segunda-feira, junho 01, 2020

A decoração da casa dos pobrezinhos que é capaz de ser o menor dos males nisto do corona.
E a bela casa de Nina Campbell (que nada tem a ver com o assunto).





Isto dos signos é coisa estúpida, sem qualquer explicação científica que lhe valha. Vai contra tudo aquilo em que acredito: não assenta em nada que consiga explicar-se, não faz sentido sob qualquer perspectiva. E, no entanto, ao que parece, estatisticamente as pessoas revêem-se nas descrições e nas previsões. Pelo menos foi o que li num livro escrito por matemáticos que se dedicaram ao estudo do fenómeno. 

No meu signo diz que sou dada a tudo o que na realidade sou. E uma dessas coisas é a casa. Sou muito dada à minha casa. Sou muito sensível a casas.

Se há coisa que me faz muita impressão é estar numa casa que me parece escura, triste, sem alma, imprópria para acolher pessoas. Se entro numa casa assim, não consigo abstrair-me do que eu faria se pudesse. As pessoas falam comigo e eu com elas e, em background, estou a pensar: este conjunto de móveis escuros, sofás escuros e quadros pendurados junto ao tecto é mais do que suficiente para quem aqui vive sofra de depressão profunda. Ou olho para uma casa toda neutra, incolor, desprovida de graça e penso: eu punha aqui umas almofadas em turquesa e, naquela mesa de apoio, uma jarra em azul profundo com uma flor única, alta, em bordeaux indecente. E um espelho naquela parede a reflectir a luz da rua. Mas não digo nada, não quero perturbar a inércia e a propriedade de quem lá vive.

Mas porque sou assim, dada a decorações e a intuições, ainda mais me custa saber as condições dos que vivem quase sem dinheiro para comer quanto mais para frescuras. Casas pobres, precárias, quartos tristes e alugados, camaratas em que apenas interessa que o corpo possa descansar, ou a pobreza humilde que disfarça as dificuldades ou a pobreza remediada que vê o facebook e o instagram e gostava de ser e ter igual mas o que sobra mal dá para um verniz, uma blusinha. 

Dizer isto é mera conversa e mesmo que, por dentro eu sinta que não é mera conversa a verdade é que, de facto, é mera conversa. Conversa que não produz efeito é conversa deitada fora, ociosa, fútil.

Falo de barriga cheia.

E não vale a pena armar-me em irmãzinha da caridade que, em vez de orações, distribui bibelots e conselhos de decoração. Mas o facto de nada disto, na verdade, não fazer sentido não anula o facto de que  a verdade é que, quando ouço nos novos focos de contágio, penso nas condições em que vivem aquelas pobres pessoas. Muitos são imigrantes, muitos são simplesmente pobres. E ser pobre deve ser tudo menos simples. Portanto, dizer que alguém é simplesmente pobre é uma coisa que é simplesmente estúpida.

E eu só espero -- e nada mais posso fazer do que esperar -- é que os muitos milhões que virão dos apoios para recuperar a economia sirvam para trazer um pouco mais de dignidade às pessoas mais pobres, às que vivem amontosadas, às invisíveis que mantêm o mundo a funcionar quando os outros se recolhem para se proteger de contágios, às que não conseguem constituir família ou, se o conseguem, mal conseguem acompanhar o seu desenvolvimento, quanto mais pensar na decoração da sua casa.

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O meu domingo foi descansado, tirando a parte de ir ao supermercado e à loja das ferramentas. O dia esteve cinzento mas bom. Há bocado, estava a ver umas coisas do trabalho, depois a ler blogs, e, por fim, fui ver o Youtube. Apareceu-me um vídeo e gostei muito de vê-lo. Gosto muito da casa que aqui se mostra. Podia ser a minha casa. Gosto da Nina Campbell. Se a conhecesse o mais certo era dar-me bem com ela.


E, no entanto, é nas pessoas dos bairros da periferia que agora merecem a preocupação de quem se ocupa das coisas da saúde pública que eu penso enquanto vejo o vídeo. No sábado, quando estava a vir de casa da minha mãe, passámos por uma carrinha, daquelas de muitos lugares (oito? nove? mais?). Era branca e ia cheia de homens jovens, quase todos negros. Iam apertados nos seus lugares. Todos sem máscara. Era sábado à tarde, deviam vir do trabalho. O mundo é um lugar perigoso para o ser humano, em especial para alguns seres humanos.



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As cores e as fleurs que aqui apareceram não são du mal, são do bem. Pretendem trazer alguma luz a um tema que me ensombra o coração. Pintou-as Monet.

Chet Baker canta Almost Blue.

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Uma boa semana para todos

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