Há dias que cheiram a férias. Nem apetece ir trabalhar. Depois, as estradas limpas. E uma pessoa a pensar que bom, bom, era ter ficado em casa.
À hora de almoço, a mesma disposição: estava-se bem era noutra. Árvores, pássaros, cheiro a terra. E assim foi. E continuou: era bom era ter ali a máquina e fotografar, andar a descobrir os tesouros que se escondem nos muitos recantos quase secretos.
E o almoço. Muita gente num. Experimentar ir ao outro. Também muita gente mas vá, também para quê a pressa? Brás de pato com courgettes e cogumelos. Bem bom. Depois vontade de ficar por ali. O Almada cheio, fila para os bilhetes. Ainda não.
A livraria. A atracção daqueles livros com aquela bela encadernação, aquele papel, aquela paginação, aquele cheiro bom a livro de verdade. A vontade de me sentar e ficar por ali.
A livraria. A atracção daqueles livros com aquela bela encadernação, aquele papel, aquela paginação, aquele cheiro bom a livro de verdade. A vontade de me sentar e ficar por ali.
A vontade de veranear, livro na mão. Cartas a Lucílio. Folhear, entrever. Ao acaso:
Continuas então a indignar-te ou a lamentar-te disto ou daquilo, sem entenderes que o único mal efectivo é o próprio facto de tu te indignares ou te lamentares?! Se queres saber a minha opinião, eu entendo que nenhum motivo de aflição existe para o homem além da própria circunstância de ele julgar que a natureza contém em si motivos de aflição.No dia em que eu deixar de poder suportar o que quer que seja, deixarei de poder suportar-me a mim mesmo.
Tem razão. E penso como se falasse e falo como se ele estivesse ali para me ouvir. Depois fechar o livro. Olhar em volta, sentir o peso dele. Penso: tenho que me esforçar mais para conseguir manter a minha ignorância, a ignorância deve permanecer intacta. Ler todos os livros como livros de enfeite, não deixar que nada fique impresso. Volteio, então, entre lenços de seda, louça gravada, medalhas de prata, pequenas caixas de cuidado desenho. E leques com coloridas pinturas.
Mas logo, de novo, a atracção: a relatividade, as grandes leis, os grandes desafios, a física das partículas, a lógica, a análise.
As cores das capas mudam, são uniformes por ramo do saber. Poder-se-ia viver uma vida inteira num limbo, entre jardins e lagos, entre estantes com livros suavemente coloridos, entre revistas que são livros e que falam de utopias, de ilhas, de magias.
Mas, pensando bem, seria muito trabalho, muito esforço: se uma pessoa se distraía, capaz de macular a ignorância. Perdia-se a inocência, a graça de ver pela primeira vez. Melhor apenas pairar sobre as leituras.
Olho o relógio. Continua com o ponteiro dos minutos certo e o das horas avariado. Não faz mal.
Abro outra vez ao acaso o livro de Lúcio Aneu Séneca.
Hoje tenho o tempo todo por minha conta, benesse que fico devendo menos a mim próprio do que à realização de uma 'esferomaquia' e à atracção que tal espectáculo exerceu sobre todos os possíveis importunos. Ninguém virá interromper-me, ninguém impedirá o curso das minhas meditações que assim, com esta certeza, prossegue com maior firmeza. Não ouvirei de vez em quando a porta a abrir-se, não verei afastar-se a cortina do meu gabinete: poderei prosseguir em paz e sossego, o que é tanto mais necessário para quem caminha sozinho seguindo a sua própria via. Não pretendo negar que sigo os meus predecessores; claro que os sigo, mas reservando-me o direito de descobrir, alterar ou abandonar alguma ideia; não sou escravo dos meus mestres, apenas lhes dou o meu assentimento!
Depois enchi-me de coragem e fui trabalhar.
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Séneca - 6ª Carta: Sobre a partilha de conhecimentos
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As fotografias foram feitas no fim de semana durante um rápido passeio in heaven.
Não sei se, por lá, vi borboletas mas, enquanto escrevia, apeteceu-me ouvir Puccini.
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A propósito de livros, queiram, por favor, descer para conhecerem uns livreiros como não haverá muitos.
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