O tema do dinheiro ganho é, neste momento, um tema sensível.
Esta sexta feira deram brado as afirmações de Cavaco Silva que, com voz agastada, referiu os seus hábitos familiares de poupança e enunciou as parcelas da sua pensão de reforma, concluindo que a verba recebida (que os jornalistas referem ser cerca de 10.000 euros mensais) nem seria suficiente para cobrir as despesas. Vinha no carro e, logo a seguir, ouvi Fernando Nobre chocado, enumerando, em contraponto, exemplos dramáticos de quase miséria e agora, na televisão, já ouvi várias outras censuras.
Esta sexta feira deram brado as afirmações de Cavaco Silva que, com voz agastada, referiu os seus hábitos familiares de poupança e enunciou as parcelas da sua pensão de reforma, concluindo que a verba recebida (que os jornalistas referem ser cerca de 10.000 euros mensais) nem seria suficiente para cobrir as despesas. Vinha no carro e, logo a seguir, ouvi Fernando Nobre chocado, enumerando, em contraponto, exemplos dramáticos de quase miséria e agora, na televisão, já ouvi várias outras censuras.
Mas como não percebi qual o contexto em que Cavaco falou, nem ouvi toda a intervenção, não me vou pronunciar. Também não me vou referir aos esquemas de cálculo das pensões pois é tema que desconheço e não gosto de falar de cor.
Mas falemos de ordenados. Para quem tem de ordenado mensal 1.000 ou menos, ou mesmo 2.000 ou 3.000 euros por mês, ouvir falar em valores de 10.000 ou 15.000 ou verbas desta ordem, pode soar excessivo. São ricos, que paguem a crise, que se lhes aumente os impostos até sangrarem, que paguem a saúde, o ensino, que sejam proibidos de usar transportes públicos.
Ridículo. Ordenados da ordem dos 10.000 ou 15.000 ou mesmo um pouco mais não são nada de extraordinário e deveriam ser o padrão de uma classe média alta. E a classe média é essencial à manutenção do consumo e, por isso, da economia.
A classe alta deve ser situada para rendimentos mensais já bem acima disso. E a classe alta é também indispensável a um país pois puxa pela franja de economia atrás da qual vai a classe média alta e, atrás desta, vai a classe média e por aí fora e assim se ajuda a manter viva a economia.
Mas, dito isto, quero referir que se verbas desta ordem me parecem normais e aceitáveis, já verbas da ordem dos 50.000 euros por mês (45.000 em ordenado e 4.500 por mês para um ppr) para funções que não são executivas nem exigem trabalho a tempo inteiro me parecem exageradas, especialmente se forem usufruídas por pessoas que se fartam de pregar que os excessos têm que acabar, que tem que haver austeridade, que se têm que reduzir custos para se ser competitivo.
Não defendo (muito longe disso!) que a cada um segundo as suas necessidades; mas o contrário disso não deve a tresloucura de uns ganharem 500 e outros 50.000 - dizendo o que ganha 50.000 que o que ganha 500 tem que ser sujeito a mais austeridade. Rendimentos como aquele para funções como as referidas ou verbas que são o dobro ou o triplo disto são tão elevados que me parecem descabidos, ilógicos, atentatórios, quase uma provocação perante uma população a quem se exigem esforços, perante os desafortunados que desgraçadamente caem no desemprego e a quem agora se vai baixar o subsídio. Há qualquer coisa de imoral em coisas destas.
Mas entorpecidos que estamos por anos de coisas ilógicas e tão atormentados perante sucessivos anúncios de catástrofes, austeridade a doer e à toa, retrocessos fatais, já aceitamos, bovinamente, quase tudo.
Vem isto a propósito do endeusamento que se tem feito relativamente a Horta Osório que, por ter estado 2 meses a recuperar de excesso de stress, achou por bem abdicar de um bónus superior a 2 milhões de euros. Como é sabido, não se passou cá, passou-se no Reino Unido, no Lloyds.
Ora, quase tudo nesta história me indispõe. Não está em causa o mérito de Horta Osório. O que está em causa é a estupidez para a qual esta sociedade tem evoluído.
Horta Osório trabalhava horas de mais, sob grande pressão e, às tantas, começou a ter distúrbios de sono. Tal como ele, inúmeras pessoas em todo o mundo têm o mesmo problema. Excesso de trabalho, excesso de pressão - e acabam por cair para o lado. Nada de muito grave. Tratam-se e curam-se. Há coisas bem piores, há quem caia morto.
Mas Horta Osório fez um a cura de sono, pôs-se bom – e, até aqui, tudo normal.
Agora entramos nas coisas ridículas.
Depois do médico que o tratou o ter declarado recuperado, teve que ser sujeito a uma auditoria médica ‘independente’ para ver se estava mesmo em condições - como se fosse uma máquina que, antes de ser colocada em funcionamento, tem que ser inspeccionada e reinspeccionada. Depois, três administradores, à vez, foram a casa dele ver com os seus próprios olhos se ele estava mesmo bem. E ele, submisso, a deixar que o observassem, que o interrogassem, a mostrar que já estava bom.
Pergunto eu: com isto tudo, não se sentiu humilhado? Tratado como se fosse um débil mental, incapaz de avaliar por si próprio a sua própria condição física?
Não, pelos vistos achou normal.
Pergunto eu: se o mal não fosse o sono, como seria? Por exemplo, se tivessem sido problemas de próstata, iriam na mesma lá a casa e far-lhe-iam o toque rectal? E ele acharia igualmente normal?
Depois, uma jornalista do Expresso entrevistou-o e tratou-o como se ele fosse um débil mental e ele respondeu como se, de facto, o fosse. ‘Então e o que é que aprendeu?’ e ele, menino culpado, lá respondeu que tinha aprendido uma grande lição. E ela ainda não contente: ‘E a nível pessoal , o que é que aprendeu?’ - e ele em vez de a mandar bugiar respondeu que também tinha aprendido que tem que dormir e dar mais atenção à Ana.
Ridículo, tão ridículo.
Agora, depois de ter sido inspeccionado por dentro e por fora, depois de ter pedido desculpa, depois de ter voltado a ser aceite no posto de trabalho, eis que, numa derradeira assumpção de culpa por ser tão imperdoavelmente humano, renuncia a um bónus milionário. E é o delírio!
Claro que é um gesto inédito e surpreendente. Mas mais surpreendente é que estas pessoas recebam verbas tão obscenas, mais surpreendente é que existam disparidades tão obscenas, surpreendente é que uma pessoa se sujeite a ser tratada como se fosse menos do que um ser humano, como se fosse uma máquina sem dignidade nem sentimentos, surpreendente é que se ache que tudo isto é normal.
Não é. Nada disto é normal. Isto tudo é obsceno.
A sociedade não deveria permitir nenhum destes disparates, nenhumas destas absurdas disparidades.
%%%%%%
Mudança de tércio
É fim de semana, meus amigos, tempo de descontrair. Nada de pensar em toques rectais ou outras coisas que tais. Tempo de lavar o olhar para ver se a lavagem chega até à alma.
Venham pois comigo até sítios em que tudo é limpo, alvo, belo.
Sienna Millher por Mario Testino |
eu volto o rosto para cheirar-te quando passas
para decorar de ti algum contorno
saber por fim que lume trazes
junto ao corpo
que incêndio apagas
ou amotinas
[Lume de João Miguel Henriques in 'Isso passa']
Natalia Osipova do Bolshoi interpreta La Bayadere
Ute Lemper, a magnífica.
ooooooo
Bom sábado!
Não sei se sabe, Jeito Manso, que o seu blog está a ser bastante badalado, entre os blogs, os bons, bem escritos e bem estruturados. Chamam-lhe "jovem blog", e apoiam-no com simpáticos e elogiosos adjectivos. Por mim, vou divulgando, porque aquilo que diz se aproxima muito daquilo que penso e eu, não seria capaz, de dizer melhor. Até a mãe do ministro, aquela que tem um blog que visito muitas vezes, transcreve, literalmente, a sua opinião. O que me deixa contente, porque afinal, nós mulheres, podemos ser a muralha, que um dia se revelará, como boicote, por detrás destes negros tempos. Quanto ao 1º tema, Cavaco, faço como fez. O homem nem devia existir, quanto mais proferir. Mas um país de gente, maioritariamente, bimba, vota em bimbos e sofremos todos. O pior, é que este, não é só bimbo. É, disfarçadamente, muito perigoso, pela ganância, estupidez e falta de visão, e todo o país sofre. O segundo tema, o Osório, estou completamente de acordo e haja Deus, para tanta basófia, tanto mau jornalismo nos media do senhor balsemão. Afinal o homem só trabalhou uns meses, "fundiu-se", e recusou uns milhões de prémio, por uns mesinhos de trabalho, "coisa/prémio", que a maior parte de nós, nunca receberá numa vida inteira de trabalho, e juntando as reformas , mesmo que viva até aos 120 anos... Os valores estão invertidos, e dar voz a estes casos, promover esta gente, só revela, que somos um país de parvalhões, ou, não sendo, que alguns, e o sr. balsemão, tem contribuído, para nos fazer de parvos. Vá lá, ainda não proibiu o Eixo do Mal...
ResponderEliminartbm
Olá TBM!
ResponderEliminarQuanto à badalação está a dar-me uma boa notícia. Como só posso pegar nos blogues à noite, sempre depois das 22, e como gosto muito de escrever, entrego-me a isto e mal tenho tempo para visitar os outros. De resto, não conheço muito bem o mundo da blogosfera. Contudo, quando visito alguns surpreendo-me com a qualidade de alguns.
O que sei é que este meu vai progressivamente tendo mais visitas diárias. Agora geralmente tem bem para cima de 400 visitas por dia. De facto, ultimamente ronda as 500. E eu fico parva com isto. Deve ser o passa palavra, porque ninguém me conhece e eu também não conheço ninguém. Fico mesmo admirada com isto. E contente também, claro. Mas é uma coisa um bocado inexplicável para mim. Estar aqui sossegada a escrever o que me vai na cabeça e haver tanta a gente a ler. Tem graça.
Quanto ao que diz, claro que não podia estar mais de acordo. Há uma falta de exigência da nossa parte que, em parte, resulta de uma manipulação intencional e, também, da incompetência jornalística que idolatram qualquer coisa, sem perderem um minuto a pensar no fundo das questões (e uma parte tem a ver com o entorpecimento em que andamos).
E olhe, TBM, muito obrigada pelo seu feedback. Gosto imenso de conhecer a opinião de quem está aí desse lado. Muito obrigada, mesmo.
Olá amiga Tá.
ResponderEliminarNada que se compare à sua lucidez e sabedoria, mas hoje também a mim me deu para o desabafo tipo assim como quando um balão já não leva mais gás e faz ploff!!
Que tristeza o nosso país nas mãos destes governantes. De tanta hipocrisia e ganância. Enfim, não vamos tornar isto mais cinzento. Passe por lá se puder e deleite-se com os finalmente que lá deixei para desanuviar.
Grande beijinho
Teresa
Teresa-teté,
ResponderEliminarJá lá estive. Gostei. E concordei com tudo. E estive a ouvir a música de que tanto gosto.
Obrigada pela visita e pelas palavras e vamos lá a animar-nos que os nossos descendentes precisam de um mundo melhor, com gente feliz.
Um beijinho, Teresa-Teté.
Está a fazer sucesso aqui, entre os blogs, posso garantir, pela referência que lhe vão fazendo. Eu, que não tenho blog, sou amiga, tia, e familiar de muita gente considerada nos blogs. Comecei por divulgar o primeiro que descobri, aliás, e através do Fio de Prumo, que lhe fazia, simpática, referência, fui ver, revi-me e gostei, e passei a divulgar. E muita gente gosta e agradece que eu divulgue. Espero que entendam que a "propriedade intelectual", como se usa dizer, não é minha, apenas passo a palavra. Mas, também já percebi, que existem pessoas, que não sabem que estão a ler blogs. Acham, que estão a ler a opinião de quem partilha, uma opinião... Porque não olham devidamente para as coisas. Ainda vamos ter muito que palmilhar, mesmo por aqui...
ResponderEliminartbm
Olá TBM, boa noite... ou bom dia, conforme a hora a que me leia,
ResponderEliminarDa minha parte só posso agradecer o passa palavra. Isto consome-me um bom bocado de tempo (até porque gosto de colocar fotografias, algumas minhas, ou pequenos filmes e a escolha é coisa que demora) mas o que é verdade é que escrever e, por vezes, pesquisar (porque gosto de ter a certeza daquilo que digo), tem sido estimulante, farto-me também de aprender, e gosto de partilhar, sempre gostei.
Por isso, fico feliz se as pessoas gostam e sabe? há muitas pessoas que me escrevem e dizem que as ajudo com as minhas palavras ou que aprendem também comigo e isso, para além de inesperado, é simpático, fico contente.
Posso às vezes andar perdida de sono mas, ao menos, alguém aproveita alguma coisa.
Um beijinho de sincero agradecimento pelo seu cuidado na divulgação do que aqui escrevo.
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