quarta-feira, novembro 09, 2011

Miguel Relvas, o ministro que não tem almofadas; Tozé Seguro, que vai à Troika pedir um subsidiozinho - teatrinhos. Vamos mas é fugir deles. Vamos voar - Richard Avedon dá-nos uma ajuda e Maria Gabriela Llansol explica-nos porquê


Quando o assunto é relativo a empobrecimento, tenho dificuldade em discutir quem é que deve empobrecer mais ou se, os que vivemos do que nos pagam (trabalho, bolsas, subsídios ou pensões – propositadamente deixo de fora os que vivem de especular financeiramente e que são os eternos poupados à austeridade) já estamos suficientemente penalizados ou se ainda há alguma ‘almofada’ de empobrecimento.

É certo que os funcionários públicos, face aos benefícios complementares que têm (a ADSE é um deles), podem ser considerados um grupo até aqui privilegiado e, portanto, poderia ser defensável que agora fossem penalizados com a sonegação dos dois subsídios para ajudarem na redução da despesa - poderia ser… mas não é.

Mas pensemos agora nos trabalhadores de tantas empresas do sector empresarial de Estado, que não têm nenhuns desses benefícios ou garantias (diuturnidades, ADSE, segurança no emprego, carreiras, etc), que estão tão sujeitos à precaridade do mercado como os das empresas privadas, e que, mesmo nas empresas rentáveis – e há várias! – estão a levar pela medida grossa, como se fossem funcionários públicos. Há muita injustiça nisso.

Por isso, não vou embarcar nesta divisão entre os que ‘podem’ ou ‘merecem’ e os ‘outros’. Nesta empreitada a que o governo meteu mãos à obra, de atirar com o país para o buraco, somos todos vítimas indefesas e é isso que deveremos interiorizar. Alimentar rivalidades é um passo no caminho de um clima fraticida. Não embarco nisso.

Segundo o governo, depois desta campanha de empobrecimento, daqui por muitos anos, daqui por 10 anos (segundo a bruxa má, Merkel), o país renascerá por si só.

Não creio. Pobreza gera pobreza. Nenhum país caminha para trás no tempo durante tantos anos de seguida. A ser verdade acabaríamos na rua, desgraçados e esfaimados, como cães ao lixo. Isso não acontecerá. Qualquer coisa acontecerá antes, qualquer coisa que quebre este enguiço.

Que muitos hábitos de pseudo-riqueza devem ser corrigidos, disso não tenho dúvida, nunca o tive. Não faz sentido ir de férias a crédito, ter carros de alta cilindrada para andar na cidade e comprados a crédito, não faz sentido toda a gente ter comprado casas para as quais não tinha dinheiro nem para a entrada e com planos de pagamento a 50 anos, não faz sentido que as pessoas acumulassem créditos em cima de créditos, não faz sentido muita coisa. Mas, não nos esqueçamos que, no conjunto, isso são peanuts.

Porque o que não faz mesmo sentido é que empresas (públicas e privadas) se metessem em avultados planos de investimento e sem capitais próprios, tudo alavancado; não faz sentido que empresas comprassem milhões, muitos milhões de acções em bolsa com financiamento bancário e sem garantias; não faz sentido que muita gente tenha enriquecido espectacularmente com rendimentos inexplicáveis e sem ser tributado por isso – e, no conjunto, estou a falar de poucas pessoas e de poucas empresas mas que ilustram o Princípio de Pareto (também conhecido por lei ABC), ou seja, cerca de 20% ou menos de pessoas ou de empresas são responsáveis por cerca de 80% dos problemas (dívidas incobráveis, imparidades, etc) - é a classe A, os ilustres. Pelo contrário, cerca de 80% das pessoas ou empresas respondem por aproximadamente apenas 20% ou menos dos problemas - é a classe C, a ralé, isto é, quase todos de nós. (... para os mais curiosos: esta lei aplica-se a quase tudo o que mexe e mesmo a coisas que não mexem, como sejam os stocks).


Mas as situações inerentes à Classe A são as que sobejamente se conhecem e que continuarão a ser poupadas (porque 'senão fogem', porque 'senão põem o dinheiro lá fora' – como se já não usassem offshores, como se já não tivessem o dinheiro a salvo...) e, ingenuamente, deixamos que todas as atenções se virem para os pobres cerca de 80% de pessoas ou empresas que pouco ou nada contribuíram para o buraco em que estamos.

Voltando onde ia: dizia eu que muitas correcções são indispensáveis, muitas, muitas. Toda a máquina tem que se pôr a funcionar, com competência, sem amadorismos, sem despesismos, com focalização no que são os verdadeiros objectivos estratégicos do país.

Mas não basta fazer isso para que o País se desenvolva, nem pensar.

O País tem que ter políticas inteligentes e estratégicas de desenvolvimento. São indispensáveis políticas activas, sólidas, postas em prática de forma consistente ao longo de anos, no sentido de fazer crescer a economia. O País não pode ser objecto de experimentalismos, voluntarismos, gestos ignorantes e impensados. Os países não devem regredir. A humanidade deve caminhar no sentido do desenvolvimento. Não posso aceitar que nos impinjam um caminho de retrocesso.

Por isso me parecem irrelevante os actuais teatros - com tão fracos figurantes...! -  a que andamos a assistir. Não consigo já nem ver nem ouvir o Relvas com aquele seu ar de velha gaiteira a falar de almofadas, nem o Seguro com aquele seu ar de sofredor menino velho, um maçador de primeira, a falar nem sei de quê que não consigo fixar nada do que ele diz, credo.

O País a precisar de um comando a sério, de uma visão, de um líder e só nos sai disto.

E a propósito: alguém me explica porque carga de água é que agora é o Relvas que por aí anda, armado em primeiro-ministro? Que é feito do outro, do marido da D. Laura? Só dou por ele quando anda no estrangeiro; parece que só tem coisas para dizer quando está longe, não é?

Já não há paciência.


(((((())))))


Mas eu disse que não quero alimentar rivalidades que só servem para criar a divisão entre os que deveriam estar do mesmo lado. E disse que já não há paciência, não foi? Então, não vou aqui ficar a remoer nisto. Vou partir para outra. Venham comigo.

Olhemos o mundo de uma outra perspectiva. Elevemo-nos. Vamos voar.

Música! Maestro.



Nureyvev

Sylvie Guillem

Mikhail Baryshnikov e Twila Tharp

Stephanie Seymour

Cyd Charisse



<|||>

 
O pensamento é impelido pela geometria dos corpos.

Quando o corpo e o espírito são dois amantes experimentados, surge a proporção escondida, sabem extrair de quase nada o ardor imenso de criar.

Chegámos a um estado de tão profunda fragilidade e pequenez, que se tornava importante saber se tínhamos vivido ou se tínhamos sonhado o nosso passado. A diferença é mínima, mas o desencanto pode ser mortal.

Ir buscar plenitude, é garantir a respiração harmónica e metódica do meu corpo nascido para perdurar.


<>

(As palavras são de Maria Gabriela Llansol, claro; a música pertence à banda sonora de África Minha e as fotografias, como é bom de ver, são de Richard Avedon)


«»

Se vos apetecer agora ouvir violoncelo, recomendo-vos que ouçam Sol Gabetta, magnífica, ali ao lado, na minha outra casa: esta semana na Música no Ginjal há cordas.

«»


Agora, enquanto vos escrevo, chove que Deus a dá e troveja que é um susto. Mas, se quando me lerem, ainda estiver assim, não se deixem enevoar - sorriam, aqueçam-se. E, meus Amigos, tentem ter um belo dia.

  

4 comentários:

  1. Enfim, com dirigentes políticos do gabarito do Obama, da Merkel ou do Sarkozy, muito pouco ou nada há a esperar. Isto não vão ser 10 anos, infelizmente receio que seja o resto dos dias das nossas vidas.

    ResponderEliminar
  2. Credo, Packard, que falta de esperança...

    Nada disso.

    Permita-me que o corrija: "Com dirigentes políticos do gabarito do Obama, da Merkel ou do Sarkozy, muito pouco ou nada haveria a esperar" - "haveria", packard, porque o mundo não figa de gatas tanto tempo. Muito antes disso alguma coisa acontecerá que volte a colocar o mundo nos carris. Espero é que seja uma coisa pacífica.

    Começo a ver algumas movimentações no sentido do Irão, esperemos que não se desenhe para aí alguma coisa que seja o rastilho. Com toda a gente em ponto de rebuçado...

    Mas esperemos que não, esperemos que isto vá lá só umas manifestações de indignados pelo mundo inteiro.

    Eu, como sou uma optimista, já nos vejo todos felizes e animados dentro de pouco tempo. Há coisas assim, a sorte que vira de um momento para o outro. Pode ser.

    ResponderEliminar
  3. O 'interessante' desta queda da 'civilização portuguesa' é a tendência para nivelar pelo mau. Não se procuram garantir as mais valias, (ADSE, estabilidade no emprego,...), adquiridas por uns ao fim de anos de luta, de igual modo, os que não as têm, não procuram ganhá-las. Acontece precisamente o contrário, quem não tem, arranja todo o tipo de argumentos para tirar a quem tem, para gerar um contentamento miserável de navegarmos em conjunto em águas malcheirosas.
    Isto é tudo de uma idiotice sem nome, de um baixo nível, de uma mesquinhez sem tamanho.
    Não tenho qualquer laivo de optimismo face à situação, é um problema de hereditariedade idêntico ao alcoolismo que grassa na nação.

    ResponderEliminar
  4. Luísa,

    Acabo de ler os seus comentários sempre a sorrir porque é tão genuína na forma impulsiva de se exprimir... - mesmo que não concorde inteiramente consigo.

    Não sou funcionária pública nem trabalho em empresas do sector empresarial do estado mas isso não faz diferença porque acho que consigo fazer uma análise isenta.

    Acho uma desgraça que nesta questão haja rivalidades e que se ande a medir quem é que merece mais perder rendimentos. Ninguém merece. O caminho deve ser para a frente e não para trás.

    Mas, dito isto, tenho que reconhecer que a situação actual a nível do estado não é sustentável. Face ao decréscimo da população contribuinte, não é aritmeticamente possível continuar a assegurar todos os pagamentos de ordenados, pensões, subsídios, adse's, etc, etc, durante muito mais tempo. Por isso, alguma coisa tem inelutavelmente que ser feita uma vez que a população está em decréscimo e vive cada vez durante muito mais tempo (felizmente).

    Mas é face a essa equação que se tem que encontrar uma solução.

    Que alguns cortes terão que acontecer a nível dos gastos do Estado, isso não há dúvida.

    Só que alguns cortes como estes não resolvem o problema de fundo que é o não crescimento da economia e o não crescimento demográfico.

    Ou seja, em minha opinião, há muita demagogia, pouca aritmética e pouca lisura.

    Que o povo português tende a ser mesquinho e invejoso é um gacto pelo que o Governo não deveria estimular as comparações que serão sempre superficiais e levarão a confrontos fraticidas.

    Continue a ser assim (como a imagino), uma lutadora, uma mulher de força.

    Um beijinho.

    ResponderEliminar