Há temas que, quando aparece uma criança morta à beira de água, se tornam virais e, como tal, toda a gente se sente contagiada. Depois, coisa tão triste acaba por cansar e a gente já nem quer ver tal coisa. já dizemos que é exploração de desgraça alheia, que é falta de gosto tanta fixação na dor dos outros.
E, dias depois, já nem vale a pena falar porque a coisa já passou de moda. E quando a gente vê barcaças transbordantes de gente até parece que já chegou a época dos saldos de refugiados, tal a banalidade daquilo tudo.
E não queremos saber de como as forças políticas de extrema direita -- devidamente adubadas com apoios financeiros e outros tipos de apoio por parte dos Steve Bannons desta vida, hienas solitárias, ou por parte de regimes que preferem uma Europa enfraquecida -- se organizam de uma forma cada vez mais estruturada.
A extrema direita usa sempre a mesma arma: o medo. O truque é instilar no seio da população, numa parte da população, a parte mais inculta, mais vulnerável, mais facilmente influenciável, o medo. Medo seja do que for. Pode ser o medo de ver as ruas invadidas por gente desempregada, faminta, mal vestida, falando línguas incompreensíveis, pode ser o medo de ver os impostos aumentados para pagar a integração de refugiados, medo que, entre os refugiados, venham meliantes, terroristas. Medo. E eles, os salvadores da pátria, as mamãs (como a Le Pen), os papàs´s (como o Salvini), aparecem como os que afastarão os medos, protegerão os 'puros', os nacionais, contra os intrusos, contra os bandidos que querem entrar no país para roubar o que pertence a quem já lá está.
Com maldade suprema, Trump separa pais de filhos, trata seres humanas como se fossem animais, seres humanos cansados, esfomeados, gente que apenas procura uma vida melhor para si e para a sua família. Mas não são apenas as fronteiras americanas que são palco de verdadeiros atentados humanitários nem é apenas Trump que é algoz. Cada um à sua dimensão mas a verdade é que culpados somos todos os que fazemos de conta que não existe.
Existe. E a indiferença com que aceitamos campos e campos de refugiados a perder de vista, uma coisa que nos deveria envergonhar, ou que aceitamos que milhares de pessoas façam quilómetros e quilómetros a pé para alcançar sabe-se lá o quê ou que aceitamos que o tráfego de armas e outros interesses geo-económicos prevaleçam sobre o respeito pelas populações, torna-nos também culpados.
A abstenção brutal nas eleições europeias é outra que nos deveria envergonhar. Como culpar a União Europeia de assistir impávida e serena a que tanta gente morra afogada no Mediterrâneo quando nem para votar nos demos ao trabalho? Como podemos censurar os que lá estão quando não nos demos ao trabalho de lá pôr quem defenda uma Europa mais humanitária, mais aberta, mais moderna?
Há quem tenha coragem e dê algum do seu tempo para ir ajudar os que estão em situações difíceis. Mas são poucos os que têm essa coragem. Eu nunca tive. De forma racional, penso que problemas desta dimensão não se resolvem com iniciativas individuais, apenas com políticas transversais, integradas, transnacionais. Mas isso sou eu a proteger-me porque sei que, mesmo não resolvendo o verdadeiro problema, se puder levar ensino, carinho e alguma atenção a quem nada tem já será muito. Portanto, é falta de coragem, sim. Mas, se a coragem não está connosco, ao menos que saibamos fazer tudo o que esteja ao nosso alcance para que o assunto do bom acolhimento de refugiados esteja na ordem do dia.
E, se os bons intuitos não vos assistirem, o que também é legítimo, ao menos não esqueçam os motivos egoístas: tal como no outro dia já aqui o referi, quando a natalidade não ajuda a demografia pois que se recorra à imigração. E nada melhor para um país do que a miscigenação: abertura total a todas as nacionalidades, a todas as raças e etnias, a todas as religiões, a tudo. Que se unam, se cruzem, se misturem, se reproduzam, que façam um mundo melhor.
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As imagens que escolhi mostram pinturas de Carlos Jacanamijoy e é assim colorido que deveria ser o mundo de toda a gente.
Boa tarde UJM
ResponderEliminarMais um vez tenho que concordar com o que escreve e que me causa nós na garganta. Que nunca lhe doa a pena!!
Abç
Muito pertinente, em todas as vertentes, este seu "post". Felicito-a pela coragem demonstrada e indico, a propósito, este link em que David Attenborough classifica a espécie humana como parasita.
ResponderEliminarhttps://www.dn.pt/vida-e-futuro/interior/humanos-sao-praga-no-planeta-diz-david-attenborough-11042107.html?fbclid=IwAR2KIM4DytkvxsCPLdrX2uVFeYI6NZY61bz89ikaK1j_d0GsisAT6jlxsp4
Queridos leitores amigos,
ResponderEliminarjá está no blog o capítulo 2 de "Variações em Quadrilha", que vos convidamos a ler.
https://contospartilhados.blogspot.com/2019/06/variacoes-em-quadrilha-capitulo-2.html
Com votos de excelente fim-de-semana,
saudações literárias!