segunda-feira, junho 14, 2021

A liberdade segundo Jon Batiste

 

Era muito pequena, seguramente menos do que cinco anos. 

Pelo verão, havia umas festas de aldeia. Hoje não localizo bem onde seria. Lembro-me de umas casas, um largo. Não sei se ali não seria terra batida. Uma zona de campo. Baile, cavalhada, arraial, jogos populares. Lembro-me que penduravam bilhas com água, se calhar estavam penduradas numa corda que unia duas árvores,  e que homens passavam montados em burros a ver quem partia mais bilhas (literalmente falando). De cada vez que um conseguia, era uma festa.

E havia petiscos. Cheirava a chouriço assado, se calhar também a polvo assado, não sei, não posso dizer  -- mas era aquela mistura de cheiros que, em noite de festa, abre o apetite e traz alegria. E os miúdos andavam à solta, corriam, brincavam, dançavam. Havia muita música e muita animação. Tudo na rua. Uma recordação de liberdade e alegria.

Não sei se nessa altura as pessoas se vestiam de forma muito colorida. Diria que não. Naquela altura a moda tendia para o soturno, para o ensimesmado. Era o tempo do tecido a metro e das modistas e alfaiates e das camisolas tricotadas. 

Contudo, quando vejo fotografias dos meus pais com os seus amigos, primos, irmãos e cunhadas, vejo-os com um aspecto quase hollywoodesco.  A minha mãe tinha vestidos claros, frequentemente floridos, corpo justo e saia rodada, o meu pai tinha calças de irrepreensível corte direito, camisas de aparência moderna, ambos de óculos escuros. Eram jovens, elegantes. Eu não estou nessas fotografias. Ou ainda não existia ou ficava com os meus avós. 

Contudo, nas festas de arraial na aldeia, nos arraiais no recreio da escola ou nos jogos de futebol em que o pai participava, andavam certamente mais práticos. 

Mas, fosse onde fosse, a minha sensação de liberdade era sempre a mesma. Eu a correr por onde queria com outros meninos, a minha mãe a conversar com amigas, o meu pai na sua vida (tenho ideia que fazia parte da organização de várias destas coisas e lembro-me dele atento a ver se as coisas estavam a correr bem) e, portanto, eu à solta.

Ao ver este vídeo com o Jon Batiste a interpretar Freedom foi do que me lembrei: alegria, largueza de movimentos, a rua como cenário para se estar, a rua como lugar de encontro e de festa.

Agora o colorido de todos eles é que é não corresponde à minha memória: aqui, nas cantorias, do Jon Batiste, as cores vibram e brincam e dançam de dar gosto. E aqui o ambiente é urbano enquanto nas minhas memórias é rural. Mas a liberdade é a mesma.


Dá vontade a gente ir para a rua dançar e cantar, não dá?

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Pinturas de Lee Rumsey e George Mullen, respectivamente

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Até já

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