Informaram que já poderíamos ir buscar o quadro, que tinha ficado muito bonito com a moldura que tínhamos escolhido. Fomos de manhã.
Aproveitámos para turistar por ali. E uma coisa é certa: quando estamos numa de fazer turismo, descobrimos coisas que antes nunca vimos. Pelo contrário, quando nos armamos em entendidos a passamos pelas ruas e jardins como cão por vinha vindimada, dando por adquirido e considerando déjà-vu tudo o que está à nossa volta, o que acontece é que passamos sem prestar atenção a nada, ceguinhos de todo.
Foi, pois, com a disposição de um marinheiro de primeira água que me fiz aos jardins. Muita gente, todas as línguas, todas as raças. Gosto imenso de andar nestes ambientes. Há muita gente que fica com comichões quando se vê rodeada de gente estrangeira. Eu não. Mil vezes isso do que cercada de vizinhas que examinam e comentam tudo o que uma pessoa veste, faz ou diz.
Chovia e íamos preparados para a chuva mas cruzámo-nos com pessoas que iam de manga curta, à fresca, e sem mostrarem qualquer frio.
Como sempre, muita gente a fotografar-se a si própria com os monumentos, por trás, votados à irrelevância. Parece que, nesta era, há uma grande tendência para o narcisismo. Por algum motivo as pessoas pensam que os outros têm muito interesse em acompanhar os seus passos ou que, na proximidade de esculturas interessantes, jardins bonitos ou monumentos excepcionais, o que é relevante é a pose que fazem ou o sorriso que exibem.
Dado que o tema 'pendurar quadros' é tema sensível cá em casa, mantive-me prudentemente reservada.
Depois de almoço, enquanto ele estava no sofá a ver séries ou futebol ou a dormir (não sei), eu atirei-me à árdua tarefa de mondar os livros que já vieram.
O meu marido colocou os sacalhões na cave. Alguns sei, à partida, que nós também já cá os tínhamos. Esses fui logo arrumando numa das estantes que lá está, na cave.
Aqueles que me ofereciam dúvidas, trazia-os para cima. Os de língua portuguesa vinham para a biblioteca do rés do chão. Os outros para a biblioteca do primeiro andar. Por isso subi, carregada de livros, muitas vezes, um ou dois lances de escadas. Depois, in loco, validava se já os tinha ou não. Se sim, voltavam para a cave. Os que não tinha foram arrumados na devida ordem alfabética. E isso está a trazer-me grandes problemas pois muitos não cabem. Por isso, tive que reformular, arrumar de outra maneira. Tudo isto é um desafio...
Parei porque já estava cansada e com medo que tanto step em doses maciças e carregada de livros me afecte as articulações já que se dão mal com carregos e com movimentos repetitivos. E foram umas horas disto.
Mas, dos que vieram de casa dos meus pais, há muitos que não tinha e que, por mim, para mim, não os teria comprado. Por exemplo, várias biografias de personagens históricas ou livros sobre saúde (cérebro, microbiota, etc). Alguns, por sinal, fui eu que os ofereci à minha mãe. O meu pai também lia mas mais livros mais técnicos ou sobre geografia ou ciências. Depois há várias obras completas: Ferreira de Castro, que foram para a minha filha, Eça, que o meu filho diz que ficará com eles, Camilo Castelo Branco que ficaram para mim pois tinha alguns mas não todos. Os do Aquilino não sei se ainda lá estão ou se a minha filha também os levou. Os do Júlio Dinis ainda não vieram. E sei lá que mais.
Claro que a estante dos repetidos já está a transbordar.
A ver se este domingo consigo dar destino aos que ainda estão em sacos na cave.
Mas, dizia eu, andei nisto, para cima e para baixo e, claro, de bico caladinho em relação aos quadros.
Até que, como por milagre, o meu marido apareceu ao pé de mim a dizer para irmos ver onde pôr os quadros. E falo no plural pois o que veio foi para o lugar de outro que, por sua vez, desinstalou outro. E assim sucessivamente. Também para pendurar o que o meu tio pintou tive que arredar outro que, por sua vez, foi para outro sítio e assim sucessivamente, e patati-patatá. Portanto, uma enfiada deles. É que nem sempre um pode usar o mesmo prego que o antecessor pois ou está acima ou está abaixo.
Mas a verdade é que a coisa fluiu sem dramas e já está tudo posto e lindinho. Milagre, milagre.
E é isto.
_______________________________________________
Vi há pouco um daqueles vídeos que me encantam. Plantar uma floresta, salvar uma floresta do declínio quando a principal e quase única espécie é atacada, andar pelos campos, fazer arte com paus, troncos, pedras, sentir a terra com as mãos, ver a natureza a reinventar-se, se. Tudo maravilhoso.
Rewilding A Forest | Maria "Vildhjärta" Westerberg | Something Beautiful for the World
Synopsis: Maria was a romantic, animal-loving, dreamy child who, growing up, had a hard time conforming to the demands associated with the trajectory towards "a normal life". As a young adult she became depressed, and was encouraged by her therapist to go for walks in the forest. The myriad of funny-looking twigs and sticks she found along the way immediately put her on a path to recovery. Now, 25 years later, she's a celebrated "twig poet" whose art is shown in galleries throughout Sweden. When a climate related crisis strikes the forest where she lives and works, she's forced into a new type of creativity in order to save the place that once upon a time saved her.
Filmed in: Värmland, Sweden
Featuring: Maria "Vildhjärta" Westerberg & Johannes Söderqvist (https://vildhjarta.net/) and Martin Jentzen (https://www.jentzen.se/)
Ai os livros, os livros, os livros... dei, desbaratei, entre outras barbaridades (lareira, como acendalha, pois, auto de fé!) caixotes de livros. Concluí que já ninguém, ou quase, quer livros! Nem a biblioteca municipal - e falo daqueles que são estimáveis, literatura portuguesa e estrangeira.
ResponderEliminarOs quadros??!! Aos cantos, amontoados, e as fotos, e a preguiça, e a falta de mão de obra - dê graças ao marido, não se esqueça (que um dia já não há...) !
Abraço,
Luísa Santos
Até quando se muda de casa, ao fim de vinte ou trinta anos, encontramos cartas, livros e coisas de que nem sonhavamos a sua existencia.
ResponderEliminarHavia o habito, em casa de meus pais, quando lá ia uma senhora costurar para nós, éramos quatro crianças, mais tres adultos, de guardar todas as sobras dos tecidos enquanto as respectivas peças de roupa existiam e, como iam passando para os mais novos, faziam sempre jeito.
Quando mudámos, há vinte e tal anos para esta casa, descobri um saco com sobras de tecido de cortinados, de (talvez)camisas de dormir, de vestidos o que me fez lembrar outros tempos e como a qualidade era outra. Entreguei o saco na junta de freguesia, onde o centro de dia lhe deu uso.
Descobri livros em duplicado, pois o meu marido trouxe os dele e eu os meus. Entreguei-os no Centro Prisional de Lisboa, assim como dezenas de revistas da Nacional Geographic que o meu marido teimava em juntar para a filha um dia consultar. Nunca o fez.
Quanto a fotografias, valha-me Deus, tenho caixas e caixas delas que só consegui separar por familia, convivios, casamentos, (hoje nao percebo porque se comprava tantas fotos de casamentos) e outras que embora não sirvam para nada são testemunhos de paisagens e lugares que já não existem da mesma forma. Destas ainda não consegui desfazer-me. E agora lembrei-me do seu marido quando disse que os filhos nem sonham o trabalho que irão ter um dia.
Boa continuação.
Um abraço e boa semana.