domingo, março 26, 2023

Viver

 

Bem. Aquilo que vou mostrar abaixo é tudo o que é oposto em relação ao meu estilo de vida. Eu preciso de segurança, de conforto, se ter a certeza que o futuro está devidamente salvaguardado, quando estive grávida e dei à luz quis ter a certeza absoluta que estava bem acompanhada, com um bom médico, num lugar que tivesse equipamentos que pudessem vir a ser necessários, depois em boas escolas, depois preocupada com o futuro deles. Sempre a querer prevenir o dia de amanhã, como soe dizer-se, seja para mim, para eles e agora também já para os filhos deles 

Mas a verdade é que admiro quem pensa o oposto do que eu penso, quem age livre e despreocupadamente.

Acho que é como na pintura: nas minhas paredes o que tenho é alheio e é aquilo de que gosto (eu e o meu marido, obviamente). Mas, se me ponho a pintar, o que me sai é o oposto. 

Pode gostar-se do que nos é distante, a todos os títulos. Aliás, às vezes parece que até me sinto mais próxima do que me é mais distante.

Uma casa feita com as mãos, viver do que a terra dá, ter um filho no meio do nada, criar a criança na natureza e entre amigos, é algo que eu jamais quereria para mim. Sobretudo, acho que por ser medrosa. E digo isto pois não consigo evitar pensar como será quando as crianças sentirem que deveriam ter frequentado a escola, convivido na cidade com outras crianças ou quando ela for mais velha e precisar de cuidados médicos e precisar de sustento e já não tenho como provê-lo por si só. Mas, por outro lado, acho que deve ser uma vida boa, a dela, uma vida animal, dentro da natureza a que pertencemos, agradecidos com o que a terra e o ar e a vida e o tempo nos dão.

Ela vive numa construção clandestina e acredita que ninguém a tirará de lá pois é uma construção integrada na natureza, feita com os materiais da terra e porque, segundo ela, para todos os efeitos, pode considerar-se que é um construção provisória. Mas diz que, se a tirarem, ainda assim acredita que se sentirá feliz pois o que tem vivido ali já lhe valeu a pena, sente-se feliz pelo que ali tem aprendido e vivido. E isso chega-lhe. E eu compreendo-a.

Nos antípodas do estilo de vida dela, lembro-me do que um amigo me disse quando lhe contei que tínhamos resolvido vir viver para uma moradia rodeada por um jardim, fora dos centros urbanos. Disse-me ele que não foi opção que alguma vez tenha considerado pois pensa sempre que, quando um morrer, a casa ficará grande e solitária para o que sobreviver. Percebo-o muito bem. Mas disse-lhe que esse raciocínio nunca entrou na nossa equação pois mesmo que isso um dia aconteça (e é provável que aconteça), o que vivermos até lá terá valido a pena. Cada dia conta. E claro que cada dia pode ser o último. Mas não temos que estar a pensar nisso em cada dia, temos é que dar-nos por felizes por termos esse dia para vivermos.

Viver como a Isa vive, tranquila, no campo, e, ao mesmo tempo, integrando algum tecnologia, deve ser bom. Isa parece banhada por luz e, não sei se pela cor do cabelo ou dos olhos, parece que a luz também lhe vem de dentro. E a casa é bem bonita. Se calhar viver como vivem os animais, que não se preocupam com os acasos de que é feito o futuro, sentir apenas o tempo que alimenta a vida é a forma inteligente de se viver.

Vivo de maneira completamente antagónica mas admirar quem é o meu oposto ajuda-me a manter o equilíbrio, os pés n terra, a cabeça na lua.

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Abro um parêntesis para dar notícias do que referi aqui e aqui. No outro dia deixei-a no hospital, à noite. Acompanhei-a até a levarem para o internamento numa ala provisória pois na ala para onde deveria ir não havia vagas. No dia seguinte, de manhã recebi um telefonema. Informavam-me que a tinham transferido para outra unidade do mesmo hospital, um edifício a uns dez quilómetros. Fiquei admirada, pensando que lhe tinha sucedido alguma coisa. Não, apenas isso, tinha sido transferida. Provavelmente precisaram da cama onde estava (desde há não mais que umas quatro ou cinco horas). Quando a fui visitar, contou que de noite estava a dormir quando ouviu uma barulheira e alguém chamar pelo nome dela. Acordou assarapantada, pensando que era de manhã e que ia fazer algum exame. Não, era uma da manhã e ia ser transferida. Ficou espantada mas não lhe deram explicações. Puseram-na numa ambulância e lá foi.

Entretanto fez anos. Conseguimos que deixassem que fossemos os três, eu e os meus filhos, levámos um bolo com velas, cantámos-lhe os parabéns a você. Tirámos fotografias, a minha filha fez também um vídeo. Parece estar bem. Pelo menos está melhor do que quando deu entrada nas urgências, na quarta-feira à hora de almoço. Está a ser estabilizada, em vigilância. E far-lhe-ão mais exames para ver se fica boa para ir para casa. 

Diz que tem dormido bem, que tem comido bem, está bem encarada e bem disposta. No fim do ano passado esteve uma semana internada num hospital privado mas não gostou, estava sempre em dúvida sobre se não estava internada ou a tomar medicamentos desnecessários por mero mercantilismo. Ao princípio coloquei essa hipótese mas depois percebi que não. Ela não se convenceu. E aparentemente tanto lhe dá estar numa enfermaria com uma data de gente, com uma casa de banho no corredor, ou num quarto só para ela, com casa de banho privativa.

Este sábado, depois de a termos ido ver, juntámo-nos aos demais e fomos até à praia. Os meninos brincaram, comeram gelados, apanhámos sol, conversámos. Foi bom.

Claro que ando cansada. Primeiro foi o joelho, depois a covid, depois o pós-covid (que ainda dura) e agora esta situação que, sendo obviamente pior para ela, a mim também condiciona completamente os dias, tanto mais que é um bocado longe daqui e tenho lá ido todos os dias. Mas são fases, passam. E, desde que as encaremos com optimismo e algum leveza, tudo se vai resolvendo.

Claro que não tenho tido disponibilidade para rever o meu 'livro'. Nem tempo para agradecer os vossos comentários e mails. Leio tudo e agradeço-vos mas não levem a mal que não vos responda ou agradeça já.

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E este é o vídeo que mostra Isa a viver no campo, feliz da vida. Está legendado em português.

Jovem mora em caverna e dá à luz a filha sozinha

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Desejo-vos um bom dia de domingo

Saúde. Confiança em dias melhores. Paz.

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