Começo a escrever quando ainda é sexta-feira. Ora as sextas-feiras produzem um certo efeito em mim. Não é tanto o espírito desorbitado das black fridays mas mais o desenfreado de thank's god it's friday.
Dantes, às sextas à noite, ia às vezes dançar até às quinhentas ou, mais recentemente, jantar e passear na praia.
Agora, apesar de ter mudado substancialmente os meus hábitos, chego ao fim do meu dia de trabalho à sexta feira e apetece-me chutar a bola para bem longe, para o alto, desatar a correr, atirar-me de mergulho, furar as ondas, voar -- coisas assim.
Claro que agora só o faço com palavras e, portanto, onde vos parece uma sucessão de palavras iguais a tantas outras usadas ao longo da semana peço a vossa generosidade para acreditar que, sob elas, se esconde a minha vontade de sacudir a plumagem, de uivar na noite, de rastejar como um tigre azul, de açoitar a monotonia dos dias e saudar a noite que chega.
Para hoje não tenho, pois, tema arrumado. Trago antes três perguntas, qual delas a mais profunda. Nada têm umas a ver com outras e haverá até quem não ache de bom gosto misturar no mesmo post o Rangel, broches e ocupações da treta. Mas numa sexta a derrapar para sábado poderá exigir-se mais a uma pobre de espírito como eu?
Primeira pergunta:
É verdade que os broches estão outra vez na moda?
Eu diria que nunca de lá saíram mas, já se sabe, cada um é como cada qual e, além do mais, gostos não se discutem.
Uma vez, ia num autocarro apinhado a caminho da escola onde dava aulas. Ia com a minha amiga Fátima, também professora e alentejana dos quatro costados, voz desempoeirada e bem colocada. Íamos na conversa, daquelas conversas que não se recomendam muito menos a duas professoras rodeadas de testemunhas. E, então, sai-se ela com esta: 'É como os broches. Nunca ninguém os faz mas a verdade é que eles aparecem feitos'. Até hoje não me esqueço. Desatei a rir e tenho a certeza que todos os que nos rodeavam fizeram o mesmo. Ou, então, não. Se calhar ficaram escandalizados perante tal declaração. Devo ainda ter dito para ela falar mais baixo, coisa que nela não deve ter produzido efeito algum.
Eu sempre gostei deles, dos broches. Houve alturas em que preferia os bem aparatosos. Ultimamente já mais comedida, ia na coisa em clássico. Também já estive virada para as obras de autor, coisa artística mesmo.
Mas depois a simplificação nos hábitos levaram-me a optar pela discrição, coisa que mal se desse por ela.
Pois bem. Qual o meu espanto quando agora leio que os broches voltaram a estar na moda. E já não se fala em broches mas em neobroches. Gosto. Neobroches parece-me daquelas de que não apenas podemos encher a boca (a falar deles) como os poderemos ostentar orgulhosamente (na lapela). Sou dada a novidades e quanto mais inesperadas melhor. Versatiles, ces néobroches viennent corser les blazers féminins et masculins. É que nisto, como em tudo o mais nesta vida, há que não haver discriminação de género. Broches são broches são broches, seja para homem seja para mulher.
(Artigo completo para poder conferir: La broche de grand-mère fait-elle son grand retour mode ?)
Segunda pergunta:
Rangel está a chegar-se à frente no PSD porque acha que o país pode vir a querê-lo como Primeiro-Ministro?
Eu diria que só se os portugueses estivessem todos com os copos quando fossem votar nas legislativas. Ora não acredito. Impossível que uns quantos milhões de portugueses se apresentassem a votar com uma valente piela.
Claro que há os burros de nascença que não se importam de votar na primeira galinha que lhes apareça à frente. Depois há os que já estão bem aviados de demência e não sabem a quantas andam, botando a cruz onde calha (e algumas lá lhe calhariam). E há, claro, concedo, os que votam depois de almoço e vão para a mesa de voto sem se lembrarem bem do que querem nesta vida nem conseguirem ver bem o que corresponde a cada quadrado. Portanto, alguns votos o Rangel talvez conseguisse ter se algum dia se apresentasse a votos nas legislativas. Mas mesmo levado ao colo pelo Expresso e demais comunicação social, com o Relvas a mudar-lhe as fraldas, com o láparo (agora em versão neo-taliban) a dar-lhe o comer à boca, com a múmia paralítica a sair da tumba para o benzer, e mesmo somando os burros, os dementes e os embriagados, ainda assim acho que o Rangel não conseguiria ter mais votos dos que o meu neto que é sub-delegado de turma teve. Até porque uma coisa é certa. Se há coisa de que o país não precisa é de um vulgar trauliteiro, de um histérico encartado, de um totó armado em fracturante, de uma irrelevante figura que melhor estaria num livro do Eça do que na vida política real.
Terceira pergunta:
Porque é que tantas pessoas têm trabalhos da treta?
O tema agora apenas é apropriado a uma sexta-feira pois o que aqui se defende é coisa das boas. Mas é coisa séria e para levar a sério. Trabalhar apenas no que se gosta e apenas o estritamente necessário -- é o tema. Por exemplo, nos serviços, reduzir o horário semanal a um máximo de vinte horas (acho que esta não é aqui dita no vídeo, esta sou eu a dizer). Anular as tretas, as tarefas inúteis. Organizarmo-nos para que sobre sempre tempo para a vida pessoal, para o lazer. Não é possível em todas as áreas. Sempre que é necessária mão de obra especializada e escassa, não é possível. Mas então que esses sejam bem pagos por terem que trabalhar o dobro dos outros.
Claro que não é tão simples assim e claro que, para lá se chegar, há muito a planear, muito a ajustar. Mas, quando se quer uma coisa, geralmente basta trabalhar para isso.
Mas o melhor é ver vídeo. Para quem prefere ler, transcrevo:
Our society is fixated on working. Some of us work 80 hours per week at jobs that don’t fulfill us simply for work's sake. Expert anthropologists, such as James Suzman, even go as far as to say that many of the jobs we work could be considered "bullshit jobs" - a complex job that is not entirely needed in the workforce. These jobs are created and executed because our culture, and lifestyle, are organized around the 8-hour workday.
So why do we work "bullshit jobs?" Many economists would say it is to fix the problem of scarcity. But what many do not know is that in our society, we passed the scarcity threshold in 1980, and most everyone has their basic needs met. So much so that more food goes into our landfills than goes into our stomachs. If scarcity is no longer an issue, why are we still working over 40 hours per week? It's because people have a humane instinct to work and be productive.
If the 40-hour workweek is no longer serving our society, could we be approaching a new economic utopia? Suzman thinks so. In the present day, especially since the COVID-19 pandemic, many workers are turning away from unfulfilling jobs and diving headfirst into their hobbies - cooking, writing, painting, and creating. If we keep on this path, our entire economic system is bound to change, making for a richer world where everyone does the work they want to be doing.
Comentário sobre o Rangel absolutamente perfeito !
ResponderEliminarPois bem. Qual o meu espanto quando agora leio que os broches voltaram a estar na moda.
ResponderEliminarE feitos à mão !
Diz a anedota que havia um senhor que se passeava debaixo da cama de chapéu alto e mãos atrás das costas a segurar um canudo.
ResponderEliminarUm dia uma senhora viu-o e disse: mas que rapazinho lindo! Se fossem dois fazia uns brincos. Assim, só um, vai ser um broche!
Se há coisa de que o país não precisa é de continuar com um manhoso encartado, a enganar os portugueses desde 2015....
ResponderEliminarA. Vieira