segunda-feira, abril 06, 2020

Olhem, meninos, amanhã a mãe e o pai estão a pensar fazer uma pizza ou um pão naan


No outro dia, em casa do meu filho, fizeram pizza. São ambos aventureiros e a culinária para eles é um bom território para descobertas. Antes, os meninos já tinham anunciado: hoje vamos fazer pizza. Estavam todos entusiasmados. Depois enviaram uma fotografia. 

E nós, gulosos frustrados,  ficámos, aqui, a olhar para aquela saborosa imagem e a lembrarmo-nos de quando, naquela outra e distante vida, mandávamos vir uma pizza e de como ela, ao chegar, trazia consigo um cheirinho bom a pãozinho feito em forno de lenha, um cheirinho a quentinho, a coisinha apetitosa.  E logo a casa se alegrava para receber tão gostosos sabores. Lembro-me daquela com alcachofras e presunto, ou, então, a outra com queijo de cabra, mel e nozes; ou, outra também boa, com mozzarela, salmão fumado, sumo de limão e folha de manjericão. Tão booooas. O que eu gostava daquelas pizzas com base estaladiça, saborzinho a coisa boa. Ou o pão naan, tão bom, só com queijo ou, então, com queijo e alho. A última vez que comemos essas delícias não nos apercebemos que nem tão cedo a elas voltaríamos. 

Que saudades.

Depois de vermos a fotografia da pizza caseira e ao imaginarmos o quanto eles, os cinco, devem ter-se deliciado com ela -- aliás, conhecendo-lhes o farto apetite, presumo que deve ter sido mais que uma -- olhámos um para o outro e, à uma, dissemos: 'e se também fizéssemos?'.

Há bocado, ele pediu que eu visse como se faz e eu disse que visse ele. Sempre a mesma coisa.

Insistiu. 

Acabei por espreitar. Não me parece que seja coisa para mim. Sugeri-lhe que fizesse ele a massa pois acho que é preciso sová-la e não me vejo ao soco com uma bola de farinha. 

A verdade é que nem sei se vamos ter tempo ou se vamos ter paciência. Ou se, entusiasmados com a perspectiva de uma bela pizzoca ou de um belo panito naan, não acabamos por arranjar tempo e paciência e vamos os dois para a cozinha, em equipa, tratar do assunto. Claro que eu preferia que ele tratasse da massa que a mim o que me atrai mais é sempre a parte criativa: por exemplo, queijo, espinafres, noz, orégãos, frango desfiado, um leve fio de azeite, um subtil toque de mel. Ou o pão naan com fio de azeite, um pouco de queijo, um pouco de alho, um pouco de alecrim. E depois, nham-nham, bora lá a ver se ficou bom e dá aí um golinho de cerveja fresquinha. Inha, inha.

A minha filha agora, que nem de propósito, acaba de enviar para a família duas receitas de bolos cremosos, daqueles ditos de caneca, para fazer no microondas. Até me lambi, ainda que, apenas, mentalmente. Ou, na volta, lambi-me mesmo na realidade. Sei lá. Bolos mais bons. Só de ver a fotografia já fico aguada. Mostrei ao meu marido e ficou a olhar para mim, penso que à espera de um sinal. Quis perceber se os vou fazer. Talvez. Ando carente de um docinho. Hoje, a meio da tarde, deu-me a fome e fiquei com vontade de uma guloseima. Então, numa colher de sobremesa, coloquei um pouco de mel e três miolos de amêndoa. Ah que bem que me soube.

Tirando isso, estou preocupada é com uma coisa. Naquela longínqua sexta-feira à noite em que resolvemos fazer a trouxa e desandar para o campo, não pensámos bem no que nos esperava. Pela parte que me toca, peguei em meia dúzia de trapos, nuns quantos livros, na máquina fotográfica, numa quanta comida, não muita, e, depois, já prestes a sair, voltei atrás, a correr, buscar o saquinho de gengibre cristalizado. Sem isso é que não. Uma pessoa mune-se para a guerra com a contenção que o momento exige -- que isto do corona tem que ser na base da guerra mesmo, espadeirada na cabeça do merdinhas até que recolha os totós e definhe como uma batata velha -- mas, noblesse oblige, que o gengibre cristalizado não me falte. Ora essa. Jamais (e, se não se importam, digam jamé). Na frente de batalha, na trincheira ou na preparação da moral das tropas, seja onde for, a guerra será sem quartel mas, sempre, sempre, sempre, com um cubo de gengibre cristalizado para apimentar e adoçar a minha existência.

Tenho andado a racionar, claro. De novo: não racionalizar mas, mesmo, racionar. Uma dor de alma ver aquele pedaço de paraíso a escoar-se. De cada vez que como um quadradinho de chocolate preto, pego num cubinho de gengibre e delicio-me com a mélange. Hoje comi o penúltimo. E, agora que tenho ali o último, estou sem saber como vou conseguir habituar-me a viver sem esse bijou, sem esse mimo, sem esse suspiro de prazer.

Enfim. Pode ser que consiga ir ao supermercado e quem sabe não sou bafejada com esse petit beaucoup de sorte. 
[Ah, que bom que é uma pessoa gostar destas pequenas coisas].

Bem. Voltando à cold cow. A pizza ou o naan.

Caso nos atiremos à faena, estou a pensar pôr a máquina a filmar. É que pode muito bem acontecer que a coisa descambe para um bailado tão harmonioso como este aqui abaixo que, obviamente, tem mão e pezinho de Alexander Ekman.

E, tirando isto, bon apetit também para vocês.


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Acham que faz sentido, neste contexto, desejar-vos uma boa semana?
Eu acho que faz. 
Se para vocês também fizer, pois que os meus votos sejam bem sucedidos.

2 comentários:

  1. Olá UJM
    Obrigada por partilhar as suas reflexões que mt me agradam e que vou seguindo com maior ou menor regularidade conforme o tempo que tenho disponível. Leio - a sempre com todo o interesse, talvez porque me revejo em mt do que diz apesar de eu ser um pouco mais velha. Sabe, também eu tenho muitas saudades dos meus meninos, dos filhos e dos netos ( cinco rapazes e três meninas) , como eu a entendo!
    Um grande abraço e uma boa semana tb para si. M.H.

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  2. Olá M.H.,

    Oito?! Quando se juntam todos em sua casa deve ser uma invasão a valer, não? E preparar um almoço para a 'malta' toda, imagino bem, com cada panelão de comida, certo...?

    Mas é tão bom, não é?

    E que saudades que a gente sente, não é? Os telefonemas, as fotografias, os telefonemas-vídeos, os skypes, tudo ajuda. Mas a falta que fazem os abracinhos e os beijinhos, não é?

    Mas as coisas são o que são. Não vale a pena carpir. O que vale a pena é fazermos tudo para sairmos desta com saúde, todos bons da cabeça..., todos bem preparados paar enfrentar o que possa vir por aí.

    Abraço, M.H., e muito obrigada pelas suas palavras tão simpáticas.

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