quinta-feira, dezembro 12, 2019

Um conto de Natal à moda da vossa Sta UJM




Só para dizer que ele há coisas. Fui para comprar um livro para uma certa pessoa, vermelha dos quatro costados. E que reparem os Caríssimos nortenhos como esta verde alface que aqui têm agora, com propriedade, está a usar a palavra vermelho. Ora, sabendo eu que deveria ter o cuidado de não oferecer um livro capitalista nem um a falar mal dos bolcheviques ou dos regimes soviéticos e pró-soviéticos em gearl, só se me saltavam os olhos para coisas dessas, completamente impróprias para o suposto consumo. Então, na demanda sistemática que resolvi levar a cabo, olhando para cima e para baixo dos escaparates, fui descobrindo mais uns quantos, não para o fim em vista, mas, quiçá, para o meu marido. 

Quando agora à noite viu um sacalhão, insurgiu-se todo: Mas não tinhas dito que já tinhas comprado os livros todos? Queria ele dizer 'para o Natal'. Expliquei que eram quase todos para ele, muita, muita bons. Disse: 'se são assim tão bons, quero já começar a ler'. Mas nem pensar, tem que esperar que o Santa Klaus desça pela chaminé e os coloque na meia. E disse-lhe o que tinha comprado para a tal pessoa. Disse: 'Coitado...'. Como sou pessoa sem problemas de auto-estima não me condoí de mim.

Bem. Mas então queria eu dizer que. 

Como paguei os livros nas máquinas de pagamento self-service, não tive oportunidade de trazer um saco. Então, vim com uma braçada de livralhões pesadérrimos prestes a despenharem-se. E aflita para fazer chichi. A pensar: mas como? onde pousar os livros? Ainda pensei: será que só com uma mão consigo desabotoar as calças, baixá-las, ficar em equilíbrio para não me sentar, etc, e, em simultâneo manter o equilíbrio com os espiões, os historiadores e os políticos no outro braço? Admiti: impossível. Uma aflição.

Pensei, então, vou à Zara compro uma coisa qualquer, peço um saco dos grandes e meto lá os livros. E assim fiz. 

Vestidinhos para soirée, vestidinhos para dates, vestidinhos para impressionar, vestidinhos para a véspera do Christmas. E camisolas para o frio e camisolões para outras ocasiões. E pérolas em colares, em brincos, em pregadores, em ganchos. E enfeites com brilhos, com glamour. E casacos, casaquinhos e casacões. E eu aflita para fazer chichi, já quase sem conseguir dar passo, já cheia de arrepios e tudo.


Pensei: Controla-te, mulher, a vontade de fazer chichi é psicológica. Não vou pensar nisso e vai passar. 

Peguei então num vestido super-hiper tchanam, tão rouge e pequenino que mais parecia um hot baby doll, e fui para o provador. Pensei: com este vestido, todo encarnado (encarnado porque era um vestido capitalista), todo cheio de brilho, vou ficar com o espírito natalício impregnado em mim. Comme il fault. Depois, como tenho uma mente tendencialmente perversa, pensei: com um vestido destes, só espero que o Santa Klaus também se apresente a preceito. Já estava a ver-me, toda produzida, toda mulher de vestido encarnado, toda natalícia, e um Pai Natal, todo oh-oh-oh, a aparecer-me em pessoa ali no escurinho da sala. E as luzinhas blinc-blinc a darem nele. 


Depois, enquanto avançava para o provador, tive um rebate de consciência: 'Credo, ó pr'a mim com pensamentos tão indevidamente cintilantes... como se o Natal fosse isto...que horror...'.

E nisto, ao entrar no provador, vejo que a anterior ocupante se tinha esquecido de alguns pertences: uns restos de palhinhas, daquelas que por vezes estão a acondicionar algumas peças para não se partirem e, em cima, uma revista. Ao pegar na revista para entregar à empregada, vi que tinha o Jorge Jesus na capa. Então percebi: era um sinal. Jesus nas palhinhas. 

Foi como um raio. Saí dali sem comprar nada, vade retro consumismo. Carregada de livros, uma verdadeira doutora, fui para o carro. A vontade de fazer chichi tinha desaparecido. O milagre tinha acontecido.

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E, depois deste angélico conto natalício, só posso mesmo é sugerir-vos que deixem que o espírito rebelde que há em vós se manifeste. juntem-se, pois, ao Seth e a mim.
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E uma bela quinta-feira a todos. 
Oh-oh-oh.

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