Não são horas de começar um post. Daqui a nada são duas da manhã. Presumo que grande parte das pessoas que habitualmente aqui vem espreitar a esta hora steja a dormir. Por vezes tenho uma certa pena de não conseguir seguir horários mais consentâneos com o ritmo da maior parte das pessoas.
Para além de ter estado com a família, estivemos no campo, caminhei por entre as árvores, li muito, fomos às compras para a casa. Tudo coisas normais e simples.
No campo, voltei a ficar espantada com os cogumelos que voltaram a aparecer. Tantos, tão bonitos, tão diferentes. Encanto-me, já o disse mil vezes. Parecem-me milagres mas ainda mais milagrosos por haver tantos, todos tão perfeitos e improváveis. Como saem, espontaneamente, da terra estas pequenas obras de arte? Não consigo perceber.
Comecei a ler os dois livros que comprei ontem. Leio um bocado de um, depois do outro, volto ao primeiro, volto ao segundo.
Então, vendo o tempo do muito tempo ainda longínquo, mesmo involuntariamente dou por mim a querer rentabilizá-lo ao máximo.
Não sei porque o faço. A minha vida e o ritmo da cidade criam em mim um certo sentimento de urgência, uma vontade talvez absurda de fazer várias coisas ao mesmo tempo, não vá não ter tempo para cada uma individualmente.
Li que a idade da reforma aumentou mais um mês e isso é uma ideia que me incomoda. No outro dia, estava a falar com a minha mãe que, até há uns anos, os meus colegas mais velhos aproveitavam a vontade que as empresas sempre têm de renovação e aceitavam ir-se embora mais cedo. Ali pelos sessenta e dois anos, levavam uma indemnização, iam para o desemprego e pouco depois estavam reformados. E antes dos sessenta e dois anos já eles andavam a fazer contas ao tempo que faltava, desejando ir para casa. E eu, depois de ter posto de parte a ideia de um dia ainda ser presidente de uma câmara, sempre pensei que faria como eles. Agora tudo se complicou. As empresas têm, na mesma, vontade de renovar o seu quadro de efectivos mas a idade da reforma é um alvo em movimento e tudo se complica.
Então, vendo o tempo do muito tempo ainda longínquo, mesmo involuntariamente dou por mim a querer rentabilizá-lo ao máximo.
Talvez por isso, agora à noite, enquanto na televisão passava aquilo dos Casais à Primeira Vista,
uma coisa inenarrável em que não dá para perceber se os 'especialistas' são nabos todos os dias, não acertando uma ou se o objectivo é mesmo o de juntar gente que se odeia
estive a ler, a pesquisar umas coisas que andam a interessar-me e, como se não fossem horas de estar a dormir, fui esticando o tempo até chegar até aqui.
De vez em quando sinto um certo cansaço também nisto. Não é que esteja a cansar-me de escrever -- porque isso se mantém intacto e cada vez com mais vontade de ter mesmo tempo para me entregar ao que escrevo -- mas é alguma frustração por, algumas vezes, por inabilidade, por desatenção ou saturação acumulada, o que escrevo transmitir ideias contrárias às que são as minhas. Posso, por exemplo, sem querer, magoar alguém.
No dia a dia, sou naturalmente irónica. Mas, obviamente, a ironia funciona bem se for acompanhada de um sorriso ou de uma expressão facial ou corporal que demonstre que há uma discrepância entre o que se diz e o que se pensa. Na escrita, falta esse descodificador. Para ajudar, pode pôr-se um smile ou um piscar de olhos. Mas, não o pondo -- e eu embirro um bocado com emojis no meio dos textos --, tem quem lê que adivinhar que quem escreve, quer dizer outra coisa que não a que escreve,
No dia a dia, sou naturalmente irónica. Mas, obviamente, a ironia funciona bem se for acompanhada de um sorriso ou de uma expressão facial ou corporal que demonstre que há uma discrepância entre o que se diz e o que se pensa. Na escrita, falta esse descodificador. Para ajudar, pode pôr-se um smile ou um piscar de olhos. Mas, não o pondo -- e eu embirro um bocado com emojis no meio dos textos --, tem quem lê que adivinhar que quem escreve, quer dizer outra coisa que não a que escreve,
Por exemplo, no outro dia, um colega disse-me que tinha tomado uma determinada decisão e que, aliás, não era apenas decisão dele, era colegial. Eu respondi-lhe: 'E foi certamente uma decisão bastante acertada'. Ele riu e disse: 'Está a querer dizer que foi uma decisão errada?'. Eu mantive: 'Não, estou a dizer que, se tomou essa decisão e se o colégio a ratificou, por definição é acertada'. Ele, que me conhece bem, disse: 'Como se eu não conhecesse essa sua ironia e não soubesse que não apenas discorda desta decisão como acha que tomamos frequentemente decisões erradas'. Mantive: 'Nada disso. Acho que as decisões que tomam são sempre exemplares'. Ele riu-se e eu também. Estávamos entendidos. Mas se ele não me conhecesse bem e se alguma expressão facial minha não denunciasse o contrário do que eu estava a dizer e ele ainda poderia pensar que eu estava a lisonjeá-lo.
Mas, escrevendo aqui, escrevendo para quem não me conhece, para quem não me vê, pessoas com experiências de vida ou personalidades muito diferentes da minha, como conseguir transmitir aquilo que, de facto, penso ou sinto? Não sei.
E depois há os temas: posso estar preocupada com um assunto mas não ter paciência para, à uma ou duas da manhã, me pôr a dissertar sobre ele e, pelo contrário, apenas me apetecer falar de frioleiras, disparatar, chutar para canto ou atalhar razões. Mas, quem me lê, não sabendo das minhas circunstâncias, se calhar vem à espera de consistência, de elevação, de tino e há dias em que, pelo contrário, só encontra desconcerto e parvoíce. E eu interrogo-me sobre se faz sentido, apenas porque gosto de escrever, escrever seja sobre o que for, mesmo que seja sobre coisa nenhuma, estar a causar estranheza em quem me lê?
Por isso, há dias em que penso que mais valia não escrever nada no blog e escrever apenas para mim.
Mas, depois, tal como hoje, deixo-me levar pela inércia e ponho de lado cuidados e indecisões e, uma vez mais, escrevo à vista de todos, a céu aberto, sujeitando-me a sentir em cima de mim vendavais, aguaceiros, trovoadas. O pior é que se há dias em que, quanto maior a tempestade melhor a mim me sabe, outros dias há, dias em que estou mais sensível ou cansada, não sei, em que me custa um bocado sentir a força dos elementos a fustigarem-me as mãos, a pele, o coração.
Enfim.
A verdade é que há alguma inclemência generalizada. Pela leitura dos blogs, por vezes surpreendo-me com a dureza das palavras que ali estão, muitas vezes ajustes de contas, ameaças veladas, juras de vingança. Dá ideia que há alguma revolta que se vai sedimentando e que, a todo o momento, está pronta a explodir. Quando leio palavras que denunciam um grande azedume penso que as pessoas se esquecem de quão transitória é a sua passagem por cá, que se esquecem da sua condição de animais efémeros. Não sei o que esperam para desperdiçar a sua vida dessa forma. Mas, enfim, também não estou certa de eu própria saber viver a vida da melhor forma. Provavelmente, com esta minha maneira de ser e sem a arte de saber transmiti-la da melhor forma, causo desagrado ou mágoa em quem me lê. E isso custa-me um bocado e é uma das razões que me levam a, por vezes, ter vontade de me deixar disto.
Mas, depois, tal como hoje, deixo-me levar pela inércia e ponho de lado cuidados e indecisões e, uma vez mais, escrevo à vista de todos, a céu aberto, sujeitando-me a sentir em cima de mim vendavais, aguaceiros, trovoadas. O pior é que se há dias em que, quanto maior a tempestade melhor a mim me sabe, outros dias há, dias em que estou mais sensível ou cansada, não sei, em que me custa um bocado sentir a força dos elementos a fustigarem-me as mãos, a pele, o coração.
Enfim.
A verdade é que há alguma inclemência generalizada. Pela leitura dos blogs, por vezes surpreendo-me com a dureza das palavras que ali estão, muitas vezes ajustes de contas, ameaças veladas, juras de vingança. Dá ideia que há alguma revolta que se vai sedimentando e que, a todo o momento, está pronta a explodir. Quando leio palavras que denunciam um grande azedume penso que as pessoas se esquecem de quão transitória é a sua passagem por cá, que se esquecem da sua condição de animais efémeros. Não sei o que esperam para desperdiçar a sua vida dessa forma. Mas, enfim, também não estou certa de eu própria saber viver a vida da melhor forma. Provavelmente, com esta minha maneira de ser e sem a arte de saber transmiti-la da melhor forma, causo desagrado ou mágoa em quem me lê. E isso custa-me um bocado e é uma das razões que me levam a, por vezes, ter vontade de me deixar disto.
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E é isto.
Espero que, ao menos, se salvem os cogumelos.
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E a todos desejo um belo dia de domingo.
Um belo domingo para si também, UJM.
ResponderEliminarEu gosto muito de a ler e nunca, nem por sombras, me magoou.
Acho que consegue transmitir a sua ironia no que escreve, eu deteto pelo menos alguma. :-)
Os cogumelos são lindos, também os acho milagrosos!
Gosto quando escreve sobre coisa nenhuma. Nem todos têm o engenho ou a arte para o fazer sem ser aborrecidamente banal ou caindo em generalidades pseudofilosóficas sobre a vida. E gosto quando escreve com ironia. É bem percetível quando o faz. Sobretudo para quem já a vem acompanhando há algum tempo.
ResponderEliminarSe uma pessoa tivesse de tirar um doutoramento para falar sobre qualquer assunto, então quase ninguém falaria sobre nada e os que falassem só falariam de um único tema. O horror! Mas às vezes, hélas, somos humanos!, claro que alguma palavra pode cair mal. Mesmo que bem intencionada. O pior insulto será talvez desconsiderar algo que tem importância para o outro - é também o insulto que mais facilmente cometemos sem nos apercebermos. O pior insulto não apaga, porém, a mais pequena das dádivas. E cada post seu, UJM, é uma dádiva que, por algum motivo que a impele a vir ter connosco todos os dias, recebemos sem nada ter de dar em troca. Por isso, continue por favor a escrever, UJM! A mim, em absoluta sinceridade, por uma vez que as suas palavras não me caíram bem, por motivos mais meus que seus, foram mais de mil as vezes em que tornaram o meu dia um pouco melhor. Mais frequentemente do que gostaria de admitir, foram a única coisa verdadeiramente boa que aconteceu no meu dia.
Um abraço,
JV
Alô, que fique claro que não fiquei nem chateada e muito menos magoada com aquele parágrafo sobre os doutoramentos, OK?
ResponderEliminarBelos cogumelos, nem todos para colocar no prato, mas ainda assim lindos!
~CC~
Escreva sobre as suas coisas, UJM. Eu escrevo principalmente sobre nada porque tudo me é importante.
ResponderEliminarBoa semana, e ó: escreva sobre as suas coisas. Beijos.
UJM,
ResponderEliminarTantas e tantas vezes as suas palavras são as únicas que ecoam no silêncio das minhas noites. Tantas e tantas vezes vejo os posts acabadinhos de publicar. Vim aqui parar não me recordo bem como. E se foram os folhetins da altura que me prenderam. Foi a conversa, sincera, sem pruridos,
sem tabus, sem pretensões mais ou menos sérias que a UJM promove, não só ao escrever, mas fazendo-o abrindo ao comentário, onde tão ativamente participa.
Escreva. Escreva quando lhe apetecer e do que lhe apetecer. Enquanto eu poder estarei cá para a ler e, ocasionalmente, comentar (qual velho dos marretas).
https://youtu.be/z-C8LqoAmKQ
Abraço e boa semana.
Paulo B
Boa noite,
ResponderEliminarHoje tenho mesmo de marcar presença. Todos os dias, ou melhor, todas as noites aqui venho e leio-a sempre com gosto.
Gosto de ler as suas analises politicas, os convivios familiares, "vejo" os seus pimentinhas crescerem fortes saudaveis e divertidos. (Já os "conheço" há uns sete ou oito anos).
Tenho sempre curiosidade pelas suas improvisadas ideias culinarias, pois penso que pega na receita base e dá-lhe o seu cunho muito pessoal. Há dias fe -me lembrar uma receita que aprendi muito jovem e que durante anos era o prato favorito dos meus amigos. Depois deixei de fa er, já nem sei porquê: Galinha de fricassé. Aprendi este prato quando a Vaqueiro(margarina) tinha um Instituto Culinario e dava o que agora se chama workshops, onde a minha mãe ía e eu fa ia questão de a acompanhar. Era dirigido por uma sua amiga, Francine Dupré. Muitas coisas e pessoas se perdem no tempo, mas quando casei trouxe algumas páginas de receitas que ainda conservo.(neste caso mais de 50 anos). Fi ontem não com galinha, mas com o chamado frango do campo e a familia adorou, alguns nunca tinham comido.
Já me diverti com as fotos que fa durante as férias ou no seu paraíso. O seu mundo magico onde a Nature a é soberana.
Gosto dos videos que mostra com outras vidas, outras pinturas. etc etc .Motivos há muitos para aqui passar todas as noites. Talve se lembre da companhia que me fe em momentos menos positivos. Já segui conselhos e outro modo de olhar o mesmo assunto.
Tudo isto para di er que compreendo os seus receios, mas como gosta de escrever, publique, pois leitores não lhe faltam. Ou melhor fa-nos falta!
Uma boa semana e como costuma dier- nos, a começar já por esta segunda-feira.
Um beijinho e peço desculpa pela falta do ... da ultima letra do alfabeto que parece ter entrado em greve.
Olá Susana,
ResponderEliminarPalavras tão boas de ler, palavras que agradeço.
Receba a minha estima, Susana.
JV,
ResponderEliminarLi o que escreveu quando estava a vir de ver o mar, o carro debaixo de uma valente chuvada. E, portanto, as lágrimas que senti que assomavam aos meus olhos passaram despercebidas ao condutor. Agradeço-lhe de coração e acredite que fiquei mesmo muito comovida com o que escreveu.
Lembro-me bem de quando escrevi uma coisa que não lhe caíu bem e desejei não o ter escrito mas, acredite, não imaginava que o que escrevi lhe fosse tocar numa corda sensível. Depois disso, volta e meia, ponho-me à rédea mais curta pois magoá-la é risco que não quero correr.
Tem um bom coração e é genuína e frontal. E eu sinto a maior simpatia por si, sabe disso.
É com muita estima que lhe envio um abraço, JV.
Olá ~CC~
ResponderEliminarSei, claro que sei. Aliás fez muito bem em alertar. Agradeço-lhe.
Mas foram outras reacções que não a sua que me fizeram vacilar e não apenas em relação a isto mas a outros posts ou comentários. Às vezes sem querer pode magoar-se quem não se quer. Acho que vou ter que recorrer mais vezes aos smiles e piscar de olhos para que se perceba quando estou no gozo.
Sobre os cogumelos, sabe que não faço ideia de se alguns destes são comestíveis. Tenho receio de arriscar e não sei se mesmo se forem iguais a alguns conhecidos se não haverá o risco de haver variantes, aparentemente iguais, mas venenosas. Fico-me pela contemplação. Nalguma coisa haveria de ser platónica... :) (e vai um smile!)
Abraço, ~CC~, e dias felizes para si!
Querida Gina,
ResponderEliminarTão querida, sempre tão querida, sempre tão amiga. Muito obrigada. Somos as duas assim, de escreveremos sobre as nossas coisas, sejam elas coisas muito nossas, sejam elas coisas de nada. Embora, claro, ninguém consiga igualá-la na sua espontaneidade e criatividade.
Beijinhos, Gina, gostei muito de receber o seu carinho. Dias felizes!
Olá Paulo,
ResponderEliminarTal como me emocionei ao ler o que a JV escreveu, também agora me emocionei com o abraço amigo que senti nas suas palavras. Estou a ouvir a música tão bonita que enviou. Nem sabe como palavras assim são um incentivo a que me deixe de 'pruridos' (às vezes também os tenho, Paulo, acredite) e continue a escrever sem filtro, deixando que as palavras, tal como me chegam aos dedos, cheguem depois até vós.
Muito obrigada, Paulo. Do coração lhe agradeço a sua companhia aí desse lado. E, com amizade, lhe desejo dias felizes.
Olá querida Pôr-do-Sol, minha amiga,
ResponderEliminarClaro que me lembro desses momentos e nem sabe o que eu sempre torci para que tudo estivesse bem consigo e da alegria que sempre sinto por sabê-la bem, vitoriosa. Por isso, acabo sempre a tratá-la por Sol Nascente, aquela que renasce cheia de luz.
As suas palavras de guerreira sempre foram também uma força para mim.
E, ao mesmo tempo, enternecia-me sempre o carinho com que falava da sua princesinha, sentimento que tão bem compreendo.
Sabê-la aí desse lado sabe-me muito bem, é uma boa companhia, alguém de quem sempre me senti muito próxima.
Para si vai daqui a minha amizade e o meu agradecimento.
Beijinhos Sol Nascente!