Não sou dada a escalas ou a pódios. Não digo isto para me enaltecer mas para reconhecer uma limitação.
Quais os melhores momentos da minha vida? Quais os melhores livros? Os melhores filmes? As melhores cenas? As pessoas mais excepcionais? As mais estúpidas?
Não sei responder. Posso, quase ao calhas, por ordem aleatória, dizer alguns ou algumas de cada 'categoria' mas não seria capaz de os elencar por uma determinada ordem ou de escolher o melhor ou o pior.
Por exemplo, se começo a pensar em pessoas estúpidas, ocorrem-me logo umas quantas mas se escolho duas ou três, logo me ocorrem outras tantas. E, se tento destacar uma, logo me ocorre que nem é apenas ser estúpida, é que soma à estupidez outras características igualmente pouco abonatórias. E depois fico sem saber se não é dar importância demais a um qualquer zé-cueca pô-lo um lugar de destaque mesmo que seja o destaque do zé-cueca mais zé-cueca. Depois penso que, mesmo que o destaque seja um destaque negativo, em casos assim o zé-cueca mais zé-cueca deveria era ser votado à mais completa irrelevância e não a um lugar num pódio. E, assim, enleada nessas dúvidas metodológicas, acabo por perder o élan.
Igualmente, se penso nos grandes filmes, logo me ocorrem uma meia dúzia. E, se tento pensar melhor, logo me aparecem mais dois ou três. Tantos. Tento reformular e, às tantas, já estou é a pensar que deveria dividir a categoria em sub-categorias. Aperfeiçoar a escala, especializá-la. E isto para tudo.
Desisto, portanto. É escusado. Daqui nunca há-de sair uma lista de preferências ou rejeições devidamente hierarquizada. Sou manifestamente incapaz.
Mas gosto de ver as listas alheias. Penso sempre que é gente organizada, boa de ideias, com a informação devidamente arquivada e catalogada na cabeça. Já me ocorreu que um dia que me dê para isso ainda me hei-de pôr a organizar um ficheiro com coisas assim. Talvez um excel. Cada folha, sua categoria. Livros. Talvez dividido em prosa e poesia. Não, mais subdividido. Assim, de vez em quando, ia rever, ajuizar sobre se a lista ainda se mantinha actualizada, ia juntar ou retirar alguns items. Mas, se penso isto, penso também logo que só se chegar a um ponto em que não tenha nada de melhor para fazer.
Hoje uma pessoa contou-me uma coisa que me fez um bocado de impressão: uma pessoa que estava ali, perto de nós, tinha, durante anos, feito uma colecção. Acabou por ser uma colecção fabulosa. Completa, exaustiva, sem falhas. Agora já não sabe onde colocá-la tal a dimensão que atingiu. Sempre pensou que um dia a doaria à prestigiada instituição à qual tinha pertencido. E agora chegou à triste conclusão que a instituição não está interessada nem, sequer, tem espaço. E ele, que procurou incansavelmente construir uma colecção perfeita, que investiu tempo, dinheiro e trabalho nisso, agora percebe que foi tudo em vão. Ao ouvir isto, senti aquilo a que talvez se possa chamar tristeza alheia.
Todo o esforço com que nos entregamos a coisas que achamos importantes pode ser inútil. Claro que isto decorre também de, tantas vezes, nos esquecermos de que somos efémeros. Ou então nem é bem isso, pode ser o oposto, se calhar, sabendo que somos efémeros, queremos perpetuar a nossa passagem por esta vida, deixando alguma coisa para quem cá ficar. Mas os outros vão estar-se nas tintas. E, às tantas, o que era tão importante e uma extensão de nós, vira tralha, mono, coisa a que ninguém sabe o que fazer, lixo que nem se sabe onde pôr.
Passou-se ainda outra coisa que me deixou a pensar. Mostraram-nos, com orgulho, uma coisa tão perfeita, tão complexa, tão à prova de tudo que o meu filho, já só entre nós, comentou: é uma coisa tão perfeita que pode transformar-se num grande problema. E eu concordei. E fiquei a pensar: porque é que as pessoas se dedicam assim em busca da perfeição? Será que acreditam que a perfeição absoluta existe? Que é melhor uma coisa imaculadamente perfeita do que uma coisa banalmente imperfeita? Não creio.
A vida está cheia de nós, de alçapões, de labirintos. Ultrapassá-los já será bom. Saber encontrar a beleza que há nos intervalos ainda melhor será. Mais do que isso já será querer demais.
A vida está cheia de nós, de alçapões, de labirintos. Ultrapassá-los já será bom. Saber encontrar a beleza que há nos intervalos ainda melhor será. Mais do que isso já será querer demais.
E a todos desejo um belo dia de domingo
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