Por volta das dez da manhã já estavam a chegar mensagens com enormes cabeças de peixe. Depois via-se um grande atum. Pelo menos foi o que ela escreveu na mensagem.
Depois a minha mãe e eles junto a uma bancada cheia de peixe.
[O mais pequeno, depois, ao enunciar os peixes que tinham trazido, referiu 'serafim'. Espanto de quem ouviu. 'Serafim?!'. A mãe corrigiu: 'Deve estar a falar do safio'.]
Foi a minha menininha, também dada às reportagens fotográficas, que deu testemunho da incursão familiar no mercado. Tinham ido buscar a bisa e tinham ido juntos comprar o peixe.
Na bancada da minha cozinha já estava o tacho grande à espera, aquele de que já nem me lembrava bem. Estava na prateleira de cima da despensa, onde a minha vista nem alcança. O meu marido já o tinha tirado lá das alturas e já o tinha lavado.
Pus-me a descascar batatas, três quilos. Depois, antes que chegassem, lavei os morangos e os alperces. A seguir, coloquei na cuba do lava-louça cebolas, umas seis ou sete cebolas novas, tomates, talvez uns dois quilos de tomate alongado bem maduro, e salsa ao dispor.
Passado um bocado, chegaram. Traziam cinco quilos de peixe fresquinho para uma bela caldeirada que iria ser feita sob orientação da minha mãe.
Várias mãos de juntaram para a faena. No fundo do tacho, azeite, duas cebolas às rodelas, três dentes de alho, vários tomates, um bocado de pimento, batatas às rodelas, salsa, louro, depois o peixe mais rijo. Um pouco de sal. Depois nova camada de cebola, nova camada de tomate, nova camada de rodelas de batatas. Por cima o peixe mais frágil (cabeças de charroco, por exemplo, e, claro, o que prefiro: os fígados). A encabeçar, a última camada de batatas, cebolas, tomate e salsa. Para rematar, sal, um pouco de vinho branco e azeite.
Lume forte até ferver. Como o tacho é muito grande, foi um castigo até que o calor chegasse cá acima. Quando chegou, baixou-se o lume e com o tacho bem tapado, deixou-se que os odores se misturassem e o caldo começasse a aparecer. Quando as batatas ficaram macias, desligou-se o lume e colocou-se coentros por cima, para perfumar.
Boa, boa.
Para sobremesa tinha morangos e alperces mas vieram também cerejas, melancia e a minha mãe trouxe o seu infalível bolo de cenoura coberto de chocolate.
A seguir ao almoço, depois de descansarmos e conversarmos um pouco, o meu filho resolveu ir com o filho do meio e com os sobrinhos para um parque perto, para irem jogar futebol. Lá foram. Quando chegaram vinham corados e transpirados. Tinham feito uma futebolada com jogadores desconhecidos que por lá encontraram.
A fera felpuda fica sempre feliz da vida com toda a família ruidosa em volta, toda a gente a fazer-lhe festas e ele a retribuir e, pelo meio a roubar um chinelo, uma meia, o que apanha. E apanhou uma flauta e apanhou um daqueles apitos das festas que estica quando se sopra. E etc.
E vai ter com cada um e vai ter com outro, sempre na boa e ciranda, entre carinhos, sempre vendo que malandrice pode fazer. Mas sempre tudo numa tranquila.
Entretanto, a menininha mais linda convidou a sua amiga que ia dormir a sua casa para vir cá ter. E, assim, para além dos cinco pimentinhas, tivemos cá mais essa menina.
E aqui é que a porca torceu o rabo. Ao ver aparecer um ser desconhecido no seu território, desatou a ladrar enfurecido e a querer investir.
Por precaução, o meu marido tinha-lhe posto a trela. Por mais que lhe disséssemos que estava tudo bem e que a menina era amiga, a fera estava furibunda. Por via das dúvidas, o meu marido resolveu retirá-lo de circulação e ele, transtornado, ainda tentou ferrar a mão do meu marido. Ficou de castigo, claro, fechado, a chorar. Mas de cada vez que via a menina ficava desorientado. Por fim acalmou mas, para evitar chatices, mantivemo-lo sempre pela trela e longe da menina.
Sei que há por aí quem perceba de cães e se souberem o que se deve fazer nestas circunstâncias, muito agradecerei. Nós, que tivemos a nossa doce boxer durante tanto tempo e nunca lhe vimos reacções destas, ficamos desconcertados e apreensivos com estas reacções exacerbadas.
Este é cão de guarda, disso não há dúvida, e é bom que assim seja. Se sente movimento junto à vedação ou ao portão, ou se alguém cá entra, ladra freneticamente, quer atirar-se e, portanto, por segurança, mantemo-lo afastado das pessoas que cá vêm. Mas deve haver maneira de o fazer perceber que algumas pessoas, que ele não conhece, são de confiança e que pode ficar tranquilo.
No parque, na rua, na praia, é cordato, as pessoas podem aproximar-se, não faz nada, toda a gente o acha uma simpatia, um fofo. Mas se alguém que ele não conheça entra aqui em casa, o animal vira uma verdadeira fera. E, como fica tão transtornado, até reage abrutalhadamente com quem tenta refreá-lo, nomeadamente comigo ou com o meu marido.
Custa-me pensar que, quando temos cá pessoas que ele ainda não conhece, teremos que o deixar preso; mas receio que seja isso que tem que acontecer.
Mal o meu filho se foi embora, levando a menina, o urso felpudo ficou calmo, tranquilo. Contudo, como o meu marido lhe tinha dado um pontapé quando ele se quis virar a ele e como ficou de castigo e toda a gente se zangou com ele, estava sentido, ar infeliz, muito quieto. Dá-me pena. Nitidamente o seu instinto é de guardar a casa de intrusos. E fica infeliz quando não o deixamos agir e, ainda por cima, o punimos.
Não falei do lanche. Salsichas, linguiça, alheira, queijo, tostas, pão quentinho, sumos, fruta, iogurtes. Os jovens comeram como se não comessem há uma semana. Fizeram as sandes ou prepararam as tostas à sua vontade. Quando comprei as embalagens de salsichas pensei, cá para mim, que era um exagero. Mas receio sempre que fiquem a olhar para o prato vazio, com vontade de mais. O meu marido, quando cheguei a casa e viu aquilo tudo, disse que eu não tinha noção, que compro sempre o dobro do que é preciso.
Sim, sim... Voaram.
A minha mãe, quando ontem estava a combinar sobre o bolo, disse que trazia o de cenoura pois eles gostam sempre e é um bolo grande. Pois bem. Não sobrou nem migalha.
Estivemos na parte do jardim que arranjámos para ligar ao pátio pois o pátio era escasso para tanta gente e, às tantas, estavam uns no pário e outros na relva e tudo bem quando era para conversar mas não era muito prático quando estava uma mesa no terraço e outra mesa na relva num piso ligeiramente mais baixo. Agora há uma continuidade, fica melhor.
E não esteve um daqueles calorões que esteve durante a semana mas também não esteve frio. Foi bom, é sempre bom quando estamos juntos. E as buganvílias estão todas floridas, as rosinhas caem em cachos e eu acho que é uma sorte e uma felicidade podermos estar juntos e de boa saúde -- e em paz.
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Desejo-vos um belo dia de domingo
Saúde. Boa disposição. Paz.