quinta-feira, dezembro 09, 2021

A belíssima casa de Iman e David Bowie

 



Se as coisas baterem certo e a vida de uma pessoa não estiver descompassada da sua maneira de ser, a sua casa dirá muito de si. Eu sei, eu sei que ontem disse que o nome e o signo são o código de entrada na personalidade de qualquer um. Mantenho. Mas há os sinais exteriores. E a casa é um deles.

Uma pessoa disfuncional ou desmotivada ou que se sente a flutuar sobre a própria vida terá uma casa que será totalmente diferente da de alguém que gosta de viver, de estar com os outros, de criar ambientes  para si a para os demais. A primeira parecer-se-á com uma natureza morta, a segunda será acolhedora, viva.

Dir-me-ão que isto sou eu a falar, que é a única realidade que conheço -- eu, burguesinha (P. Rufino dixit), bem acomodada, habituada aos ambientes lisboetas onde se bebe do fino e alheada das dificuldades económicas dos que mal têm para comer quanto mais para arranjar ambientes. Talvez. Mas, mesmo perante a miséria, há que reconhecer que se encontram atitudes distintas: nuns casos percebe-se que a pessoa se entregou ao infortúnio e noutros é fácil intuir-se que a pessoa tenta fazer das tripas coração e, no meio da pouca sorte, descobrir o caminho de saída.

Por casas. Por imaginar casas. 

No outro dia, quando veio passar o dia comigo por estar de férias intercalares, a minha menina mais linda apareceu com uma grande caixa de cartão. Estava a fazer uma casa miniatura. Tinha um piso intermédio, algumas divisões, um beliche. Achei uma graça que ela estivesse a conceber a sua casa. 

Fez-me lembrar as maquetes cuja construção acho o máximo. Dantes os estudantes de arquitectura ou faziam as suas ou mandavam-nas fazer. Lembro-me de ir de carro, a uma daquelas ruas estreitinhas e íngremes de Campolide, acompanhar quem ia buscar algumas que, por ali, se faziam. (Não era eu a autora do projecto, não sou arquitecta). Agora o que se fazem já são sobretudo maquetes virtuais, 3D, animações, vídeos que mostram com o sol banha a casa ao longo do dia, como as sombras são um elemento construtivo. Já não é preciso ter estiradores ou bancadas para as maquetes. 

Não é saudosismo. É assim. Também dantes, para se telefonar, havia um aparelho sobre um móvel com um mostrador com buracos em cima de cada algarismo. Enfiava-se o dedo em cada algarismo do número e rodava-se. Uma vez, a passear ali para os lados da Rue de Rivoli, vi um homem que ia no carro ao telefone. Aquilo de que tinha ouvido falar já era realidade em Paris. Cheguei cá a contar, entusiasmada, que tinha visto uma pessoa a telefonar de um carro. Quando apareceu por cá, era uma caixa que parecia um tijolo que se punha no carro. Era uma novidade. Tempos longínquos. Coisas boas, coisas más. Mas este é o tempo em que vivemos e eu gosto.

Voltando às casas. Gosto de casas. Quantas vezes já aqui falei da minha, da dos outros? Tantas vezes. 

A minha casa é o meu ninho, a minha verdadeira pátria. É aqui que reconheço os meus, os que falam a minha língua, é aqui o lugar das memórias partilhadas, o lugar em que as minhas raízes se expandem. Mesmo aqui, nesta casa em que vivo há pouco mais de um ano, eu sinto-me como se cá vivesse desde sempre. Do sofá em que me sento a escrever, olho em volta e vejo os quadros com pinturas que comprei numa manhã de domingo na Plaza Mayor, vejo as meninas bailarinas e os anjunhos suspensos que já nos sobrevoavam na outra casa, a carpete de Arraiolos que comprei na Tricana quando ainda os não sabia fazer, a pequena estante com portas de vidro com os álbuns de fotografias que contêm a cronologia dos dias em que ainda não havia fotografia digital. 

Uma casa é feita não apenas de paredes, do movimento entre os espaços, dos materiais visíveis e invisíveis, da luz e dos sons, mas também dos objectos que a habitam e das memórias, boas e menos boas, que lhes estão associadas.

O vídeo que hoje aqui partilho mostra uma casa extraordinária. Ampla, aberta ao exterior e, ao mesmo tempo, um ninho, um ninho repleto de memórias. Habita-a uma mulher muito bela e habita-a, também, o amor que ali se viveu e o rasto que dele ficou. 

Íman tem agora sessenta e seis anos e já não é a gazela magra de outros tempos. É agora uma bela mulher de formas generosas e sorriso sereno. 

Está quase a fazer seis anos que o seu amado marido, David Bowie, se foi. Estava doente mas escondeu-o do mundo e, em segredo, preparou um álbum que, após a sua morte, haveria de surpreender o mundo.

Íman mostra a casa que foi a casa de ambos -- e é uma casa espantosa! Vejam e ajuízem. As pinturas de David Bowie, os objectos de ambos, o afecto partilhado que a casa acolheu e ainda tão presente, a almofada que Naomi ofereceu a Iman, o enquadramento paisagístico de se perder o fôlego. Uma maravilha.

Inside Iman & David Bowie’s Scenic Home Filled With Wonderful Objects | Vogue

In this edition of Objects of Affection, supermodel Iman takes us inside her Catskills home that is full of beautiful, artistic odes to David Bowie. From a self-portrait he painted in 1980 to a Lynn Chadwick sculpture she gave Bowie for their first wedding anniversary, watch as Iman shares some of the items most important to herself. 


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Desejo-vos uma boa quinta-feira
Tudo de bom!

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