Era o pinheiro mais alto aqui do bairro
o único dos quatro iniciais
e o arquitecto a fazer o desenho
sem lhes tocar
e eu a gritar-lhe
nem um risco a mais
Altaneiro
parecia um farol sem faroleiro
atrevido deu em rachar o muro alto do vizinho
e o perigo era grande e espreitava e eu fazia de conta e assobiava
adiando o inadiável...
Era Janeiro e o meu pai partia
ele que o defendia e aconchegava
então pois tem de ser
marcou-se o dia
e o meu coração atormentado
inventava uma espécie de milagre
por acontecer
Ao cair da noite
olhei e demorei o olhar
mal sabes tu que será a última vez que anunciarás o nascer do sol
e o dia vinte de Janeiro a começar
Fugi antes do crime
embrulhada num casaco velho e quente
atravessei avenidas e ruelas
nos meus ouvidas as maquinas e as serras
e só voltei a custo ao fim da tarde
fiz o luto dos dois adoecendo
porque era uma postura única
desassombrada
um estava já velho e doente
o outro não, presente
e a vida roubou-me os dois
tão indiferente
como se não doesse nada
Quando os dias cresceram de novo
e aqueceram
e eu voltei ao meu pequeno mundo
reparei que o céu era maior e mais azul
e da varanda agora via a serra e o castelo como nunca vira
e que é verdade
que Deus fecha uma porta abrindo
sempre uma janela
pois é
e há um lugar dentro de nós
onde se guardam os pais, os amigos, os amores, os pinheiros
e os nossos queridos bichos
como de fosse a nossa arca de Noé
ainda hoje o lembro com culpa e com saudade
quando no lugar onde ele estava me deito e sonho
e olho o céu
e espreito o sol nascer como ele espreitava...
[Poema da Leitora 'Era uma Vez' a quem muito agradeço]
Olá UJM,
ResponderEliminarEspero que tudo esteja mais sereno e que se tenham encontrados soluções para minimizar os estragos nas suas árvores do seu cantinho. Já é bastante tarde, mas ainda quero deixar aqui uma palavra de apreço a este belo poema da sua Leitora "Era uma vez". A natureza é a mãe de todos nós, por isso a veneramos com tanta intencidade!...
Um beijinho e até logo, pois o dia já nasceu há muito.
maria eduardo
Olá UJM,
ResponderEliminarQueria dizer...por isso a veneramos com tanta intensidade!...os olhos já estavam baralhados e os dedos trocados, dado o adiantado de hora. Não gosto de atraiçoar a nossa Língua, basta o acordo ortográfico.
Peço-lhe que releve esta gafe.
Um beijinho
maria eduardo
Estive a olhar para o calendário. Estranha coincidência: o temporal também foi a 20 de Janeiro ou não?
ResponderEliminarNesta mesma data "caiu" Elis Regina e um ano depois um colega, ali mesmo à minha frente,dentro do banco.
Permita-me mandar um grande abraço à Maria Eduardo que como nós, ama e respeita esta nossa língua, o melhor do que ainda nos resta
Bem, hoje está um lindo dia de sol!!!
Olá Maria Eduardo!
ResponderEliminarÉ noctívaga como eu. Ontem, quando me ia deitar, já com os olhos meio fechados e quase a ter que ir de gatas para o quarto ainda li e publiquei o seu outro comentário. Mas já não consegui responder. Não leve a mal pois quando não respondo é porque não consigo mesmo. Ando numa fase de imenso trabalho e reuniões de um lado para o outro e chego a casa sempre muito tarde (uns dias é a fisioterapia, outros é a ida a casa dos meus filhos) e, por isso, como tenho que me levantar cedo, chego a um ponto em que já me custa manter-me acordada.
Quanto à troca do s pelo c o que lhe digo é que ainda deu por ela. Agora eu, que escrevo tanto que nem tenho paciência para reler o que escrevi, faço ideia a troca de letras que por aí deve ir... Só espero é que, quando isso acontecer, não tenham acanhamento em chamar-me a atenção. acho que não sou de dar erros mas sei lá... No outro dia, no Ginjal, escrevi vêem quando queria escrever vêm. Felizmente um leitor avisou-me.
Quanto ao poema da Era uma Vez é sempre um privilégio poder divulgar os poemas desta Poetisa fantástica (já que ela é preguiçosa e não há meio de publicar um livro...)
Um beijinho e boa noite (caso ainda leia isto esta noite).
Olá Erinha,
ResponderEliminarPois foi. 20 de janeiro, um dia com o qual temos que ter cuidado, um dia traiçoeiro que ceifa a vida aos mais frágeis.
PS: Na resposta à Maria Eduardo não resisti a 'uma boca' relativamente ao seu livro, que nunca mais é dado à estampa. Acho que, quando sair, não é um mas uma data deles. Eu, aqui e no Ginjal, já cá tenho muitos dos seus maravilhosos poemas. Um dia, quando a Erinha for muito conhecida, alguém vai ocupar-se de reunir os poemas que tão generosamente vai deixando por aí. É caso para dizer que, com a Erinha, a poesia anda na rua.
Um beijinho!