terça-feira, julho 05, 2016

Depois de andar a tentar há vários anos, eis que, finalmente, a Lady Gaga conseguiu tirar a carta de condução!
Uma esperança para todos os que padecem do mesmo mal.
Há sempre uma luz ao fundo do túnel
.
- Que o diga a minha cunhada....



As notícias correm mundo e quase ganham mais destaque do que as que ocupam as mentes pouco brilhantes da  intelligentsia europeia -- os ratos ingleses a abandonarem o navio, os cães alemães a abeirarem-se do redil onde se acoitam os silent lambs, etc.

Transcrevo:
What a milestone! Lady Gaga finally has a drivers license at age 30, after years of learning how to drive. The Oscar nominated singer announced the achievement on her Instagram.
“Thelma and Puhleaaaze (And yes I FINALLY got my license after years of driving w an adult present and a learners permit),” she captioned her photo. “I’M FREE. Rollin w the homies.”


Presumo que já falei dela. Tenho uma cunhada que é uma despachada. Tem solução para tudo, nada a atrapalha. Exuberante, descontraída, nunca ligou muito aos estudos e ainda menos ao trabalho. Vive para viver e isso chega-lhe e sobra-lhe. Ginásios, massagens, modas - dela se pode, verdadeiramente, dizer que pratica a arte de bem viver. Conhece meio mundo, sabe coisas de cuja existência nem suspeito e tem o raciocínio rápido e prático das mulheres do povo.

Em complemento, tem algumas outras característivas: por exemplo, fala muito alto e, pior, é completamente desbocada. A ela ouvi uma vez dizer, alto e bom som, num restaurante em que umas crianças faziam um insuportável barulho, que se devia fazer com as crianças o que se faz com os cães: deixá-los do lado de fora dos restaurantes. O marido logo a mandou falar mais baixo, coisa que nela produziu pouco efeito. Frequentemente inconveniente, tal o despropósito dos seus àpartes, a ela nada afecta. Outra vez, quando morreu um tio nosso e ninguém descobria onde estavam os cartões (da segurança social, e outros), virou-se para o meu sogro (que morreria pouco depois), cunhado do defunto, e, como se dissesse a coisa mais natural, disse: olhe veja lá se tem os seus cartões em ordem para quando morrer a gente não passar por isto.  Uma pessoa ouve estas coisas e nem quer acreditar. Mas ela prossegue como se nada de especial tivesse sido dito.

Tem ascendentes da Beira Alta, tias e primas alegres e ruidosas. Mas, que eu saiba, os beirões não são dados ao palavrão do pesado. Ela a isso é mais do que dada. Dir-se-ia uma mulher do norte quando, em família ou em sociedade, pragueja como um carroceiro de gema. A mãe zanga-se, que aquilo não são modos. Mas é mais forte que ela: nada a fazer.

Menina bem das avenidas, toda uma vida vivida na Avenida de Roma e arredores, circulando entre 'tias', nem os irmãos falam assim. Filha mais velha, tem a seguir a ela vários irmãos rapazes, todos altos, esbeltos, bonitos como modelos fotográficos. Muito simpáticos e educados, a eles não tenho ideia de ouvir dizer um único palavrão.

De cada vez que nasceram os meus sobrinhos, gritava tão alto as mais grosseiras obscenidades que toda a equipa médica tinha que a isolar para, cá fora, a distinta frequência da clínica não ficar varada com o que dali vinha. Depois, referia-se ela a esses momentos dizendo: 'berrei como uma capada'. Tal e qual.

Ora bem. Outra das suas características era não conseguir tirar a carta de condução.

Gente abastada, toda a gente com carros e ela naquilo, sem conduzir. Quem a veja, aquele tipo de mulher elegante e descontraída habituada a conviver, não desconfia que, em certas circunstâncias, o sistema nervoso lhe prega partidas e a bloqueia de forma inultrapassável.

De cada vez que ia fazer exame de código, chumbava. Dizia que já ia em estado de puro descontrolo. Se a pergunta requeria uma resposta relativa às prioridades numa rotunda, ela respondia como se a pergunta versasse o atravessamento de uma passagem de comboio sem guarda.

Vinha de lá possessa, praguejava como uma varina do Bolhão. Palavrão que até fervia. Contava que entrava para uma sala cheia de gente 'analfabeta' -- ao fazer o relato insultava todos, em especial as respectivas mães, palavrão, palavrão do pior -- que as caras não enganavam (mas não dizia cara, dizia tromba ou focinho), e que, no fim, para sua suprema humilhação, passavam todos menos ela.

Por fim, já nem dizia a ninguém que ia fazer exame, tal a vergonha de, no fim, ter que assumir que tinha chumbado outra vez. Chegou a considerar subornar a administração pública de uma ponta a outra ou ir tirar a carta a uma qualquer república das bananas -- qualquer coisa menos passar pelo permanente vexame de não conseguir fazer o exame de código.

Até que um dia, sem ter avisado ninguém, apareceu com o exame feito. Não sei se o conseguiu por métodos legais. Admito que sim. Depois lá fez o resto.

Quando se apanhou com a carta, comprou um descapotável amarelo, uma coisa completamente berrante. Convidou-me para ir dar uma volta com ela. Eu ia cheia de medo. Imaginava que ela não atinaria com os sinais de trânsito, com as mais elementares regras da condução. Lá fomos, as duas de cabelo ao vento, apesar de tudo menos espampanantes que o espampanante descapotável amarelo garrido. Para minha surpresa correu bem, tirando ter andado em sentido proibido e ter feito uma inversão de marcha completamente tresloucada.

Mas, como seria até expectável, desenrascada como é, conduz bem, frequentemente, e verdadeiramente nunca se percebeu porque é que tinha aquela incapacidade de atinar com as perguntas mais elementares do exame de código.

Lembrei-me agora disto ao ver a notícia lá de cima, de que, ao fim de várias tentativas, também a Lady Gaga ultrapassou a mesma barreira psicológica e finalmente tem a carta de condução. Boa.

Aí vai ela -- Lady Gaga ao volante!
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Todas as fotografias mostram a Lady Gaga, não a minha cunhada.

......

[Vim para aqui animada dos mais elevados propósitos, com um livro fantástico na mão, para dele escolher uns excertos. Mas, ao sentar-me no meu canto do sofá para escolher essas passagens, adormeci profundamente. Só há pouco é que acordei. Diz-me o meu marido: Bela hora para dormires a sesta.... De facto. Mas ando assim, um disparate. A custo lá consegui escrever isto que acabaram de ler. A ver se não volto a adormecer e se ainda consigo fazer o post que tinha em mente. Bolas, com que sono ando.]

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Não consigo: nem fazer outro post nem responder a mails ou comentários. Peço desculpa. Adormeço antes ainda de começar. Com esforço, apenas um cheirinho do livro que dorme ao meu lado, um que, mais para lá do que para cá, me parece que pode encaixar aqui.

Deus espera que o homem, na sua sabedoria, volte a ser criança.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela terça-feira.


7 comentários:

  1. "A ela ouvi uma vez dizer, alto e bom som, num restaurante em que umas crianças faziam um insuportável barulho, que se devia fazer com as crianças o que se faz com os cães: deixá-los do lado de fora dos restaurantes."

    Paro num café e por vezes também lá param duas "gajas" cada uma com o seu filho, que quando entram acabou o descanso, ficam ali na amena cavaqueira enquanto os putos fazem um puto de um barulho.

    e para falar a verdade vê-se com mais frequência estas situações, já não há civismo

    Bob marley

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  2. Caramba, se tem sempre tanto sono por que razão não vai dormir, não dorme tudo o que tem a dormir? Isto é alguma obrigação, algum dever, faz alguma falta?

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  3. não podia ter putos pestinhas por perto para pintar assim - https://www.youtube.com/watch?v=RmSl7hMFi60


    Bob Marley

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  4. Achei imensa graça a essa história da sua cunhada e da incapacidade, que lá resolveu finalmente, em conduzir. Será que ela sabe que tem este Blogue? A ser assim, ainda arrisca um berro! O nosso avô (paterno) lá no Douro também “sofria” dessa completa incapacidade. Aqui, em Portugal, nunca conseguiu obter a carta de condução. Nem tanto por causa do Código da Estrada, que, ao tempo, pelo que sabemos, era menos exigente. Por exemplo, as rotundas não existiam, nem auto-estradas para se circular a mais de 120km, nem os carros andavam mais, de média, de 80/90 km, o trânsito era diminuto, comparado com hoje, as sinalizações nas estradas e meios urbanos eram reduzidas, não havia zebras, enfim, era um pequeno paraíso para quem era incapaz de decorar um Código da Estrada. Porém, ao contrário dos tempo modernos, de hoje, outros “perigos” surgiam nas estradas – havia poucas principais, muito poucas, umas tantas secundárias e depois outras, de terra batida (estas, muita das vezes cheias de buracos, sobretudo no Inverno) e florestais – como, por exemplo, Gado! De vacas, a ovelhas, cabras, bois, mulas, burros, etc. O que atrapalhava, sobretudo quem não possuía o dom de guiar, como era o caso de nosso divertidíssimo e imperturbável avô. As Estradas só tinham duas faixas, um para lá, outro para cá, mesmo a Nacional Nº1, com poucos riscos descontínuos, o que obrigava a muita atenção por parte dos condutores sempre que queriam ultrapassar. Já no meio rural, a ausência, generalizada de viaturas, era compensada pela abundância de outras “viaturas”, o tal Gado. Esse nosso avô, embora não tendo a carta de condução (as autoridades aqui recusavam-lhe) lá ia, contra tudo e todos, “conduzindo”. Após várias “chatices” - desde ter embatido numa vaca, entre Alijó e o Tua, pois não soube como se desviar dela (“as vacas devem estar no campo e não nas estradas”, lá dizia, com fundadas razões), até ter quase caído ao rio Douro, no Porto, tendo a viatura ficado por um fio para mergulhar naquelas águas, ou ter conseguido a extraordinária “proeza” de embater numa árvore e o então “pára-choques” (hoje já não existem, visto ao carros modernos serem de papel, ou parecido, com umas fronhas todas iguais, uma porcaria que não evita o choque) ter ficado “emaranhado” no tronco da dita – os filhos, entre os quais nosso pai, proibiram-no de guiar, a não ser que conseguisse, por mérito, a licença de condução. Como sabia que nunca estaria à altura de tão imenso desafio, não nascera para conduzir automóveis mas pessoas (e aí era muito bom), mandou vir uma carta de condução do…Brasil, onde em tempos tinha tido negócios. E assim, sem mais, aquelas autoridades, sem sequer o terem avaliado, lá lhe enviaram a carta de condução. E ainda conduziu por uns tempos. Poucos…até os filhos lhe retirarem a dita carta. O homem era um perigo, mesmo numa época em que havia provavelmente 10% de viaturas das que existe hoje. Nossa avó revelou-nos uma ocasião em que se abordou essa incapacidade do avô, que ela, sempre que ele conduzia, rezava terços atrás de terços, “a fim de Nossa Senhora os proteger, sobretudo a mim, já que vosso avô não era crente!” Sabe UJM, tenho uma irmã e duas amigas e um amigo de meus pais que ainda não percebi como continuam vivos, tal a inabilidade para conduzirem. Por exemplo, uma delas dizia-me “não ser capaz de fazer uma subida acentuada”. Estou a vê-la um dia na Serra da Estrela…Ou o tal amigo de nossos pais, que conduz a uma velocidade média de 30km, tal como uma tia nossa que foi multada na Ponte 25 de Abril por conduzir a essa velocidade (ou menos), visto estar a por em perigo os restantes condutores! Inacreditável! Mas, conduzir bem não é tudo na vida, convenhamos.
    P.Rufino

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  5. Olá Bob, boa noite!

    Sabe que a mim também me desagrada estar em restaurantes ruidosos e se calha estar uma criança birrenta é uma chatice. Muitas vezes não serve de nada os pais quererem que se calem. Aliás, muitas vezes quando os meus eram pequenos, se começavam a fazer barulho, um de nós vinha cá para fora para evitar que incomodassem os restantes comensais. E ainda evito ir com os meus 4 pestinhas para espaços confinados onde possam armar estrilho...

    Aproveito para agradecer o vídeo fantástico que enviou. Um dia destes ponho-o aqui. É precisa uma paciência de chinês para estar tantas e tantas horas até atingir tal perfeição.

    Obrigada.

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  6. Olá doutor-Caramba,

    Escrevo porque gosto de escrever (apesar de ter sono). Não é dever, não é obrigação, não: é mesmo por gosto que o faço.

    Aliás, até gosto de escrever quando estou a dormir porque, quando acordo, é com surpresa que descubro o que apareceu escrito.

    Volte sempre para ir testemunhando o fenómeno.

    Uma boa noite.

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  7. Olá P. Rufino,

    A minha cunhada é a primeira a rir-se das suas peripécias. E toda a família tenta, debalde, que se porte bem. Mas ela, quando quer, porta-se bem, quase uma autêntica 'tia', disfarça muito convincentemente. Só que, mal se apanha à vontade, descomprime e solta a língua em grande estilo.

    E o curioso é que conduz bem e é, aliás, motorista para parte da terceira idade da família. Aquilo do código era mesmo pancada.

    E eu também conheço gente completamente atada. Tenho uma colega que a conduzir parece que vai montada no volante, a cabeça quase em cima do vidro, toda concentrada, a vinte à hora.

    E conheço um que é despistado sem saber que o é. Faz infracções absurdas, um susto andar com aquele despassarado, e, pior, vai a conduzir e, para falar com quem vai no banco de trás, vira-se todo e vai pisando aquelas riscas ruidosas das auto estradas e fazendo ziguezagues, aparentemente sem se dar conta. Um pavor. Já ninguém quer fazer viagens com ele ao volante.

    Um bom dia para si, P. Rufino.

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