sem ninguém que me ajudasse, o vi abraçado à mulher, de mão dada com um dos filhos, sorridentes, felizes, uma família feliz. Iam a sair do edifício, não me viram e eu fiquei ali parada, sentindo-me um nada.
Fui para a fila dos táxis, já era de noite, e eu ali sozinha. A bela mulher que eu era, tão desejada, tão amada, de repente ali sozinha. Que pena tive, então, de mim.
Cheguei a casa e tão desfeita me sentia que, nesse dia, nem tive coragem de desfazer a mala. Tinha-me chocado o ar de família feliz, tinha-me chocado a forma como ele se tinha livrado da minha presença, como se eu não tivesse sentimentos. Eu era a outra, a que tinha que se sujeitar a tudo, a que recebia presentes, beijos, noites de amor num hotel e ponto final. Claro que eu sabia que era a outra mas a outra é tão mulher, tão humana, tão frágil, como qualquer outra pessoa, como a mulher legítima.
Mas nunca lhe falei nisto. Prosseguimos a nossa relação como antes. Sempre consegui disfarçar muito bem o que sinto, sempre calei as minhas mágoas, sempre me contentei com o que me davam, sempre esperançada em que um dia teria tudo aquilo que desejava. Nunca tive.
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Este texto é a continuação do penúltimo e do antepenúltimo textos. Ainda não dei um nome a esta história nem a esta mulher porque ainda não sei se vai ter continuação. Se vier a ser uma história talvez lhe fique bem o nome Casta Diva e talvez a mulher possa vir a chamar-se Maria Beatriz.
A música é, justamente, Casta Diva de Bellini, aqui interpretada por Cecilia Bartoli.
Catherine Deneuve aqui é retratada por Helmut Newton. Contudo, desconheço a autoria da última fotografia.
Continuo a não identificar o texto em itálico e isso é deliberado.
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Hoje no Ginjal encerro o ciclo que dediquei a Ernesto Lecuona com dança. O Grupo Corpo dança Te he visto pasar e a música, a voz e os corpos são uma maravilha. Não quererão ir até lá, deitar uma espreitadela?
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Chove que é uma maravilha. Os campos e as barragens agradecem a chuva que cai com vigor. Vejo-a lá em baixo, contra um fundo escuro, iluminada sob a luz do candeeiro.
Aproveitem, meus caros leitores, o encanto de um fim de semana chuvoso e frio.
Com que palavras ou que lábios
é possível estar assim tão perto do fogo,
e tão perto de cada dia, das horas tumultuosas e das serenas,
tão sem peso por cima do pensamento?
Pode bem acontecer que exista tudo e isto também,
e não só uma voz de ninguém.
Onde, porém? Em que lugares reais,
tão perto que as palavras são demais?
Agora que os deuses partiram,
e estamos, se possível, ainda mais sós,
sem forma e vazios, inocentes de nós,
como diremos ainda margens e como diremos rios?
[O poema de Maria Teresa Horta, uma mulher on fire, chama-se Segredo e é lido por Pedro Lamares; a mulher de longos cabelos e corpo de intangível pássaro é Sylvie Guillem; a mulher ardente como costumam ser as ruivas é Patricia Petibon interpretanto Giulio Cesare de Antonio Sartorio; e o poema é 'Passagem' dedicado a Inês de Manuel António Pina in 'Como se desenha uma casa']
Hoje não estou para grandes palavreados porque há tanta coisa estúpida a acontecer, cá e mundo fora, e vejo tanta gente estúpida a fazer disparates à tripa forra achando-se empossado para tal (e, caraças! - de facto, foram-no porque quase tudo o que de pior se vê a acontecer, acontece no mundo civilizado, democrático, em que os governantes são eleitos pelo voto popular), que vou deixar-vos com três clips que dão gosto.
1. Já aqui anteriormente referido, O Triunfo dos Porcos ou a Quinta dos Animais do escritor inglês George Orwell foi escrito originalmente para parodiar o regime estalinista. Contudo, a alegoria foi tão bem urdida que pode ser vista como actual e adequada a muitas situações actuais.
A forma como os princípios que eram usados como bandeira antes de tomarem o poder foram totalmente adulterados logo que chegaram ao poder, as críticas aos governantes anteriores e as promessas que foram de imediato metidas na gaveta, a forma despudorada como usam o poder para seu benefício pessoal, o desprezo que revelam pela população que vai sendo explorada e empobrecida - tudo isto é uma história que conhecemos muito bem. Snowball e Napoleon, dois porcos muito conhecidos.
2. O filme Novecento (1900) de Bernardo Bertolucci, 1976, com Robert de Niro, Gérard Depardieu, Donald Sutherland, Burt Lencaster, Alida Valli, Dominique Sanda, é um filme épico, que não se esquece, e que decorre em Itália num período de guerras, pobreza, exploração, revolta, luta pelos legítimos direitos.
3. Nabucco é uma ópera de Verdi (1813 - 1901) que conta a história do rei Nabudonosor da Babilónia, foi escrita durante a ocupação do norte de Itália pela Áustria. O 'coro dos escravos hebreus' tornou-se quase um hino, a música que os italianos sentiram como o seu grito de amor por Itália, contra os ocupantes. No enterro de Verdi muitos milhares de pessoas acompanharam a sua despedida, entoando as suas músicas e, muito em especial, este 'va, pensiero'. Vai, pensamento, com asas douradas. Vai, pensamento.
No post abaixo fala-se de coisas sérias mas aqui, meus amigos, aqui mostram-se coisas importantes.
Joseph Stiglitz e de Dilma Roussef, a seguir, explicam porque são tão contrários às suicidárias políticas que estão a ser impostas à Europa. Mas isso é a seguir. Agora, meus caros, estamos na companhia de Jean Paul Gaultier. Faites vos jeux. Escolham que há para quase todos os gostos. E, no fim, receberão a cereja: Renée Fleming, elle-même, a belíssima Casta Diva.
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Ok, se já estão com a alma apaziguada, desçam, então, um pouco para se atormentarem um bocadinho que isto de se viver alienado não é lá grande ideia....