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terça-feira, outubro 04, 2011

Onde se refere a entrevista de Artur Pizarro ao Expresso na qual fala da sua homossexualidade e onde eu aproveito a boleia para dizer de minha justiça


Na revista Única do Expresso de sábado passado li uma interessante entrevista do pianista Artur Pizarro. Conhecemos a obra e não conhecemos a pessoa e, ao sabermos algumas coisas, ficamos surpreendidos. Sabemo-los cosmopolitas, viajados, reconhecidos, sorridentes, virtuosos e nem nos lembramos que são pessoas tal como nós.

Vi, pelas fotografias, que está bem mais magro do que o tinha visto há algum tempo e, de facto, confirmou que fez dieta, faz exercício, que está bem melhor assim, parece outro.


Sabia que tinha sido aluno de Sequeira da Costa mas não sabia das tensões entre eles nem que este se tinha tornado padrasto dele. 

Nada disto acrescenta ou retira valor à mestria das suas actuações mas somos assim, todos um pouco voyeurs, parece que teremos mais estima pelos artistas se partilharmos um pouco da vida deles.

Mas o que me deixou admirada foi ele ter dito que viveu, em negação e desespero, a descoberta da sua homossexualidade e que a mãe deixou de lhe falar quando o soube. Agora isso está ultrapassado e desde há alguns anos está casado com o seu parceiro de mais de uma década, a mãe foi ao casamento mas, pelo que ele diz, percebe-se que há ainda ali uns aspectozinhos a acertar.

Permito-me comentar este aspecto tão pessoal porque consta da entrevista que concedeu. Caso contrário, seria coisa que nem me ocorreria referir.

Cada pessoa apenas pode falar por si e, por isso, longe de mim censurar a mãe dele ou todas as mães que reagem com susto e contrariedade ao saberem que um filho é homossexual. Há questões culturais que, provavelmente, se sobrepõem à racionalidade.

Se algum dos meus filhos fosse homossexual – e eu acho que descobriria isso ainda antes deles próprios o descobrirem – presumo que ficaria preocupada mas preocupada sobretudo por antever que iriam ter a vida mais dificultada do que se o não fossem; e acho que tudo faria para os apoiar e ajudar. Mas sei lá, só perante as situações é que a gente pode saber.

Comecei a falar muito cedo e muito cedo comecei a ser afectuosa, alegre. Mais tarde, na adolescência, tornar-me-ia um pouco mais tímida e reservada, mas na minha infância era daquelas crianças faladoras, alegres, com quem toda a gente se metia e que sorria e falava com toda a gente.

Logo muito pequena tive um grande amigo, que manteria como grande e especial amigo até aos meus 10 anos. Ele era 1 ano mais velho que eu e era o meu oposto, tímido, reservado. Mas gostávamos muito um do outro e corríamos the extra mile para brincar um com o outro.

Uma das recordações que tenho muito clara é de como eu gostava de lhe dar beijinhos e de andar de mão dada com ele, dizendo que era o meu ‘rapaixonado’. Toda a gente me corrigia mas eu achava que a palavra ficava incompleta se lhe tirasse o r inicial. Já mais crescidinha, condescendi mas sempre com a interior sensação de estar a descalçar a palavra. As pessoas riam-se de me ver assim, menininha pequenina e já dengosa e, na brincadeira, perguntavam-me ‘O que é o Gu?’ e eu respondia confiante, ‘É o meu rapaixonado’ e abraçava-me a ele, que ficava envergonhado com as minhas públicas demonstrações de amor. Mas para mim era uma atracção natural.


Na infantil e na primária, adorava fazer-lhe ciúmes com outros meninos que gostavam de mim, via que ele sofria e mais ainda eu fazia (coisas já de mulher) mas, depois, era para o pé dele que eu ia e era com ele que eu brincava depois das aulas (a minha avó, em casa de quem eu ficava até ir para a minha casa, morava ao pé dele).

Mais tarde, separámo-nos porque fomos para escolas diferentes e aí, de novo, eu voltei a apaixonar-me por um outro menino. E depois por um outro, naquela natural volubilidade da adolescência.

Até que, ainda novinha, comecei a namorar mais a sério, e, depois, um pouco mais tarde, mudei de namorado e casei-me.

Quero com isto dizer que sempre me senti atraída pelo sexo oposto e sempre o assumi e demonstrei com naturalidade. A minha afectuosidade sempre foi expressa e retribuída abertamente, sem medos, sem vergonhas, às claras.

Mas não é por minha opção que sou heterossexual, nem foi por educação, nem foi pressão da sociedade. Nasci assim. E de uma coisa eu estou certa: se por uma qualquer inversão de factos, fosse suposto eu negar ou esconder ou mesmo disfarçar a minha orientação sexual, ficaria absolutamente incomodada e infeliz. Não consigo imaginar-me a fingir-me atraída por mulheres ou a simular algum relacionamento íntimo com mulheres. Seria uma violência extrema sobre a minha natureza. Extrema e injustificável.

Por isso, também não concebo que alguém tenha que esconder ou negar a sua homossexualidade. É igualmente violento e injustificável. Nem concebo que se descrimine, censure, evite, rejeite alguém, seja por que for ou para o que for, por ser homossexual.

Ellen Degeneres e Portia de Rossi

Acho uma coisa do além as pessoas que tentam fazer-se passar por heterossexuais, namorando ou mesmo casando com pessoas do sexo oposto, quando a sua natureza os puxa para pessoas do mesmo sexo. Que vida vivem essas pessoas? Porquê? A troco de quê?

Deve ser massacrante forçar a própria natureza, deve ser um suplício andar a esconder, andar com medo que descubram. Para quê?

Porque não assumir transparentemente, viver a vida normalmente? É que a vida é tão curta para ser desperdiçada por motivos tão estúpidos.

Haverá pessoas que espreitem de lado, que comentem… e daí?

O que é preferível? Eu acho que mais vale enfrentar de cabeça erguida e sem receios alguns eventuais olhares de soslaio do que viver uma vida atormentada.

E também acredito noutra coisa: imagino que não seja pelo facto de se ser homo ou heterossexual que o relógio biológico funcione de maneira diferente. Imagino eu que uma mulher ou um homem senter o instinto de ter um filho seja qual for a sua orientação sexual. E, vivendo num ambiente familiar de afecto, não vejo por que não terem filhos. Devo dizer que, no entanto, me faz um pouco de impressão pensar numa criança criada por dois homens mas isso é porque acho que o colo aconchegante de uma mãe não tem comparação com o colo de um pai mas, enfim, isso já é uma impressão minha. Se um casal masculino se sente capaz disso, com jeito, com dedicação, afectuosidade, também não vejo porque não hão de poder ter filhos. Quantos casais heterossexuais há que são completamente disfuncionais, secos, incapazes de disponibilidade ou de afecto? Isso é que é mau para se criar uma criança. E, além do mais, haverá sempre o colinho doce e fofo das avós.


Elton John, David Furnish e o filho de ambos
 E o resto que se dane.

Se ao fim de séculos de civilização ainda há pessoas que não sabem que a natureza tem destas coisas, problema o delas.

Eu acho que há várias coisas importantes nesta vida mas, de entre elas, uma se destaca: desde que estejamos dentro da lei, que não estejamos a comprometer negativamente o futuro, e desde que não estejamos a fazer mal a alguém, deveremos tentar ser felizes. Uma pessoa feliz não apenas não desperdiça o bem escasso que é o seu tempo de vida como ainda torna felizes os que estão à sua volta.

Por isso, meus queridos amigos, seja qual for a vossa orientação sexual, assumam-na e sejam felizes!




[Não fiquem por aqui, meus Caros, desçam um pouco mais para recolherem o vosso ingresso na Música no Ginjal, ok?]