Há coisas em que penso de vez em quando. Parecendo que não, às vezes penso. O devir da humanidade é um dos meus temas de eleição. Podia fazer por menos mas sou assim, se é para pensar, então, mais mais vale pensar em grande. Na humanidade. Pimbas. E se pensam que estou na brincadeira pois saibam que não, que com a humanidade não se brinca. E não me venham com trocadilhos do carvalho, que qual humaninade qual carapuça, que tal enormidade não está à minha altura, que para aí germanidade ainda para vai -- que não, preocupo-me não com o manuel em si mas mesmo com o género no seu todo. Believe it or not.
E isto do believe it or not agora aqui metido a desconchavo deve ser influência do Kullervo que deu em querer que eu aprenda a exprimir-me em inglês. Podia ser grego antigo para ver se ultrapasso as minhas fronteiras mas não, british, coisa tão brexitiana, tão maysiana, tão borisiana. Ao menos en français para ver se exercitava o meu charme, paroles com mal de vivre lá dentro, paroles com bisous intuídos, paroles sympas, choses comme ça. Mas não, inglês e, ainda por cima, pouco técnico.
Mas, dizia eu, que a humanidade volta e meia assoma ao meu espírito. E vem cheia de problemas e eu, que preciso é de abrir a janela e deixar entrar o ar, fico é cheia de preocupações e falta de perspectivas com medo de falta de futuro.
Ah. Outra coisa. Nada a ver mas querem saber? A meio da tarde tive uma reunião num sítio e resolvi ir a pé. A avenida cheia de turistas, gente de mochilas, jovens de shortinhos e chinelinha, mulheres muito louras com belos chapéus, todas contentes por estarem a passear numa cidade do sul, Lisboa la plus belle. E eu, salto alto, em serviço. E, então, abre-se o semáforo para peões e a passadeira é também passagem para trotinetes e, em sentido contrário ao meu, avança uma meia dúzia delas, cada uma com um deus em cima. Gigantes, musculados, muito louros, muito bronzeados, calções e tshirt de alças. Vi-me no meio deles e pensei que eram cavalos em tropel e me iam levar com eles, na garupa do bicho. Mas não, passaram por mim como se eu fosse transparente, eu a chegar ao passeio oposto e eles a passarem para o lado de lá. Suspirei mas foi suspiro curto pois logo novo tropel, eles de novo, agora na minha direcção, passando por mim, seguindo a grande velocidade, cavaleiros, deuses correndo em terra. Imagem maravilhosa a meio da tarde. Um pequeno exército de guerreiros lindos de morrer.
Mas, dizia eu, a humanidade, quando me invade a cabeça, só me dá ralações. Felizmente não é coisa em que pense muitas vezes. Mas, quando penso, só me apetece dar um chega para lá na ideia, pensar que até que a coisa se estrafegue de vez já eu cá não estou. Mas fico a pensar que ao ritmo a que a coisa se está a dar, mesmo que não dê grilo para mim, na volta ainda vai maçar os meus meninos e os que vierem depois deles e isso maça-me.
Uma das coisas que me dá que pensar é a falta de água. Medo. As temperaturas cada vez mais altas, calor abrasador, a terra gretando, as fontes e as nascentes secando, os rios exaustos, os peixes asfixiados, mortos, no que em tempos foram margens frondosas, os poços com águas pastosas, contaminadas. Os bichos desidratados, morrendo pelos caminhos. As pessoas precocemente envelhecidas, a pele enrugada, os lábios gretados, a língua inchada, branca.
Procuro, então, notícia de soluções para a falta de água. Máquinas que geram vapor a partir do calor que condensa, vapor que se transforma em água, água que alimenta árvores que se plantam na terra onde já não nasce nada, árvores que fixam a vida.
Aprendo sobre culturas que não precisam de água, procuro histórias de deserto transformado em bosque. Penso: essa é a grande luta. A luta pela sobrevivência. Combater o deserto que avança. Inventar água.
Não é coisa nova mas cada vez mais penso nisto. Leio como romance bom, coisa melhor que Tolkian -- que nunca li nem vou ler, não só porque sou ignorante encartada mas também porque acho que aquilo ali é mundo de monstros e seres trágicos e eu só gosto de ler história com gente de verdade e vidas com um lado bom. Ou então o contrário, história de lobos solitários, de tigres invisíveis de tão azuis, de cartas manuscritas, de poemas de amor, de rosas inalcansáveis.
La rosa,
la inmarcesible rosa que no canto,
la que es peso y fragancia,
la del negro jardín en la alta noche,
la de cualquier jardín y cualquier tarde,
la rosa que resurge de la tenue
ceniza por el arte de la alquimia,
la rosa de los persas y de Ariosto,
la que siempre está sola,
la que siempre es la rosa de las rosas,
la joven flor platónica,
la ardiente y ciega rosa que no canto,
la rosa inalcanzable.
Device could bring both solar power and clean water to millions
Researchers say one invention could solve two problems for people lacking basic resources
E leio e leio e leio e sobe por mim acima uma vontade de avançar e não posso dizer aqui para onde porque isto aqui não é lugar para business case, isto não passa de uma espécie de diary, daqueles que o erudito Mr. X diz que podiam ser blogs. Embora humble, humble, o meu. Mas, cenas dessas à parte, o que aqui posso dizer é que acredito que o mundo só pode sobreviver se os manuéis germanos do sub-género abaixo de cão desta vida caírem na real e perceberem que é tempo de se deixarem de lorota fajuta, de intriga besta, briguinha da treta, que deviam era concentrar esforços na salvação dos humanos, essa raça de bicho bronco, autofágico.
Mas como pode a humanidade lutar contra os demónios se, quando chega a hora de escolher, tantas vezes escolhe animais -- mas não animais elegantes, honestos, zebras sensatas embora aladas, mas, sim, animais burros, bestas quadradas?
Parece que Stephen King previu o advento da cavalgadura faz muitos anos e agora assiste ao assustador fenómeno de ver a ficção consubstanciar-se no Trump mais Trump que alguém poderia ter inventado. Um susto. Um vídeo que mete medo.
Poças, isto assusta. Trump, o real, é pior que a pior ficção. Mas não é só ele. Gente assim pulula por aí, alimentados a palha, medrando no pasto das redes sociais. É que tantos outros. O Bolsonaro, por exemplo, outro que tal também à frente desse grande outro país. Impensável. Gente estúpida, ignorante, coveiros da civilização, coveiros do planeta. Tantos.
Eu a querer pensar nos bons exemplos, naquilo em que temos que nos concentrar, e a ver gente estúpida por todo o lado. Penso nos refugiados, essa pobre gente sem terra, sem pão, sem paz, por aí a caminho, tantas vezes enfrentando a morte, em vez de estarem a reinventar as suas terras, a reconstruir cidades, a criar água, a desenhar florestas verdes e riachos, pássaros de mil cores. Uma incompreensão. O tempo a passar, o planeta a ficar exaurido e tanto desaproveitamento de tudo. E tanto que há a fazer. Tanto.
E ponho-me a ver e sou capaz de para aqui estar a ver e ver, todos os exemplos de homens que plantam florestas que encontro. São bons exemplos, histórias felizes, daquelas de que gosto.
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As fotografias photoshopadas de animais são de Julien Tabet
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E dias felizes para todos
Madame,
ResponderEliminarC'était pas mon but de vous déranger avec l'anglais... Mais vous savez, les femmes, vous avez le pouvoir de choisir, même quand le temps de choisir est déjà derrière nous.
Heureusement, on peut toujours dancer (avec le corps et, surtout, avec l'esprit)!
En vous souhaitant cordialement une excellente journée.
Oi Kullervo,
ResponderEliminarMerci par les cadeaux. Ils sont toujours três surprenants. Je ne connaissais pas les chansons ni les chanteurs et chanteuses. How do you know such uncommon things? Et, dites-moi: gosta das músicas que eu aqui costumo colocar? Or not your kind?
And you have already answered all my questions and I thank you for that. All but one. And I'm curious. Could you please answer? Or do you prefer mystery?
Aujourd'hui j'ai acheté des livres pour l'été. Is there any special book that you are kind enough to recommmend me?
E receba as minhas saudações cordiais, misterioso Kullervo