Um dia que vos conte o que se passa, e posso já dizer que é algo de inesperado, insólito e muito perturbador, talvez compreendam que a situação pela qual estou a passar justifica o abalo a que fui sujeita e o quão atarantada e triste tenho andado.
A família está a atravessar o mesmo mas talvez porque o meu vínculo é o mais forte e porque a estreita ligação me tornou também o objecto de todas as queixas, medos e desabafos, os outros encaram todo este processo com uma racionalidade e aceitação que não se comparam com as minhas. E quase me forçam a distrair-me e a não estar sempre a pensar no mesmo, temem que me afunde.
Obviamente, não quero afundar-me. Acho que vou conseguir racionalizar e superar tudo o que se passa e tudo o que ainda está por vir. Mas não me é fácil. À medida que vou sabendo mais coisas, vou reprocessando a informação dos últimos tempos e vou tentando interpretar tudo o que vivi à luz dos novos factos. Nada disto me é fácil. E tem sido uma tal sucessão de acontecimentos que nem me dá tempo a processar. A família quer que eu deixe de estar sempre a pensar no mesmo, deixe de estar a querer perceber tudo senão fico pirada pois entre a preocupação e a incompreensão pelo que se passa pouca disponibilidade mental me sobra.
Mas hoje de tarde, depois de virmos de lá, eu sempre trémula por dentro, inquieta, com medo, a minha filha falou em irmos ao CCB para fazermos uma compra que estava em falta. Soube-me muito bem. Distraí-me, ri-me, comi um gelado, soube-me maravilhosamente. Por momentos, lembrei-me que estava ali na boa e ela lá e, sem querer, fiquei com os olhos cheios de lágrimas. Mas consegui ultrapassar. Aqueles momentos ali foram, na realidade, um pouco do oxigénio de que, se calhar, sem o saber, eu estava necessitada.
Quando eu e o meu marido chegámos a casa, já eram quase nove da noite, fui ao supermercado comprar bacalhau, batatas, cenouras, feijão-verde, grão para a ceia de natal. Para o dia o meu filho encomnedou coisas que devem ser boas e ofereceu-se para ser ele a cozinhá-las. Custa-me. Gosto de cozinhar e, para além disso, detesto dar trabalho. Mas, sinceramente, ando sem qualquer vontade e cabeça para me atirar a culinárias.
Mas não posso esquecer-me, não posso mesmo, que, no meio de toda esta crise, é natal e penso que tenho a obrigação de fazer de tudo para que, apesar das complexas circunstâncias, o espírito natalício esteja vivo e que todos, em especial as crianças, tenham uns momentos de aconchego familiar.
Quando chegámos a casa, fomos arrumar as coisas e depois dar um passeio com o urso felpudinho. Enquanto andávamos, fomos conversando. Como sou extrovertida falo de tudo o que penso o que faz com que o meu marido tente impedir-me de fazê-lo por achar que não me faz bem falar tanto no que me intriga e atormenta.
Tenho esperança de conseguir ultrapassar as minhas dúvidas e receios e angústias. Dizem-me que devo deixar-me disso, ou seja, de pensar tanto, de querer compreender tudo, e, simplesmente, aceitar. Tenho esperança de lá chegar.
Hoje, apesar da constatação da complexidade da situação, apesar dos mil receios e do desgosto das coisas estarem a acontecer desta maneira, acho que estou a sentir-me um pouco mais calma. Hoje ainda não tomei nenhum ansiolítico. Se calhar foi do bocadinho no CCB, se calhar foi de ter vindo a tentar interiorizar que contra factos não há argumentos, se calhar vem de pensar que a vida continua e tem que continuar, até para não preocupar as crianças.
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Um dia feliz para todos
Saúde. Ânimo. Paz.
Que bom senti-la melhor.
ResponderEliminarEmbora nos "conheçamos" apenas deste cantinho, sinto uma empatia muito especial, e por isso tenho pensado muito no que lhes vem acontecendo. Gostaria de poder ajudar.
Com mais uns desses programinhas leves assim, vai revigorar. Temos esperança.
A familia e, quase todos os bem intencionados que por aqui passam, precisamos de si.
Vamos viver o Natal com fé em dias melhores.
Um abraço.