Música, por favor
Wagner - Tannhauser Pilgrim's chorus
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A austeridade como estratégica económica e política - e o fatal empobrecimento colectivo |
O mais que comprovado fiasco das chamadas políticas de austeridade - que vêm espalhando a insolvência por onde passam - parece, felizmente, começar a motivar uma tentativa de correcção de rota a nível europeu (embora, para nossa desgraça, tal ainda não tenha sido assimilado como necessário pelo governo português).
Como é sabido, e reportando-nos apenas ao passado próximo, essas políticas começaram por ser experimentadas na Grécia a mando de técnicos da chamada troika (contrariamente ao que aconteceu na Islândia que rejeitou liminarmente seguir essa via e onde os resultados já são conhecidos e até são melhores do que os expectáveis).
Se na Grécia, fruto de um poder político fraquíssimo, desestruturado - especialmente depois de posto a nu o embuste nas contas públicas, embuste este preparado com o apoio da Goldman Sachs (onde António Borges era vice-presidente entre 2000 e 2008) - não houve quem tivesse condições para impor um caminho alternativo ou, pelo menos, mais moderado, já em Portugal a questão foi outra.
Os chamados mercados (nos quais pontuam entidades financeiras tais como a omnipresente Goldman Sachs) têm mecanismos de salvaguarda que lhes permite ganhar sempre, especialmente quando o alvo se encontra enfraquecido. Um deles é exigir taxas de juro elevadíssimas e, dessa forma, garantir a elevada rentabilidade dos fundos que comercializam. Quando um país começa a vacilar, aí estão eles a sobrevoar a vítima.
A especulação financeira é isto |
Tem vindo a acontecer progressivamente na Europa. Quando as atenções se viraram para Portugal, José Sócrates - que tinha injectado dinheiro na economia (sobretudo porque essas eram as orientações da UE na sequência da crise financeira despoletada pelo caso Lehman Brothers) incrementando o défice das contas públicas - viu-se encostado à parede. Com a maioria do parlamento a puxar-lhe o tapete, com Cavaco Silva a desautorizá-lo publicamente, com os bancos a anunciarem mediaticamente o fim do financiamento público, José Sócrates não teve outra alternativa senão ajoelhar perante quem lhe podia valer.
O plano da troika continha muitas coisas boas, era um plano muito razoável de reestruturação das várias frentes despesistas. Tinha um ou outro ponto excessivo (por exemplo, os relativos à redução de direitos associados ao trabalho), pontos esses que deveriam ter sido corrigidos na negociação mas, de modo geral, era um plano lógico. Deveria ter sido um plano a 5 e não a 3 anos e isso deveria ter sido outro aspecto a ser negociado. E, sobretudo, deveria ter sido considerado como um dos planos a pôr no terreno, um dos, não o único. Ou seja, deveria ter sido complementado com um outro plano: o plano do lado do crescimento estratégico da economia portuguesa.
As taxas de juro são suportáveis quando não excedem o somatório da taxa de crescimento e a da inflação. Ora com uma taxa de crescimento negativa (ou mesmo que, dentro em pouco, tendencialmente nula), os juros praticados são manifestamente impossíveis de suportar, gerando, portanto, mais dívida. Ou seja, a grande prioridade por todos os motivos e também por este é a de conseguir que a economia portuguesa cresça.
A economia portuguesa não prima, desde o princípio dos tempos, por ser sólida e florescente. Reportando-nos às últimas décadas, poderemos perceber que, com um Estado Novo retrógrado, fechado e protector, difícil seria esperar que a economia, nessa altura, manifestasse um generalizado pendor inovador e competitivo.
A seguir, com o 25 de Abril, seguiu-se um período de periclitância política que se traduziu em avanços e recuos, naturais num período de aprendizagem democrática e de abertura ao mundo. Quando se estava, pois, a dar os primeiros passos no sentido da aculturação ocorreram profundas alterações estruturais no panorama económico internacional com fortíssimo impacto directo no tecido económico português.
A adesão à moeda única e a sucessiva queda de barreiras no comércio internacional, deixaram a economia doméstica exposta, em toda a sua fragilidade, à violência dos mercados internacionais.
Instalações fabris encerradas - uma imagem dramaticamente multiplicada ao longo do País |
A adesão à moeda única e a sucessiva queda de barreiras no comércio internacional, deixaram a economia doméstica exposta, em toda a sua fragilidade, à violência dos mercados internacionais.
Tudo isto está descrito de uma maneira breve e superficial já que este não é o local para análises longas e aprofundados (nem eu seria a pessoa mais habilitada para as fazer) mas, em traços largos, é muito disto que se tem passado.
Voltando pois ao nosso passado recente.
Quando Passos Coelho, impreparado, inábil, resolve provincianamente adoptar um estatuto de menoridade perante a Alemanha (o de aluno, o aluno acrítico, submisso, marrãozinho) impondo medidas ainda mais draconianas que o programa da troika e esquecendo o lado do desenvolvimento, condenou ao fracasso toda a sua política.
E tão incompetentemente o fez que isso se traduziu em descalabro em menos de 1 ano. Sem qualquer visão estratégica, sem conhecimentos, incapaz de desenvolver um raciocínio que envolva operações algébricas, colocou-se nas mãos de dois teóricos no que à economia e às finanças diz respeito, e nas mãos de um típico fura-vidas (daqueles para quem a ética é um conceito abstracto ‘que não lhe assiste’) para efeito de coordenação política.
Esquecendo este último que tão sequiosamente se atirou a todos os potes (na linguagem de Passos Coelho) que acabou por se descredibilizar totalmente junto da opinião púbica, detenhamo-nos então nos dois primeiros.
Dois dos vários erros de casting - estes especialmente responsáveis pelo buraco em que Portugal está a ser (irremediavelmente?) enfiado |
Para o ministério da Economia, Emprego, Desenvolvimento Regional, Inovação, Transportes e Energia, Passos Coelho - que se lembrou de inventar este ministério ingovernável - não teve a lucidez de perceber que, para que aquele mastodonte funcionasse, teria que ter alguém com uma grande dose de experiência e com um cabedal de Schwarzenegger. Em vez disso foi buscar um tenrinho. Absolutamente inexperiente, vivendo a milhas do país, académico, o exercício de Álvaro Santos Pereira tem sido uma festa. Não consegue fazer nada, não sabe nada, não tem jeito para nada. Aos poucos, Passos Coelho começou a fatiar-lhe o ministério e a distribuir fatias por outros, incluindo por outros que nem ministros são, como é o caso do oportuno (digamos assim) António Borges. O célebre Álvaro é, pois, desde o primeiro dia, um dos elos mais fracos do governo, um erro de casting que descredibiliza acima de tudo quem o escolheu.
Para as Finanças, Passos Coelho foi buscar outro verdinho, desta vez um homem de gabinete de bancos centrais. Ao que dizem, conhecedor da realidade financeira europeia, Vítor Gaspar não tinha experiência de gestão concreta nem do impacto que os modelos, quando mal construídos, têm no mundo real e, o dramático, é que, justamente, revela não saber construir modelos, não saber aferi-los, não saber corrigi-los nem, sequer, perceber os erros quando demonstram não se ajustar à realidade. É, portanto, desde o primeiro dia um colossal erro de casting.
E o que, para mal dos portugueses, está a acontecer é que, enquanto Vítor Gaspar, sem perceber o que anda a fazer, se entretém a traçar medidas que desgraçam as contas públicas e destroem a economia, o outro, o Álvaro, não consegue nem agir, nem reagir, e por aí anda a ouvir desacatos, a levar enxovalhos para casa, a ser justamente acusado de não fazer nada, a ser gozado e, mais grave, sem conseguir perceber o que é que os coisos querem (os coisos, isto é, os portugueses).
E, portanto, enquanto a Espanha e a Itália batem o pé e forçam a Merkel a dar os primeiros passos de recuo e enquanto o mundo inteiro implora para que a Europa ganhe tino e se organize no sentido de se pôr na rota do crescimento, Portugal - país pobre, envelhecido, sem tecido económico sustentável, com as falências e o desemprego a galoparem, com as suas melhores e mais estratégicas empresas a serem vendidas de qualquer maneira a qualquer um que apareça com dinheiro no bolso, com grande parte da população a ser tratada de forma indigna (o episódio da miséria paga aos enfermeiros é apenas mais um dos sistemáticos episódios que revelam a imoralidade de toda esta política) - continua pela voz do primeiro ministro a dizer que cumprirá a meta do défice custe o que custar (leia-se, nem que tenha que lançar mão de mais medidas de austeridade).
Podia ser autismo mas não é porque os autistas geralmente são pessoas inteligentes.
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Dizia Einstein:
Insanidade é fazer a mesma coisa uma e outra vez e ficar à espera de resultados diferentes
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Estou a acabar este texto e está justamente agora a acabar o Prós e Contras que hoje está ser interessantíssimo. Viriato Soromenho Marques, meu conhecido de outros carnavais, brilhante como sempre. Mário Soares lúcido, determinado e líder como sempre. António Esteves Martins muito objectivo, como nos tem habituado. Miguel Sousa Tavares polémico (e um pouco superficial, convenhamos) como sempre. Fátima Campos Ferreira hoje mais comedida. Ou seja, um belo programa.
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E, depois disto tudo, o que vos desejo é que tenham uma bela terça feira!
Be happy!
Depois de ler o seu belíssimo texto, ao ritmo do crescimento do défice, acabei por concordar com a frase de Einstein: “Insanidade é fazer a mesma coisa uma e outra vez e ficar à espera de resultados diferentes”.
ResponderEliminarFez-me lembrar aquela anedota em que um pacóvio se encontrava de pé, no passeio, junto do seu prédio, de vários andares, com as mãos juntas, abertas em concha, mirando as alturas. Perguntaram-lhe que fazia. Respondeu que aguardava a queda do seu relógio, que atirou do 5º andar, da janela do seu apartamento. Questionaram-no se não seria o que estava caído aos seus pés, junto ao muro. Respondeu:
─ Não é esse. O meu demora a chegar, pois anda atrasado cerca de meia hora.
Ontem também gostei de ver os “prós e contras”, mas creio que em certos aspectos os bons intervenientes deveriam ter sido mais acutilantes. Impressiona-me a lucidez de Mário Soares, apesar de algumas hesitações (fruto da inevitável aterosclerose). Do MST, gosto mais da sua face menos “politicamente correcta”, que dos seus harpejos e gargarejos de corista do “eticamente correcto”. O VSM não me desiludiu, sendo realmente igual a si próprio. AEM manteve, na verdade, a sua objectividade habitual.
Politicamente, temos um grupo que continua, ingenuamente, implorando às divindades, na expectativa de surgir uma chuvada de euros, ou esperando que, no cemitério, onde paulatinamente vão sepultando o país, comecem a florescer milhares de plantas das patacas.
Deus não é surdo, mas posso assegurar que não os ouve!
Olá DBO,
ResponderEliminarJá me fartei de rir com o seu divertido comentário. Essa do pacóvio cujo relógio estava atrasado e, daí, concluía que andava mais devagarinho, é boa...!
Também há aquele ditado (chinês?) que diz que, quando aponta para o céu, o homem inteligente olha para as estrelas enquanto o idiota se limita a olhar para o próprio dedo.
Enfim, histórias de gente intelectualmente deixa muito a desejar.
Ontem também notei algum arrastar de voz, de vez em quando, no Mário Soares mas pensei que, se fosse eu, ali, com as câmaras, com a assistência, titubeava mil vezes mais... Já tem 80 e tal anos, não é? Que lucidez, que energia ele tem. Às tantas da noite andar por ali, ideias toda no lugar, e o que ele escreve... É impressionante.
Eu sou mais agnóstica que outra coisa mas tenho fé... acho que isto muda, tem que mudar. Não sei como, não sei quando, mas acho que é capaz de não faltar muito. Isto está tudo tão miserável, tão degradado, que alguém há-de dar um valente murro na mesa.
Temos que querer isso, temos que agir nesse sentido.
E tenha uma boa noite e, amanhã, um belo dia, DBO.
PS: Já lá deixei no seu blogue os meus cumprimentos e a manifestação do meu agrado pelo seu poderoso manifesto. Bem haja.