quarta-feira, julho 01, 2015

Eu, o cansaço, o silêncio, a paz, o leão, o espelho no espelho - e a verdade de Pejac.






Estou cansada, com sono. Apetecia-me ir aos saldos e não tenho tempo. Apetecia-me ler e não tenho tempo. Apetecia-me ir ao cinema embora tema que não haja nada que se aproveite para ver, apetecia-me ir passear à noite para o Chiado embora não tenha nem força para pegar num gato pelo rabo, apetecia-me atravessar o rio de barco à noite mas acho que até me vai custar chegar até à cama, quanto mais pôr-me a andar de barco à noite. É que nem é que o trabalho seja muito mais do que é costume: é a conjugação do calor excessivo, de afazeres domésticos, familiares, de estar a fazer uma coisa e já estar a receber solicitações para outra, é começar a fazer uma coisa que requer concentração e estar a receber telefonemas e mails e recados, é olhar para a agenda e ver mais reuniões, mais trabalhos, mais preparação de reuniões, e saber que devia fazer arrumações aqui em casa e não estar a ver como ou quando, é saber que deveria fazer também limpezas e lavar os tapetes de arraiolos e dar bondex nas madeiras e aparar o mato lá in heaven e nem estar a ver quando, são as solicitações dos mais novos e dos mais velhos e é não ver jeito de nada disto abrandar. 




Não ouço notícias. Vou e venho de carro e fujo das notícias. Aqui em casa, chego tarde e não me apetece ver notícias. Aliás não me apetece ver nada do que passa na televisão. São raras as pessoas que têm uma visão própria, desempoeirada. Por acaso, numa de zapping, agora a coisa estabilizou na TVI 24 e até é gente válida. Vá lá. Estou a ouvir o Embaixador Seixas da Costa e, como sempre, é claro e sereno. Também vi o Ricardo Paes Mamede, muito bem, muito racional. Finalmente estou a ouvir alguém na televisão a dizer coisas inteligentes, com voz própria.

Entretanto, espreito aqui os jornais online e é só treta, e, claro, a confusão grega, uma europa entregue a um bando de tristes. Podem algumas vozes serem até lúcidas mas a realidade sobre a qual falam é um charco. Esta UE, este FMI, esta cegada que transformou a Europa num bando de credores acéfalos. Cansada como estou, tudo isto me cansa. Volta e meia só penso em ir para o meio do nada, fazer qualquer coisa de útil. Fazer casas para quem não as tem, ensinar a ler a quem não sabe, visitar crianças institucionalizadas, presos - coisas que façam verdadeiramente a diferença na vida de quem pouco tenha. 

Enfim, escrito assim, no meio desta minha canseira, até pode parecer um pensamento fútil de uma dondoca entediada. Mas não, nem sou dondoca, nem conheço o tédio, apenas o cansaço, nem é um pensamento fútil, é mesmo genuíno. Ainda não tive foi coragem para me organizar nesse sentido, talvez seja demasiado comodista.




Adiante. Volto a andar aqui pelos jornais e revistas e não vejo uma coisa que desperte a minha atenção. Ou melhor, ver até vejo. Uma ou outra. Coisas simples, palavras depuradas, lugares onde não há ruído, onde há paz. Podia, a sério que podia, ficar uma noite inteira a olhar para uma imagem do mais depurado que há, para meia dúzia de palavras. A beleza aparece assim, como uma essência. E depois o silêncio. Há imagens e palavras que me aparecem envoltas em silêncio e esse silêncio é branco e macio como a paz. Muitas vezes penso que era capaz de viver uma ou duas semanas ou até um mês num mosteiro. Andar em silêncio, tratar da horta, lavar o chão dos corredores, recolher-me, ler, meditar, lavar a louça, lavar a roupa à mão, estender a roupa ao sol. E tudo em silêncio. Deve ser bom. Claro que teria que telefonar todos os dias para todos os meus, para saber se estavam bem, e teria que garantir que me iam lá visitar pelo menos uma vez por semana. Faria bolinhos e compotas para lhes oferecer ao lanche.

E já nem sei a que propósito vem isto. Talvez seja porque, apesar de cansada, me sinto em paz. Há alturas em que sinto que, apesar de mil situações contraditórias e mil solicitações sobrepostas, o meu corpo ou a minha mente (não sei distinguir o que me guia, se é o corpo, se é a mente) sabe levar-me pelo caminho certo. E isso traz paz à minha vida. 




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Andei pelas cores, queria um espaço limpo de ruído, de cor, de palavras.
Acabei por me deter neste vídeo. É o branco Chanel, num relógio, mas podia ser outra coisa qualquer.



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E não me perguntem, porque não saberei responder, porque me apetece ter aqui agora um leão sobre um fundo negro. Talvez procure a dignidade, a grandeza, a coragem, a beleza em estado puro. Mas não sei. Pode ser por outro motivo qualquer.




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As imagens que escolhi para acompanhar o texto respeitam a obras de Pejac, street art no seu melhor.

A música é, de novo, de Arvo Pärt : Spiegel im Spiegel ( Cello + Piano ) - Malter /Schwalke

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, um dia bom, bom, do melhor que possa haver.
Boa sorte a todos.

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