Daquelas coisas. Estava no aeroporto, em Londres, com dois estarolas que me deixavam sempre com a sensação de estar perdida no meio daquela e de outras Babilónias, quando olho para o lado e vejo o Nureyev. Fiquei naquele estado em que a gente fica quando tem vontade de deixar cair o queixo mas, ao mesmo tempo, não quer fazer um papelinho. Disse-lhes a eles: 'Já viram? O Nureyev...'. Olharam e prosseguiram a conversa, sem ligarem patavina. Estavam para negócios e coisas assim, não para danças, muito menos para bailarinos. Ou ex-bailarinos que, naquela altura, já ele estava a caminhar para o seu final. Morreu cedo, ele. Tinha um ar solitário, ele, ali no meio daquela multidão. Fiquei a olhá-lo como quem não quer a coisa, queria ver como andava, queria saber se deslizava.
Ou seja, com Nureyev, ao vivo, foi só isto.
Já com o Baryshnikov foi diferente. Gostava muito dele, era o bad boy da dança. E confirmei a boa razão da minha gostação ao vê-lo dançando, ao vivo. No CCB. Uma maravilha. Aqueles saltos, saltos altos, velozes, aquela leveza. Um voador irreverente, provocador. Provocava a gravidade, provocava a lei dos homens.
No outro dia, ao ver como vários bailarinos russos se demarcaram da barbárie putinista, saindo do Bolshoi e botando cá para fora tudo o que pensavam, pensei cá para os meus botões: que será feito do Baryshnikov? O que dirá ele desta pouca vergonha?
Pois bem: aqui está. Não que eu tivesse dúvidas pois não creio que haja gente decente que seja capaz de não condenar abertamente Putin. Mas, enfim, tenho tido algumas surpresas. Pessoas que julgava serem decentes estão, afinal, presas num qualquer labirinto moral ou intelectual e, em vez de condenarem o invasor e agressor, condenam o invadido e agredido por não se render.
Mas aqui não havia muito que enganar. Como não podia deixar de ser, Baryshnikov condena, lamenta. Diz que, de certa forma, já o previa. Diz que não tem medo de Putin, diz que não tem muito a perder.
E fala também do seu último trabalho. Um gosto. Ouvir falar pessoas inteligentes, experientes, com vida e com graça é uma bênção.
Mikhail Baryshnikov on "The Orchard" and Putin's war
Jun 19, 2022 At the Baryshnikov Arts Center in New York City, dancer and actor Mikhail Baryshnikov stars in an adaptation of Chekhov's "The Cherry Orchard," a story whose themes of loss and freedom echo with Russia's invasion of Ukraine. He talks with correspondent Anthony Mason about the production, and how the dancer, who has remained largely non-political since his 1974 defection from the Soviet Union, says he can no longer stay silent over what he calls Putin's war.
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E, já agora, já que aqui estamos, que Mikhail nos ilumine o espírito com o seu corpo maleável, musical e atrevido
Mikhail Baryshnikov in White Nights - "Capricious Horses"
Há coisas que se intuem mas que, em concreto, se desconhecem e que, quando uma pequena ponta é revelada, nos levam a perceber que a tecnologia já avançou para campos nos quais os sistemas políticos ainda não conseguiram penetrar.
Sempre achei que a tecnologia avança mais rapidamente do que a capacidade de as organizações se adaptarem. É frequente, em diversos contextos, eu dizer isto.
Há temas que, por não terem que ver com questiúnculas caseiras ou fofocas internacionais, nos passam ao lado. Mais: se alguém fala delas, tende a passar por alarmista ou por ser fã da teoria da conspiração. Acreditem: não é o meu caso.
Digo com convicção que acho que não sei como vai ser possível travar o avanço de práticas que são absolutamente contrárias à liberdade, ao respeito pela privacidade e, em última análise, à democracia e que se relacionam com a utilização, em roda livre, da tecnologia.
Afirmações destas não deveriam ser escritas num espaço destes em que tanto falo de assuntos mediamente sérios ou hilariantes, como invento histórias, como me atiro à incompetência de Carlos Costa ou à irresponsabilidade e falta de chá de Passos Coelho. Mas este é o meu espaço e, portanto, é aqui que também falo de assuntos que, francamente, me preocupam.
Enquanto é tempo (e eu, na verdade, não sei se ainda se vai a tempo), as sociedades democráticas deveriam eleger um conjunto de assuntos transversais (isto é, independentes de linhas partidárias) e, num pacto de regime, abordá-los de forma muito responsável. E isto deveria escalar para níveis supra-nacionais pois não são assuntos de um ou outro país em particular.
Um dos temas que deveria ser encarado com seriedade é este: a tecnologia avança de uma maneira veloz e caótica, pondo em risco os regimes democráticos. A tecnologia é barata, está disponível de forma ubíqua e a sua utilização é a que se quiser. Miúdos em casa, malucos onde calhar, gente mal-intencionada -- todos podem fazer uso desregulado da tecnologia. Computação e comunicações baratas à disposição de todos. Mesmo que se queira, não é possível legislar à velocidade a que a tecnologia avança.
Já no outro dia aqui publiquei um texto que o meu filho escreveu sobre o aproveitamento da vasta e detalhada informação das redes sociais com o objectivo de manipular o sentido de voto (e de que a eleição de Trump é exemplo).
As notícias que agora leio sobre isto da internet das coisas ao serviço da espionagem deixam-me ainda mais preocupada. Não sei se a televisão lhes deu o devido destaque mas sei que fui ao Expresso e não encontrei nada. O critério de selecção e alinhamento das notícias é outro dos preocupantes factores que nos estão a levar à alienação colectiva. Pode o mundo estar a perder o pé que as televisões e muitos jornais preferem dar relevo a tricas domésticas sem qualquer importância.
Transcrevo breves excertos do que acabo de ler (e, para o efeito, nem presto muita atenção ao facto de poderem ou não ser os russos a estarem por detrás desta monumental fuga de informação sensível ou que a actuação da CIA aqui referida tenha acontecido no período Obama -- e não presto muita atenção porque acho que o problema é, na verdade, tão mais grave quanto, neste momento, escapa ao controlo de qualquer organização):
A WikiLeaks revelou na passada terça-feira mais de 8000 documentos confidenciais da CIA. Nos mesmos, são explicadas várias táticas de espionagem e hacking (pirataria informática) que a agência de segurança norte-americana utiliza. Entre as alegações, foi destacada por todo o mundo a possível capacidade de a CIA conseguir iludir a segurança de smartphones e televisões para efeitos de espionagem.
A Samsung também reagiu, mas com declarações mais curtas. De acordo com a WikiLeaks, nos mais de 8000 documentos divulgados, a marca poderia ter as suas televisões, mais concretamente a série F8000, de acordo com a BBC, a serem usadas para espionagem através dos microfones do aparelho.
FBI's James Comey: 'There is no such thing as absolute privacy in America'
FBI director’s assessment deepened privacy concerns raised by the details of CIA tools to hack consumer electronics for espionage published by WikiLeaks
“All of us have a reasonable expectation of privacy in our homes, in our cars, and in our devices. But it also means with good reason, in court, government through law enforcement can invade our private spaces,” Comey said at the conference on Wednesday. “Even our memories aren’t private. Any of us can be compelled to say what we saw … In appropriate circumstances, a judge can compel any of us to testify in court on those private communications.”
The Center for Cyber Intelligence, based at the CIA headquarters in Langley, Virginia, has a second covert base in the US consulate in Frankfurt which covers Europe, the Middle East and Africa.
A programme called Weeping Angel describes how to attack a Samsung F8000 TV set so that it appears to be off but can still be used for monitoring.
A CIA attack system called Fine Dining provides 24 decoy applications for CIA spies to use. To witnesses, the spy appears to be running a programme showing videos, presenting slides, playing a computer game, or even running a fake virus scanner. But while the decoy application is on the screen, the system is automatically infected and ransacked
"'Year Zero' introduces the scope and direction of the CIA's global covert hacking program, its malware arsenal and dozens of "zero day" weaponized exploits against a wide range of U.S. and European company products, include Apple's iPhone, Google's Android and Microsoft's Windows and even Samsung TVs, which are turned into covert microphones," the organisation said in a release.
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ALERT!
Wikileaks claims CIA HACKS TVs & Phones WORLDWIDE
Este é o pouco recomendável mundo novo que habitamos.
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Há um lado intrinsecamente transgressor em tudo isto, uma voragem fora de controlo, uma coisa que junta a criatividade com o abuso, a genialidade com a loucura e o aventureirismo com o disparate puro e duro.
E eu, face a tudo isso, se não me levam a mal, prefiro ver coisas como esta aqui abaixo.
Belas, divertidas e inócuas.
Depois de, abaixo, ter falado de milagres, falo agora de mistérios. Falo, não. Pergunto: o que somos está escrito nos nossos olhos?
Eu gosto de olhar de frente com quem falo e gosto de perceber a reacção das pessoas através do seu olhar. No entanto, alguns olhares são opacos. Assustam-me olhos assim, secos, inexpressivos. Outros são luminosos, empáticos - atraentes.
Se me olho nos olhos, olhando-me no espelho, não sei dizer o que dizem os meus olhos. No entanto, quem me conhece bem, conhece o que penso ou sinto apenas através do meu olhar. Talvez o meu olhar seja um véu transparente que me une ao mundo.
Mas não sei.
Um olhar diz o que vai na alma de quem nos olha? Que responda quem souber que eu que de pouco sei.
(...) Francis Giacobetti (Marselha, 1939) começou sua carreira de fotógrafo ainda jovem, em 1957. Ficou mundialmente famoso por suas fotografias de moda e design, e ainda por seus nus. Trabalhou entre as décadas de 1960 e 1980 como fotógrafo e repórter da revista masculina francesa "Lui". Em seu currículo ainda estão passagens pelas revistas "Paris Match", "Life" e "Look". Atuou como diretor de arte da empresa de cosméticos "Shiseido" e desenvolveu projetos de câmaras de fotografia e vídeo para a empresa Canon.
Para o "Projeto Hymn," Giacobetti recorre a seu olhar mais inquieto e através de uma serie de 300 trípticos realiza um inventário da genialidade humana contemporânea. Um tributo em que o fotógrafo registrou a íris, o rosto e as mãos de personalidades como Stephen Hawking, Jacques Costeau, Oscar Niemeyer, Akira Kurosawa, Federico Fellini, Luciano Pavarotti, Gabriel García Márquez, Sebastião Salgado, Roy Lichtenstein, Aung San Suu Kyi, Nelson Mandela e Mikhail Gorbatchov. (...)
Alguns desses trabalhos estão aqui abaixo. Juntei, por baixo de cada composição fotográfica, um vídeo onde se podem ver e ouvir as pessoas representadas. Talvez que alguns de vocês, Caros Leitores, consigam perceber se há relação entre a íris, as mãos, os rostos e o que as pessoas que os têm são.
Mikhail Baryshnikov (agora com 66 anos)
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Gérard Depardieu - agora com 67 anos
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Aung San Suu Kyi - agora com 70 anos
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Ray Charles - (1930 - 2004)
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Não consigo resposta para as minhas perguntas. Por isso talvez seja preferível procurar milagres.
Quando o assunto é relativo a empobrecimento, tenho dificuldade em discutir quem é que deve empobrecer mais ou se, os que vivemos do que nos pagam (trabalho, bolsas, subsídios ou pensões – propositadamente deixo de fora os que vivem de especular financeiramente e que são os eternos poupados à austeridade) já estamos suficientemente penalizados ou se ainda há alguma ‘almofada’ de empobrecimento.
É certo que os funcionários públicos, face aos benefícios complementares que têm (a ADSE é um deles), podem ser considerados um grupo até aqui privilegiado e, portanto, poderia ser defensável que agora fossem penalizados com a sonegação dos dois subsídios para ajudarem na redução da despesa - poderia ser… mas não é.
Mas pensemos agora nos trabalhadores de tantas empresas do sector empresarial de Estado, que não têm nenhuns desses benefícios ou garantias (diuturnidades, ADSE, segurança no emprego, carreiras, etc), que estão tão sujeitos à precaridade do mercado como os das empresas privadas, e que, mesmo nas empresas rentáveis – e há várias! – estão a levar pela medida grossa, como se fossem funcionários públicos. Há muita injustiça nisso.
Por isso, não vou embarcar nesta divisão entre os que ‘podem’ ou ‘merecem’ e os ‘outros’. Nesta empreitada a que o governo meteu mãos à obra, de atirar com o país para o buraco, somos todos vítimas indefesas e é isso que deveremos interiorizar. Alimentar rivalidades é um passo no caminho de um clima fraticida. Não embarco nisso.
Segundo o governo, depois desta campanha de empobrecimento, daqui por muitos anos, daqui por 10 anos (segundo a bruxa má, Merkel), o país renascerá por si só.
Não creio. Pobreza gera pobreza. Nenhum país caminha para trás no tempo durante tantos anos de seguida. A ser verdade acabaríamos na rua, desgraçados e esfaimados, como cães ao lixo. Isso não acontecerá. Qualquer coisa acontecerá antes, qualquer coisa que quebre este enguiço.
Que muitos hábitos de pseudo-riqueza devem ser corrigidos, disso não tenho dúvida, nunca o tive. Não faz sentido ir de férias a crédito, ter carros de alta cilindrada para andar na cidade e comprados a crédito, não faz sentido toda a gente ter comprado casas para as quais não tinha dinheiro nem para a entrada e com planos de pagamento a 50 anos, não faz sentido que as pessoas acumulassem créditos em cima de créditos, não faz sentido muita coisa. Mas, não nos esqueçamos que, no conjunto, isso são peanuts.
Porque o que não faz mesmo sentido é que empresas (públicas e privadas) se metessem em avultados planos de investimento e sem capitais próprios, tudo alavancado; não faz sentido que empresas comprassem milhões, muitos milhões de acções em bolsa com financiamento bancário e sem garantias; não faz sentido que muita gente tenha enriquecido espectacularmente com rendimentos inexplicáveis e sem ser tributado por isso – e, no conjunto, estou a falar de poucas pessoas e de poucas empresas mas que ilustram o Princípio de Pareto (também conhecido por lei ABC), ou seja, cerca de 20% ou menos de pessoas ou de empresas são responsáveis por cerca de 80% dos problemas (dívidas incobráveis, imparidades, etc) - é a classe A, os ilustres. Pelo contrário, cerca de 80% das pessoas ou empresas respondem por aproximadamente apenas 20% ou menos dos problemas - é a classe C, a ralé, isto é, quase todos de nós. (... para os mais curiosos: esta lei aplica-se a quase tudo o que mexe e mesmo a coisas que não mexem, como sejam os stocks).
Mas as situações inerentes à Classe A são as que sobejamente se conhecem e que continuarão a ser poupadas (porque 'senão fogem', porque 'senão põem o dinheiro lá fora' – como se já não usassem offshores, como se já não tivessem o dinheiro a salvo...) e, ingenuamente, deixamos que todas as atenções se virem para os pobres cerca de 80% de pessoas ou empresas que pouco ou nada contribuíram para o buraco em que estamos.
Voltando onde ia: dizia eu que muitas correcções são indispensáveis, muitas, muitas. Toda a máquina tem que se pôr a funcionar, com competência, sem amadorismos, sem despesismos, com focalização no que são os verdadeiros objectivos estratégicos do país.
Mas não basta fazer isso para que o País se desenvolva, nem pensar.
O País tem que ter políticas inteligentes e estratégicas de desenvolvimento. São indispensáveis políticas activas, sólidas, postas em prática de forma consistente ao longo de anos, no sentido de fazer crescer a economia. O País não pode ser objecto de experimentalismos, voluntarismos, gestos ignorantes e impensados. Os países não devem regredir. A humanidade deve caminhar no sentido do desenvolvimento. Não posso aceitar que nos impinjam um caminho de retrocesso.
Por isso me parecem irrelevante os actuais teatros - com tão fracos figurantes...! - a que andamos a assistir. Não consigo já nem ver nem ouvir o Relvas com aquele seu ar de velha gaiteira a falar de almofadas, nem o Seguro com aquele seu ar de sofredor menino velho, um maçador de primeira, a falar nem sei de quê que não consigo fixar nada do que ele diz, credo.
O País a precisar de um comando a sério, de uma visão, de um líder e só nos sai disto.
E a propósito: alguém me explica porque carga de água é que agora é o Relvas que por aí anda, armado em primeiro-ministro? Que é feito do outro, do marido da D. Laura? Só dou por ele quando anda no estrangeiro; parece que só tem coisas para dizer quando está longe, não é?
Já não há paciência.
(((((())))))
Mas eu disse que não quero alimentar rivalidades que só servem para criar a divisão entre os que deveriam estar do mesmo lado. E disse que já não há paciência, não foi? Então, não vou aqui ficar a remoer nisto. Vou partir para outra. Venham comigo.
Olhemos o mundo de uma outra perspectiva. Elevemo-nos. Vamos voar.
Música! Maestro.
Nureyvev
Sylvie Guillem
Mikhail Baryshnikov e Twila Tharp
Stephanie Seymour
Cyd Charisse
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O pensamento é impelido pela geometria dos corpos.
Quando o corpo e o espírito são dois amantes experimentados, surge a proporção escondida, sabem extrair de quase nada o ardor imenso de criar.
Chegámos a um estado de tão profunda fragilidade e pequenez, que se tornava importante saber se tínhamos vivido ou se tínhamos sonhado o nosso passado. A diferença é mínima, mas o desencanto pode ser mortal.
Ir buscar plenitude, é garantir a respiração harmónica e metódica do meu corpo nascido para perdurar.
<>
(As palavras são de Maria Gabriela Llansol, claro; a música pertence à banda sonora de África Minha e as fotografias, como é bom de ver, são de Richard Avedon)
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Se vos apetecer agora ouvir violoncelo, recomendo-vos que ouçam Sol Gabetta, magnífica, ali ao lado, na minha outra casa: esta semana na Música no Ginjal há cordas.
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Agora, enquanto vos escrevo, chove que Deus a dá e troveja que é um susto. Mas, se quando me lerem, ainda estiver assim, não se deixem enevoar - sorriam, aqueçam-se. E, meus Amigos, tentem ter um belo dia.
Mikhail Baryshnikov, outro homem especial: já aqui falei deste homem que voa(va) e que, voando, nos leva(va) com ele.
Hoje, ao pegar na Harvard Business Review (HBR) de Maio para ler um determinado artigo, dei com ele na página dedicada aos casos exemplares, Life's Work.
Transcrevo algumas partes que considerei interessantes, precedendo-as de algumas informações biográficas.
Mikhail Baryshnikov começou a estudar ballet aos 9 anos na sua terra natal, Riga, Letónia, que, na altura, estava integrada na União Soviética.
Belíssimo
Aos vinte e tal anos era a estrela do famoso Kirov Ballet tendo sido considerado por um exigente crítico o mais perfeito bailarino alguma vez visto.
Em 1974 foi para o Canadá e dali para os EUA onde, algum tempo depois, se integrou no American Ballet Theater, onde mais tarde veio a ser o director artístico.
Saíu em 1989 para fundar, em parceria, uma companhia de dança moderna e participou em filmes, teatros e televisão.
Mikhail by Leibovitz ('les beaux esprits se rencontrent')
É agora director artístico no Baryshnikov Arts Center (BAC) e aos 63 anos ainda actua.
Foi entrevistado para a HBR pois o seu exemplo pode ser uma inspiração para os gestores deste mundo que tão desinspirado anda.
À pergunta sobre a permanente reinvenção que tem sido a sua carreira, responde: É instintivo. Há um relógio interno que dita o que me interessa a cada momento. A mudança na minha vida pessoal é impelida por uma necessidade quase primária de explorar, de testar fronteiras. Eu apenas sigo essa urgência. Às vezes olho para o que os outros estão a fazer e teimosamente vou na direcção oposta. Às vezes funciona, outras vezes não.
À pergunta sobre qual a explicação para ser, tão rapidamente, tão bom em novas funções: Não há segredo. É preciso energia positiva, talento, muito trabalho árduo, e uma vontade para absorver o mais possível das pessoas com quem se está a trabalhar. E talvez alguma sorte. Não penso que tenha sido sempre bom em tudo. Muitas vezes atirei-me a coisas demais. Mas era o apetite de um jovem.
Sobre se melhorou com a idade: Aprendi certamente a controlar o passo. A idade força-nos a focar-nos no essencial.
Perguntando-lhe sobre qual a razão para que o BAC seja uma organização multi-disciplinar, respondeu: Quanto mais vires, quanto mais souberes, desejavelmente melhor tu te tornas. Há a ideia de que os artistas não deverão ‘poluir’ os seus instintos criadores vendo o trabalho de outros artistas. Penso que isso é errado.
Finalmente, à pergunta sobre qual a razão para ser tão bom no que faz, responde: Isso é a pior coisa que uma pessoa pode fazer: pensar em como se tornou tão bom numa coisa. De qualquer modo, nem sempre sou tão fantástico – perguntem à minha mulher.
Mikhail by Leibovitz
[Já agora: foi casado com Jessica lange de quem teve uma filha, Alessandra (que é a sua cara). Mais tarde passou a viver com a bailarina Lisa Rinehart com quem tem três filhos mas com quem não se casou (não acredita no casamento)].
Vejamo-lo agora, extraordinário Mikhail, numa vibrante interpretação sob o olhar emociado de Helen Mirren em White Nights. Nunca aprenderemos o suficiente enquanto não soubermos emocionar-nos com momentos de pura arte, assim.
Gestores deste país, vejam como ele sente, vejam como ele desliza, vejam como ele voa.
Enjoy!
PS: Depois de verem o filme, caso queiram saber a minha opinião sobre a descida da TSU, baseada em conhecimento de aritmética e conhecimento do meio empresarial, desçam por favor, até ao piso de baixo.
Depois, se me permitem, uma sugestão: é hora de chill out, so, please, venham comigo até à beira Tejo, vamos curtir a nossa Alma Lusitana . É no piso ainda mais abaixo.
A grande arte: no bailado, Baryshnikov, o homem cheio de graça, de graciosidade, o atleta que ignora os limites do corpo humano, voando, voando no bailado Don Quixote, a grande música aqui ao serviço da dança.
Apenas o vi ao vivo uma única vez mas nunca mais o esquecerei. Mikhail era ele próprio a música e voava sobre o espaço. Quando acabou eu não queria que ele acabasse porque, enquanto o vi, voei com ele. É esta a força dos verdadeiros artistas: levam-nos com eles.