quarta-feira, setembro 30, 2020

Um dia normal com reuniões, pássaros, um gato e um coelho.
E, ainda, dicas de quem não se acha invisível e segredos de quem vive para além dos 100

 



Desde que viu o meu interesse pelas avozinhas, o meu amigo algoritmo descobriu nova fileira para despertar a minha curiosidade. Agora, no meio da dança, da música, de cenas de humor, sugere-me vídeos com casos de longevidade. E eu, aqui chegada, vou espreitar, claro. 

A vida é um mistério e a forma serena de encarar a sua finitude é ainda, para mim, também um mistério.

Conhecer casos de vida em que as pessoas vão por aí afora como se as suas células não conhecessem os seus limites é para mim sempre algum motivo de curiosidade.

Depois conto-as à minha mãe, reforço a ideia de como as pessoas manterem-se activas, motivadas, com projectos, é vital.

Mas, antes de chegar ao Youtube tive um longo dia. Comecei o meu turno da noite já bem tarde. Acabei a jornada já tarde, depois fomos caminhar, depois ao supermercado, depois aquela faena protocolar de lavar umas coisas, outras mudá-las de embalagem, depois, fazer um jantar rápido, depois jantar, depois falar com mãe e filho (com a filha tinha falado enquanto caminhava), depois arrumar umas coisas... e, às quinhentas, finalmente, aninhar-me no meu sofá macio e confortável.

Antes disso, o meu dia foi como sempre são os meus dias de trabalho: reuniões, telefonemas, desafios que me são lançados e que inevitavelmente se traduzem em mais trabalho -- mesmo que, em alguns casos, trabalho para me ver livre deles -- mais documentos para despachar. Corre depressa o meu tempo. Ao marcar reuniões, vejo a agenda e assusta-me um bocado ver como as semanas vão ficando para trás. Daqui a nada, setembro terá ido. 


Pelo meio, à hora de almoço, varro o pequeno terraço junto à cozinha, estendo alguma roupa, passeio pelo jardim, falo com a minha mãe, rego algumas flores. Hoje fui ao canteiro grande junto à horta buscar umas pequenas estacas de alfazema e espetei-as no canteiro que está debaixo de uma das janelas da sala. A ver se pegam. Imagino abrir a janela e sentir que o cheirinho bom do alfazema entra em casa. Também descobri, num dos casinhotos atrás do muro, uns suportes metálicos, daqueles em que se põem os vasos que se querem elevados. Como comprei uma planta que parece um feto mas não é, vai ficar ali mesmo bem. Também comprámos uma espécie de bonsai de rua. E também para essa taça encontrei um pequeno suporte, mais baixo. Tudo sempre mesmo a calhar para as coisas que imagino. Tudo isto me enche de alegria. Parece magia: o sonho que sonhei tantas vezes, eu a entrar numa casa e ir descobrindo coisas que me agradam, peças, coisas que não percebo como ali estão, coisas que posso tomar como minhas.

Quando estou toda a manhã em casa, fechada, a trabalhar, e apenas à hora de almoço vou à rua, os pássaros levantam-se num frémito ruidoso e apressado que me provoca arrepios à mistura com um pouco de susto. É uma agitação que me enche sempre de uma emoção que não sei explicar bem. 

Também aconteceu uma coisa: andava eu a fotografar as casinhas de pássaros que estão nas árvores quando senti aquela impressão estranha que, por vezes, in heaven, também sinto: a de que estou a ser observada. Como estava sozinha em casa, essa sensação vem acompanhada de um certo receio. Olhei em volta, devagar. Até que o vi: o gato preto. Empoleirado no muro, observando-me, atento e silencioso. O que pensará ele? Rondei-o de longe, fotografei-o. De vez em quando ia fazendo bchhhh, bchhhh. Ele imóvel, fixando-me. Quando arrisquei chegar-me mais perto, levantou-se e esgueirou-se devagar para o lado de fora. Quando voltei a casa estava toda contente: tanta vida, passarada, um gatinho. Quando a sopa estava quase pronta, fui à horta apanhar uns pés de hortelã e... à minha frente saltou um coelhinho que desatou a correr, aos saltinhos. Pensei que estava a ser um dia de sorte. E foi mesmo: as reuniões da tarde correram bem e toda a gente acabou com sorriso, motivada e a acreditar no peixe que eu ando a vender.

Podemos sempre ter mais do que temos: mais amigos, mais abraços, lingotes de ouro, iates, carros de corrida, coutadas privadas -- coisas assim. Mas podemos também estar agradecidos com o que temos. Talvez quem pouco tem dificilmente sinta isto. Acredito que os que não encontram o seu rumo nem o seu bocado de terra nem o seu refúgio nem o colo e amor de quem os ame acima de tudo e que se sentem perdidos, abandonados e, talvez, sem qualquer perspectiva não consigam sentir-se agradecidos. Mas há sempre um caminho que vai ao lugar certo e, em qualquer circunstância há sempre um ponto de luz onde nos guiar, há sempre uma palavra que surge no momento em que precisamos dela.

E, portanto, talvez seja essa a sabedoria que mantém a vida naqueles que ignoram a lei da vida e avançam pelos cento e tal com um sorriso, com um motivo para viver.

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Mas passemos ao que interessa. 

A vossa atenção, por favor.






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As pinturas são de Artemisia Gentileschi (1593 – c. 1656) 

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E, em especial a si, desejo um dia feliz. 
Saúde, sorte, coragem. E amor.

terça-feira, setembro 29, 2020

Ayahuasca...?

 


Sobre práticas religiosas não precisaria nem falar, toda a gente que por aqui me acompanha sabe que não sou de práticas religiosas. Não sigo igrejas. Baptizaram-me, puseram-me na catequese, fiz a primeira comunhão e a comunhão solene. Nada daquilo me convocava para o que quer que fossse. Aquela não era a minha praia. Achava que nada daquilo fazia sentido, nem a perseguição com os pecados nem aquelas cenas surreais que não tinham nada a ver com nada. Não sobrou nada. Desaderi. 

Dada a sentimentos para-religiosos eu acho que sou. Acredito na incompreensível infinitude da perfeição e da beleza. Acredito na eternidade do mar, da terra e do céu e todo o mistério dessa improvável convivência me faz ter vontade de me ajoelhar de estupefacção e rendição. Acredito no milagre do nascimento e no supremo milagre da vida. Tenho, pois, esse lado espiritual. E é uma espiritualidade pouco selectiva. Por exemplo, daqui por algum tempo vou ter vontade de me benzer de espanto de cada vez que vir um cogumelo a brotar da terra. E é o mesmo que sinto quando, ao ver flores ínfimas e de uma perfeição incompreensível, me dizem que são flores aéreas. Curvo-me perante esse lado inexplicável e maravilhoso das coisas. É tudo isso que venero. Também sou capaz de me comover perante a imagem de uma mulher com o filho ao colo. Madona, nossa senhora, mãe. Se há quem lhe chame santa, tanto me faz. Sou capaz de a contemplar e me sentir intimamente reconhecida ao perceber nela o mesmo imenso e incondicional amor que tenho pelos meus filhos e pelos filhos dos meus filhos, um sentimento abençoado que não se esbate com o tempo nem sofre a erosão do quotidiano. 

E, sendo eu assim, claro que nunca senti qualquer apelo por seguir mandamento, restrição, ou lei de trânsito para circular entre capelas ou serviços religiosos. Pastores, padres, bispos, cardeais -- tudo hierarquias que me são estranhas. Afastei-me dos rituais e da castração intelectual metódica do catolicismo tal como nunca senti o mínimo apelo por jeovás, evangélicos, iurds ou o que quer que seja. 

Religião, para mim, não sei o que é que não o simples apelo pela bondade, pela generosidade, pela tolerância, pela liberdade, pelo supremo respeito pela dignidade alheia, pelo amor, pela beleza, pela harmonia, pela transcendência sem nome, sem regras.

Na política também sou assim. Gosto de política. Mas gosto da política abstracta, pura. Gosto da coisa pública e de pensar a melhor forma de a servir. Gosto do pensamento limpo. Gosto de pensar no futuro. No meu pensamento não encaixam ambições ou compromissos relacionados com concelhias, com distritais, com aparelhos partidários. Por isso sou apenas eleitora atenta, votante assídua -- mas sem ligação a qualquer partido. Se a nível das legislativas sou geralmente votante no PS é porque, das opções que se apresentam a votos, é a que me parece mais adequada à minha visão política.

Não participo, pois, em homilias, liturgias, comícios, cegadas do género, cenas que metam aventais, velas, rezas, búzios, cantares em volta, flores atiradas ao mar. Zero. 

E mais. Pode isto que vou dizer a seguir não ter a ver com o anteriormente reportado mas vou, na mesma, dizer. É que gosto de ter controlo sobre mim. Sou livre e gosto de me sentir livre, senhora de mim, na plena posse dos meus direitos, das minhas faculdades.

Talvez por isso, nunca me embebedei. Nunca. Dantes, ao primeiro gole, subiam-me uns calores, dava-me vontade de rir e, de seguida, de dormir. Por isso parava logo aí. Nem apreciava vinho. Até que milagrosamente comecei a gostar e o álcool deixou de me fazer passar por vergonhas. Agora posso beber, e claro que bebo moderadamente, que não me sobem os calores, não desato na gargalhada, não caio de sono. Aprecio, sabe-me bem. E nunca me cai mal.

Muito menos outras drogas. Nunca me droguei. Nunca fumei erva. Nada. Não sinto necessidade e é risco que não quero correr, o de ficar desatinada, descontrolada. Talvez quase todos os meus colegas e amigos o tenham feito. Não faço ideia. Não sinto curiosidade. Não me sinto diminuída ou fora de moda, nunca me senti. Não sou de me encarneirar. Sinto orgulho em ser independente e em aceitar ser guiada pela minha consciência.

Talvez por tudo isto, diverti-me à brava ao ver aqui as minhas ídolas falando de tema afim, o Ayahuasca. Claro que nunca tinha ouvido falar em tal coisa. Não faço ideia se é coisa conhecida em Portugal ou moda que ainda cá não chegou. Tanto faz. O que sei é que as Avós da Razão são uma graça: mentes livres, desbocadas, divertidas. Umas jovens descomplexadas. Abençoadas miúdas que tanta alegria e gosto pela espontaneidade nos trazem.

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Pinturas de: Maximo Laura, Renzo Campodonico, Daniel Rodriguez, Adriana Cillóniz, Ginny O'Brien, Jorge Vilca.
Gustavo Santaolalla interpreta Pajaros
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E uma terça-feira muito feliz a todos quantos aí estão a aturar-me.
Saúde. Alegria.

segunda-feira, setembro 28, 2020

Em dia de pequeno ajuntamento ao ar livre e de máscara, uma pergunta: alguém se prepara para ser velho?
[E, já agora, Van Gogh teve mesmo uma namorada?]

 


Perguntaram às meninas como é que tinha sido. Tinham-se preparado para a velhice? Quem perguntou foi um estudante de medicina, certamente um jovem. Ouvi a pergunta e pensei na minha mãe que, aos oitenta e sete, fala das velhas como se estivessem numa fase da vida da qual ela ainda está longe. E, na família, acho que também ninguém pensa nela como sendo velha. Talvez os meninos, se indagados, ficassem na dúvida e dissessem que se calhar já é um bocadinho velha, mas mesmo só um bocadinho. Velhas são as mulheres acabadas, desalentadas, aquelas mulheres que parece já carregarem a morte às costas. Mulheres ou homens, bem entendido.

Ainda hoje. Fomos buscá-la de manhã. Tínhamos muita coisa para fazer mas nada que ela não acompanhasse: fomos ao Leroy, depois ao supermercado, depois a um horto. Só depois viemos cá para casa. Enquanto eu fazia o almoço, já ela se atirava a um cortinado para lhe subir a bainha. 

Por causa da covid, essa peçonhenta malapata que se arrimou a todos os lugares de todo o mundo, almoçámos debaixo do alpendre. Como o tempo esteve bom, esteve-se bem. Até adiantei o toldo que o sol estava de feição e não apenas encadeava como aquecia para além da conta. 

Logo de seguida, começou o pessoal a chegar. Todos sempre na rua, todos de máscara. E, quando foi o lanche, a mesa grande toda aberta e uns sentados, outros levantados, o pessoal tirou a máscara mas, tirando esses momentos, tudo mascarado. Não se pode facilitar agora que a miudagem voltou à escola. E, para adoçar o lanche, a minha mãe trouxe bolo de cenoura revestido a chocolate que fez no sábado às noite. E trouxe caixas de gamboada para toda a gente -- e que boa está, bela, lustrosa, gulosa, boa, boa. É como marmelada mas melhor. Feita com as minhas bem nutridas gamboas. Comi um pouco de pão de abóbora e nozes com requeijão e um pouco de gamboada -- e é acima de muito bom. (Das calorias a gente fala depois, quando estiver de mal com a vida. Agora é mesmo só para falar do bem que sabe).

E, antes e depois do lanche, a minha jovem mãe já estava a fazer as bainhas num outro cortinado. Por mais que eu lhe dissesse que não havia qualquer urgência, que, quando trouxer a máquina de costura, logo arranja, disse que ia já adiantando e que, depois, logo reforça. Não houve como dissuadi-la. Sente-se bem estando ocupada. E, senhores, como a percebo.

A seguir fomos todos dar um passeio pelas redondezas. Uns de bicicleta, um valentão a correr, outros a pé. De vez em quando encontrávamo-nos e os atletas abrandavam, para retomar o fôlego. E a minha mãe, na maior, a passear, obviamente a pé, mas a acompanhar o passo da malta mais jovem. E sempre na boa, na conversa, jovial. 

De manhã, no horto, escolheu uma flor para pôr no vaso debaixo da escada que dá para o jardim, ao lado do vaso do hibisco. E, quando viu um vasinho com uma planta com umas folhas radiosamente coloridas e me disse 'olha, as tuas avós é que tinham sempre destas flores', resolvi logo trazer. Perguntei: 'Mas é de vaso ou de chão?' e ela disse: 'elas tinham no chão, podes pôr no canteiro das rosas'. E assim será.

Do supermercado, também trouxe uma broa de milho que diz que um entendido em padaria lhe disse que aquela era a melhor que já tinha comido. Portanto, agora que à noite a fomos levar -- como já tinha um compromisso para esta segunda-feira, não deu para dormir cá -- levou a broa de milho, o vaso com as florzinhas amarelas, e mais um saco de gamboas para ela, para o meu tio e para distribuir pelas amigas, e mais um ramo de louro e, ainda, hortelã porque diz que gosta de perfumar a sopa com hortelã. E descobriu que na horta também há lúcia-lima, erva-cidreira, erva-príncipe, salsa e hortelã-pimenta. 

Primeiro foi a mudança, depois as arrumações, sempre tudo à pressão, apenas duas semanas de férias, tudo sempre sem tempo para assentar, e logo depois o recomeço do trabalho, o dia inteiro a trabalhar. Portanto, ainda não houve tempo para andarmos a investigar tudo o que há na horta. Também não somos entendidos, não estamos despertos para o reconhecimento das espécies. 

De ervas de cheiro e chás ainda só tinha identificado a hortelã. Fiquei tão, tão, contente por saber que há lá mais. Ao passarmos por elas pensávamos que eram ervas vulgares. A minha mãe, não, a minha mãe é entendida. E eu já estou desejando ir lá apanhar umas folhinhas para fazer perfumadas infusões

Quando se foram embora, os meus filhos levaram romãs. Figos da índia, apesar de serem óptimos, ninguém se afoitou a levar, aqueles picos são mesmo diabólicos. Viram na internet que, se metidos em água a ferver, os picos caem e, na realidade, ao experimentarem, verificaram que os picos caíram quase todos. Mas não todos, e é coisa em que não dá para arriscar. Aqueles picos são tramados. E os figos, fiquei também agora a saber, são danados de calóricos, mais ainda que os figos normais. Não fazia ideia. Gulosa como sou, tenho andado a comê-los como gente grande.

Os meninos, claro, numa alegria, a jogarem às escondidas, a rirem, a perseguirem-se. Felizes por estarem juntos. Falam muito alto, zaragateiam, brincam, correm, andam de balouço, fazem toda a festa.

E nós com eles. 

Mas, bolas, já me desviei: a questão do post era outra, era a idade. Como é que uma pessoa se prepara para ser velha? 

Mas alguém se prepara para a velhice...? As meninas do vídeo abaixo dizem que não, claro. E se eu perguntar à minha mãe responderá o mesmo. Tal como eu. Tal como os meus filhos. Tal como os meus netos. A gente vai vivendo, um dia a seguir ao outro, todos os dias uma coisa nova, todos os dias a recomeçar. Não precisa de ser nada de especial. Pode ser um pensamento, uma coisa que se lê, alguém que se viu na rua, uma página de um livro, um programa na televisão, um sorriso ou uma palavra. Todos os dias são novos dias. Até que um dia se dá por ela e se percebe que já se viveram muitos dias. Nem percebemos como. E percebemos também que não sabemos se teremos outro tanto para viver. 

O meu marido, nestas conversas, que não alimenta nem lhe interessam, tende a ser fatalista. Fatalista digo eu. Na volta, simplesmente realista. Eu digo muitas vezes que sei lá se não vou viver até para além dos cento e vinte anos. Toda a gente já farta, tudo a rogar pragas, 'estupor da velha que nunca mais desanda' e eu, na maior, fresca e fofa, feliz da vida, cheia de ideias, toda entusiasmada com tudo, como se estivesse a conhecer o mundo pela primeira vez. Claro que, se digo coisas destas, o meu marido nem diz nada. Já está por tudo. Mas é assim que penso, que a vida é uma coisa maravilhosa e que, assim tenha saúde para o festejar, levarei a vida como um deslumbramento inaugural, cada dia uma porta aberta para o dia seguinte. Até um dia me surpreender com algo nunca visto ou sentido e, na maior tranquilidade, mergulhar num sereno mar de luz.


Mas, enfim, não vos maço mais. Estou vidrada nas Avós da Razão e, portanto, é com elas que termino o o post e o dia. Ouçamos o que elas dizem, vejamos como estão tão longe de ser velhas e acabadas, partilhemos o seu gosto de viver.

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August Macke está aqui apenas porque sim tal como a Natalie Merchant também. 
Gosto deles e isso chega.
Tal como gosto de todos os meus Leitores mas hoje, em especial, dos que já não se pode considerar que sejam uns teenagers mas que estão longe de ser velhos.
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Desejo-lhe, a si que está aí a fazer-me companhia, tudo de bom.
Be happy.

domingo, setembro 27, 2020

Assim fala Pepe Mujica. Assim fala Nietzsche. Assim fala Garcia Márquez.

 


Gosto de ver as entrevistas de Pepe Mujica ou os apontamentos de reportagens com ele. Se eu tivesse duas vidas, por um lado via aquilo de que gosto e, por outro, ia informar-me sobre aquilo ou aqueles de que gosto. Por exemplo, iria informar-me sobre o seu desempenho como Presidente do Uruguai para além do lado mais pitoresco ou simbólico ligado ao seu despojamento e vida humilde. Mas o facto de não ter um conhecimento bem informado sobre o papel que a história do Uruguai lhe reservará não me impede de simpatizar com a pessoa. E nem é só a vida simples que leva ou as posições políticas que manteve enquanto desempenhou cargos públicos: é também, e não sei se sobretudo, a forma como fala. Há qualquer coisa de poético nas suas palavras, qualquer coisa que não tem que ver com a linguagem usada na comunicação social, qualquer coisa que não tem a ver com as tricas da actualidade mas com algo de mais profundo.

A vida apressada que levamos, a pressão que algumas exigências sociais (nomeadamente as que se prendem com um consumismo exacerbado) têm vindo a impor, a dedicação exagerada que algumas profissões requerem, tudo isso talvez tenha sofrido uma quebra com a pandemia. Talvez muita gente tenha percebido que isso, às tantas, pode não ser a melhor opção. Ao vermo-nos forçados ao recato, talvez muitos dos que antes eram dependentes de estímulos externos, tenham percebido que a vida é possível mesmo quando vivida com maior vagar, com algum resguardo, entre amigos e, sobretudo, no calor afectuoso da família. 

O que eram as ditaduras dos mercados que, de forma geral e com maior ou menor beneplácito de quase toda a sociedade, têm vindo a sofrer alguns abalos -- e com a dura consequência de muito desemprego em alguns sectores -- talvez percam alguma da sacrossanta protecção de que universalmente usufruíam.

Mas, muito antes da fractura que está a ser imposta pela pandemia, já Pepe Mujica se atinha ao essencial, mostrando estar muito longe das temáticas a que se agarra grande parte da população, no Uruguai e em todo o mundo.

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É neste contexto em que agora vivemos -- hoje sossegada em casa, entretendo-me a tratar da sua arrumação, a pôr a lavar, a estender, apanhar e engomar roupa, a cozinhar, a regar, a dispor estacas de alfazema em vasos e canteiros, neste tranquilo remanso de que, privilegiadamente, posso usufruir -- que me ponho a ler, a ver vídeos. Uma rica vidinha, a minha -- reconheço.

Acabei o Narciso e Goldmund, belo livro, e, de seguida, hesitei entre O Ouriço e a Raposa e o Exercícios de Admiração de Cioran. Mas tudo tem sempre a ver com a nossa disposição e disponibilidade. E hoje não me apeteceu delongar-me nem num nem noutro. Diria que chatos, não condicentes com os tons dourados deste sweet september. Ou talvez a requererem um recolhimento que as cores chamativas das buganvílias não me permitem. Lembrei-me então de ir à procura do Zaratrusta. Não encontrei. Não sei se está noutro sítio ou se se perdeu de mim. Do Nietzche encontrei o 'Para além do bem e do mal' e, para meu espanto, encontrei várias partes assinaladas. Já não me lembrava de as ter assinalado. Reparo que sobretudo é onde a ironia, o gozo e a diversão são mais evidentes que assinalei. Rio-me, sinto-me muito bem disposta ao ler aquilo. Algumas partes são mais extensas e tenho preguiça de aqui as colocar, levar-me-ia muito tempo, requereria de mim muita atenção. 

Transcrevo algumas partes mais breves.

67) O amor por um só é uma barbaridade: porque se exerce à custa de todos os outros. O mesmo quanto ao amor por Deus

74) Um homem de génio é insuportável se, além disso, não possuir pelo menos duas outras qualidades: gratidão e asseio.

84) A mulher aprende a odiar na medida em que desaprende de encantar.

97) Como? Um grande homem? Eu apenas vejo o actor, representando a seu próprio ideal.

153) O que se faz por amor, faz-se sempre para além do bem e do mal

154) A loucura é rara nos indívíduos -- mas é a regra nos grupos, nos partidos, nos povos, nas épocas.

237) [...] Vestida de negro e calada, toda a mulher tem aspecto de -- inteligente


E agora, enquanto estava a ler o Nietzsche, pus-me a ouvir Garcia Márquez. Algumas entrevistas longas, com muita piada. Mas, para aqui, escolho um vídeo pequeno, com mesmo muito que se lhe diga.  Acresce que o Gabo é daqueles contadores de histórias de quem a gente quer sempre saber mais. (Virtudes dos vídeos, da net, de tudo -- falo como se ele estivesse vivo e, na verdade, é como se estivesse). Difíceis começos têm, por vezes, os grandes escritores. 

Como nasceu o Cem anos de solidão


Voltei a dar um banho às minhas fotografias, desta vez um banho de verde.

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A todos desejo um belo dia de domingo

sábado, setembro 26, 2020

Ao fim do dia, um Natal avant la lettre
--- e um receio, uma little sombra, a pairar

 


Como sempre que podemos, ao fim da tarde vamos fazer uma caminhada. Porque sou encalorada, fui de manguinha curta. Jeans, ténis de verão, blusinha ligeira. Todos os dias seguimos um percurso diferente. Vamos conhecendo as redondezas. Começou a escurecer e a fazer frio. Vento e frio. Não senti frio, ou seja, não resfriei, mas sentia o ar frio na minha pele, sensação agradável. O vento nas copas das árvores, o ar fresco na minha pele, a penumbra a descer devagar sobre o dia. Gosto mesmo. As luzes das casas começaram a acender-se. De vez em quando, um cão vem lá do fundo e chega-se aos muros para ladrar. Tenho ideia de que, ao princípio isso acontecia muito mais do que agora mas acredito que seja impressão minha pois, se não passamos pelas mesmas casas, os cães não podem reconhecer-nos. Digo eu.

Vamos conversando, por vezes eu falando ao telefone, vendo as casas, olhando para tudo. Hoje passámos junto a uma casa que não parecia de verdade. Tenho que tentar voltar a passar por lá. Não faço ideia onde terá sido. Vamos andando ao acaso, afastamo-nos, por vezes já nem sabemos onde estamos nem qual o melhor caminho para voltarmos para casa. Esta casa tinha umas árvores que tenho ideia que eram pequenas. Talvez arbustos ou talvez árvores cortadas como bonsais. E tinham luzinhas ínfimas pelo meio. Quase parecia iluminação de natal. Mas luzes mais pequenas. Pontinhos de luz dourada. Tinha escurecido, o ar cada vez mais frio, e ali, do nada, aquela casa de brincar com o jardim iluminado daquela forma irreal, como se saída do sonho de uma criança. 

Tive um dia muito intenso, com reuniões prolongadas e duras, e, de repente, saio para caminhar ao fim do dia e tudo se dissipa, sou apenas alguém que caminha por caminhos desconhecidos, observando casas desconhecidas, que se prepara para entrar numa casa até há pouco desconhecida. 


No outro dia, esteve cá, de novo, a antiga proprietária. Veio buscar o correio. Simpatizo muito com ela. Em muitas coisas identifico-me com ela. Começamos a conversar e a conversa flui como se nos conhecêssemos há muito tempo. Eu tinha saído de uma reunião. Como era dia de semana e sabe que estou a trabalhar, tem receio de me tomar tempo demais. Mas estava a entrar na hora de almoço, não tinha problema. Contou-me muitas coisas e eu ouço com curiosidade. É sempre muito intrigante isto: pessoas que mal me conhecem, confiam imediatamente em mim e contam-me muitas coisas da sua vida, coisas muito pessoais, íntimas até. E eu ouço com gosto, quero que contem mais. Talvez por isso, por sentirem que me interesso mesmo, as pessoas me contam tantas coisas. Ela também é encalorada. Diz que, tal como eu, atravessa quase todo o ano com roupa de verão. Perguntou-me se me sentia bem, se já me sentia em casa, e eu disse-lhe que sim, desde o início. Ela confessou que, na sua nova casa, ainda não se sente bem 'em casa' e que pensa muitas vezes nesta. Percebo-a. Esta casa tem história, tem vivências, sente-se que é uma casa com muitas memórias dentro, foi feita por eles. Contei-lhe que as minhas coisas eram absolutamente compatíveis, que tudo encontrou o seu sítio, que rapidamente tudo se acomodou, que o espaço rapidamente se familiarizou com as minhas coisas. Ela conta-me que, com ela, não. Tenho pena, deve ser uma sensação desagradável. Esta é uma casa com recantos e em cada recanto ela tinha as suas coisas. Diz que agora há coisas que não consegue pôr na casa nova, faltam-lhe paredes, falta-lhe o chão certo para os seus tapetes -- e se ela os tinha lindos. 

O jardim também. Árvores, arbustos, flores escolhidas por eles. Vejo que olha em volta, certamente recordando quando cuidava deles. É estranho: se eu a compreendo tão bem, como sou eu tão desprendida em relação à casa em que morei até há tão pouco tempo? É estranho. Mas sou assim. Estou sempre disponível para ir em frente, para o que aí vem, e desprendida em relação ao que foi. 

Ontem dizia ao meu marido que é engraçado como me identifiquei tão de imediato com esta casa. Se andar às escuras dentro de casa, é nas calmas, dou com tudo, é como se o meu corpo conhecesse desde sempre os seus quatro cantos. 

Tenho lido muito, aqui. Os dias correm rapidamente entre afazeres profissionais mas, mal me despacho, agarro num livro. Sinto-me tão feliz. É daquelas felicidades maiores: agarrar num livro e tocar a transcendência. São palavras, bem sei, nada mais do que palavras. Mas a forma como um fio as percorre, desenhando tramas, pontos, enlaces é tudo. Esse fio transforma-se em seiva ou sangue e as palavras tornam-se árvores ou carne e nelas o vento e o tempo esculpem formas, chagas, flores, lágrimas. Página após página recupero o prazer de me entregar à leitura. De vez em quando, volta a vontade de me sentar a fazer tapete de arraiolos. Mas já não teria onde pô-los e é tão absorvente como escrever num blog. Por isso, aqui estou, tecendo conversas de nada. No fim, não tenho uma carpete para estender no chão, tenho palavras que por aí andam esvoaçando, numa rede invisível que une oceanos e continentes.


Ah, é verdade, quando regressámos da nossa caminhada, uma lua crescente iluminava o céu e um pássaro piava bem alto, o seu lamento atravessando a noite que, entretanto, já se tinha mesmo instalado. Ia a pensar que, um dia destes, inauguramos a lareira e que vai ser bom estarmos em volta da mesa, a madeira a crepitar, o calor bom a aquecer os nossos corações, eu a carregar tabuleiros de comida, toda a gente a protestar que é demais mas todos a atirarem-se a eles com um apetite de dar gosto. Mas logo me lembrei que, com isto, os números que não param de aumentar, se calhar não vai poder ser este inverno -- e isso arrefeceu-me a boa disposição. Bolas, que tristeza, isto. Mas não disse nada porque, quando se fala, parece que as coisas ganham forma. Por isso, guardei para mim na esperança que, um dia destes, já não haja problema, nem distanciamento, nem máscaras: só abraços, beijos, risos, conversas boas, cantorias, alegrias. Tomara, tomara, tomara. Façamos figas, caraças, façamos figas a toda a hora. Façamos figas para fazer sentido que eu ilumine a minha casa, acenda a lareira, ponha cânticos de Natal, ponha a melhor toalha sobre a mesa toda aberta e mais outra mesa, também aberta, e faça tabuleiros e tabuleiros de comida. 

[Senão, quando chegar o já tão próximo 25, haja chuva, vento, trovoada, granizo ou neve, ponho a mesa na rua e tento convencer a toda a gente a vestir casacões, botifarras, gorros e o que for preciso para festejarmos a alegria de estarmos juntos.]

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E sai um moon river para levar a apreensão para bem longe...?

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E, esperando que gostem das minhas flores, tentativamente tingidas com as cores do luar, 
desejo um belo sábado a todos os que aí estão desse lado

O Paulo preocupado porque a outra já tem 82 e a bela Helena, de 91, a dizer que está livre mas que, assim como assim, preferia que ele tivesse 18

 

Ah o que eu me rio com estas meninas. Muito bom. Cabeças desempoeiradas, divertidas, um passado leve, cheio de memórias mas não há mágoas, ressentimentos, tristezas. Nada disso. Coisas más são mala pesada e mala pesada elas não carregam, deixam para trás. Com elas é apenas aceitação, leveza, presente e futuro, gosto de viver. É assim que eu quero ser quando for crescida. Conversar, rir, amar. Estar até ao fim disponível para o amor, para o riso, para a surpresa.

Agora, quando ligo o computador e vejo que as notícias não me trazem novidades que se aproveitem, esgueiro-me para o Youtube. É como quando ia visitar prima da avó, casa com móveis grandes e escuros, conversa chata e, mal podia escapar-me, ia para o pátio ver se descobrir os sapos que andavam por lá escondidos entre os canteiros, entre as pedras do laguinho. Muito melhor que coisa monótona e datada como a conversa lá dentro. 

E o safado do algoritmo, sabendo-me devota, vá de me sugerir mais oração: um e outro e outro vídeo delas, as fantásticas Avós da Razão.

Estive aqui com os auscultadores, para não perturbar aqui o meu vizinho do lado, entretido com coisa séria, até que ele me disse: 'só te vejo rir. o que é?'. Disse: 'As avós'. Ele respondeu: 'Logo vi'. E é. Elas são coisa boa de ver.  Todos os dias toda a gente deveria ver uma coisa que fizesse rir. Aliás, nada como uma conversa cheia de malandrice, insinuação, suposição, alegria, bola para a frente, risota e ar fresco. 

Partilho este apenas porque foi o último de vários que tenho estado a ver. Espero que também gostem.

sexta-feira, setembro 25, 2020

Com quem foi o melhor beijo?

 

Se a mim me fizessem esta pergunta em público teria que dar a resposta óbvia. Qualquer outra, para além de poder ser não verdadeira, poder-me-ia trazer sarilhos. 

E se eu gosto de beijos. Não há amor de verdade se não houver o prazer de beijar -- isto se for amor entre um casal, bem entendido. Mas, mesmo nos outros tipos de amor, penso que um beijo, um beijinho ou uma beijoca são laços indispensáveis na explicitação do afecto.

Mas, no caso da Sharon Stone, não houve esse tipo de pruridos: a pergunta referia-se a beijos em contexto profissional. Provavelmente não terá sido beijo técnico mas, sim, um pouco melhor que isso mas, de qualquer maneira, um beijo no contexto do trabalho que estavam a levar a cabo. Portanto, quiçá nada a ver com afecto mas com profissionalismo. Felizmente não sou actriz, senão não sei se conseguiria ser tão profissional quanto isso. O distanciamento suficiente para estar aos beijos e ficar como se não tivesse sido nada comigo parece-me coisa inantigível. Um beijo na boca é um momento de tal aproximação, de tal cumplicidade e comunhão que não sei como é possível ficar-lhe indiferente. E a verdade é que Sharon Stone parece também não conseguir ficar alheada e, passado tanto tempo, ainda recorda o bom que foi beijar Robert de Niro. E não me admiro. 

Robert de Niro é um homem da cabeça aos pés, daqueles homens que respiram masculinidade por todos os poros. E para um homem beijar bem uma mulher, bem, mesmo bem, tem que ser muito homem. Acredito que uma mulher também consiga beijar bem outra mulher. Mas lá está, para que o beijo seja bom tem que ser muito mulher. Ambas. Tal como um beijo homem-mulher só é uma porta aberta para o paraíso, para o covil dos amores, para o início e o fim dos tempos, se o homem for muito homem e a mulher muito mulher. Só assim haverá ternura, entrega, comprometimento, atração fatal.

O filme onde Sharon Stone degustou os belos beijos de Robert Niro, os melhores beijos da sua vida profissional (e se ela tem beijado...), foi o Casino. Por acaso, foi filme que não me encheu as medidas. Filmes entrecruzados por um narrador que, em voz off, vai tingindo a fita com explicações e embaciamentos, perdem fluidez e filmes sem fluidez (tal como livros ou conversas sem fluidez) são uma seca.

Não encontrei nenhum vídeo dedicado às cenas com beijos (mas, certamente, não tarda vai aparecer) mas encontrei este aqui abaixo onde dá para perceber a qualidade e envolvimento que existiu entre ambos.


E para provar a minha teoria, se Robert de Niro é um homem muito homem, Sharon Stone, por diversas vezes, também já deu provas mais do que suficientes de que é uma mulher muito mulher: quando representa e ousa como gente grande, quando tem um avc e recupera e se lança para uma nova vida, quando se apresenta de cara lavada mostrando as rugas, a pele macilenta e a perda de viço que as pessoas não esperariam ver numa femme fatale e, mais recentemente, quando se mostra, enervada, revoltada e, de certo modo, poderosa, falando do caso da sua família devastada e ameaçada pela covid, apelando a um voto que não num assassino.

quinta-feira, setembro 24, 2020

Sobre a pulhice que a Joana Mortágua fez à Inês de Medeiros a propósito da maravilhosa vista dos bairros sociais de Almada.
E, ainda. o que dizem as velhas aos jovens que aos trinta e tal anos se portam como se tivessem mais de noventa

 


Ontem à noite a minha filha enviou-me o vídeo no qual a Inês de Medeiros gabava a boa vista dos bairros sociais de Almada. Não percebi porque mo mandava. Sem se pronunciar sobre o que ali estava, limitou-se a dizer que as redes sociais não falavam de outra coisa. Respondi que não conseguia formar ideia sobre 29" descontextualizados. E não liguei patavina.

Para meu espanto, hoje não se falava noutra coisa, até a televisão para lá foi, meio mundo a querer armar a barraca sobre tal solo. 

Li que foi a Joana Mortágua que o divulgou. E isso, do que li e ouvi, foi a única coisa que me pareceu mal. A deslealdade, a coscuvilhice, o mau carácter que a mana Mortágua aqui revela é que me parece repelente. Que mal tem dizer a verdade? É verdade que os bairros sociais de Almada, nomeadamente aqueles a que Inês se refere, têm uma vista espectacular. Porque não o poderia dizer? 

Algumas vezes já eu própria o referi: sorte a das pessoas que aqui vivem, a de terem uma vista destas. Claro que quem ali mora terá uma vida difícil, claro que as suas casas não são palácios. Em Almada nem em qualquer outro lugar do mundo. Mas têm uma vista extraordinária. É a mais pura das verdades. Acresce que, segundo leio, Inês de Medeiros, na intervenção da qual a intriguista mana Mortágua extraíu os 29" com os quais pretendeu apunhalar Inês de Medeiros pelas costas, garantiu que no concelho da Margem Sul não existe “um sistema de guetização”, estando o Executivo focado em lançar uma política “em sentido contrário”, com mistura de diferentes grupos sociais. Mas isso a menina Mortágua já não disse. Claro que não. Se tivesse divulgado o teor do que Inês de Medeiros defendeu, estragava o efeito da bomba que pretendeu largar. 

E o que tem a aprovação de um hotel em Porto Brandão a ver com aquilo? Sonsa, esta mana Mortágua, sonsa e enviesada, escalena. Tantas vezes eu também lamentei que lugares que são dos mais lindos do mundo não fossem de conhecimento alargado, não fossem divulgados, não fossem aproveitados para um turismo de qualidade. Quantas vezes andei ali pelo meio a fotografar aqueles navios abandonados, aquela vista fabulosa. Muito inteligente o ter-se aprovado a construção de um hotel de qualidade em Porto Brandão.

Estas  pretensas moralistas, estas intriguistas que se alimentam disto, revelam a toda a hora aquilo de que são capazes. Dantes, quando eu assistia a gestos destes, sentia o desprezo que ainda hoje sinto mas acreditava que, tal como eu, toda a gente as iria também desprezar pois, julgava eu, aquela velha máxima de que Roma não paga a traidores prevaleceria. Mas hoje já não fico tão tranquila pois o que constato é que as vilezas de que as meninas do BE são capazes colhem mais do que as ortodoxias do PCP. Se a nível legislativo não me apanham a votar nem num nem noutro, a verdade é que o PCP, sendo gente frequentemente facciosa e pouco aberta à mudança, é, na maioria, gente séria, leal, gente de carácter, gente de quem se pode dizer que what you see is what you get.

E sobre a sacanice da Joana Mortágua não digo mais nada, não me apetece. Sempre que estou perante gente que se põe em bicos de pés para exibir a sua veia populista, só me apetece virar-lhes costas, ignorá-las, votá-las ao mais absoluto desprezo, deixando-os a falar sozinhos.

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E passo a um outro tema que, se calhar, não tem nada a ver. Se calhar.

Pasmo muitas vezes com o conservadorismo de alguma gente nova. Tentando apresentar-se como moderninhas, causas fracturantes e o escambau, meninas muito avant garde, mostram muitas vezes que têm ideias quadradonas, que concebem estruturas de vida que não estão com nada, meninas que não têm noção do ridículo em que caem quando se armam em vizinhas e preparam insidiosas armadilhas a quem, de frente, fala sem premeditação. Meninas que se acham sábias, sabichonas, que gostam de dar lições. Não suporto. Cresceram velhas e o pior é que são mais velhas, mais descarnadas e cerebralmente mais esvaziadas do que muita velha carregada de anos biológicos mas com uma jovial leveza na alma e a cabecinha carregada de neurónios a bombar.

Olhem bem o conselho das Avós da Razão a uma jovem de 33 anos

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E um dia feliz para si

quarta-feira, setembro 23, 2020

Cá por casa

 



Não me falta o espaço. Essa desculpa já não poderei invocar. 

Tenho este em que agora estou e posso ter ainda mais um ou dois espaços. No jardim, por exemplo, sob o alpendre. Tenho trabalhado lá. Não sei se funcionaria bem como covil de escrita mas talvez. Ou no sótão. 

Aquele espaço que antes, quando aqui vim pela primeira vez, me parecia o espaço ideal, agora não me atrai, acho que é sóbrio demais para mim. É que, mal cá vim já na qualidade de proprietária, com mais vagar e atenção, comecei a achar que o espaço estava a calhar era para o meu marido, com estantes à sua volta para os livros que apenas ele lê (história, história política e/ou económica, coisas nessa base). Contudo, embora já lá tenha as outras suas coisas, usar aquele recanto, usar mesmo, ainda não começou verdadeiramente a fazê-lo. Como aquilo ali é, digamos assim, o escritório privativo do quarto e ele madruga -- enquanto eu sou noctívaga --, quando ele quer começar a fazer alguma coisa, ainda eu estou a dormir. Ainda esta manhã vi que eram seis horas e já não dei por ele, provavelmente já tinha ido fazer a sua caminhada matinal. Horas loucas, as dele.

Mas a verdade é que, sobretudo, ainda estamos a ajustar-nos à casa. 

Agora, neste preciso momento, estou numa secretária minúscula na salinha dos de língua portuguesa, salinha que, para além dos vinte e quatro metros lineares de prateleiras para acomodar prosa e poesia (algumas das quais pertencentes àquelas estantes que tanto me desiludiram e das quais, afinal, agora até gosto), tem ainda, devidamente resguardados de olhares alheios, os meus colares, anéis, brincos, écharpes, carteiras e outros bens de primeira necessidade. A room of my own.

Estou aqui hoje sentada pela primeira vez.  Um dos meninos já aqui teve aulas e gostou. Mas, para mim, é uma première.  Ainda não me pronuncio, tenho que sentir o lugar. No entanto, para testar a qualidade do ambiente, já aqui tenho uma caneca de um quente e saboroso chá rubro (proveniente da caixa dos tesouros que a minha filha me deu pelo Natal), estou a ouvir o canto dos pássaros e, pela janela, vejo trepadeiras, arbustos, flores, árvores. 

Qualquer dos três lugares possíveis cumpre o que me sempre me pareceu essencial: sossego, harmonia. Qualquer deles tem ainda, junto ao poiso em que escrevo, um lugar para me reclinar caso me apeteça ler ou descansar, neste caso uma chaise-longue sob a janela.

Mas subsistem ainda alguns pontos em aberto. Por exemplo, tenho ainda uma dúvida: não sei se deverei estar como estou agora, em silêncio, ou se faria sentido ter música. A nossa aparelhagem é uma das coisas que ainda não veio. É grande, analógica e material: tem um gira discos, um leitor de cassetes, um amplificador, um leitor de cd's, tem colunas separadas. Os nossos LP's e cd's estão encaixotados mas também ainda não vieram. Talvez possamos depois pôr tudo isso no sótão que está decorado como uma sala ampla e multi-funcional, bem agradável. Mas o que imagino para mim, enquanto desse curso à inspiração, seria uma coluninha pequena que contivesse rádio, para poder ouvir a antena 2, mas também outras coisas. Mas uma coluninha não dá para os cds. Aliás nem já o computador dá para cd's. Tudo tende para a desmaterialização.

Isso significa que estamos cada vez mais dependentes de tecnologia, de telecomunicações. Um dia não há rede, não há sinal, o computador avaria e lá ficamos no ar, sem poder fazer nada, totalmente desprovidos de meios físicos para o que quer que seja. Não me agrada, isso. Não sou avessa à mudança mas a verdade é que a sociedade está percorrer este caminho na maior cegueira. Não faz sentido a humanidade estar dependente de coisas que não controla minimamente e relativamente às quais, não tarda, não tem qualquer alternativa. Mas adiante que não é hora nem tenho competência para filosofias. E, para mais, filosofar é capaz de ser bom mas, neste contexto, não me serve de consolo.

Mas, voltando à banda sonora para me acompanhar na escrita, ter que estar a descarregar músicas é coisa que não puxa por mim e para a qual não creio que tenha paciência. Nem é bem paciência, é mais o pensar que ficaria agarrada a obras escolhidas por mim, coisa demasiado limitada. Portanto, para já, se quiser ouvir alguma coisa, tenho o youtube que me vai dando a descobrir coisas que, de outra forma, jamais conheceria.

E, obviamente, isto que acabei de escrever não apenas é contraditório em relação ao que acima disse como revela bem como passivamente vamos aceitando que escolham por nós, como vamos assimilando a ideia de que tudo o que escolhemos, lemos e ouvimos fique registado algures (não sabemos em que condições e por quanto tempo), seja processado e reprocessado (sabe-se lá como e por quem), para daí se inferirem gostos e tendências (sabe-se lá para que fins), sendo-me depois dado a conhecer aquilo que, à partida, já se sabe que vai merecer o meu agrado. Isto tem tanto de fantástico quanto de assustador. E eu só não me atormento mais com esta perversidade porque tenho plena consciência de que estou cá de passagem pelo que o melhor é ir fechando os olhos a estas coisas para aproveitar o lado bom da vida -- natureza, arte, afectos e etc. -- e não viver o resto dos meus dias com a sensação de que um tsunami, do qual obviamente não conseguirei escapar, está a passar-me por cima.

Mas, nisto da escrita, há mais. 

Para que me entregue a sério a qualquer actividade, seja o que for, incluindo justamente escrever, tenho antes que me informar sobre as vias certas para chegar onde me parece que faz sentido chegar. Se pode parecer que tenho uma ideia meio frívola de colocar a questão, a verdade é que também tenho um lado operacional e de gestão que me impede de começar sem ter um plano para chegar ao meu objectivo. Talvez seja deformação profissional: não se investe sem antes se avaliar se vale a pena e se temos meios para lá chegar. Com isto, de escrever, estou na mesma. Sei onde está a parte da matéria prima, sei onde está parte da mão-de-obra mas, para se chegar ao produto vendável, há uma longa cadeia de produção cujo processo, na íntegra, desconheço. Portanto, ao estar aqui hoje não estou senão a ensaiar se o local seria adequado ao desenvolvimento da actividade mineira, extrair alguma coisa de dentro de mim. Chego sempre à mesma conclusão: como quando a gente quer ir para um mercado que desconhece, penso que, também neste caso, o melhor será arranjar quem me ajude. Um agente. Tenho pensado nisso, tenho que arranjar um agente. Mas como, se ainda não escrevi nada? Ou seja, encontro-me sem saber se quem nasce primeiro é o ovo ou a galinha. Dilemas sobre dilemas.

Mas tenho também que ter tempo. Não consigo entregar-me ao que quer que seja sem ser na íntegra. Não posso escrever um bocadinho, depois despachar uns temas, atender umas chamadas, depois mais meia dúzia de linhas, dois mails, uma linha, três team meetings, dois parágrafos. Não dá. 

Mas dá para ir ensaiando, sonhando, divagando. Isto. Conversas soltas, coisas de nada.


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terça-feira, setembro 22, 2020

O apelo de mulheres menos belas e não tão jovens

 


Apesar de possuir um apurado sentido estético e de ter preferido desde sempre as raparigas muito jovens com o seu encanto primaveril, não deixava também de reagir perante o apelo de mulheres menos belas e não tão jovens. Durante os bailes sucedia por vezes deixar-se prender por uma qualquer rapariga desanimada e sem frescura, que ninguém desejava e o conquistava pela via da compaixão, e não só da compaixão, mas devido também à sua eterna curiosidade. 
A partir do momento em que se dedicava a uma mulher -- fosse por semanas ou apenas por horas --, ela tornava-se bela aos seus olhos e a sua entrega era completa. A experiência ensinara-lhe que todas as mulheres eram belas e capazes de dar prazer, e que mesmo a de aparência insignificante, desprezada pelos outros homens, podia revelar um ardor e uma entrega inauditos, e que mesmo aquela que perdera já o viço da juventude era capaz de derramar uma doce ternura melancólica e mais que maternal; no fundo, todas possuíam um segredo e um encanto cujo desvendar o fascinava.

Nesse aspecto eram todas elas semelhantes: havia sempre um gesto especial capaz de compensar qualquer falta de juventude ou beleza, embora nem todas o prendessem durante o mesmo tempo. A menos bela não lhe inspirava menos amor e gratidão do que a mais jovem e graciosa, a sua entrega era sempre total. 


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Excerto de Narciso e Goldmund, Hermann Hesse; Bodyscapes de Carl Warner;  F Major de Hania Rani

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Porque é que o esquilo congelou?


Gostava muito de que por aqui me aparecesse um esquilinho. Acho-os das coisas mais fofas do mundo. São super expressivos, super fotogénicos, super amorosos. 

Leio que o vídeo abaixo está a tornar-se viral e já li explicações sobre o que leva o esquilinho a ficar imóvel, absorto. Pode ter acontecido que tenha ouvido algum som, inacessível ao ouvido humano e tenha ficado atento, tentando perceber o que se passa. Mas também pode ter-lhe ocorrido alguma ideia ou batido alguma súbita saudade.

Seja como for, é uma ternura.


segunda-feira, setembro 21, 2020

Uma mulher poderosa encanta-me no dobrar de mais um dia em que tentei (mas não consegui) esfolar um rabo que está pendente e que não se compadece com as minhas beautiful flowers

 




Tenho cada vez mais para mim que se todos nós, colectivamente, fizermos um esforço para não perdermos tempo com tretas como as lágrimas do populista-achegado ou com outros pseudo-eventos ou com outras pseudo-pessoas-importantes mais depressa essa gentinha perderia protagonismo e melhor saúde mental todos teríamos. 

Cheguei aqui, agora, e todas as notícias internas me parecem treta. Pura treta. Não estou nem aí.

Mas, reconheço, também pode ser porque dias como o de hoje me deixam a deitar por fora.


Apesar de não ser nada de novo ou interessante, conto porque é que o meu dia me foi tão sobrecarregado: as idas à outra casa (eu para separar roupas para dar, outras para o lixo, outras para trazer, o meu marido com selecção de papeladas, projectos de arquitectura transactos, dossiers e dossiers de trabalhos em versões anteriores à definitiva, coisas assim) esgotam-me. Horas. Sacos e sacos e sacos. O meu marido também exausto. Tudo o que é trabalho pesado sobra para ele: carrega com sacalhões pesadíssimos, uns para os contentores da rua, outros para o carro. 

Mas, enfim, pelo menos já trouxe os meus casacos de malha, os meus blasers, as minhas calças. É que a prioridade tinham sido louças, coisas de cozinha, livros, bibelots, candeeiros, móveis essenciais. De roupa tinha trazido sobretudo a de verão, que era o que fazia falta. Mas o outono já aí está e eu já andava sem saber bem o que vestir. Mesmo aqui em casa, quando anoitece e esfria, eu olhava para o guarda-roupa sem saber bem a que deitar mão. E esta semana tenho compromissos presenciais que me exigem que as minhas toilettes anteriores saiam à cena. 

E depois há alguns fatos completos de que, embora já me estejam à justa, não quero desistir assim tão facilmente. Aquele elegantésimo e superlativo fato Armani que foi presente do meu marido, que conseguiu acertar com o meu tamanho e que, ousando à grande, sem que eu tivesse minimamente suspeitado de tal ousadia, conseguiu que me assentasse como uma luva -- esse tive que trazer, claro. Ou aqueloutro que comprei em Madrid depois de ter percorrido os costureiros da Serrano e de me ter posto nas mãos de uma bicha fantastique que adivinhava todos os meus gostos -- que conjunto mais lindo, aquele - quando fui a um casamento de sonho em Seteais, esse também teve que vir. Peças assim, intemporais. Não gosto de coisas tchanan...!, gaiteiras, espaventosas, datadas. Prefiro peças que não passam de moda. Ou seja, dessas, apesar de já me caberem à justa, não ia desfazer-me. E quem sabe, um dia destes, alguma das meninas da família não precisa de alguma destas fatiotas para uma ocasião especial?

No fim, quando já não aguentávamos mais -- cansados, desidratados, saturados -- e enquanto o meu marido andava abaixo e acima, ainda varri, passei com a esfregona, garanti que as casas de banho estavam impecáveis, que as luzes estavam apagadas. Fechei a porta e vim. Aquela casa, que era a minha casa de sonho até há pouco tempo, agora já pouco me diz. Quando viro as costas e fecho a porta, o que fica para trás é passado. Apesar de gostar de visitar as minhas memórias, a verdade é que parece que sou toda feita de futuro.

Como já era tarde, encomendámos uma pizza e, a caminho da casa nova, fomos buscá-la, a pizzaria já a fechar. 

Depois foi aquela frustração: o hall e o corredor da casa nova uma vez mais atafulhados de sacos, mais coisas para arrumar, eu já sem saber como distribuir as coisas. Na cozinha, algumas peças sem caberem onde faria mais sentido e, claro, a impaciência a ir ganhando terreno. Cansaço e fome à mistura é do pior que há.

Enquanto a pizza foi apanhar um aperto no forno, nós fomos tomar banho. E, com isto tudo, acabámos a almoçar às cinco da tarde. 

Não vejo a hora de esvaziar os armários todos, de trazer tudo e deixar a outra casa finalmente vazia para poder usufruir de tempos livres sem ter a necessidade de os anular, sempre a tratar de tudo o que há sempre para tratar. Até porque, quando for vendida, não pode lá ficar nada. O meu filho que, quando saíu de casa, não tece paciência para levar nada nem escolher o que era de guardar ou deitar fora, continua sem paciência para se atirar a isso. Dossiers da faculdade, livros, coisas de computador, sei lá o que para lá ainda há. Hoje, ao abrir gavetas do quarto da minha filha, dei com roupa interior dela. Não a deitou fora e eu não gosto de deitar fora coisas que não são minhas. Hoje aproveitei algumas peças. O resto, que estava ainda em bom estado, pus num saco também para dar. 

Na verdade a casa parece quase vazia mas, na verdade também, ainda com coisas que não acabam.

Bem.

Ah, e fiz o jantar em dose XL para dar para o almoço também de amanhã. 

E, finalmente, quando o sol estava de fugida, ainda fui para a espreguiçadeira ler mais um pouco. Uma bênção. Uma meia hora de descanso e bem-aventurança. 

Depois fiz telefonemas enquanto passeava para trás e para a frente no jardim, fotografando as flores que me trazem apaixonada. Tão lindas, tão perfeitas. Divindades silenciosas.

Mas tudo o que é bom não pode ser em grandes doses pelo que, de seguida, tive que entrar em casa para passar a ferro e sei lá mais o quê.

Portanto, como é óbvio, com este programa de festas, não quero cá saber de minudências e banalidades. E, assim sendo, para aqui tenho estado a ouvir música. Música poderosa, intérpretes poderosos. Em especial uma mulher poderosa. Poderosa em todos os sentidos. A destemida Yuja Wang mostra como se atira a tudo com uma energia que contagia. Mulheres poderosas e, ainda por elegantes e femininas, são uma graça. E um perigo.


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E nada mais a declarar. 

Quando voltei ao jardim já a noite vinha descendo. Lá em cima, entre o piar discreto das aves nocturnas, uma nesga de lua. Fotografei-a. Ainda não tinha reparado na lua desde que aqui vivo. Gostei. É uma boa companhia, boa como todas as companhias que são cheias de subtilezas.


Desejo-vos uma boa semana, com muitos momentos bons, com boas notícias. 
E que a saúde e a boa sorte vos acompanhem.