No post abaixo mostrei quatro políticos nacionais de se se lhes tirar o chapéu. Comunistas. Não sei se são solteiros e bons rapazes mas isso também aqui não interessa para nada. Se no domingo houver sítio para se votar nos mais giraços, voto neles, está decidido. Quatro pães (dantes dizia-se borrachos). O PCP faz criação de homens bonitos, disso parece não haver dúvida.
Mas isso é no post seguinte. Aqui, agora, a conversa é outra. Estava a escrever aquilo e a pensar que os rapazes são uns borrachos e, por borrachos, lembrei-me dos meus tempos de namoro com o maior borracho do pedaço. Vamos ver como vou escrever para não chocar as almas mais bentinhas.
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Já aqui contei: eu namorava outro. Era bem comportado, educado, simpático. Os meus pais gostavam dele. Antes desse, eu tinha andado de namoro com outro que era doido varrido, um caso sério de paixão louca entre nós dois e os meus pais sobressaltavam-se. Com este a coisa era mais calma, não havia razão para alarme. As minhas avós também gostavam muito dele, era bonito, delicado, cantava lindamente. Os pais dele também gostavam muito de mim. Quando eu fazia anos ou pelo Natal, ofereciam-me sempre um presente para mim e um para a casa. Esta de me oferecerem louça e coisas assim deixava-me um bocado incomodada mas enfim. De qualquer maneira, ainda agora uso umas travessas de inox que foram eles que me ofereceram, estão como novas, lembro-me da senhora dizer que eram boas e, de facto, têm sido. De vez em quando os meus pais convidavam os pais dele para virem a nossa casa e outras vezes eram eles que convidavam os meus pais. Não sei porquê mas aquela coisa tão familiar não me agradava muito mas o namoro nasceu logo tão pegado e tão institucional que a coisa andou dessa forma.
Enxoval já todo feito, famílias cada vez mais próximas (tias incluídas), tudo levava a crer que o casamento estava mais do que certo.
Até que aconteceu aquilo de que aqui já vos contei.
A minha mãe estava mais ou menos ao corrente daquela minha vida dupla e vivia apavorada que a coisa desse para o torto, Lidar com um já é uma canseira, fará com dois, dizia-me ela. E tu vê lá no que te metes. E, Ai valha-me Deus. Um susto permanente. Por isso não lhe podia contar tudo. E sempre a recomendação final, E o teu pai que não sonhe...
Não sonhou.
Na véspera de acabar o namoro com o noivo disse ao meu pai. Vou acabar o namoro. O meu pai não disse nada. Ficou sério. Depois perguntou Mas porquê? Respondi, Porque já não gosto dele. Não insistiu mas ficou apreensivo. Acho que pensou que se calhar eu corria o risco de ainda ficar solteira.
A minha mãe tinha-me pedido, Tu não digas nada ao teu pai que já tens outro senão ele desconfia logo que foi por isso. Não gosto nada destas coisas mas tanto me pediu que lhe fiz a vontade. Aliás, como vos contei, era minha firme intenção deixar passar um tempo antes de me meter noutro namoro. Mas no dia seguinte mudei de ideias.
A minha mãe pediu: Mas, para já, não digas nada ao teu pai, deixa passar algum tempo.
Mas eu não sou de deixar passar o tempo. No fim de semana seguinte, o meu pai tinha ficado de me ir buscar a um sítio. Eu estava com o meu novo namorado mas, para não ferir a susceptibilidade do meu pai, combinei que me despediria antes para o meu pai não o ver. Só que, nestas coisas, não sou de me dar a grandes cuidados. Para poder estar com o meu amor até à última, deixei que ele me levasse mesmo até ao sítio onde o meu pai me iria buscar. Nada a fazer. O meu pai já lá estava. Quando me viu, saíu do carro e olhou muito admirado para o meu acompanhante, um total desconhecido para ele. Eu apresentei-o. Acho que apenas disse o nome, tenho ideia que não disse que era o meu novo namorado. Mas não foi preciso. Esquecida de cuidados, despedi-me dele com um daqueles big beijos na boca em que nos tínhamos tornado peritos. O meu pai deve ter ficado de cara à banda. Nem me lembro do que ele me disse no carro - se é que disse alguma coisa.
Sei que disse à minha mãe que o tipo não parece boa peça, cabelo comprido, barbas, e deve ser um descarado, a beijá-la daquela maneira ali à minha frente, sem me conhecer. Mas, uma vez mais, acho que até fui eu que comecei por beijá-lo assim, esquecida de que o meu pai estava ali. Ou seja, assim de chofre, sem ter tido para assimilar a coisa por partes, o meu pai apanhou logo um susto dos valentes.
A partir daí, a coisa complicou-se para o meu lado: os dois, ele e a minha mãe, de pé atrás com ele.
Uns dias depois, eu quis ir ao cinema à noite com ele e o meu pai não deixou. Tentei que a minha mãe intercedesse - mas nada. A minha mãe também estava céptica. Ele, sabendo que eu namorava com outro tinha-se andado a fazer a mim, não devia ter princípios, que sabe-se lá quem é, que gente é essa,... Por mais que eu explicasse que eu tinha vontade própria, que tanto se tinha atirado ele a mim quanto eu a ele, que tanta falta de princípios tinha tido ele quanto eu, aliás eu, pior eu ainda que ele, nada a fazer: ele era o mau da fita, um perigoso marau que tinha seduzido a ingénua donzela.
Furiosa, disse: eu já combinei com ele ir ao cinema, não vou agora dizer que os meus pais não me deixam, até teria vergonha, isso eu não digo. Mas venham connosco, venham fazer de paus de cabeleira para impedir que a gente esteja no cinema de mão dada.
A minha mãe não queria, o meu pai ainda menos, mas lá devem ter pesado os prós e os contras e aceitaram.
Perguntaram-me que filme é que era e eu não sabia. Sabia apenas que tinha lido vagamente qualquer coisa a ver com o Andy Warhol, pensei que deveria ser uma coisa pop, artística, nem sei. O filme era o que menos interessava.
Lá fomos, os meus pais muito secos, a minha mãe um bocado nervosa, estava a ver o meu namorado pela primeira vez, e tão diferente que era do outro. Eu e ele na boa, embora eu estivesse curiosa por saber o que achava ela dele. Presumia que o ia achar um borracho mas sabia lá se não ia embirrar com alguma coisa.
Até que o filme começou e, aí, eu comecei a ficar atrapalhada. E o meu namorado também. Quanto mais o filme avançava mais eu ficava nervosa. Só me apetecia meter-me debaixo da cadeira. A mão do meu namorado começou a ficar gelada e transpirada. Ou então era a minha que estava assim. Eu só dizia, ai valha-me deus, ai, que horror. Ele, incomodado também, dizia, Não olhes. Para ele também era uma situação terrível.
Eu já mal conseguia olhar para o écrã, nunca tinha visto uma coisa assim. Aliás, nem percebia o que estava a acontecer. Palavra de honra. Vocês nem imaginam. Eu só pensava no que os meus pais estariam a pensar. Imaginava que no intervalo me iam dar uma valente bofetada, talvez até o meu pai desse um murro mesmo em cheio na cara do meu namorado. Apavorada. Eu estava apavorada.
O meu namorado disse: no intervalo pedimos desculpa aos teus pais, explicamos que não fazíamos ideia, e vamo-nos embora. Mas eu só queria fugir, não ter que encarar os meus pais.
Aquilo nem era pornografia. Era uma outra coisa. Pior, acho eu. Ele era sexo oral explícito, grandes planos, homens com homens, sodomizações para todos os gostos, sei lá. Uma coisa sem explicação. Nem sei. Eu já me encolhia, fechava os olhos, uma vergonha sem tamanho.
Se querem que vos diga nem sei qual dos filmes foi, se foi o Flesh, se foi oTrash. Era do Paul Morrisey, o que era assistente do Andy Warhol. Depois vi que era cinema underground, uma coisa assim. Fui agora ver os trailers e penso que deve ter sido o Flesh pois, embora não encontre o do Trash, vi algumas cenas e parece-me que esse seria passado mais no mundo da droga enquanto o primeiro seria no mundo da prostituição masculina.
Até que foi o intervalo. Pensei, É o meu fim. E preparei-me para o pior.
Mas não. Estranhamente, os meus pais estavam como se não fosse nada com eles, não se deram por achados, aguentaram firmes, com superioridade. E eu, tão aflita estava, nem tive coragem para dizer para nos irmos embora, estava verdadeiramente sem acção. Se calhar o mesmo se passava com eles. Voltámos para a sala depois do intervalo. Encolhi-me e tentei não ver nada para não morrer de vergonha.
Nunca mais falámos no assunto. Uma pedra em cima.
E uma coisa é certa: nunca mais se colaram a nós. Acho que puseram as barbas de molho, coração ao largo. Não sei. Se calhar acharam que foi de propósito, que fomos nós que os quisemos praxar e nunca mais se arriscaram a outra. Não faço ideia.
Mas vocês querem crer que ainda hoje sinto vergonha...? Que vergonha... Que cena do caraças, que horror.
***
Bem. Já escrevi outra vez que me fartei, credo. Vocês desculpem lá estes lençóis. Não vou reler pelo que, por favor, relevem as gralhas, está bem? (Mas se derem com alguma de arrepelar os cabelos, por favor avisem-me, ok?)
Relembro: para verem a criação de gatos que é o PCP, desçam, por favor, até ao post seguinte. É um consolo para a vista.
***
E por aqui me fico. Desejo-vos, meus Caros leitores, uma belíssima quarta feira!
Eras fresca, eras...
ResponderEliminar;)))
que pais tão certinhos que tenho... não sei como sai tão atinado.
ResponderEliminarSr Bartolomeu, a não ser que conheça a autora do blog (pelo menos desde a primária), é que o seu comentário tem alguma lógica (e mesmo assim....).Digo isto, porque parece-me que a autora não o vá chamar a atenção.
ResponderEliminarficava melhor "Era fresca, era", e eu que sou um parolo
ainda Sr. Bartolomeu - só por curiosidade, se este post fosse escrito pela HSC, fazia o mesmo tipo de comentário(eras, é esta que estraga tudo), só por curiosidade...
ResponderEliminarEstimada UJM,
ResponderEliminarO que me ri com este seu Post! E depois, você é tão feminina a escrever estas coisas, a transmitir estas emoções e atrapalhações!
Eu com os meus pais em jovem tive outra diferente. Meu pai estava numa de querer ver um kung-fu e lá o levei,mais a minha mãe e irmãos. A certa altura, há por lá uma cena de um malandro arrancar o coração com um faca a um outro, preso numa trave. Diz-me minha mãe: "olha, acho que é melhor irmos embora, teu pai ainda me desmaia aqui no cinema!" E lá fomos embora.
Já cenas dessas, em filmes, sucedeu-me, também ainda rapaz novo, mas com uma namorada que me convidou (!) para eu ir ver uma "coisa forte". No fim do filme, perguntei-lhe "o que pretendia com aquilo". Enfim!
P.Rufino
Olá UJM,
ResponderEliminarLi este seu post e o do dia 19 de Setembro, que ainda não tinha lido e adorei, fartei-me de rir com as suas peripécias romanescas, os seus enamoramentos, as emoções à flor da pele, etc., tudo descrito com tanta sensibilidade, delicadeza, simplicidade e subtileza que nos prende do princípio ao fim. Gostei imenso e obrigada por esta partilha tão pessoal, sem preconceitos, tão natural, tão autêntica! Que magia tem, UJM!
Um beijinho grande
Senhor(a) anónimo(a), não me sinto obrigado a isso mas de todo o modo informo-(0)-(a) que não conheço a autora nem desde a primária, nem de qualquer outro lado, inclusive daqui. Não a conheço. Mas leio o que escreve a não raras vezes, sorvo o que escreve, embrenho-me até perder a consciência de mim, nos cenários que ela cria. Comungo nas suas opiniões de carácter político e social. Divirto-me com as estórias que aqui deixa e que me atrevo a pensar que são dirigidas a quem as lÊ; isso, dá-me o direito de me considerar íntimo da autora. Uma intimidade virtual, bem o sei, mas que me liberta do formalismo - segundo o meu critério - de me dirigir a ela, fazendo uso de chavões que no contacto virtual não fazem o menor sentido. Quando o Senhor(a) anónimo(a) menciona as iniciais HSC, deduzo que se refere a Helena Sacadura Cabral. Se assim é, devo dizer-lhe que não a conheço também e que, nos comentários que lhe dirijo, não a trato por tu. O motivo porque o não faço, tem a ver com a distância que a autora mantém, quando escreve - sem dúvida muito bem - mas sem criar uma ambiente de entrosamento com a pessoa que a lê. É esta a forma como Eu a leio, e nesta matéria, Eu sou soberano nos critáerios que adopto, até que a pessoa interessada me faça saber o contrário, nessa altura, respeito-lhe inteiramente a vontade.
ResponderEliminar;)
Sr Bartolomeu, já tem autorização.
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