Nunca sei se devemos desfazer-nos do que, na altura, nos parece dispensável ou se deveremos guardá-lo para ocasião posterior. Muitas vezes, na dúvida, guardo. E sou censurada por guardar tralha inútil. Anos depois, alguém (frequentemente alguém que antes me censurou) se lembra disso ou as circunstâncias o fazem relembrar e, graças à minha persistência, as coisas voltam à cena.
Por isso, não sei. A Marie Kondo tem aquele critério de guardar apenas o que nos faz feliz mas acho isso redutor: o que não me faz feliz num dia pode fazer no outro. No outro dia, a minha menininha, ao ficar toda molhada, pediu-me roupa para se trocar. Fui à gaveta de blusas que já mal me cabem e foi só escolher uma.
Quando nos mudámos pensei: se calhar não faz sentido guardar roupa que não voltará a servir-me. Mas, à última hora, pensei: e se alguém aqui em casa precisa de uma blusinha ou coisa do género, como resolvemos a situação? E é o que tem estado a acontecer.
Acho que já contei: quando era miúda, a minha mãe temia ficar de férias só comigo. As nossas férias quase coincidiam mas o meu pai tinha menos dias que nós. Por isso, parte delas estávamos só nós duas ou me entretinha por ali, em casa ou com amigas. Mas, fosse como fosse, a primeira tentativa era fazer mudanças em casa, o que, para minha frustração, a minha mãe abominava. Queria era descansar depois de um ano lectivo a aturar alunos, queria que eu a deixasse dormir a sesta em vez de andar a moer-lhe a paciência.
Quando às vezes, ao falar com a minha mãe, relato algumas dificuldades ou algumas decisões difíceis de tomar, ela diz: o que faz isso é ter muito, quem tem pouco não sente essas dificuldades.
E concordo. A abastança nem sempre é sinónimo de felicidade. Não sei se há um ponto de equilíbrio, um break-even point. Aquele ponto de equilíbrio perfeito em que a gente percebe como mais favoravelmente resolver o dilema: come-se o bolo ou fica-se com ele? Não é fácil. Quantas vezes queremos desfazer-nos de uma coisa ou de uma pessoa e, ao mesmo tempo, não perder a função que essa coisa ou função representa. Qual o ponto em que se percebe: já era? Ou como perceber se é coisa que valha a pena ainda o esforço de uma reparação ou se o desgaste já é tanto que mais vale partir para outra....?
- Obviamente que não. Fica bonita na sua imperfeição.
Mas, sobre isto, não sei que dizer. Os anos passam e não me trazem sabedoria. Não consigo estabelecer regras que algum tempo depois ainda sejam inequívocas ou defender teses que, com o passar do tempo, continuem a parecer-me intemporais. As certezas vão ganhando matizes com o tempo e sei agora que apenas os estúpidos acham que sabem tudo. Conheço alguns.
Diria que o nosso coração sabe a resposta mais depressa que a mente. Sabemos com as emoções primeiro do que com o raciocínio se há espaço na nossa vida para o que, de momento, nos parece estorvo ou inutilidade ou, se pelo contrário, precisamos é de reconquistar espaço para que coisas ou pessoas novas ocupem o espaço entretanto deixado livre.
[PS: Claro que o que acima escrevi não se refere a livros. Livros são livros são livros]
Guarda o que agora não presta lá virá tempo que te sirva. Dizia minha avó e tinha sempre razão.
ResponderEliminarTenho-o verificado ao longo dos anos. Contudo os tempos/modas mudaram tanto e o espaço é tão caro, que torna isso impraticável.
Guardei, por recordação ou só porque sim, algumas roupas da minha filha e o que sinto agora ao ver a minha neta adolescente usá-las, é comovente.
Por graça juntei na mesma moldura, fotos da filha e neta vestidas com a mesma roupa o que por vezes confunde quem vê.
Continuação de boas mudanças. Renovar é sempre refrescante, pena é que, o que não depende de nós, demore mais do que gostariamos.
Um beijinho e bom domingo.