segunda-feira, dezembro 23, 2013

O caso de Jaycee Lee Dugard e dos portugueses que continuam a apoiar Passos Coelho e Paulo Portas: o 'síndrome de Estocolmo' a atacar em Portugal? Fosse eu de fazer escolhas do tipo 'o facto do ano' e escolheria 'a manipulação que leva as pessoas a defenderem os seus agressores' como o 'Facto do Ano' em Portugal (em Portugal e não só)


No post abaixo, qual Santa Baby, pela voz da pouco talentosa Irina Irina Shayk (pouco talentosa a cantar, note-se) que se apresenta em lingerie e coberta de luzinhas natalícias, envio uma cartinha ao Pai Natal. É o ambiente natalício a subir por mim acima.

Mas isso é a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra. É séria.

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Não sou de eleger o melhor ou o maior ou o mais relevante seja do que for. Acho sempre que me ia esquecer de outros igualmente bons. A minha memória vai e vem como quer e não quando eu a convoco. Por estas alturas escolhem-se a figura do ano (e, neste caso, até abro uma excepção ao concordar em atribuí-la, a nível internacional, ao Papa Francisco), o facto político, o isto, aquilo e o outro. Ou o melhor livro, ou o melhor filme ou a melhor frase. Coisas assim para as quais sinto que a competência e a memória me falhariam.

Mas há um facto que eu gostava de deixar aqui assinalado. No sábado à noite ouvi o Eixo do Mal e, não estando lá a Clara Ferreira Alves que eles dizem que está a recuperar bem (terá sido operada? Tomara que seja coisa ligeira. Deve ser pois as crónicas no Expresso continuam a sair regularmente e com a qualidade do costume), esteve em sua substituição o Prof José Adelino Maltez.


No meio da conversa e da animação que é sempre aquele programa, o acima referido disse uma coisa que me deixou a pensar: que a manipulação a que as pessoas são sujeitas é tanta que faz com que defendam e desejem aquilo que as prejudica.

É um facto e isso é um facto inquietante.

Não me lembro em que contexto ele o referiu, se se estaria a referir às mais recentes sondagens que mostram que o PS não descola e que o PSD, estranhamente, se aguenta, se ao facto de não ser clara a alternativa política caso houvesse agora eleições - ou a outra coisa qualquer. Mas seja qual for o contexto é um facto que, perante a situação que vivemos, ainda há quem a defenda e pretenda manter-se nela. 

Por isso, se eu quisesse eleger um facto que tenha marcado o ano de 2013 talvez escolhesse este. No entanto faço a ressalva: é um facto que não é só de 2013 nem é só português. Mas agora cinjo-me a este horizonte mais restrito que é aquele que nos é mais próximo.

As pessoas são sujeitas a tal manipulação que acabam a eleger quem lhes faz mal, acabam a defender aquilo de que deveriam fugir.


Penso que é isto o síndrome de Estocolmo a uma grande escala.

Ao escrever estas palavras, relaciono o que disse com a crónica de Pedro Mexia deste sábado no expresso. Fala ele de Jaycee Lee Dugard, uma rapariga que foi raptada quando tinha 11 anos e que viveu sequestrada durante 18 anos, sujeita a abusos e maus tratos de toda a espécie.Teve duas crianças do violador. Quando foi descoberta negou que tivesse sido maltratada e defendeu o raptor, o violador, o abusador, o algoz.


Publicou um livro, intitulado 'Vida roubada - a memória de um rapto' no qual relata como chegava a desejar a companhia do raptor e como temia desagradar-lhe, não fosse ele deixá-la ali abandonada ou fazer-lhe ainda pior. 

Faz lembrar a história de Natascha Kampuch ('3096' - o número de dias que esteve aprisionada) de que aqui já falei; mas Pedro Mexia diz que o livro de Jaycee Lee Dugard não revela a inteligência e a racionalidade que transparecia do livro de Natascha. 


No entanto, o síndrome de Estocolmo está lá: a relação que se torna ambivalente, em que o abusado, receando um abandono ainda mais insuportável, perde a força para se rebelar, perde a esperança na capacidade de poder libertar-se e passa a querer as boas graças do raptor.

Ler relatos destes é uma coisa que perturba. Quando li o livro de Natascha, quase me sentia fisicamente oprimida. Os mecanismos mentais de adaptação que as pessoas, quais animais em cativeiro, desenvolvem como forma de se auto-protegerem, alienando-se, perdendo os valores pelos quais se regiam antes do sequestro, é uma coisa que inquieta.

A população portuguesa tem estado a viver um período nefasto, um regresso civilizacional imperdoável, um ataque aos seus direitos e dignidade que não deveria ser, de forma alguma, suportado. E, no entanto, apesar de tudo isto ser contra-natura e apesar de ser público que este crime não se destina a dinamizar a economia (que está mais débil), nem a resolver o problema de desemprego (que está mais elevado), nem a pagar a dívida (que está muito maior), nem a nada de bom para a esmagadora maioria da população ainda há muita gente que defende esta solução.


As pessoas que votam em Passos Coelho, a julgar pelos números nas sondagens, são pessoas que estão certamente a viver pior que antes dele ter formado governo, talvez estejam desempregadas ou em vias de o seu, talvez se sintam ameaçadas, talvez tudo isso e mais algumas coisas - mas, talvez porque foram de tal forma manipuladas que já padecem de síndrome de Estocolmo, querem preservar esta situação.

Talvez temam que, se estes abusadores se forem embora, fiquem abandonadas à sua sorte, desprotegidas, que o seu dinheiro no banco seja roubado, que as suas pensões deixem de ser pagas. Não sei. Mas, se não for isto, alguma explicação há-de haver para que, nas intenções de voto, ainda haja tanta gente a prestar-se a dar o aval à continuação do saque e da destruição a que se assiste.

Portanto, acho que é chegado o tempo de psicólogos e psiquiatras entrarem em acção. Este país está a ficar um lugar estranho e as pessoas estão a revelar sintomas inquietantes.

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A música é Arvo Pärt - The Beatitudes.


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Relembro que, se descerem um pouco mais chegarão a um outro mundo, ali onde síndromes de Estocolmo e outras patologias não têm lugar. Passos Coelho ainda menos.

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Muito gostaria que aparecessem também lá no meu Ginjal e Lisboa onde se pode ler e ouvir um Poema de Natal de Vinicius de Moraes. As minhas palavras aninham-se em volta deles para os ouvir.

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Resta-me, por agora, meus Queridos Leitores, desejar-vos uma bela semana a começar já por esta segunda feira.

(Tomara que isto não esteja cheio de gralhas. São duas da manhã e tenho que me ir deitar porque não tarda tenho que estar a pé e o drama é que se houver coisas para corrigir só o poderei fazer ao fim do dia. Detesto isto mas não tenho alternativa)

3 comentários:

  1. isto de síndromes, estocolmo ou outra merda qualquer, penso que não há quem nos bata, 47 anos de ditadura, e acabou, porque calhou.Ainda não vi ninguém defender esta hipótese, o 25 de Abril foi um acaso.


    dou-lhe um exemplo recente, Os professores.Por acaso cerraram fileiras e não compareceram ao exame, ou a carneirada lá foi indo, e quem é mais resistente e não é revolucionário de pantufas, depois fode-se.

    Cada um leva a sua vidinha, e naquela noite, CALHOU, porque o regime não ofereceu resistência.
    Este povo e manso e medroso, esqueça essa treta de estocolmo, a não ser que queira usar como eufemismo para (MANSO, e MEDROSO)

    E já agora onde está a solidariedade com o cidadão que foi constituído arguido por interronper o PC, devem estar a fazer as compras de Natal, não?


    quando ouço dizer que o banco alimentar bateu outro record, dá-me vontade de rir.Dever ser assim que exorcizam o caganço

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  2. Não creio que sejam só os portugueses que apoiam Passos Coelho os que sofrem do síndrome de Estocolmo.
    Se me permite, atrevo-me a dizer que se trata de uma visão bastante redutora.
    O mal é atávico, para não dizer endémico.
    Os que não sofrem, são os -egoístas- bem instalados e os exilados ou emigrados, passe o eufemismo, consoante a perspectiva e as razões que os levaram à Diáspora (risos... amargos).
    O fatalismo histórico confunde-se com a realidade histórica e tem quase 900 anos.

    Um abraço


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  3. Realmente dá que pensar, esta atitude. Se calhar o anónimo é capaz de ter razão. Isto é um povo patético. A malta gosta é de, como dizia o outro, levar na tromba. Quando vejo estas sondagens, só me apetece é ir para longe! Se houvesse uma rejeição em massa, digamos, uns 70% de abstenções, ou coisa assim, talvez o sistema e os políticos que comem da sua manjedoura pensassem um pouco para reflectir e mudar. Assim sendo, continua tudo na mesma. No Sábado, num supermercado por aqui, eu e minha mulher estavamos a ouvir um casal de idosos que se queixava desta vida, destes cortes, desta carestia de vida, etc, etc, mas atribuindo a culpa ao Mário Soares (!!), aos “outros”, o Sócrates e que estes “fazem o que podem para salvar o país da desgraça, mas que de seguida, lá voltarão os socialistas e depois de novo estes e é assim. Não há alternativa!” As pessoas compram manipulações, embustes, resignam-se etc. É uma espécie de Fado. Outros estão-se nas tintas. Num jantar nesse dia, um dos cavalheiros dizia: “estou-me nas tintas para a crise, estou a safar-me como nunca imaginava (trabalha na área financeira, diga-se) e portanto cada um que faça pela vida, como eu!” Assim, friamente! Tive com vontade de o mandar para put...que o par.., mas preferi o desprezo, embora, mais tarde, aproveitando uma deixa de um terceiro, tenha metido um “ferro”, a criticar, de algum modo, aquela aleivosia. Estrebuchou, mas ficou por ali. Vai ver, daqui a uns 2 anos, o panorama político mais coisa menos coisa é semelhante. O povo gosta dos seus opressores. Veja como se recorda Salazar, Pombal, etc. Com respeito. É assim. Somos um bando de carneiros. Embora estes, quando em situação limite, de perigo, se juntem todos, fazem uma espécie de frente unida, ficam ali quietos a aguardar e depois fogem. Este povo é pior, vai em direcção ao precipício. No fundo, tem o que merece.
    Votos de um Bom Natal em família! Cá passaremos com o neto, um encanto de 2 anos já!
    P.Rufino

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