Nem vale a pena contar sobre as horas a que cheguei a casa. Sem lamúria que quem corre por gosto não se cansa. Nem vale a pena contar que logo adormeci e que arrefeci. Acordei agora, bem depois da meia-noite, e tive que me embrulhar numa mantinha. Agora já estou a ficar quentinha. Mas continuo com a cabeça adormecida.
Tinha coisas para falar: a ilicitude da greve dos enfermeiros, por exemplo. Coisa que estava na cara. Atentar contra a vida humana não é lícita em nenhuma parte do mundo civilizado. Resta saber o que vai acontecer a quem publicamente praticou ilicitudes. Mas, estando já dentro do sábado, acho que mereço descanso, especialmente descanso mental.
Ademais já tenho a cartilha lida: dado que o fim de semana promete ser de arrebimba, o meu marido já avisou que não me abalance a dormir até a manhã ir avançada. Até tremo. Já estou mesmo a ver que, estando eu ainda no primeiro sono, vou começar a ouvir as movimentações que precedem o conhecido: vá, acorda, já é tarde. Ninguém merece.
Quase não tenho pegado no tapete. Tenho tanta coisa para fazer e tão pouco tempo e tão pouca disposição. Volta e meia ocorre-me alguma coisa que deveria ter feito e não fiz. Agora, por exemplo, estou a lembrar-me que deveria ter enviado um mail pois deveria ter uma resposta antes de segunda-feira. Mas não vou enviar um mail profissional a esta hora. Gaita. Com toda esta sobre-ocupação nem tenho lido. De manhã estava numa reunião, vi um mail a dizer que era o último dia para enviar umas tretas. Pensei que deveria era mandar bugiar quem assim me estava a maçar. Pensei que, de tarde, se estivesse para aí virada, logo veria se me apetecia fazer aquilo. Mas de tarde tive mais que fazer. Agora estou aqui a pensar que vou ter que fazê-lo na segunda-feira e, com o que me espera, não sei como vou conseguir. Não há pachorra. Já me falta a paciência para frioleiras que podem ser muito importantes para alguns mas que, na minha opinião, são meras inutilidades. Ainda há muita improdutividade nas empresas portuguesas. Não que não se trabalhe. Trabalha-se, trabalha-se até demais. Mas faz-se é muita treta inútil.
E sinto-me uma chata, a escrever sobre coisas chatas. Até a mim me chateio. tenho que me libertar disto. Chegar a estas horas (passa bem da uma da manhã) e pôr-me a falar de canseiras e maçadas é coisa que não se deseja a ninguém. Vou parar com isto.
Vinha com ideia de falar numa coisa. Para mim a atracção física está associada ao agrado físico, a olhar e agradar-me. Acho que não poderia sentir-me atraída por alguém feio, mal jeitoso, fisicamente desagradável. Mas vi à hora de almoço um casal tão feio, tão disparatadamente mal jeitosos os dois, tão bizarros no despropósito do aspecto físico e, ao mesmo tempo, tão enamorados, tão declaradamente in love, que me senti intrigada e enternecida. O que viam eles um no outro que os deixava assim? A minha maneira de ser e a minha racionalidade não me deixaram perceber de onde vinha aquele notório amor: olhavam-se e sorriam, de mãos dados, como se nunca tivessem visto nada tão lindo, tão amoroso. Senti-me limitada na minha capacidade de compreensão, como se faltasse alguma faculdade que, faltando, me impedia de ver a raiz das coisas.
E também tinha vontade de falar de outra coisa. Durante um pouco fiquei sozinha no gabinete. Entrou-me, então, uma menina que trabalha lá há pouco tempo. Há umas semanas eu tinha interferido por ela de forma até bastante veemente pois parecia-me injusto que não reparassem no seu valor. Agora o seu valor foi reconhecido e ela veio agradecer-me. E, ao fazê-lo, sorria timidamente mas olhava-me nos olhos. Estava um pouco comovida mas sorria, olhando-me de frente. Foi tão inesperado que me senti, por dentro, bastante comovida. Pensei que há momentos na vida da gente que valem mais do que mil sucessos da treta. Tive vontade de me levantar e dar-lhe um abraço. E tive vontade de dizer-lhe que, dentro de algum tempo, talvez esteja ela a lutar pela justiça em relação a alguém que mereça atenção e reconhecimento. Mas não disse, não quis armar-me em moralista. Ou receei que a voz se me fragilizasse.
E pronto. Daqui a nada são duas. Vou encerrar o expediente. As árvores que aqui coloquei são candidatas à Árvore Europeia do Ano. A segunda é nossa, é um carvalho em Mértola. Gostava que ganhasse. Mas qualquer árvore que ganhe vai merecê-lo. Numa outra encarnação fui uma árvore e espero que, numa futura, volte a sê-lo.
Mas, antes de me ir, deixem que partilhe convosco mais um voo de Sergei, aqui ao som de Like a Prayer. Um prazer vê-lo. Oremos.
Vinha com ideia de falar numa coisa. Para mim a atracção física está associada ao agrado físico, a olhar e agradar-me. Acho que não poderia sentir-me atraída por alguém feio, mal jeitoso, fisicamente desagradável. Mas vi à hora de almoço um casal tão feio, tão disparatadamente mal jeitosos os dois, tão bizarros no despropósito do aspecto físico e, ao mesmo tempo, tão enamorados, tão declaradamente in love, que me senti intrigada e enternecida. O que viam eles um no outro que os deixava assim? A minha maneira de ser e a minha racionalidade não me deixaram perceber de onde vinha aquele notório amor: olhavam-se e sorriam, de mãos dados, como se nunca tivessem visto nada tão lindo, tão amoroso. Senti-me limitada na minha capacidade de compreensão, como se faltasse alguma faculdade que, faltando, me impedia de ver a raiz das coisas.
E também tinha vontade de falar de outra coisa. Durante um pouco fiquei sozinha no gabinete. Entrou-me, então, uma menina que trabalha lá há pouco tempo. Há umas semanas eu tinha interferido por ela de forma até bastante veemente pois parecia-me injusto que não reparassem no seu valor. Agora o seu valor foi reconhecido e ela veio agradecer-me. E, ao fazê-lo, sorria timidamente mas olhava-me nos olhos. Estava um pouco comovida mas sorria, olhando-me de frente. Foi tão inesperado que me senti, por dentro, bastante comovida. Pensei que há momentos na vida da gente que valem mais do que mil sucessos da treta. Tive vontade de me levantar e dar-lhe um abraço. E tive vontade de dizer-lhe que, dentro de algum tempo, talvez esteja ela a lutar pela justiça em relação a alguém que mereça atenção e reconhecimento. Mas não disse, não quis armar-me em moralista. Ou receei que a voz se me fragilizasse.
E pronto. Daqui a nada são duas. Vou encerrar o expediente. As árvores que aqui coloquei são candidatas à Árvore Europeia do Ano. A segunda é nossa, é um carvalho em Mértola. Gostava que ganhasse. Mas qualquer árvore que ganhe vai merecê-lo. Numa outra encarnação fui uma árvore e espero que, numa futura, volte a sê-lo.
Mas, antes de me ir, deixem que partilhe convosco mais um voo de Sergei, aqui ao som de Like a Prayer. Um prazer vê-lo. Oremos.
Um bom fim de semana.
Um carvalho em Mértola! Há um sobreiro que pertence a Águas de Moura - nome que é lindo em lugar bastante feio e desinteressante - e é mais ou menos parecido.
ResponderEliminarMas, algumas dessas árvores são bem defeituosas, saem do padrão. E são bonitas. Por que não aceitar que as pessoas que achamos feias, apenas saem do padrão, e que gostar de alguém está para lá do que aparece. A sua obsessão com a beleza nunca lhe deu problemas? O belo é para nos extasiar a alma, para nos fazer sentir gratos e plenos por nos ser dado aos sentidos, não é para ser o primeiro mandamento das nossas vidas e muito menos comandar os nossos afectos. Penso eu de que.
Desejo-lhe um bom dia e melhor fim de semana, apesar de uns posts que de certeza não enviaria a amigos e conhecidos e não entendo por que os coloca para nós, mas está no seu direito o uso de qualquer parvidade, como está no nosso deixá-la a falar sozinha. Estique-se o quanto queira UJM, está em sua casa. Mas quando no seu real direito ocupe a casa inteira, não cabe lá mais ninguém.
A beleza, a fealdade, coisas tão complexas quanto subjetivas.
ResponderEliminarBonita história da dimensão humana que deve existir nas relações profissionais.
Bom fim-de-semana.
Qualquer uma das árvores é absolutamente fantástica!
ResponderEliminarBom fim-de-semana Para a UJM:))
Credo, Bea, acordou mal disposta ou quê...? Que mau humor esse...
ResponderEliminarGosto de beleza, sim, mas como já o referi mil vezes no blog não tenho dúvida de que a beleza é subjectiva e que o que me faz ficar siderada de admiração não diz nada a outras pessoas. Também não tenho dúvidas e também já mil vezes aqui o referi, para mim a beleza é inclusiva e não obedece a padrões de perfeição. Pergunta-me se a minha obsessão pela beleza nunca me trouxe problemas e a resposta é simples: claro que não.
Contudo, neste post não falo nem de afectos nem de ficar com a alma extasiada. Falo de atração física, só isso. E o facto de precisar de achar um homem bonito para me sentir atraída também nunca me trouxe problemas. Se estivesse à procura de homem e apenas me aparecessem homens horrorosos, de susto, aí talvez tivesse um problema. Felizmente não é o caso, já estou servida.
Quanto a na minha casa não caberem mais pessoas para além de mim, se a sua memória é razoável, lembrar-se-á de todas as muitas vezes em que falo de ter a casa cheia. E isso acontece não apenas literalmente como em sentido lato. Não sou pessoa solitária: gosto dos outros, preocupo-me com os outros, tento sempre arranjar espaço para acolher quem me procura.
Espero que, entretanto, o mau feitio com que se levantou já lhe tenha passado. Com um dia tão bonito como esteve, o azedume não está com nada, Bea.
Desejo-lhe uma boa noite e um bom domingo.
Olá Francisco,
ResponderEliminarLembro-me sempre de Sartre, feio todos os dias, e, no entanto, disputado por várias mulheres como se fosse um Apolo. Ou Serge Gainsbourg, feioso e mal encarado e, no entanto, por quem a BB ou a Birkin ou várias outras caíram de paixão. Portanto, quem o feio ama belo lhe parece e, assim sendo, tudo é relativo e subjectivo.
Quanto às relações humanas em contexto profissional é tema que tem muito que se lhe diga e é tema que a mim me causa alguma apreensão pois vejo a tendência para se criarem mecanismos para substituir os laços humanos directos (avaliações através de métricas, por exemplo, que podem favorecer os mais ambiciosos e calculistas). Um dia ainda se há-de voltar a perceber que o contacto directo e próximo é preferível aos mecanismos automatizados de avaliação de desempenho.
Um belo domingo para si, Francisco.
Ah!Ah!Ah!
ResponderEliminarHoje também estranhei um pouco o comentário da Bea...apesar de a achar sempre uma pessoa muito franca!
Beijinhos :))
UJM!
ResponderEliminarE o famosíssimo Plátano de Alijó, que tem mais de 150 e picos anos? Ah, pois, a minha estimada amiga "esqueceu-se" desta outra árvore histórica! Eh, Eh!
Bom, de facto, passando ao real, esse Plátano é um "must" e lá está para durar, ali perto da Igreja (se calhar, com a benção do Senhor poderá durar outro Século e...sem pagar impostos, nesse caso). Alijó é uma terra de muitos afectos para mim, como Rufino que sou, já que a nossa família tem lá muitas raízes. Duas ruas têm inclusivamente o nome de um Rufino: José Rufino, meu tio-avô, na rua da Pousada e com um busto dele, mais adiante, perto do Plátano e Joaquim Rufino, meu avô, ambos benfeitores daquela terra, que muito fizeram por ela Pousada, Escola, Creche, Hospital, etc). Tenho ainda hoje uma imensa saudade delesa ambos! E depoi,s eram gente culta, Democrática e com um enorme sentido de humor (e românticos, com histórias, nesse caso, bem curiosas).
Pois, voltando ao Plátano, é de ir lá e deixar-lhe um abraço!
Em Serpa também há uma bela e muito antiga (2 mil anos?) oliveira. A ver!
Bom Domingo!
P.Rufino
PS: volto a estar ausente por uns dias! Dos passeios e vistas que por ali à volta se desfrutam, falamos um dia.
Olá Isabel,
ResponderEliminarNão sei se está a banhos pelas Termas se foi só ir e vir mas, seja como for, saiba que até me ri com a sua gostosa gargalhada. É bom rir.
E eu gosto de ler a Bea e os seus remoques, por vezes tão secos e directos. Mas este sábado acordou com os pés de fora (diz-se com os pés ou com o rabo? A sério, não sei. Ou se aquilo do rabo se diz quando está virado para a lua, mas aí o sentido é outro, não é?)
Bem. Um belo domingo para si, Isabel, de preferência passeando no meio de belas árvores. Ou, pelo menos, com vista para as árvores.
Olá romântico P. Rufino,
ResponderEliminarAté já fui ver ao google como é o seu plátano... e é gigante, lindo, um deus. Tenho que ir ver. Aliás, tenho que ir a Alijó. Já na outra vez estive para ir e, à última hora, não deu. A ver se é este ano. Lá irei conhecer as suas raízes, perceber de onde vem toda essa genica e verve.
Bons dias (de passeio?) e não demore muito que sem os seus comentários o Um Jeito Manso não é o mesmo.
e um bom domingo!
Diz-se "Acordou com os pés de fora" e a expressão "Nascer com o rabo virado para a lua" é para as pessoas que têm sorte. Pelo menos eu acho que é assim...
ResponderEliminarBoa semana:))
Olá Isabel,
ResponderEliminarEntão é isso: no outro dia a Bea acordou com os pés de fora e eu, porque nesse dia não devo ter dormido com o rabo virado para a lua, fui a vítima dela.
Capaz de ter sido isso...
Boa semana também para si, Prof. Isabel!
AH!AH!AH!
ResponderEliminarDeve ter sido isso!
Boa noite:))