Ia no carro e ouvi que a canção era toda ela cheia de segundos sentidos. Ando em maré de me espantar. Espantei-me. Tanto que a cantei quando era miúda... Cantiguinha de criança.
Andava na infantil e tinha aulas de francês, de piano e de ballet. Francês, adorava, ballet ainda mais. Piano era um castigo. Adorava ouvir mas tocar está quieto. A professora desesperava, pedia que me concentrasse. Mas não era questão de não me concentrar, era mesmo falta de jeito. É como com poesia. Tanto que gosto de ler e ouvir -- e escrevê-la, está bem, está. Há coisas que não são para qualquer um.
Mas francês era coisa boa, rebuçadinho rolando gostoso na minha boca de menina. Au clair de la lune mon ami Pierrot. Tão bonito. Clair de lune. Palavras tão delicadas. O luar é tão bonito mas a ideia de clair de lune é ainda mais. E afinal. Prête-moi ta plume, pour écrire un mot. Estive agora a ouvir. Não sei. Talvez. Canção de amor, de abandono, de desafio. Talvez.
A vida é cheia de surpresas e mesmo o que, em dada altura da nossa vida, tinha um certo significado, pode ser, afinal, outra coisa.
Au clair de la lune, on n'y voit qu'un peu.
On chercha la plume, on chercha du feu.
En cherchant d'la sorte, je n'sais c'qu'on trouva.
Mais je sais qu'la porte sur eux se ferma.
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E em dias de excesso de trabalho e de muito cansaço pouca energia me sobra para ler, escrever ou, sequer, para pensar. Sinto falta de alguns minutos durante o dia para respirar ou para olhar pela janela. Sinto falta de inspiração, sinto falta de ser capaz de encontrar belas fotografias ou de conseguir evocar belas pinturas. O que faço, aqui à noite, faço com algum esforço, com muito sono e nem querendo pensar no dia que me espera. Leio os blogs que acompanho ou os jornais e sinto saudades de outros. Penso que preciso de férias e não consigo tê-las. Sinto saudades de quando não tinha que tomar decisões difíceis e sei que o tempo não anda para trás. Sinto vontade de escrever histórias e não tenho tempo para me motivar a escrevê-las.
A vida fácil nem sempre é fácil. Vendo-a de longe tem tudo de bom. Vendo-a de perto é assim. Por exemplo, as algas. Verdes, luminosas, lavadas pelo mar, lisas e macias. Vistas de perto, um novelo de muitos mil fios enleados, presos, sem paz.
Gosto de cartas de amor. De escrevê-las, de recebê-las. Mas tão distantes que elas andam. Memórias longínquas.
Gostava de agora conseguir escrever aqui uma mas as palavras fogem-me. E de receber uma. Gostava tanto. Com poemas que me falassem de memórias eternas, de memóras de esbatidas ilhas longínquas, de flores bordadas com o fio da saudade, de pássaros escondidos entre plumagens róseas de árvores, de abismos nos quais os corações se despenham, enleados, eternos amantes. Gostava. Mas tudo está tão distante.
Gostava de agora conseguir escrever aqui uma mas as palavras fogem-me. E de receber uma. Gostava tanto. Com poemas que me falassem de memórias eternas, de memóras de esbatidas ilhas longínquas, de flores bordadas com o fio da saudade, de pássaros escondidos entre plumagens róseas de árvores, de abismos nos quais os corações se despenham, enleados, eternos amantes. Gostava. Mas tudo está tão distante.
Prête-moi ta plume, pour écrire un mot.
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Fotografias do The Guardian
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