O PCP e Gorbatchov

 

Já votei CDU nas autárquicas, fui apoiante da Geringonça quando ela se formou, defendi Jerónimo de Sousa por pensar tratar-se de um homem honrado.

Sempre relativizei algumas afirmações e atitudes do PCP, no fundo por me parecer que há ali uma irracionalidade que é próxima da fé religiosa, daquelas coisas em que há uma questão de crença contra todas as evidências e que, sendo isso, deixá-los estar, a crença é coisa do domínio da metafísica, quem acredita, acredita. Desvalorizava o resto à pala disso.

Contudo, a posição hipócrita, sectária, manipuladora e, mesmo, de desonestidade intelectual do PCP face à invasão da Ucrânia por parte da Rússia foi, aos meus olhos, a gota de água. Não é possível continuar a relativizar o que os comunistas portuguesas dizem e fazem.

A reação agora perante a morte de Gorbachev é outra que tal. É uma reacção tão absurda, tão primária, tão obtusa que até dói. Não há explicação. É de doidos. 

Da minha parte o que posso fazer em relação ao PCP (ou CDU) é simples: não voltarei a votar neles, seja para o que for.

E se já fui à Festa do Avante, uma ou duas vezes, para ver como é -- e é coisa que não vale a pena, uma espécie de festa de campistas ou de excursionistas -- uma coisa também é certa: não voltarei a lá pôr os pés. 

Tenho agora para mim que ainda bem que os que restam dos comunistas em Portugal não têm qualquer poder pois, se o tivessem, seriam perigosos. Ainda há pouco soube de algumas atitudes vexatórias que alguns tiveram publicamente contra quem queria aprovar uma moção a favor da paz na Ucrânia, uma coisa verdadeiramente pidesca. A distorção ideológica, o desrespeito pelo direito internacional, o apoio às ditaduras, a defesa de oligarcas, a solidariedade para com regimes em que impera o desprezo pelos mais básicos direitos humanos, a simpatia por regimes em que campeia a corrupção, a tirania e a ausência de respeito pela democracia e pela liberdade não podem ser relativizados. Por muito que manipulem e envolvam o que dizem em conversa dita de paz, por muito que invoquem frases feitas ou o passado anti-fascista de alguns militantes (e ninguém desvaloriza esse passado) a verdade salta à vista. E não pode ser relativizada.

Claro que, no meio de tudo isto, continuo com a mesma dúvida de fundo: o que leva gente que penso ser gente de bem, gente que sei que não é mentecapta, a continuar a defender o PCP? Ou, se não a defender, pelo menos a compactuar? Cegueira clubística? Fanatismo religioso? Não sei. Não percebo. Mas assusta-me. Desgosta-me e preocupa-me.