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sexta-feira, agosto 03, 2018

Bibliotecas onde se sente a pátria portuguesa





Por algum motivo de que agora não me lembro bem -- mas que tenho ideia que tem a ver com a longa noite fascista -- a palavra pátria não tem conotações lá muito boas. Ou, então, isso é fruto da minha imaginação. Pode ser.

Mas eu gosto do conceito pátria. Gosta da minha pátria. Em especial, identifico-me com aquela coisa de a minha pátria ser a língua portuguesa. Essa ideia é daquelas bem paridas: ouvindo isso a gente quase sente vontade de jurar a pés juntos que, pela língua portuguesa, morrerria.

E depois há aqueloutro território: o dos livros. Podia fazer uma casa só com livros: as paredes feitas de livros, uma cama, um banco, uma mesa. Livros. Um caminho feito de livros. Podia viver no meio de livros.

Não sei se uma pessoa se revela através dos livros que possui. Admito que sim.


Já vos contei que, de vez em quando, não tendo especial má impressão de uma pessoa, quase fico a desprezá-la quando me conta, deliciada, a porcaria de livro que anda a ler? A sério. Disfarço, claro. Mas vem uma tal onda de rejeição cá de dentro...

Ou música. Por exemplo, não tinha muito má ideia de uma certa criatura. No outro dia fiz uma viagem com ele. Às tantas, resolve pôr a sua play list. Fogo... Lá uma ou outra que se aproveitava mas, a maioria, uma basbaquice, uma pimbice... E o tipo todo contente. E eu, por dentro, 'és cá um belo basbaque...'

Bem. Falava eu de livros.

A ver se nas férias de verão convenço o meu marido a ir ao Ikea comprar uma estante alta e a levar a estante pequena para o hall dos quartos. Ando nesta luta há séculos... e ele recusa-se. Quer o hall desatranvacado e não quer ir ao Ikea. Mas já não tenho onde pôr os livros. Por exemplo, agora tive cá, até há pouco, três meninos. Os pais foram comprar bicicletas e deixaram-nos cá. As crianças queriam sentar-se no cadeiraozinho pequeno e tiveram que estar a tirar-lhe os livros de cima. Felizmente não quiseram ir para um sofá para onde gostavam de ir e que agora está soterrado por livros. Acho que tantos os livros que nem perceberam que, por debaixo, estava o sofá que era de estimação.


Claro que, se vier a conquistar a estante nova, já sei que vou ter a mesma tentação de sempre: repovoar de novo toda a biblioteca. Enfim, repovoar mais ou menos. Tirar tudo, tudo, para fora e voltar a reordenar, redefinir critérios, arrumar direitinho, à larga, deixar ficar espaço livre para acomodar novos.

Uma coisa que, um dia que tenha tempo para mim, hei-de fazer é andar a conhecer bibliotecas, ver qual a organização, espiar os critérios, deleitar-me com obrasfantásticas, respirar o cheiro bom dos livros.

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Estas três que aqui partilho convosco são três das mais belas bibliotecas do mundo. Conheço as duas situadas em Portugal e confirmo que são especiais, belíssimas. Poderão ver outras em The world's most beautiful libraries – in pictures, artigo do The Guardian -- baseado em In a new Taschen book, the Italian photographer Massimo Listri travels around the world to some of the oldest libraries, revealing a treasure trove of unique and imaginative architecture

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E porque de palavras se fazem os livros e de livros as bibliotecas, aqui vos deixo algumas belas palavras ditas por quem as tão bem sabe dizer e escritas por quem as sabia arrancar da terra e de dentro do corpo


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A 1ª fotografia é da Biblioteca do Covento de Mafra

A 2ª fotografia é o Real Gabinete Português de Leitura no Rio de Janeiro

A 3ª é a Biblioteca Joanina de Coimbra

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Desejo-vos um belo dia

domingo, abril 17, 2016

E, no fim, comi um fradinho


Há pouco contei-vos da inteligência que se percebe no olhar dos animais e mostrei-vos o porte majestoso das aves de rapina de Mafra. Vi-as, altivas, nos claustros do Convento que, este sábado, estive a visitar.



Agora estou em casa do meu filho a tomar conta dos meus fofinhos lindos que já estão a dormir já que os pais foram jantar com amigos. 

Antes estive em casa dos meus pais, o meu pai sempre impaciente, com pressa, pressa de jantar, pressa de se despachar, pressa de ir dormir, pressa que eu me vá embora, pressa de tudo, não se percebe porquê mas, enfim, sempre foi apressado e agora, apesar de não ter motivo para ter pressa, continua na mesma. Uma vez, não sei se aqui já o contei, disse à senhora que o lava, levanta e dá de comer: 'Vá despache-se, depressa, vá que eu hoje vou morrer'. Ela desatou a rir 'Oh senhor, então e está com pressa para ir morrer...? Duma destas é que nunca tinha ouvido falar...'. De vez em quando tem destas maluquices. Mas depois, outras vezes, aliás, a maior parte das vezes, tem boa memória e bom raciocínio. Hoje a senhora estava a conversar com a minha mãe e a dizer que a máquina de lavar roupa tinha dado o berro, que, mal a ligava, desatava a fazer barulho e não trabalhava. Pensavam que ele não estava a prestar atenção. Pois saíu-se com esta 'Isso deve ser a correia, ou soltou-se ou partiu-se'. É aleatório, tanto pode dizer coisas normais e estar bem como, sem motivo aparente, estar impaciente, enervado e a dizer palermices. 

A minha mãe estava com dores nas costas mas sempre com os seus projectos, a ensaiar alternativas para fazer um poncho de crochet em linha crua para a neta, às voltas com o seu smartphone (ainda não lhe falei nisto aqui...) e sempre com ideias. Se lá apareço com o cabelo apanhado, não gosta, prefere ver-me com o cabelo solto. Ora eu, ao fim de semana, não me apetece ter nada a moer-me a paciência, nem sequer o cabelo a ir-me para a cara, especialmente se estiver vento. Mas hoje fiz-lhe a vontade, soltei o cabelo. Diz que rejuvenesço dez anos. No fundo, acho que ela se esquece da idade que tenho, gosta de me ver de uma maneira que a faz esquecer-se disso.

Antes de lá ir visitá-los e levar algumas compras mais pesadas, tínhamos estado a passear entre a Ericeira, a zona mais campestre de Sintra e Mafra. Ontem tinha-me lembrado de ir visitar a biblioteca do Convento de Mafra e aproveitámos para andar a passear pela região.


E ainda andei à procura dos antiquários que tinha ideia de serem em Odrinhas e que, afinal, parece que são em Sta Susana mas o meu marido, sabendo o programa de festas que tínhamos pela frente, não quis andar a perder tempo à procura -- fica para uma próxima. 

A Foz do Lisandro

[Entretanto, já estou em minha casa, já estive a cear (quatro morangos com kefir) e, como é costume, já estou cheia de sono. Por isso, terei que abreviar. Ou seja, vou poupar-vos.]

A primeira vez que visitei o Palácio Nacional de Mafra era pequena. Foi uma tortura, salas e salões, enormes, quase vazios, tectos lá muito em cima, uma coisa interminável. Os meus pais queriam ver a biblioteca e a biblioteca ficava lá no fim de tudo. Ao fim de tantos anos, essa primeira imagem ainda está nítida dentro de mim.
É este e é o de Vila Viçosa. Aliás, na minha cabeça, é frequente misturá-los. 
Por isso, hoje tentei ver se já era possível fazer um atalho, ou seja, comprar bilhete só para a biblioteca; mas a senhora disse-me o óbvio: a biblioteca é no fim, para lá chegar tem que se passar por todo o convento. Ou seja, mantinha-se o que, para mim, seria um suplício.


Contudo a nossa percepção das coisas vai-se alterando e desta vez o Convento, sendo mesmo muito grande, já me pareceu de uma escala mais comportável do que aquela que, até aqui, persistia em manter-se gravada na minha memória.


No entanto, tenho que confessar que há aqui, para mim, uma dimensão excessiva, uma certa aridez decorativa (se é que assim me posso expressar), parece que há uma desmesura naquelas dimensões que faz com que se torne um pouco inóspito. Falta-lhe aquela imagem de conforto dos espaços verdadeiramente habitados. Nunca o terá sido a ponto de haver cunho pessoal de forma vivida.

Gostei de ver, e já não me lembrava, a parte das enfermarias e a parte das celas. O edifício é extenso e uma pessoa retém aquilo a que, na altura é mais sensível. Não tinha ideia nenhuma de já ter visto estas partes.

O dinheiro do Brasil era muito e e a obra quis-se imponente, que ninguém se poupasse a esforços. Tivesse eu a cabeça mais fresca e escolheria para aqui uns excertos do Memorial do Convento que o ilustram mas já não dá, estou a precisar de acabar isto e ir dormir.

Por isso, mostro apenas algumas fotografias. Claro que escolhi algumas das partes de que mais gostei. Há tectos fantásticos, há salas bonitas, há corredores lindíssimos no belo lioz rosa e cinza, há quadros de grandes dimensões, há impressionantes candelabros, espelhos, e cortinados que tornam alguns espaços deveras acolhedores, em especial as zonas mais íntimas.







Sala de Música


Candeeiro da Sala de Caça





E a igreja imponente, bela, de uma dimensão impressionante.
Devia ir haver um casamento porque vi estarem a chegar umas pessoas ultra aperaltadas e, não fora o não me poder dar a esses desfrutes dado ter os afazeres inadiáveis de que acima já falei, e teria lá ficado a fazer a reportagem.

Finalmente, então, a Biblioteca. Decepção: só podemos chegar um pouco para além da entrada. Eu queria circular, cirandar, espreitar as lombadas dos livros. Nada. Perguntei à senhora que lá estava a que se devia isso. Respondeu-me que têm falta de pessoal, que não podem deixar circular. Paciência.


As fotografias foram feitas, pois, a partir do exíguo espaço onde me pude movimentar. Mas a Biblioteca é linda, ampla, luminosa, aquelas cores suaves que resultam da pedra, dos livros, do pavimento, das entradas de luz.






É pena que não haja visitas guiadas ao longo dos corredores, varandins e estantes e que não haja leituras de excertos do Memorial do Convento ou música de câmara na sala de música. Mas, enfim, se há área em que está tudo, ou quase tudo, por fazer é na área da Cultura. Tomara que o País acorde para essa imperiosa necessidade.

Seja como for, obviamente gostei muito de revisitar este espaço.

Depois, deu-me a fome e fomos até a uma pastelaria logo ali em frente -- e, sem pestanejar, atirei-me a um fradinho. Retirei-lhe a envoltura e quando o tive despidinho nas minhas mãos, chamei-lhe um figo. Doces mas não muito, húmidos e bem apaladados, os fradinhos comem-se que é uma maravilha. Claro que, com o meu bom apetite e gulosa como sou, estava capaz de despachar meia dúzia de seguida. Mas, enfim, algum comedimento é necessário e, portanto, fiquei-me só por um. O meu marido, que gosta de me ver feliz, ainda sugeriu que os trouxesse eu para casa. Mas não, resisti. Tentações, sim, mas das que não causam grandes estragos. É que com seis fradinhos não sei não, capaz de passar para o tamanho XXL.

No fim ainda olhei para o alto, esperançada que os sinos tocassem. Mas não. Silenciosos. Pena.

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Lá em cima, cantando, segundo leio no youtube é Myriam Madzalik num Concerto de música de Mozart na Basílica do Convento de Mafra.
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Mas este post não ficaria completo sem qualquer coisa sobre o Memorial do Convento. Aqui está.

José Saramago - Memorial do Convento


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E queiram, por favor, descer até às aves de rapina (e a uma recordação minha, sempre tão sentida,  da minha cadela mais querida).

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