sábado, junho 01, 2019

Porque falta a electricidade na Venezuela?


Temos por vezes a tentação de acharmos que temos a solução para todos os problemas. Nem paramos para pensar que a coisa pode ser muito mais complexa do que imaginamos ou que desconhecemos a maior parte das verdadeiras condicionantes. Ou isso, ou pior: sem qualquer veleidade, achamos que conseguimos traçar a fronteira entre o bem e o mal, como se o bem e o mal fossem campos contrários e bem identificáveis -- e, a partir daí, armarmo-nos em espectadores à espera que uns vençam os outros. Tontos que somos, todos, temos também, muitas vezes, a tentação de assumirmos como adquiridas algumas realidades, sem que nos ocorra que, um dia, do nada, o enredo pode virar-se do avesso e o nosso papel passar a ser o oposto do que foi até então.

O que se passa na Venezuela é um desses casos e eu, apesar de dada a tentações, neste caso não me sinto tentada a nada: não dou palpites, não sei nada, não percebo nada, não faço ideia como é que aqueles pobres infelizes podem sair daquilo.


Era um país rico, promissor, um chamariz para investidores e, afinal, quando caíu o grande líder dos pés de barro, ficou à vista o atraso de vida que ali grassava. O sucessor, um arremedo de sucedâneo do morto, é outro Trump -- só que com conversa bolivariana. O país arrasta-se na maior miséria, num ambiente de bradar aos céus e o Maduro continua na dele, a clamar pelos amanhãs que cantam, brandindo ameças contra o Trump, contra os bandidos de Portugal que o roubaram, contra muitos outros inimigos, todos sabotadores, contra-revolucionários. Sendo que algumas vezes tem razão, ao embrulhar tudo na mesma linguagem lunática, ao mostrar a deformação lógica que enforma todos os raciocínios e ao exibir os tiques ditatoriais, mesmo quando teria razão, perde-a por completo. 

No meio disto, em vez de aparecer uma verdadeira alternativa, apareceu um que, fisicamente, até parece uma espécie de Obama mas sem nada a ver, sem que se perceba ao que vem, com a agravante de andar a ser levado nas palminhas pelo próprio Trump, pelo Bolsonoro e por mais um ou outro que mais valia estarem calados, ou seja, por gente que não é flor que se cheire.

Por vezes, ao saber da pobreza, da fome, da falta de medicamentos, dos cortes de electricidade, dos hospitais sem condições, ou ouvir testemunhos impressionantes em que se percebe a paranóia, o sectarismo e a cegueira do Maduro e dos que o apoiam, ocorre-me uma daquelas soluções a la minute (que caem pela base ao mais leve escrutínio): porque é que as nações Unidas não intervêm e não arranjam um qualquer comité que governe o país até que a dignidade seja restituída aos cidadãos e que haja comprovadas condições para levar a cabo eleições livres?

Mas se, na verdade, não sei qual a solução, custa-me compreender que, na era em que as máquinas aprendem e em que já não há cão nem gato que não use coisas que recorram a inteligência artificial ou a computação na nuvem, em que sequenciar o ADN já é canja de galinha, ainda não exista a solução para impasses governativos destes, em que quem está no poder não dispõe das mais básicas competências (a todos os níveis) para governar um país e em que não aparece alternativa credível. Deveria haver um manual com as instruções para seguir em cada caso. Mas pelos vistos não há e pelos vistos não é fácil saber o que fazer... e, portanto, tirando muita informação cruzada e muita contra-informação, não acontece nada. E os pobres coitados que ainda não conseguiram fugir, vão sobrevivendo sabe-se lá como.

A reportagem abaixo, da BBC, pode fazer alguma impressão (a mim fez-me muita) mas acho que deve ser vista. Por cá, em especial os camaradas do PCP deveriam conseguir tirar as vendas e ver o que aqui se mostra, mas ver com olhos de ver.                                                                                                                                                                                       

The truth behind Venezuela's blackouts



3 comentários:

  1. Não tenho interesse em entrar em polémicas por várias razões.

    Só digo que convém ver um pouco mais além do que se diz nas televisões ocidentais.

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  2. Por exemplo (embora num português de péssima qualidade):
    https://www.diariodocentrodomundo.com.br/por-dentro-da-tentativa-do-golpe-fracassado-de-30-de-abril-contra-maduro-por-fania-rodrigues/

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  3. Embora o Maduro não seja propriamente flor política que se cheire, se não existisse o boicote que está em prática, a Venezuela não passava pelo sofrimento que acontece actualmente. Quanto ao Governo português, não só não devia ter optado por uma política seguidista das posições da ALE, FRA, ESP, etc, até pelo facto de termos uma colónia de cidadãos numerosa naquele país, como não tinha o direito de cativar o dinheiro venezuelano que se encontra no Banco Novo (podíamos, por exemplo, ter tomado uma posição idêntica à da Irlanda). E é lamentável ouvir essa sinistra figura do actual governo, Augusto Santos Silva, vir dizer, mentindo e manipulando os factos, que o governo não interfere nas decisões de um banco privado, como é o caso do Banco Novo. O MNE Silva sabe muito bem que o Banco Novo, pelo facto de ter vindo a ser injectado, regularmente, com dinheiros dos contribuintes (de forma aliás escandalosa – não há dinheiro para a Saúde, para melhorar a Escola Pública, Tribunais e até os lesados do BES, etc, etc, mas há para enterrar no Banco Novo), é, para todos os efeitos, um Banco, que embora, na aparência seja privado, é intervencionado pelo Estado, resgatado pelo Estado e o mais que se sabe. Daí que , o governo português não tenha o direito de cativar esse dinheiro do Estado Venezuelano, que muita falta faz ao seu povo, para aquisição de, por exemplo, medicamentos, alimentos, etc, permitindo, aceitando, que se congele aqueles milhões que ali foram confiados e depositados pelas autoridades venezuelanas. Como digo, o Madura não presta, mas qualquer boicote e atitudes como as que o governo português tomou, de autorizar o congelamento do dinheiro venezuelano, que se encontra no Banco Novo, só irá atingir quem mais sofre, ou seja, o povo daquele país. Lamentável. Mas, é a política externa, subordinada a outros países mais influentes da U.E que temos hoje.

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