domingo, março 20, 2022

No meio das mil sombras de grey é bem visível uma linha muito vermelha, tingida de sangue

 


Aprendemos, quando estudámos História, que há sempre gente que se põe do lado do invasor. Desde tempos imemoriais. Enquanto uns querem manter a nacionalidade com que nasceram e defendem a sua terra como se defendessem a sua casa e o seu coração e querem a independência da sua terra e do seu espírito e a liberdade para escolher o que querem, há sempre os que se baldeiam para o lado de lá, defendendo os agressores. Sempre assim foi. Corre-lhes nas veias o sangue de Miguel de Vasconcelos. Vêem vantagens em alinhar com os invasores, criticam os que lhes fazem frente. 

Claro que lutar pela liberdade custa muito. Por vezes custa a liberdade. Por vezes custa a vida. Mas há os que antes livres, embora em risco, do que ajoelhados e servis.

Não vale a pena eu tentar imaginar o que faria se fosse ucraniana e quisesse continuar ucraniana e quisesse viver civilizadamente, livremente, junto dos outros europeus livres e, ao mesmo tempo, tivesse medo da ameaça do ditador assassino. Se calhar lutava com todas as minhas forças a favor da Ucrânia livre, quereria que a Ucrânia aderisse à UE e, provavelmente, com medo de que neutralidade significasse ficar indefesa, quereria que a Ucrânia pertencesse à Nato. Se calhar.

Há por aí muito fala-barato a pregar que a Ucrânia não apenas deveria estar caladinha para não afrontar o violador Putin como que nunca deveria ter dito que gostaria de estar dentro da Nato. 

Mas o que se vê é no que deu a neutralidade em que a Ucrânia está. Neutral e indefesa -- sem que a Nato se arrisque a defendê-la não vá o criminoso carregar em mais botões, nomeadamente os nucleares, e não apenas abrir uma cratera invernal onde andes havia um país como espalhar a guerra por todo o mundo. Se a Ucrânia pertencesse à Nato certamente o cão raivoso teria pensado duas vezes. Assim está à vontade: destrói, esventra, dizima, extermina. E nós, os civilizados, os livres, nada podemos fazer para travar o criminoso porque, como a Ucrânia não pertence à Nato, estamos de pés e mãos atados. Bela neutralidade a da Ucrânia... muito conveniente para a Rússia. 

E, perante estes crimes tenebrosos, ainda há quem venha criticar a Ucrânia ou lembrar guerras pretéritas. Não sei como funciona a cabeça desta gente que, num momento em que o que há a fazer é exigir o fim da guerra e o fim da invasão e afirmar o total repúdio pela actuação de Putin, aparecem a invocar outras guerras e nem todas com mão de Putin. Claro que nem todas as guerras à superfície da terra têm mão de Putin. E daí? 

Vamos continuar a matar-nos uns aos outros até que não sobre vivalma porque antes houve uma guerra e antes de essa uma outra e antes uma outra e antes uma outra e antes uma outra? Vamos ser burros a esse ponto?

O mundo não é linear nem a história é a preto e branco. Sei que há muitas sombras, muitos cinzentos, mil sombras de cinza. Mas no meio de tudo há uma linha vermelha, traçada a sangue. E aí a compreensão dos factos simplifica-se: há os que estão de um lado dessa linha e os que estão de outro.

Eu estou do lado da liberdade, da democracia, do direito à livre escolha dos cidadãos, eu estou do lado da paz. Nem tudo é perfeito neste lado. Mas, ainda assim, é o lado que prefiro. Do outro lado há os que defendem regimes autocratas, ditatoriais, intimidatórios, os que não querem saber de liberdades e direitos individuais, os que não respeitam a dignidade ou a vida humana.

E há ainda a corte dos agressores, violadores, assassinos: gente que os desculpabiliza, que acusa as vítimas, que invoca os 'mas' que sempre há para invocar. Do lado desses, bem como do lado dos cobardes, vendidos e influenciáveis claro que não espero mais do que aquilo de que são capazes: intriga, ameaças, manipulação, maledicência, conversa fiada.

Mas dos corajosos eu espero que não se calem. 

É importante que muitas vozes consigam chegar até à Rússia. É importante que comece a formar-se na opinião pública russa o sentimento de revolta e de consciência da insustentabilidade daquele regime corrupto, podre, diabólico, malévolo. É importante que rapidamente apeiem o criminoso. Putin tem que ser impedido de continuar a fazer mal, tem que ser impossibilitado, seja de que forma for, de continuar a espalhar o mal e a envenenar o ar que se respira.


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Fotografias, uma vez mais, do Guardian

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E a vida continua. Este sábado foi um dia muito feliz para nós, cá em casa. Estivemos todos juntos, em família, estivemos bem e em paz. Excepto eu e o meu marido, todos os outros, graúdos e miúdos jogaram ténis, brincaram. E comemos à volta da mesma mesa, conversámos. Um dia sereno.

Como eu desejo que todos, todos, possam estar bem, de boa saúde, apaziguados, tranquilos, sem inimigos, fazendo planos para o futuro... 

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Saúde. Paz.

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