quarta-feira, setembro 25, 2019

Paradoxos, contradições, cenas, coisas que não são o que parecem.
E, claro, bolos.





Nesta era de fake news, de bruah-ah-ahs virais, de inflamados estados de alma e de funfuns e gaitinhas para todos os gostos parece que já não se pode ser politicamente incorrecto e dizer, tout court, o que verdadeiramente se pensa.

E isso é que era bom. Era, era. Era o que faltava.

Por exemplo.

E é mesmo só exemplo. Porque quem diz isto que vou dizer podia dizer outra coisa qualquer.

Por exemplo, se acho que o Ronaldo é o melhor jogador do mundo vou votar no Zé da Gatinha porque já não posso com o rabo da Georgina sempre espetado para a fotografia? Ora abóbora.

Ou.

Se acho que a Ana Gomes é a melhor comediante da televisão portuguesa, vou votar no Batatinha para o Globo de Ouro? Porquê?

Ou se acho que o Louçã é que tinha mesmo pinta de Cardeal, ia votar no poeta Tolentino para fazer turma com o Manuel Clemente et al.? Eu não. Está bem que aí não risco. Mas isto é um exemplo, ok?

Ou, se acho que o cão é o melhor animal para guardar a casa, vou mas é arranjar um canário fofinho só para o cão não ficar a achar-se? Sou maluca ou quê? (Quero dizer, ser se calhar até sou mas não sou parva, olhem lá)

Ou, se sou encalorada, vou vestir um casacão com gola de pele só para os encalorados não ficarem em maioria? isso é que era bom.

Ou, se quero fazer uma casa à maneira, vou contratar não um arquitecto mas um alfaiate só porque acho que os arquitectos acham que sabem desenhar casas e já não tenho pachorra para isso?

Ou se o chá de lúcia-lima me sabe bem e me faz bem vou beber um panaché de coca-cola só porque não gosto de facilitar a vida ao chá de lúcia-lima? Vou, vou...

Ou, se gosto de me perfumar antes de sair de casa, vou mas é pulverizar-me de alto a baixo com detergente para a louça só porque gosto de dar tiros nos pés?

Ora.

E, em vez de dizer o que me vai na alma a propósito do que vejo à minha volta, vou antes falar de equinócios dourados, outonos românticos, céus brancos e névoas macias como tule só para ninguém se sentir maçado com as minhas opiniões?

Ora. Era o que me faltava. Era mesmo.

Ou.

Só por exemplo.

Por exemplo, se gosto de chocolate preto e, ao mesmo tempo, de meter na boca um ou dois cubos de gengibre cristalizado, quero lá saber de mais ninguém gostar disso e de ninguém perceber que raio de gosto é o meu. Eu gosto, digo que gosto. Que é que hei-de eu fazer se sou de gostos inconsensuais? Fazer de conta que não? Em vez de chocolate preto à mistura com gengibre vou comer caramelos de Badajoz? Vou, vou. Havia de ter graça.

E se faço um esforço do pior que há para não me desatar a rir que nem uma perdida quando tenho pela frente um ga-ga-go muito ga-ga-ga-go a disfarçar que é ga-ga-go muito ga-ga-go porque hei-de eu dizer que não, que não me dá nenhuma vontade de rir? 
[E isto apesar de ter um na família e de eu própria, em miúda, durante algum tempo, ter sido ga-ga-ga. Aliás, o meu familiar acha que ser ga-ga-go é muito sexy, diz que tem muita saída junto das mulheres à conta disso.]
E se já estou a rir só a antecipar o que vai ser amanhã a entrevista da Joacine Katar Moreira com o Ricardo Araújo Pereira vou dizer que não? Vou, vou, esperem por essa. 

E vem esta conversa toda a propósito de quê? -- perguntarão vocês.

   Ora, a propósito disto tudo -- confessarei eu sem perceber a vossa dúvida.

Mas o que é 'isto tudo'? -- perguntarão vocês, ligeiramente atónitos.

     Ora, 'isto tudo' é o infinito que nos cerca -- responder-vos-ei eu do alto da minha perplexidade.

E aí vocês olharão à volta e, em silêncio, espantar-se-ão: Oh pá, mas esta gaja pirou de vez ou quê?

      E aí, lamento, não poderei esclarecer-vos porque resolver paradoxos abertos é coisa que não é para mim. Eu é mais bolos.

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E estes bolos -- que parecem feitos de propósito para adoçarem a nossa mente durante este nosso simpático período eleitoral -- foram confeccionados pelo pasteleiro Luke Vincentini que, qual J. Pinto Fernandes, não tem nada a ver com esta história.

E agora, para terminar, se não se importam, vão buscar uma flute de champanhe e preparem-se para delicadamente depositar este moranguinho na minha boca, ok?


Nham-nham

6 comentários:

  1. A UJM passou-se dos carretos?????????

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  2. Pois claro que me passei. Quem é que aguenta tanta conversa bem comportada, tanta análise, tanto cenário, tanta sondagem, tanto descálculo com base em teorias das probabilidades janadas?

    Portanto, se não se importa, não desfazendo mas aos costumes digo nada e pim-pam-pum cada bala mata um (sendo que aqui as balas e os matanços são inocentes e metafóricos).

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  3. Olá Ujm, se eu gosto de iogurte com açúcar mascavado misturado (não confundir com iogurte açucarado) e só me querem dar iogurte natural, por sinal bem amargo, porque raios não hei-de votar em enfiar uma colher de doce no iogurte! Eu gosto. Não é por haver mestres iogurteiros que me ameaçam com a escassez de iogurte em tempos de abundância de leite, que eu vou arriscar a comer a coisa amarga! Uma óptima semana para si. Ana

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  4. UJM, apenas li uma parte dos "ou's" porque me cansei.

    Mas qual é o problema de se dizer o que se pensa? Não percebo a dificuldade.

    (Embora não seja preciso dizer tudo o que se pensa, na medida em que em que tudo o que se pensa não interessa ao mundo, nem sequer ao indivíduo que partilha espaço de trabalho ou o que seja. Se eu não gostar da camisola da pessoa, não devo dizer-lhe sem que me pergunte, por exemplo. Isso é com a pessoa e não me prejudica. Não é uma questão da expressão para mim detestável que é o "politicamente correcto", mas sim de educação.)

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  5. Olá Ana,

    Pois saiba, Ana, que está a falar com uma fã de iogurtes. Mas, por exemplo, gosto muito de kefir que de doce não tem nada. Mas gosto. E gosto tal e qual ou gosto misturado com fruta ou com mel. E gosto de iogurte com gelatina. Só ainda não me habituei àqueles todos com proteínas. Acho-os muito espessos, um bocado pesados. E também gosto com sementes e cereais.

    E também gosto de salada de quinoa com peixe cru e edamame. E algumas pessoas, só de ouvir falar em tal, já estão agoniadas.

    Portanto, gostos.

    Uma boa quinta-feira, Ana.

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  6. Olá Isabel Pires,

    Fartou-se de tanto 'ou' e eu percebo-a. Mas estava para ali virada. Podia ter ficado a noite toda a debitar 'ou's. Fui pegando no argumentário que por aí vou ouvindo sobre razões para fazer o contrário do que me parece lógico e transformando-os em conversa mole.

    E também concordo: ainda hoje estive com uma amiga que é baixinha e cada vez mais gordinha, vestida com um vestido justo e curtinho, toda feliz da vida com a toilette. Ainda por cima estava a comer uma tosta com ar bem apetitosa, cheiinha de queijinho cheiroso e derretido. Seria uma tremenda falta de sensibilidade se chegasse ao pé dela e dissesse que aquele vestido não está com nada em relação a ela. Nem pensar. Ou dizer que aquela tosta apetitosa também não parecia adequada a alguém que quer continuar a conseguir enfiar-se em vestidinhos assim...? Claro que não. Aliás, estive foi a ponto de lhe pedir que me deixasse dar uma trinca na tosta.

    :)

    E haja boa disposição para enfrentar o dia a dia!

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