É sábado e, afinal, continuo sem conseguir dar uma para a caixa. Aliás, ainda pior um pouco que ontem.
No entanto, a culpa não é do dia. Pelo contrário, o dia foi bom, tranquilo, nada a lamentar.
Mas não dormi bem. As preocupações e revelações da véspera fizeram-me acordar a meio da noite, deixando-me algum tempo sem conseguir dormir.
Depois, estando de novo já a dormir, acordei com um sonho. Já era de manhã, seis e meia da manhã. Uma vez mais, acordei a rir à gargalhada. O meu marido, que já estava acordado, admirou-se. Acontece que eu estava numa daquelas de quando nem consigo falar. Ria, ria, ria. Quase sufocava a rir. Levantei-me, fui à casa de banho, e fui e vim a rir. Quando regressei à cama fiz um esforço para lhe contar. Mas não consegui, ria, ria, ria.
Quando fomos fazer uma caminhada, de novo tentei contar-lhe mas voltei a rir até mais não poder. Ele sorri ao de leve. Já nada o espanta.
Vou contar-vos, porque a escrever é mais fácil, mas peço que não levem a mal. A sério: sem ofensa. Foi um sonho. Vou contar tal como me lembro. Foi assim:
Estava com um grupo de amigas e resolvemos ir lanchar. Uma disse que tinha ouvido falar num sítio. Fomos. Era num primeiro andar, parecia uma casa de habitação transformada. Havia uma mesa grande com uma toalha encarnada e com bugigangas em cima. Fomos ver. Nem percebi o que era aquilo. Uma senhora disse: é uma quermesse. Olhei e vi pratinhos ínfimos de barro, mas toscos, sem história, bocadinhos de vidro, tretazinhas sem qualquer estética e que não vi como servirem para alguma coisa. Cada coiseca com um papelinho com o preço. Começou a dar-me vontade de rir. Depois olhei para as paredes e vi símbolos pintados em faixas encarnadas. Reparei que havia símbolos que se repetiam. Junto a cada símbolo uma letra. Perguntei: 'São símbolos?' Disseram que sim com ar de quem nem percebia a dúvida. Perguntei: 'Mas que símbolos são?' E então uma senhora com ar de sargentona disse-me, muito compenetrada: 'Mecanismo. Folha de gengibre. Passarinho.'. Ouvi sem querer acreditar, a tentar conter o riso. Uma que estava comigo, não percebeu bem: 'Folha de cálculo?'. E a outra, agastada, quase ofendida: 'Não! Folha de gengibre!'.
E eu já mal conter o riso. Quando tenho vontade de rir e quero conter-me, fico quase a explodir, a gargalhada pronta a desbragar-se. Depois, olhando bem, em volta, ocorreu-me: 'Mas isto aqui é o PCP?'. E a sargentona: 'Claro, havia de ser o quê? Não conhece os símbolos?' E eu, quase a rebentar a rir: 'Mas têm significado?'. E ela, séria, institucional: 'Têm valor histórico'. Toma e embrulha.
E eu cada vez mais aflita para não me desatar a rir.
Então uma das minhas amigas chamou-nos à varanda. Havia música na rua. Um homem baixo, encorpado, careca, os pelos do peito grisalhos, de calções curtos de futebol, tshirt de alças, decotada, e com uma coisa no corpo de tipo catavento, dançava desengonçadamente, de forma destrambelhada e cómica. Dizia: 'Como saí do partido, agora para usar o mecanismo só cá fora, na rua'. E eu, perdida de riso com os movimentos de baiana desasada dele, parecia uma bicha maluca mas com corpo e traje de campista, com o dito mecanismo a mexer-se em cima da cabeça e em volta do corpo, quase como uma hélice ou umas asas mal amanhadas. Não me contive, desatei a rir, a rir. E a pensar: 'Como será que dançam usando o símbolo da folha de gengibre? Ou o do passarinho?'.
Só maluquices, bem sei. Os meus sonhos têm o seu quê de surreal, acho que já aqui o confessei. E fazem-me rir perdidamente. Tenho passado o dia todo a rir, lembrando-me da sargentona a falar com orgulho dos símbolos históricos do partido: 'Mecanismo. Folha de gengibre. Passarinho'.
Juro, estou a escrever e a rir. Fazer o quê? Falta-me um parafuso, provavelmente.
Resultado: primeiro que voltasse a adormecer foi uma chatice, desatava a rir a toda a hora. Depois, certamente muito pouco depois, estando a dormir, tocou o despertador. Portanto, a noite não foi o repositório de descanso de que estava necessitada.
A seguir ao almoço fomos levar a vacina. As vacinas. Covid e gripe. Muita gente mas a fluir. O acto em si, normal, tranquilo.
E depois, mais ao fim da tarde, fomos dar o nosso passeio higiénico com o urso cabeludo. Também tranquilo.
O pior foi que, ao chegar a casa, vínhamos os dois meio KO. Eu adormeci no sofá, mas profundamente. Ele não sei. Jantámos meio mongas, espapaçados. Foi o resto do almoço, ele é que aqueceu, que pôs a mesa.
Depois arrastámo-nos, de volta, até à sala. Ambos quase a dormir, com frio. Fomo-nos encasacar. Agora já não estou a congelar mas está a pesar-me tudo, sobretudo a cabeça, nem sei se é a querer doer, se é a querer que me deite.
Nas outras vezes que as levámos não nos deu pancada alguma. Agora, não que seja grave mas é uma moleza em cima do corpo que nem vos digo nem vos conto. E dói-me cada braço, no lugar da picada. A jovem enfermeira disse para pormos gelo. Mas, com o frio com que, apesar de tudo, ainda estou, nem pensar em despir-me para me pôr de braço ao léu com gelo em cima. Disse também que tomássemos paracetamol se tivéssemos sintomas. Mas dá-me ideia que, da forma como estou, se tomo um paracetamol, durmo, de seguida, até segunda feira. Não sei se isto é efeito secundário da vacina ou se é do mecanismo, folha de gengibre, passarinho, mas de alguma coisa é.
Vou, pois, ver se consigo arrastar-me até aos meus aposentos. O que me vale é que a cama, a esta hora, já deve estar bem quentinha.
Fui.
__________________________________________
Mas antes: desejo-vos um bom dia de domingo
Saúde. Boa disposição. Paz.
UJM
ResponderEliminarA exemplo do ano passado, também levei as duas ao mesmo tempo. Este ano, a enfermeira, devia estar zangada com o marido ou namorado, não teve contemplação com o homem que tinha pela frente, e espetou, a agulha as duas vezes sem dó nem piedade, porra, andei três noites a dormir de papo para o ar porque ao virar o corpo, doía.
Ai, Ccastanho, não me diga nada. Também me dói cada braço, no local da picada. Mas isso não é nada quando comparado com a moleza que tenho em cima de mim. Também me doem um bocado as pernas em cima mas o pior é mesmo o sono e a moleza. Na rua arrasto-me. Aqui no sofá adormeço e olho para o computador sem energia.
ResponderEliminarA enfermeira disse-nos que, se nas vezes anteriores não sentimos efeitos secundários, agora também não sentiríamos. Pois nunca senti nada e agora estou aqui como se precisasse de dormir durante uma semana. É certo que já andava a precisar de de descanso. Mas agora é diferente. E o meu marido está na mesma.
Mas se calhar amanhã já estou fina.
Obrigada pelo seu testemunho.
Uma boa semana.