Tinha deixado a televisão da sala ligada. Fui acabar a sopa e tratar de outras pendências. Quando acabei, voltei para a sala para passar um brilhozinho nas unhas. Estava o Marques Mendes a perorar e, estando eu ocupada com uma tarefa que obriga a pouca movimentação não vá estragar o trabalhinho, deixei-o estar.
E então ouvi o impensável: na sequência da convicta defesa da retirada da comenda ao Berardo, a quem chamou burlão e aldrabão, qual justiceiro adepto da justiça popular, dispensando os órgãos institucionais que têm por missão tomar decisões sobre isso, Marques Mendes defendeu que fossem também retiradas as condecorações a Zeinal Bava e Helder Bataglia e, de caminho, também a Sócrates (uma condecoração atribuída em 2005) e isto, segundo ele, devido a, e passo a citar: apesar de "não ter sido julgado nem condenado" a sua conduta "foi inadmissível no plano ético e mancha a imagem de Portugal".
Ora não sei a que se refere ele. Se se refere àquilo que o próprio Sócrates reconheceu, de gostar de levar um estilo de vida digamos que desafogado e, para tal, recorrer a dinheiro emprestado por amigos, não sei se isso é razão para retirar condecorações a alguém. A menos que uma condecoração seja uma estrelinha de bom comportamento na caderneta. Mas, então, se é isso, o melhor é dá-las a padres e freiras e, mesmo assim, poucos passarão no crivo. Mas se refere a questões que constam da acusação e que nem o juiz Ivo Rosa ainda conseguiu digerir e que ainda estão longe de ser julgadas em tribunal que é onde estas coisas se tratam, então, uma vez mais Marques Mendes se esticou. sistematicamente mostra ser um manipulador e, se ainda é Conselheiro de Estado, muito mal aconselhado andará Marcelo Rebelo de Sousa.
E se a semana passada louvei o editorial de João Vieira Pereira, actual director do Expresso, por me parecer que estava mais atilado e isento, à segunda semana, constatei que me enganei, continua igual a si próprio, tendencioso, pouco profissional.
No artigo 'O sorriso é dele, a vergonha é nossa', no qual salta a pés juntos em cima de Berardo, não hesita em ceder ao seu vício: o de ir buscar Ricardo Salgado e, sobretudo, Sócrates, para os apresentar como os pais de todos os males do mundo para, como sempre, através deles, justificar o percurso de Berardo.
A dado ponto escreve: 'Tal como Salgado e Sócrates, também Berardo foi idolatrado. Algo que acontece com demasiada frequência. Basta lembrar que durante anos ninguém questionou a alegada herança de Sócrates que lhe permitia comprar apartamentos de luxo ou fazer uma vida desbragada numa das mais caras cidades do mundo.'
E mais à frente: 'Quando entrou no Parlamento Berardo deve ter achado que Sócrates ainda era primeiro-ministro ou que os banqueiros mandam alguma coisa'.
Uma forma rudimentar de pensar e, lamento dizê-lo, também de escrever.
E, lendo aquela prosa, fico sem perceber se o João Vieira Pereira tem dons mediúnicos e consegue ver o futuro, sabendo já a sentença do caso Marquês, ou se, uma vez mais, confunde o manuel germano com o género humano, a árvore com a floresta e a beira da estrada com a estrada da beira. Ele já sabe se Sócrates comprou mesmo apartamentos de luxo? Ele já sabe se Sócrates cometeu crimes? Se sabe, seria interessante que o dissesse. Mas que o dissesse fundamentadamente. É que eu não sei ainda de nada.
Sempre conheci João Vieira Pereira assim: pouco perspicaz, gabando o que os outros gabam, louvando o que os outros louvam, incapaz de ver um palmo à frente do nariz. Mas, quando alguém cai em desgraça, aí ele vira o mais implacável saltitão a pés juntos. Um puro maniqueísta, ainda por cima desprovido de subtileza.
Volto a dizer aquilo que sei: Sócrates foi julgado politicamente através das eleições e é nas urnas que se julga quem vai a votos. No que se refere às suspeições -- sobre as quais a gente mais incompetente que a Procuradoria já pariu construiu impunemente o maior monstro jurídico alguma vez foi visto e que temo que nenhum ser vivo conseguirá alguma vez virar de lés a lés -- há que esperar que, nas nossas vidas, alguma conclusão seja retirada.
Pela parte que me toca, a minha posição é a de sempre: qualquer pessoa é inocente até prova em contrário. E não há justiceiro de meia tigela que me faça mudar de ideias, seja ele uma espécie de conselheiro de estado, seja ele um director de jornal.
E eu, se é para ser assim, com base no diz-que-diz-que e no vale-tudo popularucho, avanço já daqui com uma proposta de condecoração com a Grã-Cruz do Macho com o Body mais Improvável para Duarte Pacheco do PSD, esse espectacular macho latino a quem não se conhecem outros feitos que não o de cultivar bem o corpo e de ter uns mamilos indecorosamente arrebitados.
E, tirando isso, nada mais.
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Acho um piadao a estes jornalistas inflamados com o Berardo e Salgados desta vida, acusando tudo e todos de terem idolatrado estas figuras.
ResponderEliminarÉ que me parece tudo um grande tiro no pé. Onde andava este jornalista justiceiro para desmascarar estas personagens enquanto era tempo? E essa idolatria foi e muito incentivada pelos meios de comunicação social onde hoje escrevem como grandes justiceiros em nome do povo.
Enfim.
É por estas e por outras que a comunicação social tradicional está nas ruas da amargura.
O que vale é que enquanto isso temos o Alexander Ekman. Ao invés de ver o Marques Mendes, aconselho a puxar para trás a emissão da rtp2 para a noite de sábado!
Boa semana
Olhe que o MM não sei não se aquilo não anda pelos lados da psicopatia, a dissimulação é tanta que assusta.
ResponderEliminarRelativamente à questão de se passar de bestial a besta é cena típica da relação idólatra de personalidades narcísicas, relação que em geral se dá nos dois sentidos, tanto no imperativo de se ser idolatrado como de se cultivarem ídolos. Como o ídolo é visto num estado de grandeza irrealista, quando vem a realidade da imperfeição do mesmo, o idólatra "merdifica-o" completamente, uma vez que neste tipo de relações há um vínculo invejoso negado associado à luta pelo poder fantasiado ou mesmo real.
Uma rica 2.ª feira.
PS: Que visão do inferno, o Duarte Marques! Só esse tronco desproporcional em altura, que medo!
Boa tarde
ResponderEliminarComeço por fazer uma declaração de interesses.
Fiquei traumatizado:
a) Sou português e por isso foi um enorme soco na "tola" ter um ex-primeiro ministro suspeito de corrupção;
b) Sou empregado da PT (agora Altice) e por isso foi um enorme soco na "tola" ter um ex-presidente da empresa suspeito de gestão danosa/corrupção;
Dito isto, tenho que afirmar que passado o período de necessário nojo, teve inicio o tempo analítico e, por essa razão, subscrevo o que escreve UJM. A análise ao que vamos lendo e ouvindo permite acrescentar que a POC* manifestada pelo pequeno MMend(t)es também é observável JMTavares e pelos PRangel e NMelo, e o "Soscras" nem é candidato (como seria se fosse!!).
*POC --> Perturbação Obsessiva Compulsiva, esta doença psicológica deriva de um distúrbio de Ansiedade, que mantém a pessoa num estado de vigília e alerta.....uma doença psicológica extremamente limitadora e que se não for tratada atempadamente, tem tendência a agravar...
Abç
Ah, Paulo, o Alexander Ekman que conheci através de si. No sábado, foi? Tenho que ver. Tem razão, o que valem mil parvoíces e baboseiras perto da arte de dançar?
ResponderEliminarOnde andava o director do Expresso? Ele bem pode dizer que esteve sempre lá. E esteve. Louvando quando todos louvavam e espezinhando quando todos espezinham.
Ainda este sábado lendo sobre o João Pereira Coutinho, o artigo terminava contando que ele tinha convidado o jornalista para almoçar antes de ir num avião particular dar um passeio. Os jornalistas habituam-se ao bem-bom dos belos almoços e jantares e ao contacto com quem bebe do fino e, depois de terem papado e bebido do bom e do melhor claro que não vão morder a mão que lhes deu de comer.
Abraço, Paulo, e thanks pela dica!
Francisco,
ResponderEliminarEste seu comentário deveria ser emoldurado, ou tatuado na testa do Marques Mendes. E do João Vieira Pereira também. Tal e qual. Nunca vi tão bem descrito.
Acho que na próxima vez que falar de um deles venho aqui buscar esta sua descrição.
E o corpo daquele Duarte Pacheco é isso mesmo, um susto, uma fantasia, um disfarce de carnaval. Fartei-me de rir com o que escreveu. A gente vê e não acredita, pois não?
:)))
Oh, muito obrigado!
EliminarMuito boa, a sua descrição do DM...Que risada!!
Um rico dia.
Olá Smiley Lion,
ResponderEliminarGostei de ler o que escreveu. Um leão sorridente já de si inspira simpatia mas a escrever assim ainda mais me agrada.
Eu não sei se é essa POC ou se é, antes, o que está explicado no comentário do Francisco:
"Como o ídolo é visto num estado de grandeza irrealista, quando vem a realidade da imperfeição do mesmo, o idólatra "merdifica-o" completamente, uma vez que neste tipo de relações há um vínculo invejoso negado associado à luta pelo poder fantasiado ou mesmo real."
É isso, o Sócrates já não é primeiro-ministro já já devem ir uns oito anos e, no entanto, é o que se vê, uma obsessão constante, como se o homem fosse o pai e a mãe de todos os males do mundo.
Abraço, Smiley Lion!