Há um perfume de homem que sempre me levará nas asas da memória até um longínquo verão em Angola.
À medida que o tempo mais passa mais eu vou percebendo como foi de charneira na minha vida a minha viagem a Angola, um mês de total liberdade, quase vinte e quatro horas por dia junto de jovens da minha idade, grande parte deles até então meus desconhecidos.
Não havia telemóveis e, porque andávamos de um lado para outro, praticamente nem telefones dos outros. Não Tínhamos, portante, que telefonar nem esperar por telefonemas. Andávamos à solta, num outro continente. Portanto, foi quase como se tivéssemos cortado o cordão umbilical à família, ao mundo onde antes vivíamos.
A magnífica largueza de horizontes daquelas paisagens, o clima que convidava ao quase desnudamento, os dias longos, quentes, os maravilhosos pores de sol, aquelas praias em que apetecia estar até ser bem tarde, a descontração de toda a gente, a boa comida, a boa companhia, tudo, tudo eram mil maravilhas que eu avistava e desfrutava através daquela porta aberta que eu podia transpor sem ter que pedir autorização, sem ter que me justificar.
As amizades que nasceram, o afecto que se ia fortalecendo dia após dia, a alegria que uma certa pessoa que aparecia de manhã, cabelos molhados, sorridente, brincalhão, desafiador, e perfumado com Eau Sauvage, me trazia (e, creio, trazia a todos) não se esquecem.
O tempo passa, passa muito rapidamente, mas há coisas que a erosão não leva.
A Dior escolheu, e bem, Johnny Depp para dar corpo ao espírito da Eau Sauvage. Leio que:
Sauvage Eau de Parfum smells citrusy, musky, and spicy giving the wearer a feeling of being fresh after the shower. The main notes are ambroxan, bergamot, and Sichuan Pepper with a lasting power of 8 – 10 hours with a very good projection.
Born to be wild....Easy Rider, ,,,,
ResponderEliminarVivi em Luanda desde 1951 a 1959, praias da Corimba...Liceu Salvador Correia um mundo diferente, saudades !!!!!!!!
A.Vieira
UJM
ResponderEliminarSaudades de Luanda, tenho muitas. A Mutamba, nas minhas torradas ao lanche, ou uma tasca acima da Mutamba onde escolhia o linguado e grelhava no cavão ao fundo da tasca, que maravilhosos linguados que lá comia, já agora, na tasca havia teias de aranha espalhadas pelas paredes, mas o peixe, Dios Mío, que linguados enormes e saborosos. Ou a praia da barracuda no fim da ilha com a esplanada ao fim da tarde, ou o Hotel Trópico "quando havia dinheiro ,claro está", ou o cinema ao ar livre em Alvalade, ou os concertos de rock também na zona, ou as discotecas Animatógrafo ou o Quatro e, e outras coisas mais que não vem a propósito. Belos tempos até acabar a comissão de tropa.
Quanto a perfumes adoro. Sempre adorei boas fragâncias. E quando não tinha dinheiro suficiente para as comprar, visitava perfumarias para desfrutar das amostras. De "almiscarados" gosto do TERRE D’HERMÈS, mas o meu de eleição de há muitos anos é, sempre, o Acqua Di Parma intenso. Não prescindo deste amadeirado soberbo.
Olá Alexandre Vieira,
ResponderEliminarUm mundo muito diferente. Teve sorte em viver nessa realidade durante todos esses anos. Eu apenas desfrutei dessa magnífica experiência durante um mês. E, no entanto, jamais a esquecerei. Foi muito marcante para mim.
Gostei de saber isso de si, A. Vieira.
Um bom domingo para si!
Olá Ccastanho,
ResponderEliminarVi o Dr. Jivago no cinema Alvalade. Inesquecível, uma noite mágica. Lugar deslumbrante.
E o peixe e o marisco que comi em Angola... E os gelados. E as praias imensas.
Tudo maravilhoso, tudo um outro mundo.
O Terre d'Hermès é muito bom, revela muito bom gosto.
O Acqua Di Parma não conheço mas olhe que fiquei muito curiosa.
Obrigada pelas suas recordações.
Um bom dia de domingo, Ccastanho.
Que uma adolescente, que pela primeira vez na sua vida saiu da casa dos pais para se aventurar com outros da mesma idade numa terra distante, sentisse que esteve no paraíso, compreendo perfeitamente. Também compreendo que, recordando agora esses tempos, volte a sentir a mesma sensação de liberdade e de encantamento que então sentiu. Também compreendo. O que eu não compreendo é a descrição que a UJM agora faz (em setembro de 2023), da Angola colonial como tendo sido um paraíso perdido.
ResponderEliminarEu ia escrever um relambório sobre este assunto, mas não o farei, porque não consigo ter disposição para isso. É um tema que mexe demais comigo por dentro. Eu estive em Angola na guerra colonial. Quando digo que estive na guerra, quero dizer que estive mesmo na guerra: estive debaixo de fogo várias vezes e até fui alvejado direta e pessoalmente, percorri caminhos minados e armadilhados, dormi no chão com os pingos da chuva a cairem diretamente em cima da cara e mesmo assim dormia, e até vi pessoas a morrer (vi pessoas a morrer!). Sabe o que é que sentimos quando vemos alguém a morrer, com o corpo despedaçado, ali mesmo à nossa frente, perante a nossa mais desesperada impotência?
Luanda teria sido para mim um simples lugar de passagem, que me deixaria como recordação um banal almoço na Versailles e pouco mais, se eu não tivesse estado lá durante um mês, a frequentar as consultas externas no serviço de Psiquiatria do Hospital Militar. Está mais do que visto que não temos nada em comum. Para si, Angola foi o paraíso na Terra; para mim, foi O INFERNO.
Fernando,
ResponderEliminarCompreendo perfeitamente o que diz. Deve ter sido um horror, um sofrimento que deixa marcas para todo o sempre.
O mundo consegue ser distinto perante quem o vê segundo distintas lentes.
Por onde andei não vi guerra. Era uma adolescente, novinha, inexperiente. Vi Angola com os olhos deslumbrados de quem pisa África pela primeira vez e está um mês com outros jovens, longe dos pais e do ambiente cinzento, antiquado e opressivo de Portugal.
Deslumbrei-me com as paisagens, com o espírito de todas as pessoas com quem me cruzei. Mantiveram-nos longe de todos os dramas que, nessa altura, pessoas como o Fernando viviam.
Se fosse hoje claro que eu teria outra consciência.
É a mesma coisa, em ponto ínfimo e absurdamente metaforizado, de ir visitar uma cidade e achá-la uma maravilha. E virem dizer isso a alguém que passou um dia nas urgências do hospital a assistir a toda a espécie de desgraças e misérias humanas. Parecem realidades que não coexistem. Mas sabemos que coexistem.
Na minha ginástica, convivo com duas senhoras que viveram em Angola antes do 25 de Abril. Há uma nostalgia, uma saudade, uma recordação de fascínio pelos anos em que lá viveram. Dizem que os pais eram trabalhadores, nada abastados. Não tinham noção do que se passava. Era simplesmente o local em que viviam e onde viviam os amigos. Também coexistiram com os tempos de guerra. Vieram e perderam tudo. E, no entanto, quando se lembram dos tempos em que lá viveram, quanta saudade exprimem...
É assim a vida. Múltipla, diversa, cheia de contradições.
Com estima, um abraço.