sábado, novembro 24, 2018

O caminho do amor




Desde que ganhei consciência de mim que preciso de espaço. O espaço é-me vital.

Penso que já uma vez aqui o contei: numa formação daquelas comportamentais, fizemos uma experiência. Cada um de nós, à vez, vendado, no centro e, à volta, numa roda larga, as outras pessoas da turma. E as pessoas começavam a aproximar-se em silêncio. E nós deveríamos aguentar o mais que pudéssemos. Quando achássemos que os outros já estavam muito em cima de nós e já não conseguíssemos mais a pressão da sua presença, deveríamos dizer que parassem. Quase todos os meus colegas aguentaram até estarmos quase em cima deles. Eu, quando foi a minha vez, mandei-os parar quando ainda não estavam nem a um metro de mim.

Mal acabei de fazer dezassete anos, com o pretexto de não querer perder tempo em transportes, depois de muita persistência e guerra, saí de casa dos meus pais para viver perto da faculdade. Por muito bem que me desse com eles, já não queria estar sob seu controlo, nem dos vizinhos da rua, nem do bairro, nem de conhecidos, sequer de amigos. Quis libertar-me de tudo. Ia a casa ao fim de semana e adorava lá estar mas bo mesmo eram os dias de semana, à larga.

A sensação de liberdade é-me indispensável. Viver num meio pequeno e confinado não é para mim. Viver sob vigilância da família ou de vizinhos ser-me-ia insuportável. Se há coisa de que gosto é de me sentir turista, livre.

Imagino que em meios pequenos não seja fácil conhecer novas pessoas, conversar com elas, jogar os deliciosos jogos da sedução que levam um no sentido do outro, percorrer novos caminhos, ousar descobertas. Mesmo pessoas que vivam solitárias e gostassem de descobrir amores ou paixões terão mais dificuldade em fazer esse percurso de descoberta quando se sabem vigiados e, possivelmente, comentados ou criticados. Mas há que arriscar, soltar as amarras, não deixar a vida por viver.

Em contrapartida, quando uma pessoa tem a certeza de ter descoberto a 'outra' pessoa -- aquela por quem o seu coração bate de uma maneira especial, aquela por quem os seus olhos se enternecem, aquela que passa a habitar o seu pensamento -- a procura de outros deixa de ser tema. 

Mas, mesmo nesses casos, a história não acaba aí. Sabermos de quem gostamos não nos isenta de termos que procurar o ponto de convergência, de tentarmos alcançar o momento em que a fusão acontece, em que os dois corações se tocam. No labirinto que são os caminhos de cada um há aquele caminho, aquele único caminho que conflui no caminho, daquele também único caminho, do labirinto do outro, daquele que amamos. 

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O desenho, que me deu vontade de escrever o que acabaram de ler, é da autoria de Elia Colombo

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